Numa reunião a portas fechadas, senadores discutem estratégias para defender o mandato de Dilma Rousseff. Sem o tom inflamado da tribuna, a petista Gleisi Hoffmann admite que a queda da presidente é questão de tempo. “Nós vamos perder na comissão, isso está claro”, diz. “Vamos falar sério aqui. Se ela voltar, não tem condição de governar”, acrescenta.
A cena está em “O Processo”, de Maria Augusta Ramos, que chega aos cinemas na semana que vem. Será a primeira estreia da safra de documentários filmados durante a crise do impeachment.
A diretora focou suas lentes no Senado, onde se desenrolou o último capítulo da novela. A ação vai de abril a agosto de 2016, quando a presidente é afastada definitivamente. Foram quatro meses e meio de debates inúteis. Quando a partida começou, os dois lados já sabiam qual seria o placar. Mesmo assim, era preciso cumprir o rito previsto na Constituição.
O filme expõe o lado mais farsesco do processo que instalou Michel Temer no poder. Os senadores se atrapalham com os termos da acusação, baseada em pedaladas fiscais e decretos de crédito suplementar. No fim, a autora do pedido de impeachment reconhece que era tudo pretexto. Nas palavras dela, Dilma não seria derrubada por “questões contábeis”.
A professora Janaína Paschoal é responsável por alguns momentos de alívio cômico. Depois de uma fala histriônica, ela repõe as energias atacando uma caixa de Toddynho. Em outra passagem, o peemedebista Raimundo Lira pede a troca da campainha usada para silenciar os colegas. Ele explica que o volume não estava “à altura do momento histórico no Brasil”.
Na maior parte do tempo, não há motivos para rir. Os fatos se sucedem em ritmo monótono, sem muita novidade para quem acompanhou o noticiário da época. A produção também carece de bastidores da ala pró-impeachment. O ponto de vista dominante é o da defesa, que repete o discurso do golpe à exaustão.
O documentário ganha força quando expõe as contradições do processo. Num ponto alto, o ex-ministro Gilberto Carvalho ensaia uma rara autocrítica sobre a derrocada do PT. Com mais de duas horas de duração, o filme fica devendo outras cenas fora do script.