Dirigentes da FAP participam de seminário sobre Gramsci em Roma

O seminário tem a finalidade de "realizar uma discussão envolvendo os estudiosos do pensamento de Gramsci em diversas partes do mundo"

Por Germano Souza Martiniano

[dropcap type="2"]A[/dropcap] Fundação Astrojildo Pereira (FAP) participará, nos próximos dias 18 a 20 de maio, do Seminário Hegemonia e Modernidade, em Roma, Itália, no momento em que se completam os 80 anos da morte de Antonio Gramsci, uma das referências essenciais do pensamento de esquerda no século 20, co-fundador do Partido Comunista Italiano. O evento, organizado pela Fundazione Gramsci, tem o objetivo de "realizar uma discussão envolvendo os estudiosos do pensamento de Gramsci em diversas partes do mundo" e também destaca, com o convite feito à FAP, o papel da Fundação como uma instituição de cultura da esquerda democrática brasileira que tem, no filósofo marxista, uma de suas referências.

A FAP estará sendo representada no seminário por meio de dois de seus dirigentes, especialistas em Gramsci no Brasil, Alberto Aggio e Luiz Sérgio Henriques (que também é tradutor do filósofo). Para Aggio, o convite da organização do evento, para que a Fundação Astrojildo Pereira integrasse o seminário, foi um forte reconhecimento das atividades de publicação e tradução do pensamento de Gramsci realizado pela FAP e de seus comentadores aqui no Brasil. "Um reconhecimento que deve ir além da Itália", avalia Aggio.

Em rápida entrevista para a FAP, Aggio e Luiz Sérgio ressaltaram a importância do evento. Confira, a seguir:

O que este seminário pode contribuir para a FAP?

Alberto Aggio: A FAP se coloca internacionalmente como uma instituição da cultura da esquerda democrática que tem em Gramsci uma de suas referências. O convite dos italianos significa um reconhecimento das nossas atividades de publicação e tradução do pensamento de Gramsci e de seus comentadores aqui no Brasil. É um reconhecimento que deve ir além da Itália.

Luiz Sergio Henriques: A FAP é uma fundação ligada ao Partido Popular Socialista (PPS), que por sua vez, vem do Partido Comunista Brasileiro (PCB). O PCB sempre teve relações muito fortes com os comunistas italianos, sendo Gramsci um deles. Portanto, o intercâmbio de ideias entre italianos e brasileiros, mantendo essa corrente de pensamento viva entre Brasil e Itália, é bom para nós, bom para os marxistas brasileiros, bom até para os não marxistas. E é bom, também, para os italianos quando levamos a tamanha complexidade da vida social brasileira.

Gramsci é um dos maiores intelectuais do Século XX, qual a importância de relembrar os 80 anos de sua morte?

Alberto Aggio: Gramsci é hoje o pensador que, vindo do marxismo, demonstrou uma vitalidade impressionante ao se voltar para temas que até então o marxismo não havia se embrenhado. Ele enfrentou o momento de uma passagem ou "mudança epocal", relativamente similar à que estamos vivendo hoje, com o aumento da importância da visão global do mundo e também da complexidade da vida social. Isso repercutiu num pensamento que, a nós hoje, aparece com grande atualidade para se pensar os impasses da vida, da cultura e da política democrática atual.

Luiz Sergio Henriques: Os marxistas, em geral, possuem uma concepção pobre da política e do estado, eles tendem a raciocinar muito dicotomicamente, como se houvesse duas classes, operária e burguesa, em conflito direto sem mediações, sem instituições políticas, sem a cultura, sem a história de cada país, etc. Com Gramsci é diferente, pois ele leva esses fatores em conta, ele dá explicações metodológicas para mostrar que a luta política não é um confronto apenas econômico e uma luta direta entre classes, e sim, algo mais complexo, com mais atores políticos, na qual a cultura tem papel fundamental, pois não se muda a realidade sem estar plenamente consciente da dimensão cultural, do modo como as pessoas pensam e agem. Essa é a riqueza do pensamento de Gramsci e por isso a importância de se relembrar os 80 anos de sua morte.

* Germano Souza Martiniano é Assessor de Comunicação da Fundação Astrojildo Pereira (FAP)

A programação completa do Seminário Hegemonia e Modernidade pode ser conferida clicando na imagem abaixo ou no link http://www.fondazionegramsci.org/convegni-seminari/egemonia-e-modernita/


Roberto Freire: O governo das reformas

Há exatamente um ano, no dia 12 de maio de 2016, se iniciava o governo de transição do presidente Michel Temer, ainda na condição de interinidade após a instauração do processo de impeachment de Dilma Rousseff pela Câmara dos Deputados. Nesse período, em meio a enormes dificuldades decorrentes de um perverso legado de desmantelo e irresponsabilidade deixado pelas gestões lulopetistas nos últimos 13 anos, o Brasil já logrou êxito em diversas áreas e vem caminhando a passos largos para superar a crise e retomar o caminho do desenvolvimento.

Uma série de mudanças necessárias para fazer o país voltar aos trilhos vêm sendo levadas a cabo de forma corajosa pelo atual governo, que conta com um apoio parlamentar poucas vezes visto. Trata-se de uma gestão que já pode ser apontada como uma das mais reformistas da história republicana brasileira, sendo comparável ao período de Itamar Franco (1992-1994), a quem servi honrosamente como líder na Câmara.

A aprovação do texto-base da reforma trabalhista é um exemplo importante do compromisso do governo com a modernização das relações de trabalho e o avanço do país. O projeto, que ainda será analisado pelo Senado, dá força de lei aos acordos coletivos entre empresas e trabalhadores e busca posicionar o Brasil na vanguarda, superando o engessamento e o anacronismo de uma legislação que não é mais capaz de se conectar com a realidade do mundo de hoje e do futuro.

A proposta da reforma da Previdência, já aprovada em uma comissão especial da Câmara antes de seguir para análise do plenário da Casa, também faz parte desse pacote de medidas fundamentais para tirar o Brasil do atoleiro. O texto é resultado de um amplo debate com as bancadas de todos os partidos e representa a possibilidade de o país economizar nada menos que R$ 600 bilhões nos próximos dez anos – aliviando o déficit previdenciário que hoje ameaça a aposentadoria de milhões de brasileiros e a própria sustentabilidade do sistema.

Além das reformas mais importantes, o governo do presidente Temer acertou ao decidir pela liberação de saques do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Até a última atualização da Caixa, mais de R$ 16,6 bilhões foram sacados. As estimativas dão conta de que mais de 30 milhões de trabalhadores que pediram demissão ou foram demitidos até 31 de dezembro de 2015 sejam beneficiados em todo o país. Os recursos totalizam R$ 43,6 bilhões referentes a cerca de 50 milhões de contas inativas.

Ao contrário do que diziam os lulopetistas, o atual governo também se preocupou com o fortalecimento dos programas sociais. Uma das primeiras medidas foi o reajuste de 12,5% do Bolsa Família, valor acima da inflação registrada nos 12 meses anteriores. Além disso, mais de 10 mil unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida, cujas obras estavam paralisadas, foram retomadas.

Na área educacional, foram renovados mais de 1,1 milhão de contratos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e houve o repasse de R$ 5 bilhões para instituições federais dos ensinos básico, técnico e superior. O governo ainda aprovou a medida provisória que reformula o Ensino Médio, um passo determinante para reformarmos um modelo que já não funciona e conduzirmos o país a um novo patamar de desenvolvimento.

Em apenas um ano, foram aprovadas outras medidas fundamentais como a PEC do Teto dos Gastos Públicos, a MP do setor elétrico, o projeto que desobriga a Petrobras de participar de todos os consórcios de exploração do pré-sal, a Lei de Governança das Estatais, entre tantas outras que ajudam a recuperar a confiança perdida junto à sociedade e aos agentes econômicos.

Após o desastre econômico gerado por Lula e Dilma, o Brasil já vislumbra um horizonte menos tempestuoso. O último boletim Focus, do Banco Central, indica uma perspectiva de inflação menor e crescimento maior do PIB brasileiro em 2017. A estimativa é de um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), antes em 4,03%, agora em 4,01% - a 9ª redução consecutiva do indicador, que está dentro da meta estipulada pelo governo (4,5%). Já em relação ao desempenho do PIB, a projeção oscilou positivamente de 0,46% para 0,47%. Para 2018, a expectativa é de alta de 2,5%.

É evidente que não se resolverão todos os graves problemas do país da noite para o dia, mas o importante é que o Brasil está de volta aos trilhos e no rumo certo. Ainda vivemos um momento delicado, com cerca de 14 milhões de desempregados. Historicamente, o emprego é o último indicador a se recuperar em meio às grandes crises econômicas, mas certamente isso também vai acontecer, sobretudo a partir da aprovação das reformas.

Há um ano, quando Temer assumiu a Presidência da República, poucos imaginavam que o Brasil seria capaz de se reerguer e sair do fundo do poço em tão pouco tempo. O caminho que temos pela frente ainda é longo e árduo, mas os primeiros passos foram dados e servem como alento para que a população não perca a esperança no país. Atravessaremos essa transição com um governo corajoso e reformista, que nos levará ao porto seguro de 2018.

* Roberto Freire é ministro da Cultura


Luiz Carlos Azedo: O juiz de Bruzundanga

Afinal, o que seria de Bruzundangas se todos tivessem a mesma aposentadoria e os mesmos direitos?

A República de Bruzundanga, de Lima Barreto, completa 95 anos, uma efeméride pouquíssimo lembrada, a não ser por alguns estudantes de Literatura. Às vésperas de Natal de 2014, ela já havia sido abalada por um escândalo envolvendo a maior empresa estatal do país, uma petroleira, e os donos da nação, entre os quais estavam a Mandachuva — a primeira mulher a assumir a Presidência — e seu padrinho, o Mandachuva que a antecedera. O problema é que ninguém ainda sabia disso, a não ser o cronista que reconta essa história, num tributo ao escritor carioca maldito (ele era pobre, mulato e gay).

No país imaginário de Lima Barreto, a esposa do presidente de uma grande empresa que estava preso ameaçara contar tudo o que sabia à polícia e à Justiça sobre o maior escândalo de corrupção da nação, se o marido passasse o ano-novo na cadeia. Estava revoltada porque os donos da empresa decidiram demitir todos os executivos e foram passar o Natal em um balneário do Caribe, depois de encerrar os negócios no ramo da construção para viver de outras fontes de renda. O recado veio cifrado numa nota de coluna de jornal.

Por essa razão, o executivo foi solto, chegou a fazer uma delação premiada, mas ela foi incinerada pelas autoridades porque houve um vazamento do conteúdo para jornais e revistas sensacionalistas, que insistiam em escandalizar o povo com os podres da República. O problema é que ele não desistiu, negociou nova delação, com mais 40 executivos da empresa. Em sua obra póstuma, o mestre do escárnio já havia desnudado a essência de Bruzundanga. Quase cem anos depois, nada havia mudado quanto aos costumes políticos. Só as velhas patacas foram substituídas pelo barusco, a moeda criada em homenagem ao ex-diretor da petroleira local que resolveu denunciar as falcatruas que escandalizavam o mundo naquele Natal. Mas já estavam inflacionadas pela enxurrada de dólares que jorraram das plataformas da petroleira para misteriosas contas no exterior.

O ex-mandachuva continuou a trajetória como aquele personagem de Todos os homens são mortais, de Simone de Beauvoir, o Conde Fosca, já citado em 2014, quando começou a Operação Enxuga Devagar. Se vocês não se lembram, por ser imortal, esse personagem podia decidir o que quisesse, os outros pagavam com a própria vida quando algo dava errado. Naquele Natal, a esposa de um executivo da petroleira que havia sido preso procurara o secretário particular do ex-mandachuva e avisara que contaria tudo se o marido continuasse em cana. Ele também foi solto a tempo de participar do amigo oculto da família, graças à Mandachuva, que gastou um dos cartuchos que tinha no tribunal para conseguir-lhe um habeas corpus. Coisas que ainda aconteciam em Bruzundangas.

Privilégios

Mas havia um juiz ferrabrás numa das províncias que resolveu subverter a ordem natural das coisas e pôs em cana todos os envolvidos no escândalo ao seu alcance. O ex-diretor da petroleira, convencido pela família, resolveu falar o que sabia. Relatou três encontros com o ex-mandachuva, que tinha conhecimento de tudo o que se passava na petroleira e agora ele está na iminência de ser preso. O executivo da estatal também entregou a ex-mandachuva, que meteu as mãos pelos pés e, no passado, acabou apeada do poder. Agora, também corre o risco de ser condenada e presa.

No meio de tanta confusão, o vice-mandachuva assumira o poder. Nele ainda se equilibra para terminar o mandato e chegar às eleições nacionais do ano que vem. A situação no país continua delicada. Durante a crise mundial, o povo viveu no mundo da fantasia, gastando mais do que podia, como naquela fábula da cigarra e da formiga. Agora, a saída é acabar com os privilégios e reinventar a economia, mas a elite política, os empresários que mamam nas tetas do governo e a alta burocracia resistem às reformas. Afinal, o que seria de Bruzundangas se todos tivessem a mesma aposentadoria e os mesmos direitos? O escândalo na petroleira virou o país de cabeça pra baixo. Quem foi mandachuva em Bruzundanga jamais perde a majestade. Na quarta-feira, ele será interrogado pelo juiz ferrabrás. O problema é que o tal magistrado veio de Curitiba.

* Luiz Carlos Azedo é jornalista.


Hélio Schwartsman: Reforma trabalhista

Se planejar todos os aspectos da vida econômica resultasse num ordenamento eficiente, os Estados comunistas teriam dado certo. Não deram.

Raciocínio análogo se aplica à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que, com mais de 900 artigos, pretende regular nos detalhes as relações entre patrões e empregados.

São reduzidas as chances de esse calhamaço de imposições legais, muitas delas concebidas para lidar com a realidade laboral dos anos 40, que não existe mais, produzir soluções satisfatórias para ambas as partes.

Um exemplo banal. Lembro de já ter sido forçado diversas vezes pela CLT a sair em férias em períodos em que fazê-lo não interessava nem a mim nem à empresa. Ora, uma legislação deixa os dois lados insatisfeitos e não traz nenhum benefício público não tem razão para existir.

É óbvio que nem tudo na CLT são firulas como essa. Alguns de seus artigos (poucos) estabelecem normas que efetivamente protegem o trabalhador, mas não há dúvida de que já passa da hora de promover uma rodada de desregulamentação que nos livre dos anacronismos, ingerências e aposte na capacidade das partes de resolver seus problemas sem a tutela do Estado.

A livre negociação, vale lembrar, está na base da democracia e é um dos principais elementos que explicam o melhor desempenho da economia de mercado sobre outras formas de organização social.

É difícil dizer se a reforma proposta pelo governo é a ideal. Ela até caminha na direção correta, mas só saberemos se não contém exageros depois que ela for colocada em prática e produzir resultados.

Se surgirem efeitos deletérios provocados pela mudança na legislação e não pela crise econômica (é fácil confundir as duas coisas), não será complicado voltar atrás. Parlamentares não hesitam muito antes de aprovar “direitos”. É em parte por causa dessa tendência que nos metemos na enrascada fiscal em que estamos.


Pesquisa mostra aumento da confiança dos brasileiros sobre a situação econômica

As medidas de ajuste já implementadas pelo governo de transição do presidente Michel Temer que resultaram na redução do índice de inflação, dos juros e no controle dos gastos públicos estão aumentando a confiança dos brasileiros na retomada da econômica depois da crise provocada pelo desgoverno do PT.

É o que aponta a pesquisa do instituto Datafolha divulgada nesta terça-feira pelo jornal “Folha de S. Paulo” (veja aqui). A pesquisa mostra um salto de 37% para 45% na porcentagem dos que esperam uma melhora econômica em sua vida pessoal. Já os que acham que sua situação vai piorar caiu de 27% para 18%, enquanto 34% consideram que nada mudará.

O levantamento registrou ainda uma queda de 10% em relação ao pessimismo sobre a sua situação econômica e do País na comparação com dezembro de 2017. De acordo com o Datafolha, a redução foi de “41% para 31% na porcentagem dos que acham que a economia brasileira vai piorar.”

A parcela de quem prevê melhoria na situação da economia do País também aumentou, passando de 28% para 31%, mas os que acham que tudo ficará como está são 35%, ante 27% no fim do ano passado.

A pesquisa Dafolha ouviu 2.781 pessoas em 172 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

 

 


Luiz Carlos Azedo: Ossos do ofício

Vamos raciocinar friamente: para uma “greve geral” na qual supostamente 40 milhões de trabalhadores cruzaram os braços, as manifestações do Primeiro de Maio de ontem não passaram de protestos tradicionais. Com a diferença de que milhões de diaristas e outros trabalhadores informais rogaram aos patrões que os deixassem trabalhar no feriado, para recuperar o dia em que faltaram ao serviço, contra a própria vontade, porque os ônibus não circularam nas periferias.

Isso significa que as paralisações, os protestos, os vandalismos e os excessos policiais devem ser subestimados? Não, de forma alguma, são sintomas de um processo de radicalização política que complica mais do que ajuda a resolver as questões. A violência nas manifestações do dia 28 de abril reforçou a narrativa do golpe contra a Dilma Rousseff e de que o país caminha por uma via autoritária, o que é completamente falso, mas está colando na mídia internacional.

Ossos do ofício para o governo Temer, que resultou de um processo de impeachment e herdou a baixíssima popularidade da ex-presidente Dilma. Considerando também o fato de que vários ministros estão sob investigação da Operação Lava-Jato, até que o balanço dos protestos não é tão desfavorável. As votações das reformas da Previdência, na Câmara, e trabalhista, no Senado, para onde convergem as pressões da oposição, serão a prova dos nove. As duas reformas são uma espécie de rubicão, tanto para o governo Temer como para o país.

O governo Temer tem três pontos de sustentação: o primeiro é a Constituição, que lhe garante o respaldo das Forças Armadas e o reconhecimento dos demais poderes da República; o segundo, a política econômica e a blindagem da equipe que a conduz; o terceiro, a ampla base parlamentar no Congresso, que está sendo posta à prova. É como uma mesa que se mantém de pé sem uma perna, porque o peso que suporta está sobre a superfície escorada. Se perder um desses pés ou o peso se deslocar para o outro lado, ela cai.

A perna que lhe falta é o apoio da opinião pública, que está à deriva. A oposição está pior das pernas do que o governo, porque sofreu uma dupla derrota no ano passado: a perda do poder central, com o impeachment de Dilma; e, logo depois, a fragorosa derrota nas eleições municipais. O imponderável são as reformas da Previdência e trabalhista, que estão mexendo com a opinião pública; as forças derrotadas pelo impeachment estão se aproveitando disso, principalmente o PT, que procura renascer das cinzas, apesar da imagem carbonizada.

As reformas

Quem está contra a reforma da Previdência são os servidores públicos que têm aposentadorias privilegiadas, entre os quais se incluem algumas poderosas corporações das carreiras de Estado. Num país cujas instituições mais importantes foram criadas por uma elite escravocrata, mexer em certos privilégios é verdadeira blasfêmia. Além disso, certas categorias de servidores, ao passar dos anos, foram realmente aviltadas, o que faz das aposentadorias e pensões com salários integrais uma espécie de compensação de toda uma vida. O problema é que a Previdência, com a mudança do perfil demográfico da população, se tornou insustentável. Entretanto, ninguém espere uma rendição dos privilegiados. Não sabem o que é derrota, sempre ganharam a queda de braços.

No caso da reforma trabalhista, a questão é parecida. Escorada na velha CLT do Estado Novo, de inspiração fascista, formou-se uma enorme burocracia na estrutura sindical, que dispõe de recursos cativos que não dependem do desempenho de seus dirigentes nas campanhas salariais. Há também um pacto perverso entre sindicalistas e patrões quanto ao imposto sindical, que também é recolhido em favor das entidades patronais. São 16 mil sindicatos, com dezenas de diretores e centenas de empregados cada, um exército de centenas de milhares de ativistas, cujos piquetes profissionalizados são capazes de paralisar os transportes e tumultuar a vida das cidades.

A reforma da Previdência e a reforma trabalhista não são um capricho de Temer para passar à história como estadista, são exigências urgentes da economia. Estamos vivendo o esgotamento de um modelo de capitalismo no Brasil, que se baseava na brutal transferência de recursos públicos para os monopólios privados, pela via dos contratos de obras e serviços, dos privilégios fiscais, dos empréstimos camaradas, tudo isso acompanhado de mecanismos de financiamento político dos partidos no poder e reprodução das oligarquias, além do enriquecimento pessoal de seus operadores. Esse modelo foi desnudado pela Operação Lava-Jato, mas seu colapso também tem a ver com uma revolução tecnológica que pôs em xeque os meios de produção e as relações de trabalho tradicionais. Ela é irreversível.

* Luiz Carlos Azedo é jornalista.

 

 

 


1º de Maio: Dia de luta e de reflexão sobre a necessidade das reformas

Davi Zaia

O Partido Popular Socialista (PPS), sucedâneo do PCB (Partido Comunista Brasileiro), com firme e histórica presença nos movimentos sindicais e nas lutas de nosso povo, saúda os trabalhadores brasileiros pela passagem de mais um 1º de Maio e conclama mulheres e homens do mundo do trabalho a refletirem sobre o momento de profunda crise econômica e política deixada pelo desgoverno do PT (Partido dos Trabalhadores) ao País e da necessidade das reformas da Previdência e trabalhista propostas pelo governo de transição do presidente Michel Temer.

O desemprego recorde de 13,7% no primeiro trimestre deste ano registrado pelo IBGE, que já atinge 14,2 milhões de pessoas, mostra a dimensão da crise na qual as gestões lulopetistas mergulharam o Brasil, marcadas ainda pelo desequilíbrio das contas públicas, inflação e juros altos, e pelos dos escândalos de corrupção do mensalão e do petrolão.

Para enfrentar a herança maldita do PT e recuperar a economia, o PPS reconhece a importância das medidas adotadas pelo governo Temer – redução da inflação, queda dos juros, liberação do dinheiro das contas inativas do FGTS (Fundo de Garantis por Tempo de Serviço), além da aprovação a PEC dos Gastos Públicos no ano passado para o equilíbrio financeiro – e apoia as propostas apresentadas pelo Executivo ao Congresso de reformas da Previdência e trabalhista.

O PPS considera fundamental o avanço da reforma previdenciária para garantir a estabilidade do sistema de aposentadorias no País e contribuiu para aperfeiçoar o projeto, apresentando diversas propostas que foram acatadas pelo relator da matéria na comissão especial da Câmara, deputado Arthur Maia (PPS-BA).

O partido também avalia que a reforma trabalhista, já aprovada na Câmara e que agora segue para votação no Senado, é um passo importante para a modernização das relações de trabalho no Brasil e que as mudanças preservam os principais direitos dos trabalhadores, dentre eles o 13º salário, férias e a jornada de trabalho.

PPS tem posição clara de que é preciso modernizar a legislação trabalhistas e previdenciária para torna-las mais adequadas ao momento atual de enormes dificuldades provocadas pelo crescente desemprego e também das constantes mudanças no mundo do trabalho.

Neste 1º de Maio, o PPS conclama todos os trabalhadores brasileiros a refletirem sobre os caminhos que o País terá de trilhar para superarmos a crise, buscarmos a estabilidade política e o crescimento econômico, reafirmando o compromisso com o Brasil, o fortalecimento da democracia e o respeito aos princípios republicanos.

* Davi Zaia é presidente do PPS


Luiz Carlos Azedo: A greve geral

“Não houve greve geral, houve paralisações de servidores e nos transportes, muita agitação e vandalismo”, disparou o Sueco

“No meu tempo, Saldanha, essa greve seria considerada um fracasso; cadê a classe operária? Greve foi a de 1953, em São Paulo. O que você acha, Chamorro?”, indagou o Sueco, como era conhecido Geraldo Rodrigues dos Santos, o Geraldão, um negro alto, de fala mansa e sorriso fácil. Santista, Geraldão era portuário e participou intensamente da greve que parou São Paulo e o Porto de Santos na década de 1950. Durante o regime militar, dirigiu o PCB na antiga Guanabara, na mais rigorosa clandestinidade, onde reencontrou os dois camaradas.

Seu amigo João Saldanha, o Souza, ficou famoso como comentarista esportivo e técnico da seleção brasileira de futebol, mas, na década de 1950, era dirigente do PCB no bairro paulista da Moóca, onde a greve começou. Fazia a ligação entre o líder comunista Carlos Marighella e o comando de greve. Durante a ditadura, deu cobertura para o velho amigo Geraldo, que andava com uma cápsula de cianureto no bolso para ingerir caso fosse preso. O Sueco havia jurado não delatar nenhum companheiro na tortura; preferiria morrer se fosse preso.

Geraldão vivia num “aparelho” na Favela da Maré, que somente alguns familiares e o motorista Dedé, que tinha um táxi, conheciam. O terceiro camarada na conversa vivia clandestino em Niterói, com o nome de Paulinho, onde organizava os trabalhadores têxteis e operários navais. Era ninguém menos do que Antônio Chamorro, um dos líderes da greve geral, ao lado da também tecelã Maria Sallas e do metalúrgico Eugênio Chemp.

“O Marighella chegou na redação do Notícias de Hoje, reuniu todo mundo e apresentou o plano de parar a capital, a ferrovia e o porto de Santos. Depois, pretendia abrir as sedes do partido na marra”, relata Saldanha, que já era jornalista. O PCB vinha de uma derrota eleitoral fragorosa para Jânio Quadros, que obtivera 285 mil votos na disputa pela Prefeitura da capital, na capital paulista, enquanto André Nunes Júnior, apoiado pelos comunistas, não chegara a 17 mil votos. A eleição havia acontecido três dias antes, em 22 de março. A tese parecia uma loucura do líder comunista, que, na década de 1970, viria a aderir à luta armada e acabou morto pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, durante a Operação Bandeirantes.

Naquele 25 de março, o PCB completava 31 anos. Chamorro e Maria Sallas lideravam uma assembleia de trabalhadores da indústria têxtil no Salão Piratininga, na rua da Moóca, na qual reivindicavam 60% de aumento salarial. Por causa da inflação, o apoio à greve foi quase unânime. No dia seguinte, encabeçados por Eugênio Chemp, os metalúrgicos aderiram à greve, lutavam por 800 cruzeiros a mais nos salários. No terceiro dia de greve, eram 70 mil operários concentrados no antigo hipódromo da Moóca. Piquetes de mil trabalhadores saíram em direção às demais fábricas de São Paulo, parando 70 empresas no dia seguinte. Houve repressão, mais de duas mil pessoas foram presas, Chemp quase levou um tiro. Uma tecelã e um metalúrgico foram feridos à bala. Mesmo assim, marceneiros, carpinteiros, padeiros, sapateiros, vidreiros, gráficos e até os trabalhadores da cervejaria Brahma pararam. Eram 300 mil operários de braços cruzados.

Chemp encerrava ali sua carreira paralela de craque do São Paulo Futebol Clube, onde até hoje figura na lista dos estrangeiros que mais brilharam no clube: 14 gols em 19 jogos, em oito vitórias, seis empates e cinco derrotas. Nasceu em Kiev, na Ucrânia, mas tinha nacionalidade uruguaia. Chamorro era brasileiro, descendente de espanhóis. O Brasil transitava do rural para o urbano com a industrialização de São Paulo, cuja capital passara a ser a maior cidade do país. No começo da década de 1950, mais de 1 milhão de trabalhadores fizeram greves, que traziam a novidade de lutar contra a carestia, ou seja, contra a inflação, e não apenas por aumentos salariais.

Paraquedas
O Pacto de Unidade Intersindical (PUI), que resultou dessas greves, foi uma reação à CLT de Vargas e ao atrelamento dos sindicatos ao Ministério do Trabalho, que hoje as centrais sindicais estão defendendo, num período de expansão da indústria e do trabalho assalariado no campo; em contrapartida, havia inflação alta e superexploração do trabalho. Com o fortalecimento dos sindicatos, o movimento desaguou na greve geral de julho de 1962, quase dez anos depois, que resultou na conquista da lei do 13º salário, sancionada pelo presidente João Goulart. Mas voltemos à conversa entre os três amigos, sentados na beira de uma nuvem bem alta, lá no céu.

“O que você achou da greve, Geraldo?”, perguntou Saldanha. “Não houve greve geral, houve paralisações de servidores e nos transportes, muita agitação e vandalismo”, disparou o Sueco. “Só espero que ninguém morra”, completou Chamorro. Foi uma alusão ao Primeiro de Maio de 1953, comemorado no antigo hipódromo da Moóca, após a conquista de 32% de aumento salarial para praticamente todas as categorias grevistas.

A história é a seguinte: Um anarquista italiano, para abrilhantar a festa, resolveu saltar de paraquedas. Acontece que o equipamento não abriu e a festa virou tragédia. Revoltada, a família não queria um enterro de herói da classe operária. Os grevistas, porém, insistiram e fizeram, na marra, um funeral de gala. Bradavam: “O cadáver é nosso!”

Luiz Carlos Azedo é jornalista

 


Luiz Carlos Azedo: Outro rombo no casco

O coração da investigação sobre Duque é a criação da Sete Brasil, pela Petrobras, para a construção de 21 sondas de perfuração no pré-sal

Às vésperas da greve geral convocada para hoje, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu mais um torpedo abaixo da linha d’água: a notícia de que o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque fará delação premiada. Preso em Curitiba, a sua defesa protocolou ontem um pedido de novo interrogatório ao juiz federal Sérgio Moro, no qual os advogados afirmam que “o acusado de forma espontânea e sem quaisquer reservas mentais, pretende exercer o direito de colaborar com a Justiça”. Ao lado do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, Duque fazia parte da blindagem petista a Lula e Dilma Rousseff no escândalo da Petrobras.

Duque mira a redução da pena. Em quatro ações penais, uma das quais por lavagem de dinheiro e ocultação de bens e valores, foi condenado a mais de 50 anos de prisão e responde a outros seis processos na 13ª Vara Federal de Curitiba. Tudo indica que sua delação está em linha com a do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, que também tentou convencer Vaccari a contar tudo o que sabe sobre o esquema de corrupção que operava em nome da cúpula do PT. Se Vaccari aceitar o acordo, a situação da cúpula petista, de Lula e de Dilma ficará mais complicada.

O coração da investigação sobre Duque é a criação da Sete Brasil, pela Petrobras, para a construção de 21 sondas de perfuração no pré-sal, com a participação da Odebrecht, dos fundos de pensão, do BNDES e alguns bancos. O caso foi delatado pelo ex-gerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco, que presidiu a empresa. A Odebrecht chegou a pagar propinas no valor de R$ 252,5 milhões aos envolvidos no escândalo, em troca de contratos no valor de R$ 28 bilhões. Duque pode relatar como foi o processo decisório na Petrobras, do qual o ex-presidente Lula teria tomado parte, segundo as delações de Marcelo e Emílio Odebrecht.

Mesmo em Vaccari, as duas delações vão apertar o cerco ao ex-presidente da República que deverá ser interrogado pelo juiz federal Sérgio Moro no próximo dia 10, em Curitiba. O depoimento estava marcado para o dia 3, mas acabou adiado a pedido da Polícia Federal. Ciente de que sua situação está se complicando cada vez mais, o petista aposta na politização do processo e antecipou o lançamento de sua candidatura a presidente da República em 2018. Além disso, vem subindo o tom contra Sérgio Moro, a ponto de dizer que vai se mudar para Curitiba e, assim, comparecer às audiências das 87 testemunhas que indicou, atendendo intimações do juiz. Ou seja, fará do julgamento um palanque eleitoral.

Mas se engana quem pensa que Lula escolheu Moro como adversário eleitoral. O petista já apontou as baterias para o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), que não se fez de rogado e também se movimenta como candidato a presidente da República, encarnando o figurino do anti-Lula. Nesse aspecto, hoje, em São Paulo, que as centrais sindicais pretendem parar, haverá um duelo entre Lula e o prefeito tucano, que gravou um vídeo convocando os funcionários da prefeitura ao trabalho e oferecendo transporte alternativo para os que desejarem trabalhar.

A greve geral

Desde o Germinal, de Émile Zola, cuja história se desenrola durante a preparação e eclosão de uma greve de mineiros no norte da França, a greve é descrita como a forma de luta mais eficaz e radical dos trabalhadores. O autor chegou a viver alguns meses entre os mineiros para reproduzir as condições de trabalho e vida deles, os primórdios da organização política e sindical e as divisões entre marxistas e anarquistas, que já existiam quando o livro foi lançado, em 1888. Germinal é o nome do primeiro mês da primavera no calendário da Revolução Francesa. Clássico do naturalismo, Zola associa as sementes das novas plantas à possibilidade de transformação social: os brotos das mudanças sempre voltarão a germinar. A história se passa na segunda metade do século XIX e virou leitura quase obrigatória de sindicalistas e militantes de esquerda no século passado.

A greve convocada para hoje contra a reforma trabalhista e a reforma da Previdência ocorre num mundo completamente diferente daquele que inspirou a criação das grandes centrais sindicais e o chamado Estado de bem-estar social, que se baseava na grande indústria mecanizada e nas linhas de produção do taylor-fordismo. Essa é uma realidade que já não existe mais nos setores mais dinâmicos da economia, haja vista as montadoras de automóveis completamente robotizadas e as modernas colheitadeiras de soja, que realizam em meia hora o trabalho de um dia. É uma greve de sindicalistas em defesa do imposto sindical e servidores públicos que não querem abrir mão do regime de Previdência diferenciado.

* Luiz Carlos Azedo é jornalista.

Fonte: http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-outro-rombo-no-casco/


Mauricio Huertas: Para onde caminha o Brasil?

O livre pensar é um direito. Uma conquista. Então, vamos lá: Para onde caminha o Brasil? Parece haver consenso nos dois lados da trincheira, entre governistas e opositores, que o governo do presidente Michel Temer é simplesmente uma transição do pós-PT para algo que está por vir, um futuro ainda desconhecido. A escolha democrática se dará em outubro de 2018. O grupo que está hoje no poder é simplesmente consequência dos caminhos políticos e institucionais trilhados - e não há aqui qualquer julgamento de mérito, apenas uma constatação óbvia dos fatos.

Esteja você do lado que estiver, tendo gritado "Fora Dilma" ou "Fora Temer" (ou ambos), situado mais à direita ou mais à esquerda no velho mapa partidário e ideológico, a sua cota de responsabilidade será cobrada nas eleições de 2018, quando escolheremos o(a) Presidente da República, senadores e deputados federais que guiarão os rumos do país no Executivo e no Congresso Nacional.

Grosso modo, teremos em 2018 um menu bastante variado de opções, possibilitando que os eleitores votem livremente naqueles candidatos que considerem melhores, mais preparados ou mais adequados para o momento que o país vive. Nunca se teve tanta informação e transparência tão reveladora das entranhas do sistema político-eleitoral como se tem agora, o que não se traduzirá necessária e automaticamente na melhoria da qualidade dos eleitos.

É por isso que este convite à reflexão nos parece tão urgente e oportuno. De que adianta seguirmos militando nas redes e nas ruas, manifestando nossas preferências ou, ao contrário, protestando contra tudo aquilo e todos aqueles que repudiamos, às vezes em disputas fratricidas dentro de um mesmo campo democrático e republicano, se não formos capazes de promover ações verdadeiramente transformadoras através do voto?

O cenário das próximas eleições é ainda bastante incerto, mas já começam a se desenhar no horizonte as primeiras candidaturas. Num contexto global de exacerbação do radicalismo, com o quadro nacional propenso também a buscar salvadores da pátria aleatórios diante do descrédito da política mais tradicional, tornam-se preocupantes os destinos do país, da economia, dos direitos sociais e individuais, das garantias constitucionais de liberdade, segurança, desenvolvimento, bem-estar, igualdade e justiça como valores supremos.

Mas não venham apontar a Lava Jato e outras operações da Polícia Federal e do Ministério Público, nem suas gravíssimas implicações na Justiça, como "culpadas" da degradação que macula, desonra e constrange a maioria dos partidos e de seus mandatários. É triste que tenhamos chegado tão fundo do poço moral e ético, mas é alvissareiro que ainda possamos reagir democraticamente para sanear e desenxovalhar a política sem atalhos fascistas, autoritários e antirrepublicanos.

É salutar que velhos caciques, sobretudo os envolvidos em esquemas de corrupção e caixa 2, percam o lugar cativo que mantinham há décadas, abrindo espaço para novas lideranças e organizações que possam arejar a nossa democracia representativa, aprimorar a democracia participativa e instituir mecanismos cada vez mais necessários da democracia direta.

Portanto, é difícil afirmar diante das incertezas da política para onde caminha o Brasil, mas seguramente o rumo certo será dado na medida em que o maior número de cidadãos tiver a capacidade de se reunir, refletir e agir com isenção, responsabilidade, consciência, ética, equilíbrio, maturidade e espírito coletivo para enfrentar os desafios que se colocam à nossa frente. Que essas dores do crescimento sejam apenas sintomas naturais da construção de uma verdadeira Nação.

* Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira) e apresentador do #ProgramaDiferente

 


Denis Lerrer Rosenfield: O impasse

Analisando o cenário político, torna- se inevitável utilizar conceitos militares: a elite da classe política está sendo dizimada. Os mais importantes partidos estão envolvidos nas delações agora vazadas e tornadas públicas. PT, PMDB, PSDB, PRB, PP e outros foram delatados, em depoimentos bastante verossímeis, cujas provas serão logo apresentadas.

Ex-presidentes entraram também na lista, com grande destaque para Lula e Dilma Rousseff. O primeiro terá pouquíssimas chances de ser candidato novamente, apesar de sua demagogia e da estridente defesa de seus advogados, diretos ou indiretos. Oito ministros do presidente Michel Temer foram acusados, levantando uma pesada sombra sobre seu governo. Seu afastamento da sociedade tende a aumentar se mantiver o status quo. Um terço do Senado foi acusado, bem como expressivo número de deputados, embora proporcionalmente menor.

Como pode um país seguir adiante com tal falta de representatividade de sua classe política? A sociedade não se reconhece em seu governo nem em seus parlamentares. Na verdade, nem os considera “seus”, mas deles mesmos, por estarem envolvidos na corrupção, agindo de costas e à revelia do conjunto da Nação. Desconhecem o significado de bem coletivo, do que é a coisa pública.

É bem verdade que estamos na etapa de abertura de inquéritos, ainda vai ser decidido quem é culpado ou inocente. Não se pode prejulgar juridicamente o desenlace das denúncias e dos posteriores julgamentos. Todavia a defesa dos envolvidos é por demais precária, todos repetem o mesmo mantra de que são inocentes ou ainda não foram julgados… Poucos se voltam para o real esclarecimento dos fatos que os incriminam.

Um olhar desavisado levaria a acreditar que todos são santos e os delatores, mentirosos, como se estes não corressem o risco de perder os benefícios da colaboração premiada se não respeitarem a verdade. Os políticos só aumentam a sua falta de credibilidade. Não transmitem confiança à sociedade. E assim propiciam um julgamento político, irreversível, de que são culpados. Seriam péssimos atores. A sociedade clama por mudanças e reafirma com força a moralidade pública, valor que ela percebe como inexistente em nossos governantes e representantes.

Acontece que o País não pode parar. Se o fizer, acoplar-se-á a essa enorme crise política, agravando a crise econômica e social, isso quando começamos a observar certas tendências que estão revertendo a curva no que diz respeito a inflação, PIB, investimento e desemprego. Tudo é ainda muito incipiente, continuando tributário das turbulências políticas. Em pouco tempo o novo governo muito fez na área socioeconômica, embora pouco tenha apresentado no quesito da moralidade pública. Vivemos um impasse que se pode traduzir tanto num avanço quanto numa reversão das expectativas.

As reformas aprovadas pelo governo Temer, como as do teto do gasto público e da terceirização, são estruturantes no que diz respeito ao presente e ao futuro do País. Devem ser necessariamente complementadas pelas da Previdência e da modernização da legislação trabalhista. Se estas não forem feitas por causa da crise política, não só o governo se fragiliza, como o País terá sérios problemas, ainda mais agudos, nos próximos anos. E qualquer que seja o próximo presidente, de “esquerda” ou de “direita”, terá inevitavelmente de enfrentar essas questões. Melhor fazê-lo agora, pois seu custo será menor; caso contrário vai aumentando com o correr do tempo e com a inércia governamental, política e partidária. O resto é mera encenação demagógica.

Dentre os sérios problemas do atual governo está o seu déficit de comunicação, pois não tem conseguido transmitir à sociedade a necessidade dessas mudanças. Termina se consolidando na opinião pública a ideia de que elas ferem “direitos” e seriam de natureza “neoliberal”. Os eleitores, capturados pela desinformação, exigem de seus parlamentares, por exemplo, que votem contra a reforma da Previdência. Tal discurso acaba por disseminar essa percepção, como se tudo dependesse de vontade política na distribuição dos recursos públicos.

Na perspectiva da esquerda e de uma direita irresponsável, toda a discussão passa a ser focada na estrita esfera distributiva, não levando em conta a produtiva. Discute-se a ampliação dos benefícios sociais, os ditos “direitos” das corporações, a criação de novos privilégios, e assim por diante, como se os recursos do Tesouro fossem inesgotáveis. Daí, pode vir a tornar-se encarniçada a luta entre as corporações incrustadas no Estado e o restante da população, que não goza os mesmos benefícios. Assim sendo, os dispêndios do Estado logo se tornarão muito superiores às suas receitas, levando a uma situação de insolvência que, por sua vez, aguça ainda mais os conflitos sociais.

As políticas públicas, e os partidos, deveriam estar mais voltados para as condições de produção de riquezas, de tal modo que os recursos à disposição do Estado possam também aumentar. Quanto mais rica for a sociedade, maior será a sua capacidade distributiva. Quanto mais insistir num distributivismo social sem amparo produtivo, menor será a sua própria capacidade distributiva, além de hipotecar a riqueza presente e a futura. Criam-se, dessa forma, condições de asfixia da capacidade produtiva, que seriam concretizadas por aumentos de impostos e contribuições voltadas para financiar os déficits previdenciários.

O Estado de bem-estar, também dito previdenciário, deve enfrentar o problema de financiamento da sua Previdência, uma vez que o seu crescimento exponencial não cabe mais dentro de suas disponibilidades de financiamento. Não se trata, como se alardeia, de um problema de “direitos”, mas de como o Estado é capaz de gerir os seus recursos. O bolo é limitado. Uma fatia maior para a Previdência significa fatias menores para saúde, saneamento, educação e habitação.

 

Fonte: O Estado de S. Paulo – 17/04/2017

Foto: Antonio Cruz/EBC


Maurício Huertas: Lava Jato - Cumpra-se a lei; punam-se os culpados!

Mal comparando – e vai aí uma explicação bastante simplista e simplificada da Teoria Geral da Relatividade de Einstein, buracos negros são regiões que possuem uma quantidade tão grande de massa concentrada, maciça e compacta que nada consegue escapar da atração da sua força de gravidade, nem mesmo a luz. No coração de um buraco negro, o tempo para e o espaço deixa de existir. Em resumo, seria o estágio final de uma estrela após o seu colapso gravitacional.

A publicação das delações dos executivos da Odebrecht mostra, com todos os detalhes sórdidos e uma crueza deprimente, o colapso do nosso sistema político-partidário dominado por uma organização mafiosa que se apoderou do Estado. Por outro lado, a Operação Lava Jato é o foco de luz que desafia as leis do crime e da Física: conseguiremos escapar desse buraco negro?

O escárnio dos delatores narrando a compra de políticos com seus codinomes ridículos (mas apropriados), o envolvimento de legendas à esquerda e à direita, no governo e na oposição, tudo isso regado com o derramamento de dinheiro público para manter essa estrutura putrefata mostra que, não por acaso, chegamos à fase decisiva das investigações no clima que justamente se apelidou de “fim do mundo”.

Agora, neste momento apocalíptico, ou nos perdemos todos na implosão que engole tudo que parecia sólido em nosso universo político (naves, sondas, asteroides, luas, planetas e até resquícios de vida inteligente) após a falência da última missão tripulada do partido da estrela e de seus satélites em governos de coalizão que nos deixaram perdidos no tempo e no espaço, ou nos reinventamos e partimos verdadeiramente para a construção de um novo mundo, com princípios éticos, democráticos e republicanos.

Da suspeita generalizada e empírica de que no Brasil existia uma corrupção empresarial e política sistêmica, arraigada há décadas, partimos para a certeza comprovada da podridão como única regra do jogo, com o mau cheiro típico e o transbordamento de um esgoto a céu aberto que exige saneamento urgente.

O que fazer, então, a não ser defender que se cumpra a lei e punam-se os culpados? Doa a quem doer, sem protecionismo, corporativismo ou partidarismo. Não podemos ser cúmplices, já que fomos todos omissos ou negligentes – para dizer o mínimo – diante dos sinais cada vez mais evidentes da necrose que tomava conta do tecido social, político e institucional que protege a nossa frágil democracia.

Ou reagimos permanentemente, com o máximo rigor, à máfia instalada na máquina estatal, ou damos por barato que todos são venais na sociedade e tudo tem seu preço: das medidas provisórias, licitações, leis, tempos de TV, alianças partidárias, perguntas em debates eleitorais, notícias, fim de greves, impeachments etc. até o pastor, o sindicalista, o servidor, o índio, a polícia, o promotor, o delegado, o juiz, o candidato, o político eleito e o eleitor.

Que sejam punidos exemplarmente corruptos e corruptores, políticos e empresários, delatores e delatados, partidários do campo azul ou do campo vermelho do nosso mapa tão fortemente polarizado mas que – chegamos à triste conclusão – não se diferenciam tanto assim na hora e nos métodos da pilhagem dos cofres públicos para se manterem no poder.

Bandido é bandido, seja rico ou pobre, culto ou ignorante, amigo ou inimigo. Não há como compactuar com esse sistema. Não há como ser condescendente com a corrupção. Que as investigações, apurações e o julgamento das denúncias vá às últimas consequências, com celeridade, independência e responsabilidade. Todo apoio às ações saneadoras do STF, da Procuradoria Geral da República, do Ministério Público e da Polícia Federal. Que se resgate no Congresso Nacional o mínimo de pudor e de espírito público para fazer avançar as reformas estruturais e profiláticas.

Passar o Brasil a limpo deixou de ser força de expressão. É uma necessidade vital. Ou, do contrário, abriremos caminho para salvadores da Pátria que, a pretexto de sanear o País, atendendo aos anseios difusos da turba que se manifesta nas ruas e nas redes contra a corrupção e a imoralidade, descambem para atalhos autoritários e desprezem as conquistas do nosso valoroso Estado Democrático de Direito. A saída, ainda que traumática e tortuosa, é pela Política. Vamos traçar o nosso rumo.

* Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira) e apresentador do #ProgramaDiferente

** Foto: Agência Brasil/EBC