Não é preciso simpatizar com as ideias de Jean Wyllys. Quem preza a democracia deve se preocupar com o anúncio feito ontem pelo deputado do PSOL. O parlamentar abriu mão do terceiro mandato, para o qual foi reeleito em outubro, e decidiu deixar o país. O motivo foram as seguidas ameaças de morte que ele já havia informado à polícia.
Jean é um dos raros políticos brasileiros que se declaram homossexuais. Sempre defendeu bandeiras da causa LGBT, como o casamento civil de pessoas do mesmo sexo. Era uma voz solitária num Congresso que não espelha a diversidade da sociedade brasileira. Para ficar num exemplo: as mulheres são a maioria da população, mas ocupam apenas 10% das cadeiras na Câmara. Na próxima legislatura, serão 15%.
O deputado também ficou conhecido como desafeto de Jair Bolsonaro. Os dois trocaram ofensas públicas no plenário da Câmara e nas redes sociais. A disputa já foi parar no Conselho de Ética e no Supremo Tribunal Federal. Em dezembro, o ministro Celso de Mello arquivou uma queixa do presidente contra o rival.
Depois do atentado contra Bolsonaro, Jean relatou um aumento no tom das ameaças. Ele se tornou um alvo preferencial de militantes bolsonaristas. A Justiça já condenou um deputado eleito do PSL, partido do presidente, por acusá-lo falsamente de defender a pedofilia. O parlamentar pediu proteção policial e passou a andar com escolta.
Não é prudente desdenhar das ameaças. Há dez meses, a vereadora Marielle Franco, também do PSOL do Rio, foi assassinada a tiros. Há 12 dias, o carro da deputada Martha Rocha, do PDT fluminense, foi alvo de tiros de fuzil. Os dois casos ainda não foram esclarecidos pelas autoridades.
Adversário político de Jean, o deputado Rodrigo Maia reconheceu a importância de seu mandato e disse que ninguém pode ameaçar um parlamentar impunemente. Fez o que se esperava de um presidente da Câmara. O presidente Bolsonaro e seu filho Carlos, o “02”, preferiram usar o Twitter para debochar da renúncia. Ninguém pode dizer que esperava outra coisa.