Alon Feuerwerker: Todos trabalham para nada acontecer. E o efeito didático desse travamento geral
O sistema político brasileiro travou, e isso torna muito difícil a ruptura organizada. A nossa história republicana tem sido feita de rupturas organizadas, mas está complicado produzir uma. A crise toma viés crônico. No geral, mas também na vida interna de cada ator. O traço mais visível da política brasileira hoje é a paralisia degradante.
Em todos os nossos impasses desde 1930, sempre houve alternativa à mão. Ou nascida de uma dissidência do sistema dominante, ou surgida da cooptação de dissidentes do poder por forças novas emergentes. E a vida seguia, com componentes de renovação e continuidade. Até um novo impasse exigir, mais uma vez, a solução prussiana de sempre.
Mas hoje não há dissidência efetiva no poder, unido no objetivo de conter o Partido da Justiça. E as “forças novas emergentes”, quando não caricaturais, são embrionárias e desprovidas de maior influência no único canal possível para acesso ao governo: os partidos. Daí que o debate no Brasil gire, apenas, em torno de como estes vão se salvar do tsunami.
É a lógica que comanda o PT, coeso no esforço para Lula poder ser candidato em 2018. Faz sentido para o PT, pois Lula é competitivo. Mesmo se perder, será forte puxador de votos para os candidatos da legenda e coligadas de esquerda. Mas o discurso do PT morre por aí. Eleger Lula para quê? Vai governar como? Com quem? Para fazer o quê? Não há pistas.
O PT está como o exército que espera fora das muralhas da cidade sitiada, enquanto dentro dela os inimigos se enfraquecem a cada dia nas disputas internas. Supõe-se que alguma hora ficarão suficientemente fracos e não poderão resistir. Mas é uma suposição perigosa. E se, sobrevivendo, conseguirem unir-se para enfrentar e esmagar a força adversária?
Parece ser o cálculo do PSDB, que luta para manter o sistema de alianças montado no impeachment de Dilma e na ascensão de Temer. Espera ganhar 2018 com esse bloco, contando ainda com o sempre tonificante controle das torneiras do orçamento federal. Os tucanos não estão debatendo se vão sair do governo. Estão procurando a melhor maneira de continuar nele.
O PSDB talvez seja a sigla mais bem posicionada por enquanto para 2018. Além de influência no federal, tem na mão os orçamentos do estado e da cidade de São Paulo. Tem um candidato com currículo, Alckmin, e um “novo”, Dória. E teria, certeza absoluta, apoio maciço do establishment, imprensa inclusive, num eventual segundo turno contra Lula.
O desafio do PSDB é evitar contaminar-se com a infecção galopante do governo Temer sem abrir mão das posições de poder. Num mundo ideal, o PSDB faria como fez com Collor: ajudou a derrubar o presidente e depois reaglutinou a base collorida para isolar e derrotar a esquerda. Mas Collor era um só e inorgânico. Temer e o PMDB são muitos. E muito orgânicos.
O PT, que viu o poder escapar assim em 1994, não enxerga vantagem em apoiar uma facção do peemedebismo-tucanismo contra a outra, pois não quer ajudar a consolidar uma nova hegemonia contra ele. Faz certo sentido. Mas com isso o PT abre mão de desestabilizar imediatamente o inimigo. E quem sobrevive pode ficar forte mais adiante.
Já o PSDB corre o risco de surgir em seu campo uma alternativa viável e não contaminada. Mas ela teria de vir de fora do mundo político hegemônico. E a lei brasileira reduz muito a permeabilidade do sistema eleitoral ao surgimento de Macrons, Corbyns ou Trumps. Aqui os partidos são donos da política, e os políticos são donos dos partidos. O sistema defende-se.
Se você anda estupefato por nada ter acontecido ainda diante da avalanche de fatos, eis a explicação: nada acontece porque acontecer alguma coisa não interessa a ninguém que pode fazer alguma coisa acontecer. Decepcionante talvez, mas com certeza didático. Você que sai à rua atrás de miragens tem aqui a chance de crescer. Políticos movem-se pelo poder.
Este talvez venha ser o principal saldo positivo desta crise. A possibilidade de absorver rapidamente, da vida prática, o que se levaria uma existência inteira para aprender dos livros. É um choque brutal de didatismo. As instituições “neutras” e os aparelhos “destinados à defesa do bem comum” ficam pelados na via pública e menos capazes de amortecer os choques.
O problema das calmarias são as tempestades que podem vir depois. Ainda mais quando tem eleição no calendário. Até a semana que vem. Ou até um fato novo, nosso visitante cada vez mais habitual.
* Alon Feuerwerker, analista político FSB Comunicação
Fonte: http://www.alon.jor.br/2017/06/todos-trabalham-para-nada-acontecer-e-o.html?m=1
Luiz Carlos Azedo: Ninho de aflitos
Fernando Henrique Cardoso sugeriu a antecipação das eleições presidenciais de 2018, o que é considerado uma heresia pela maioria dos políticos governistas
A crise ética chegou com tudo ao PSDB, que virou um ninho de aflitos. As agruras do partido se intensificaram por causa do pedido de prisão do senador Aécio Neves (MG), ex-presidente da legenda, que também foi afastado do exercício do mandato pelo ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, depois de conversa gravada pelo empresário Joesley Batista, dono da JBS. Novo pedido será julgado na próxima terça-feira, pelo STF, e pode se transformar num divisor de águas na relação entre Corte e o Congresso.
Candidato a presidente da República em 2014, Aécio foi o autor do pedido de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, negado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por 4 a 3. Agora, está no epicentro da crise política envolvendo o Congresso e o o STF, porque sua eventual prisão precisa ser autorizada pelo Senado e uma decisão da Corte nesse sentido, atendendo o novo pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pode aprofundar a crise entre os Poderes. Antecipa, de certa forma, o impasse em torno da eventual denúncia do presidente Michel Temer, que, para ser julgada pelo STF, precisa primeiro ser aceita pela Câmara.
Como há um grande número de políticos envolvidos na Lava-Jato e outras operações da Polícia Federal, o ambiente no Congresso caminha para um alto lá no Ministério Público Federal e no próprio ministro Fachin, o que pode aprofundar a crise entre os Poderes. Quem farejou o aprofundamento da crise foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em nota surpreendente, na qual sugere a antecipação das eleições presidenciais de 2018, o que é considerado uma heresia pela maioria dos políticos governistas. Isso significa aceitar as bandeiras da oposição, num momento em que o PT arrefeceu seu entusiasmo com o “Fora, Temer!” e “Diretas, já”, pois prefere ver os partidos da base governista sangrando em razão do apoio ao presidente da República.
FHC deu um cavalo de pau nas suas próprias posições políticas: “A conjuntura política do Brasil tem sofrido abalos fortes e minha percepção também. Se eu me pusesse na posição de presidente e olhasse em volta, reconheceria que estamos vivendo uma quase anomia. Falta o que os politicólogos chamam de ‘legitimidade’, ou seja, reconhecendo que a autoridade é legítima e consentir em obedecer. A ordem vigente é legal e constitucional (daí ter mencionado como ‘golpe’ uma antecipação eleitoral), mas não havendo aceitação generalizada de sua validade, ou há um gesto de grandeza por parte de quem legalmente detém o poder pedindo antecipação de eleições gerais, ou o poder se erode de tal forma que as ruas pedirão a ruptura da regra vigente exigindo antecipação do voto.”
Na mesma linha, o presidente interino do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), defendeu a saída dos tucanos do governo, em sintonia com a maioria da bancada na Câmara. O partido só continua na base aliada porque os ministros tucanos Aloysio Nunes Ferreira (Relações Exteriores), Antônio Imbassahy (Secretaria de Governo), Bruno Araújo (Cidades) e Luislinda Valois (Direitos Humanos), no começo da semana, avisaram à cúpula da legenda que permaneceriam nos cargos, mesmo que a direção partidária decidisse abandonar Temer. O governador Geraldo Alckmin, o prefeito João Doria e o senador José Serra (SP) são hoje os principais apoios do presidente dentro da legenda, mas tudo pode mudar por causa do reposicionamento de FHC.
Às cegas
FHC praticamente decretou o desembarque do PSDB, ao avaliar que a situação se agravou — “Ou se pensa nos passos seguintes em termos nacionais e não partidários nem personalistas ou iremos às cegas para o desconhecido” — e afirmar que a legenda deve deixar o governo se o presidente Temer não convocar eleições antecipadas: “A responsabilidade maior é a do presidente, que decidirá se ainda tem forças para resistir e atuar em prol do país. Se tudo continuar como está com a desconstrução continua da autoridade, pior ainda se houver tentativas de embaraçar as investigações em curso, não vejo mais como o PSDB possa continuar no governo.”
A posição do PSDB gerou reações contrárias dos aliados. O presidente do PPS, Roberto Freire, que deixou o ministério da Cultura quando foi divulgada a gravação da conversa de Temer com Joesley Batista e defendeu, na ocasião, a renúncia do presidente, repercutiu assim a nota de FHC: “Temos que reafirmar que, dentro da Constituição, tudo. Fora dela, nada. A partir disso, dizer a FHC que presidente só é destituído por impeachment e se por moto-próprio renunciar; as eleições para preencher tal vacância estão previstas na Carta Magna. Qualquer outra solução é grave equívoco.”
Luiz Carlos Azedo é jornalista
O Estado de São Paulo: A soberba de Lula
Ao se descortinar os fatos graves contra o ex-presidente, ficou demonstrado que o mito do herói petista serve melhor à literatura do que à política
O Estado de S.Paulo
O oportunismo que marcou a trajetória política do ex-presidente Lula da Silva, desde sua ascensão como líder sindical, foi tomado durante muito tempo como uma das virtudes capazes de levar um ex-metalúrgico a ocupar a Presidência da República. A realidade dos fatos, sobejamente documentada nos autos de um número constrangedor de processos judiciais a que responde, encarregou-se de demonstrar que o mito do herói serve melhor à literatura do que à política. Ao descortinar aos olhos dos cidadãos minimamente informados fatos graves que só a fé cega em um demiurgo é capaz de obliterar, as investigações sobre a conduta do ex-presidente revelaram que de virtuoso o oportunismo não tem nada.
Em evento de posse da nova direção do Partido dos Trabalhadores (PT) no sábado passado, na Assembleia Legislativa de São Paulo, Lula se apresentou como o único cidadão capaz de tirar o País da crise. Trata-se da imodéstia de quem se vê acima de qualquer responsabilidade que possa recair sobre seus atos, alguém ungido por um especial desígnio que justificaria qualquer desvario político. “Se o PT deixar, serei candidato para voltar a ver uma sociedade mais igual”, disse o ex-presidente. Poucas vezes uma afirmação de Lula soou tão embusteira. O PT é Lula, o rumo do partido é a expressão máxima de sua vontade. Portanto, o PT não tem qualquer ingerência sobre sua eventual candidatura à Presidência em 2018. Aliás, ainda que tivesse, esta prerrogativa, hoje, é exclusiva do Poder Judiciário, que pode torná-lo inelegível pela Lei da Ficha Limpa.
Durante o discurso, Lula mostrou que além de soberbo é incapaz de compreender a grandeza do cargo que ocupou e que sonha em voltar a ocupar. Afirmando que para voltar à Presidência “não precisa convencer os não convencíveis”, pois lhe bastariam “50% mais um” dos eleitores, Lula deixou clara a visão mesquinha que tem da Presidência da República, como se uma vez eleito estivesse comprometido apenas com o destino daqueles que o apoiam, e não com o de todos os brasileiros.
Ao arvorar-se em único capitão habilidoso o bastante para conduzir um navio à deriva, Lula esconde o papel determinante que teve na construção da pior crise política, econômica e moral da história recente, o mais eloquente atestado do desastre que o lulopetismo representou para o País. Em um misto de vaidade e desfaçatez, o ex-presidente afirmou em seu discurso na Assembleia Legislativa que “a melhor experiência de governança neste país foi do PT”. Para ele, a profunda recessão econômica e os 14 milhões de brasileiros desempregados são “fatos alternativos”.
Citado na delação superpremiada do empresário Joesley Batista como beneficiário de uma conta milionária abastecida com dinheiro de propina, Lula não se deu por constrangido e lançou mão de seu conhecido senso de humor rasteiro. “Estou quase fazendo delação para pegar os meus US$ 82 milhões”, ironizou. O problema seria encontrar um possível delatado, já que as investigações realizadas até agora colocam Lula no topo do esquema de corrupção engendrado para pilhar os recursos do Estado.
Mas não foi só a soberba, a imodéstia e a desfaçatez que marcaram o discurso de Lula na posse da nova direção de seu partido. O cinismo também deu as caras quando o ex-presidente afirmou que “o País nunca precisou tanto do PT como agora”. Prometendo resgatar o “Lulinha Paz e Amor”, o ex-presidente disse que “o PT é o único capaz de devolver a alegria ao povo brasileiro”. Lula é o grande artífice da grave crise por que passa o Brasil e por meio de seu discurso agressivo e excludente disseminou a cizânia e implodiu todas as pontes para uma reconciliação nacional em torno de um projeto de retomada do crescimento econômico, do desenvolvimento social e do debate de ideias próprio da democracia em um ambiente menos anuviado.
Se em meio à crise paira a incerteza sobre qual caminho o País deverá seguir em 2018, o lulopetismo já apresentou razões mais do que suficientes para a Nação saber qual deve ser evitado.
Editorial - O Estado de São Paulo
Voto distrital misto x distrital puro
Dê a alguém a prerrogativa de falar em seu nome e esse poder será abusado
Fernão Lara Mesquita
Lula, Dilma, Temer, o Ministério Público, a PGR, todos dizem que é armação. E é!
Quanto, em cada episódio, dá pra discutir até o fim dos tempos. Dê a alguém a prerrogativa de falar em seu nome e esse poder será abusado. Transforme uma instituição num gatilho e, mais cedo ou mais tarde, para o bem e para o mal, ele será acionado.
A legitimação do poder é a questão essencial da democracia. O melhor a fazer nesse quesito é não delegar nada: só o eleitor põe, só o eleitor despõe. A questão é como montar um sistema que viabilize isso com a necessária agilidade e economia de traumas. Há duas variações. Os sistemas de voto distrital puro com “recall” ou “retomada” de mandatos e o voto distrital misto com governo parlamentarista.
Aos exemplos. A Carolina do Norte elege 13 deputados federais e 170 estaduais. Toma-se o número total de eleitores e se divide pelo número de vagas dos Legislativos municipal, estadual ou federal. Isso dá o tamanho de cada distrito eleitoral. Cada distrito – nas eleições municipais, um bairro ou conjunto de bairros – elege apenas um representante. Como os candidatos só têm de pedir voto naquele distrito, acaba o problema do custo das campanhas e doenças correlatas. Nas eleições estaduais cada distrito (o número de eleitores dividido por 170 neste exemplo) será a soma de “N” distritos municipais. Ou, nas federais, quando o Estado será dividido em 13 distritos, eles serão a soma de “N” distritos estaduais.
Só senadores são eleitos pelo Estado inteiro. A conta, aí, é nacional: o número total de eleitores dividido pelo número total de vagas. Como representam pessoas, e não paisagens, onde houver mais população haverá mais senadores. Os demais representantes em Washington também não são deputados do Estado “tal”, são deputados “do distrito n.º tal do Estado tal”. Cada deputado de cada instância pode, se quiser, saber o nome e o endereço de todos os seus representados. Se alguém morrer ou cair, só haverá eleição para reposição no distrito dele. Nada de suplente.
As fronteiras de cada distrito são redefinidas a cada dez anos com base no censo. A Federal Election Comission é a única que pode legislar sobre financiamento de campanhas. Todo candidato é obrigado a prestar contas até 15 dias depois de receber cada contribuição ou fazer despesas iguais ou superiores a US$ 5 mil. Daí para baixo cada um pode ter a sua regra.
36 Estados adotam o “recall” ou “retomada” de mandato para representantes eleitos. 19 estendem o “recall” a todo funcionário eleito (e todos os que têm por objeto fiscalizar governos ou prestar serviços diretos à população, começando pelos promotores do equivalente ao Ministério Público, são diretamente eleitos).
Na maioria dos municípios nem se vota mais em prefeito. Elege-se uma “diretoria” colegiada (“Council”) de cinco ou seis membros, coordenada por um CEO, com metas a cumprir. Não cumpriu, rua! Só as megacidades têm prefeitos e Câmaras Municipais e, mesmo assim, nem todas. Cada uma faz como quiser. As eleições municipais são apartidárias. Concorre quem quiser, sem pedir ordem a ninguém. As grandes cidades têm até Constituições próprias regulando instrumentos como referendo, recall, leis de iniciativa popular, penas para crimes, gestão de escolas públicas, regras para endividamento, etc. Não estando em confronto com os 7 artigos e 28 emendas da Constituição (aqui a soma é de 330!), valeu.
Todo assunto sensível vindo dos Legislativos ou de iniciativas populares vai a referendo. Entra na cédula da próxima eleição pedindo sim ou não do eleitorado inteiro. Nada de “consultas a movimentos sociais” valendo decisão e outras tapeações do gênero. Voto, sempre, e de todos os afetados, sempre.
Todo e qualquer eleitor – até o morador de rua – pode derrubar seu representante. Basta iniciar uma petição. Não precisa haver razão específica ou crime. Um simples “não me representa” é suficiente. Se conseguir a assinatura de 5% dos eleitores do seu distrito, convoca-se uma votação de todo o distrito para destituí-lo, ou não, e eleger seu substituto. O resto do país pode continuar trabalhando em paz.
O voto distrital puro põe o eleitor mandando diretamente em cada pedacinho do país, o que lhe dá poder, mas não para tudo. Juntando grupos majoritários de pedacinhos do país, ele manda no país inteiro sem, no entanto, ganhar caminhos fáceis para golpes. Tudo tem sempre de ser aprovado passo a passo, na ida ou na volta, por todos os eleitores de cada pedacinho do país.
Agora vamos ao distrital misto. Ele também delimita a área em que cada candidato pode pedir votos. No resto, tudo fica meio como é no Brasil. Você vota diretamente num candidato, mas dá mais um voto ao partido que vai pro candidato que ele puser numa lista lá dele. Você nunca sabe ao certo representante de quem cada deputado é: de um pedaço “X” do eleitorado ou de um grupo dentro de um partido com poder para montar a tal da lista.
Para remover quem se comportar mal tem de parar o país, convocar eleições gerais e votar numa nova mistura de partidos que, somados, deem maioria e elejam um primeiro-ministro. Ou seja, você até pode expulsar o ladrão, mas tem de deixar para a quadrilha a escolha do novo chefe.
A pretexto de baratear o custo da eleição e fazer representar todas as “tendências” da população nas suas mínimas expressões temáticas, o voto distrital misto mantém um monte de partidos e caciques decidindo quem pode ou não se candidatar a quê e legislando sobre tudo dentro e fora da sua casa e até da sua cabeça.
Resumindo: com voto distrital puro com “retomada” e referendo, os políticos deixam de mandar e passam a obedecer. A partir daí você decide quais reformas fazer e quando. Com distrital misto com parlamentarismo, os políticos – índios e caciques – entregam alguns anéis, mas não os dedos com que continuarão te agarrando por todos os lados, especialmente na região do bolso.
Não é por outra razão que 9,99 entre 10 políticos preferem o voto distrital misto. É muito chato ter patrão!
* Fernão Lara Mesquita é jornalista
Fernando Gabeira: Mala preta aos três anos da Lava-Jato
Apertem os cintos: a isso o que chamam estabilidade nós chamamos turbulência
O Brasil não é para principiantes. Tantas vezes ouvimos essa frase que se tornou lugar-comum. A fase de combate à corrupção iniciada há três anos pela Lava Jato pode levar-nos a conclusões maniqueístas, do tipo bem contra o mal, republicanos contra patrimonialistas.
Olhando de perto, a frente que se coloca contra o trabalho da Lava Jato é muito mais ampla do que o grupo dos grandes partidos que articulam para destruí-la, no governo e no Congresso.
Líder entre os juízes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que absolveram a chapa Dilma-Temer, apesar das provas, Gilmar Mendes fixou-se num argumento importante: o da estabilidade. Quem a rejeita, num país com 14 milhões de desempregados? O argumento de estabilidade deveria sempre estar sobre a mesa.
No entanto, conforme mostrou Bolívar Lamounier, em intervenção recente, um julgamento visto por todo o País no qual se enterram as provas é um fator de instabilidade. Cava um novo fosso entre a sociedade e as instituições, revelando uma Justiça Eleitoral, pouco conhecida até então, como um artefato de outra galáxia.
Em outra posição dentro da grande frente adversária estão os responsáveis, jornalistas próximos ao Planalto e o próprio PSDB, que saltou para a enganadora maciez dos cargos no governo.
Interessante classificar os que pedem a queda de Temer como irresponsáveis. Já que estamos usando a palavra, é bom lembrar que não somos presidentes nem recebemos um empresário investigado à noite, sem anotação na agenda, usando senhas no portão de entrada.
Não nos parece responsável um presidente que mantém aquele tipo de diálogo, tarde da noite, com o dono da Friboi. Tampouco parece responsável designar como interlocutor do empresário Joesley Batista um assessor especial que, horas depois, é filmado carregando a mala com R$ 500 mil.
Para ficar no universo mínimo de uma só palavra, a irresponsabilidade decisiva foi de Temer. Supor que três anos depois da Lava Jato não só tudo terminaria em pizza, como o dinheiro da propina seria pago diretamente na Pizzaria Camelo.
Foi Temer sozinho que arruinou suas chances de conduzir as reformas e jogou para fora da pinguela uma grande parte da sociedade, já constrangida com ela, mas vendo-a como a única saída momentânea. A maioria tem o direito de rejeitar um presidente que se envolve em práticas tão sospechosas. De achar que ele deva ser investigado, mas que os dados já expostos o desqualificam para o cargo.
Neste instante, a pergunta dos que defendem a instabilidade: se Temer cair, não pode ser pior, o caos não tomaria conta? A hipótese das diretas é bom tema para uma pajelança, mas não é uma proposta viável, na medida em que sua aprovação depende do Congresso.
Não tenho ilusões sobre um presidente eleito pelo atual Parlamento. Também ele seria escolhido com base numa promessa de neutralizar a Lava Jato. Independentemente de seu perfil, ele terá, de alguma forma, de comandar a frente contra as investigações.
Lula cumpriu o seu papel, a cúpula do PMDB e o presidente do PSDB também o cumpriram. Nesse particular, até o momento foram derrotados.
Temer está em guerra aberta contra a Lava Jato. Usa a mesma tática de Lula contra Moro. Agora o general a abater nas hostes adversárias é o ministro Edson Fachin. Esta semana surgiu a notícia de que Temer teria usado a Abin para investigar a vida de Fachin, descobrindo seus pontos fracos. Atribui-se a notícia a um assessor de Temer. Se isso foi mesmo assim, fico em dúvida se ele queria atingir seu chefe ou deixar no ar uma suspeita sobre Fachin.
Na Câmara, um dos veteranos da batalha Eduardo Cunha, o deputado José Carlos Marin, tornou-se vice-líder do governo. E disse que é perfeitamente legal a Abin investigar um ministro do STF.
Marin e outros veteranos da batalha de Cunha articulam uma CPI da JBS e o objetivo principal é levar Fachin para depor. Fachin é o Moro de Temer, até que Temer caia do governo nos braços do próprio Moro.
Estranha estabilidade a que nos oferecem os defensores da presença de Temer. Nos tribunais as provas não valem. Durante as investigações também pouco importam: em vez de se defenderem, os acusados passam a atacar os investigadores.
A máquina do Estado volta-se agora contra as instituições que realmente estão trabalhando com seriedade, desvelando o esquema continental de corrupção. Temer assumiu a mesma tática de Lula. E sem nenhuma combinação prévia se prepara para gastar dinheiro com um pacote de bondades que o tire do isolamento de hoje. Nem os próprios defensores da estabilidade econômica pensavam num desdobramento como esse.
Quando se desenha uma estabilidade com um presidente na corda bamba, as pretensões, mesmo legítimas, vão esbarrar a cada instante na sua própria negação. Ao invés do termo estabilidade, para conservar o que já existe, prefiro uma expressão para mudar o que está aí: equilíbrio dinâmico.
Se Temer incorreu em crime, ele precisa sair. Um novo presidente, eleito pelo Congresso, fará parte do mesmo bloco contrário ao da sociedade que apoia a Lava Jato. Mas como seria o último a tentar a batalha final, talvez tivesse algum cuidado – nessa guerra já caíram alguns dos principais expoentes da política brasileira. Num ano eleitoral existe uma chance de a sociedade controlar um pouco mais o Parlamento e o presidente escolhido por ele.
Não é um futuro dos sonhos. É um caminho difícil no rumo das mudanças, mas é o que a Constituição nos oferece. Teremos muito ainda que suportar. Mas será um fardo menor que enterro de provas nos tribunais e guerra contra investigações que podem destruir o gigantesco esquema de corrupção.
Por enquanto, vamos assistir à guerra de Temer contra a Lava Jato. Apertem, pois, os cintos: o que chamam de estabilidade nós chamamos de turbulência.
* Fernando Gabeira é jornalista.
Luiz Carlos Azedo: Mudança de eixo
As reformas da Previdência e trabalhista estão sendo mitigadas porque o governo sofre chantagem da própria base
O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) foi embora cedo ontem da Câmara, depois de aprovar em votação simbólica a primeira das medidas necessárias para o “pacote de bondades” que o Palácio do Planalto preparou para ver se melhora a popularidade do presidente Michel Temer. Como sempre acontece nos momentos de crise política grave, o governo raspa o fundo do tacho com uma das mãos para poder gastar com a outra. No caso, trata-se da restituição aos cofres públicos dos precatórios depositados há mais de dois anos que não foram sacados pelos beneficiários. Com a aprovação da proposta, o governo federal espera reforçar os cofres da União com R$ 8,6 bilhões.
Precatórios são dívidas do poder público decorrentes de condenações judiciais definitivas. Para dar um caráter social ao projeto aprovado, foram incluídas duas exigências: que 20% desse montante seja aplicado pela União na manutenção e desenvolvimento do ensino e, pelo menos, 5% no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM). No embalo, foram incluídas as requisições de pequeno valor (RPV), oriundas de ações contra o poder público, mas com valor limitado a 60 salários mínimos.
Logo após o encerramento da sessão, quem também deixou a Câmara foi o relator da reforma da Previdência, deputado Arthur Maia (PPS-BA), cujo parecer está pronto. Indagado sobre a votação da reforma, foi curto e grosso: “Vamos ter que esperar, agora não dá”. Pra bom entendedor, isso significa que o governo ainda não tem votos para aprová-la, apesar da retórica oficial. A prioridade não é esticar a corda com a Câmara, é recompor a base do governo.
No outro lado do Congresso, acontece a mesma coisa. A reforma trabalhista caminha lentamente no Senado. Ontem, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) fez a leitura do relatório favorável à aprovação da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado. Manteve o projeto aprovado pela Câmara, mas indicou os vetos que serão recomendados ao presidente Temer, em troca do apoio da base aliada no Senado. Versam sobre ambiente insalubre para gestantes e lactantes; descanso de 15 minutos a que as mulheres têm direito antes de iniciar a hora-extra; acordo individual para determinar jornada de 12 horas de trabalho com 36 horas de folga; a “comissão de representantes dos empregados” em empresas com mais de 200 funcionários; e intervalo intrajornada de 30 minutos para horários acima de seis horas de trabalho.
O relatório será votado em 20 de junho e, depois, será encaminhado para a Comissão de Constituição e Justiça. Ferraço faz parte do time de tucanos que defende o desembarque do PSDB do governo Temer, mas afirma ter compromisso com as reformas. Uma coisa não teria nada a ver com a outra. Essa, porém, não é a posição da maioria da bancada de senadores tucanos, que defende a permanência do partido no governo. Na crise, a prioridade da bancada é evitar a cassação do senador Aécio Neves (MG), que está com mandato suspenso e precisa ser blindado pela legenda na Comissão de Ética, controlada pelo PMDB. Não é esticar a corda por causa das reformas.
Chantagem
O agravamento da crise ética, porém, começa a criar problemas para a equipe econômica. Não bastam as entrevistas do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, sobre os problemas na economia. Analistas já alteraram as projeções para 2017. A previsão de crescimento caiu de 0,5% para 0,2%. A economia fecharia o ano em aceleração ascendente de 0,8% no último trimestre, ou 3,2%, a taxa anualizada, mas agora a projeção é declinante: 0,4%, 0,12% e 0,% no segundo, terceiro e quarto trimestres, segundo o Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV).
Para alguns economistas, esse é o resultado das “bondades” do governo: reajustes nas faixas de renda e de financiamento para compra de imóvel; ampliação do volume de crédito subsidiado; não devolução antecipada de empréstimos do BNDES ao Tesouro, para aumentar o funding de créditos subsidiados; subsídio para a renovação da frota de veículos e à indústria automobilística; medidas de compensação à indústria nacional da cadeia de petróleo, a pretexto de perdas geradas pela redução do conteúdo local.
Na verdade, as reformas da Previdência e trabalhista, que serviriam para reduzir o ajuste fiscal e aumentar a produtividade, estão sendo mitigadas porque o governo sofre chantagem da própria base. Nada é feito para acabar com os cartórios na burocracia federal, que tanto encarecem a produção e favorecem a corrupção, além de servir de trincheira para os setores que apostam no “quanto pior, melhor” para manter seus privilégios. É ou não uma mudança de eixo?
* Luiz Carlos Azedo é jornalista
FAP terá estande na 33° Feira do Livro de Brasília
A Fundação Astrojildo Pereira fará distribuição de livros de publicação própria, além da venda de obras de autores parceiros e sessões de autógrafos
Germano Souza Martiniano
A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) terá seu próprio estande na 33° Feira do Livro de Brasília, maior evento literário do Centro-Oeste brasileiro, que ocorrerá entre 16 e 25 de junho no Shopping Pátio Brasil. Serão mais de 100 expositores entre livrarias, editoras, distribuidoras e revistas. No estande da FAP serão distribuídos livros de publicação da própria fundação e também serão vendidos livros de autores parceiros, além de sessão de autógrafos, conforme programação abaixo.
O evento
Com a temática “Inclusão e Cidadania”, a 33° Feira do livro de Brasília busca misturar todas as culturas em um único espaço, por isso foram convidados diversos artistas, músicos, escritores, poetas, entre outras personalidades de várias partes do Brasil e até do mundo. Dentre os principais convidados estão o poeta Antônio Cicero, o antropólogo baiano Antônio Risério e o premiado escritor Cristovão Tezza. O evento também irá homenagear o cantor Belchior e o poeta Ferreira Gullar, que faleceram há pouco tempo.
Programação da sessão de autógrafos FAP:
17 de junho às 15h - “O Corpo”do diplomata brasileiro aposentado André Amado
“O Corpo” se trata de uma trama policial, que se passa em Brasília, temperada com pitadas de espionagem e de informação histórica e técnica sobre o mundo do crime e da intriga política.
19 de junho às 19h – “Poeira e Escuridão” do cineasta, conselheiro consultivo e Ministro da Cultura interino João Batista de Andrade
“Poeira e Escuridão” reproduz a desolada paisagem que existe em torno e dentro do homem. Em linguagem "cinematográfica", o dia a dia da cidade grande é estampado nos olhos-lentes e na caneta do cineasta João Batista de Andrade.
20 de junho às 19h – “Um Lugar no Mundo” (Estudos de história política latino-americana) do historiador e dirigente da FAP Alberto Aggio
“Um Lugar no Mundo”, como diz Paulo Fábio Dantas Neto, Doutor em Ciência Política pelo Iuperj, é uma obra que busca dar perspectiva cosmopolita ao que é suposto como um lugar político pródigo em particularidades, entre as quais a de ser um lugar compartilhado por diversos lugares nacionais. A ideia da América Latina, enquanto substantivo coletivo, singular e plural, não é posta em discussão, mas tomada como premissa.
https://www.topleituras.com/livros/corpo-fba1/resumo
Ciclo de palestras Stefan Zweig
O Ministério da Cultura e o Midrash Centro Cultural apresentam o Ciclo Por que Stefan Zweig? Organizado por Marcos Chor Maio e Alenjadra Josiowicz, o evento se propõe a refletir sobre os problemas associados à intolerância a partir da obra de Stefan Zweig e o contexto de sua produção, tendo como referência os dramáticos dilemas humanos dos séculos 20 e 21. O ciclo ocorre todas as quartas-feiras, às 20h, com entrada gratuita.
Ciclo Por que Stefan Zweig?
21 de junho - Mesa Redonda
Stefan Zweig - História, Memória e Interpretações do Brasil
Karen Lisboa (USP)
Eduardo Silva (FCRB) & Maria G. Salgado (UFRRJ)
Alenjadra Josiowicz & Marcos Chor Maio
28 de junho - Mesa Redonda
Intelectuais e crise da esfera pública
Stefan Zweig, nosso contemporâneo
Glaucia Villas Bôas (UFRJ)
Eduardo Jardim (PUC-Rio)
Luiz Werneck Vianna (PUC-RIO)
Local: Midrash Centro Cultural, Rua General Venâncio Flores, 184, Leblon. Web: http://www.midrash.org.br
José Roberto de Toledo: Ibope, Internet e voto
Web virou maior influência para eleger um presidente
Pela primeira vez, uma pesquisa extraiu da boca do eleitor o que urnas e ruas sugeriam mas faltavam elementos para provar: a internet virou o maior influenciador para eleger um presidente. Sondagem inédita do Ibope revela que 56% dos brasileiros aptos a votar confirmam que as mídias sociais terão algum grau de influência na escolha de seu candidato presidencial na próxima eleição. Para 36%, as redes terão muita influência.
Nenhum dos outros influenciadores testados pelo Ibope obteve taxas maiores que essas. Nem a mídia tradicional, nem a família, ou os amigos - o trio que sempre aparecia primeiro em pesquisas semelhantes. Muito menos movimentos sociais, partidos, políticos e igrejas. Artistas e celebridades ficaram por último.
TV, rádio, revistas e jornais atingiram 35% de "muita influência" e 21% de "pouca influência", somando os mesmos 56% de peso da internet. A diferença é que seus concorrentes virtuais estão em ascensão - especialmente junto aos jovens: no eleitorado de 16 a 24 anos, as mídias sociais têm 48% de "muita influência" eleitoral, contra 41% da mídia tradicional.
No total, conversa com amigos chega a 29% de "muita influência" para escolha do candidato a presidente, contra 27% das conversas com parentes. Movimentos sociais alcançaram 28%. A seguir aparecem partidos (24%), políticos influentes (23%), líderes religiosos (21%) e artistas e celebridades somados (16%).
Por que a internet tem um peso tão grande na eleição? A constatação do Ibope é importante por levantar essa questão, mas, sozinha, não é suficiente para respondê-la. Outras pesquisas baseadas em resultados eleitorais e estudos empíricos ajudam a entender o fenômeno, mesmo que indiretamente.
Lançado em 2016 nos EUA, o livro "Democracy for Realists" vem provocando polêmica por contestar o conceito popular de que, na democracia, o eleitor tem preferências claras sobre o que o governo deve fazer e elege governantes que vão transformá-las em políticas públicas. Para os autores, e dezenas de fontes que eles compilam, não é bem assim. O "do povo, pelo povo, para o povo" funciona na boca dos políticos, mas não na prática.
No mundo real, pessoas elegem representantes mesmo cujas ideias e propostas estão em desacordo com o que elas pensam. Não fosse assim, os congressistas brasileiros deveriam sepultar em vez de aprovar as reformas da Previdência e trabalhista, rejeitadas pela maioria dos que os enviaram para Brasília.
Segundo Achens e Bartel, o eleitor não vota em ideias, mas em identidades. Elege quem ele imagina que representa o seu lado contra o outro - sejam quais forem os lados. É aquela piada irlandesa. "Você é católico ou protestante? Ateu. Mas você é ateu católico ou ateu protestante?". Ou seja: de que lado está?
Nos EUA, essa linha é mais fácil de traçar porque as identidades se resumem, eleitoralmente, a duas legendas. Mesmo na disruptiva eleição de Trump, 95% tanto de republicanos quanto de democratas votaram nos candidatos de seus partidos. E no Brasil, onde dois em cada três eleitores dizem não ter preferência partidária?
Nas eleições de 2004 a 2014, a geografia separou petistas de antipetistas. Bairros, cidades e Estados mais pobres ficaram majoritariamente de um lado; enquanto moradores dos locais mais ricos, em geral, ficaram do outro. Em 2016, não mais. A internet misturou e segue confundindo essas fronteiras. A construção de identidades virtuais via Facebook e Twitter aproxima forasteiros e afasta vizinhos. Proximidade física importa, mas menos.
Quanto mais tempo ele passar online, mais a internet influenciará o eleitor. O celular bateu a TV também na urna.
* José Roberto de Toledo é jornalista
Fonte: http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,ibope-internet-e-voto,70001836115
Roberto Freire: A ‘herança maldita’ e o futuro
O tamanho do desafio que se coloca diante do atual governo – recuperar o Brasil e fazê-lo superar a mais grave crise econômica de sua história – é diretamente proporcional ao legado perverso deixado pelo lulopetismo após 13 anos de desmantelo e irresponsabilidade na condução do país. Em 2003, quando assumiu a Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva atacou injustamente o seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, ao apontar a suposta “herança maldita” que recebia da gestão anterior. Pois a história provou que os responsáveis pela derrocada brasileira, especialmente no campo econômico, foram Lula, Dilma e o PT, e por onde se queira analisar não faltam dados para comprovar tamanho desastre.
Como se não bastassem os 14 milhões de desempregados que hoje retratam a penosa realidade brasileira, é necessário enfrentar uma outra faceta do problema que ameaça, inclusive, o futuro do país. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade (Iets), publicada no último domingo (4) pelo jornal “O Globo”, o índice de desemprego entre os jovens de 14 a 24 anos já é de 30%, o que corresponde a quase 10% do total de brasileiros sem ocupação profissional, de acordo com o IBGE. Em números absolutos, o percentual representa nada menos que 1,265 milhão de jovens e adolescentes em capacidade de trabalho.
O levantamento, cuja responsável é a economista e pesquisadora Sonia Rocha, apontou ainda que a pobreza entre crianças e adolescentes de até 14 anos aumentou de 25,8% para 29% em apenas um ano, de 2014 a 2015. A situação é ainda mais preocupante quando se observa o grupo de pessoas entre 15 e 19 anos, que registrou um crescimento no percentual de pobres de 17,9% para 22,3% no mesmo período.
Outro relatório que escancara o quanto os governos do PT foram danosos ao Brasil foi publicado pelo prestigiado International Institute for Management Development (IMD), uma das mais respeitadas escolas de administração do mundo, em parceria com a Fundação Dom Cabral. De acordo com o World Competitiveness Yearbook, publicado desde 1989, o país perdeu 23 posições no ranking de competitividade mundial desde 2010 – quando Dilma foi eleita presidente –, despencando da 38ª para a 61ª posição em uma lista com 63 nações. Para que se tenha dimensão do estrago, o verdadeiro tsunami da incompetência lulopetista nos deixou à frente apenas de dois países: Venezuela e Mongólia.
A “pátria educadora”, slogan criado pelo marqueteiro oficial do PT durante o segundo governo Dilma, amarga a vexatória 62ª e penúltima colocação no ranking quando o critério é a qualidade da educação – embora o país seja o oitavo colocado em gastos públicos com ensino. Trata-se de mais um indicativo claro de que, se os governos lulopetistas deixaram algum legado ao Brasil, este foi altamente negativo sob todos os aspectos. Tudo isso só mostra o quão necessário foi o impeachment da ex-presidente, consumado em absoluto respeito à ordem democrática e constitucional e com amplo apoio da sociedade brasileira.
É importante lembrar que, apesar de ter contribuído decisivamente para levar o país ao atoleiro, Dilma não é a única responsável por tal descalabro. A irresponsabilidade teve origem ainda no governo Lula, que não soube aproveitar um momento de forte expansão da economia mundial e fez uma opção profundamente equivocada ao incentivar o consumo desenfreado, o que gerou um endividamento recorde das famílias. O PT não pensou em um projeto nacional de desenvolvimento; apenas pôs em prática um projeto de poder. O resultado, ao fim e ao cabo, é a maior crise econômica de nossa história – para não citarmos os infindáveis escândalos de corrupção e o saque aos cofres públicos.
A árdua tarefa de reerguer o Brasil e reconduzir o país aos trilhos do crescimento, a cargo do governo de transição, deve ser compartilhada por todos os que temos espírito público, responsabilidade e compromisso com o futuro. Independentemente do recrudescimento da grave crise política e moral que o país enfrenta neste momento, é preciso reunir forças em torno das reformas em tramitação no Congresso Nacional, propostas modernizadoras que nos levarão a um novo patamar de desenvolvimento. Superar a verdadeira herança maldita deixada por Lula e Dilma não é fácil, mas estamos no caminho certo e temos a obrigação de avançar.
* Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS
Fonte: http://noblat.oglobo.globo.com/artigos/noticia/2017/06/heranca-maldita-e-o-futuro.html
Fonte: http://www.diariodopoder.com.br/artigo.php?i=54628679732
Alon Feuerwerker: Quando a chave para a solução está no problema, a tendência da crise é perenizar
Os desdobramentos do triunfo do governo no TSE permitem desconfiar: terá sido uma vitória de Pirro? Fechou-se uma porta para a remoção do presidente, mas ao custo de imenso sacrifício de recursos políticos, materiais e simbólicos. Quem discorda dirá que não, que se alcançou o essencial. E é verdade. Mas é fato também que o custo foi mesmo altíssimo.
Vitórias de Pirro em sequência são uma ameaça e tanto. O presidente tem instrumentos para vencer cada uma das batalhas já contratadas, mas é razoável suspeitar que os sucessos terão características pírricas. Pode, por exemplo, mobilizar os 172 deputados necessários para bloquear o STF, mas ao custo de provavelmente perder a confortável maioria.
Pode em setembro nomear alguém in pectore procurador-geral, com a missão de pôr um freio na Lava-Jato e congelar as ameaças. Isso terá o apoio entusiasmado dos congressistas alvejados por denúncias e processos. Mas, com a exceção dos fidelíssimos, impelirá os demais a manter distância do chefe do Executivo em ano eleitoral. E haverá resistência social.
Outra possibilidade extrema é ministros do STF passarem a adotar posição sistematicamente obstrucionista. É apenas uma hipótese teórica, não há ainda qualquer sinal de que vá acontecer, mas é bom ficar de olho. O presidente e o governo estão numa guerra pela sobrevivência e já deram todos os sinais de que, se depender deles, irão até o fim.
Tem lógica, porque a alternativa é complicada. Não se vislumbra uma saída que garanta fora do poder a tranquila sobrevivência nos planos político e judicial. Gerald Ford foi muito criticado quando perdoou Richard Nixon. Isso em boa medida lhe custou a reeleição na disputa com Jimmy Carter, mas permitiu, como se diz, virar a página. No Brasil de hoje? Difícil.
Quando só o problema tem as chaves da solução, a tendência da crise é perenizar, num processo de contaminação progressiva. Os atores "neutros" vão sendo arrastados para o ringue, e os árbitros vão perdendo a capacidade de arbitrar. Até que alguém, velho ou novo, prevaleça pela força e corte o nó górdio. Pois nenhuma crise dura para sempre.
Mas ninguém hoje parece ter a espada. Um desembarque do PSDB certamente catalisaria o impulso para o governo cair pela via congressual, pela autorização ao STF ou mesmo por impeachment. Só que o PSDB também reluta diante da opção de fortalecer decisivamente a Lava-Jato, o Ministério Público e a Justiça. Por razões óbvias.
A situação pode ser esticada indefinidamente? Não. Pode ser estendida até a eleição do ano que vem? Talvez. Nisso apostam o núcleo dirigente do PT e Lula, que hoje preferem o cenário de definhamento progressivo do governo Temer e tucanos aliados. A renovação dessa aliança em torno de um nome intocado poderia fortalecer o campo liberal-conservador para 2018.
O problema do PT é que, se o presidente e aliados têm instrumentos para bloquear ou pelo menos frear as coisas em Brasília, o petismo não tem como neutralizar Curitiba, lato sensu. A ameaça para Lula e o PT está no Paraná, e não no Distrito Federal. 2018 pode bem chegar com um lado condenado e inelegível e o outro habilitado a tentar sobreviver na urna.
De sonho também se vive, o PT espera que o governo tire a castanha do fogo e isso tenha "repercussão geral". De quebra, ganharia com a suposta anemia do quadro econômico, alimentada pelo impasse. Falta combinar com os russos. A esquerda achava que a degradação do governo Sarney daria em mudança em 1989. Deu. Mas no fim a mudança foi Collor.
O presidente beneficia-se de seus aliados não terem força suficiente para livrar-se dele a um custo baixo para eles próprios. E de os adversários preferirem o apodrecimento progressivo à ruptura de consequências incertas. Mas, como o governo só tem o impasse a oferecer, a janela de oportunidade traz apenas uma paisagem medíocre.
De todo modo, para um doente grave, cada dia a mais é a esperança adicional de surgir, de repente, a cura. E o governo espera que ela venha de uma economia melhor. E isso daria a um sobrevivente Michel Temer alguma força para influir em sua sucessão e proteger-se, e a seu grupo. Pode-se duvidar da eficácia do plano, mas não deixa de ser um plano.
Vamos continuar monitorando em tempo real o paciente na UTI.
* Alon Feuerwerker é jornalista e analista político na FSB Comunicação
Samuel Pessôa: Sangue-frio
O Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV) tem revisto o cenário de crescimento para pior, apesar de não ter havido grandes revisões para o crescimento em 2017 em comparação a 2016.
Há um ano prevíamos crescimento de 0,5% em 2017, com aceleração contínua ao longo do ano. A economia fecharia o ano crescendo 0,8% no último trimestre, ou 3,2% considerando a taxa anualizada.
Hoje, prevemos crescimento de 0,2% em 2017, com expansão de 1% no primeiro trimestre (já conhecida e fruto de um choque positivo de oferta de produção agrícola), seguida pela estagnação da economia –respectivamente, crescimento de -0,4%, 0,1% e 0% nos segundo, terceiro e quarto trimestres.
Há uma tendência entre os formuladores de política econômica de achar que crescimento sempre pode ser estimulado. Assim, agora que o cenário de menor expansão se consolida, principalmente em seguida ao agravamento da crise política que acomete o governo Temer, há a tentação de produzir crescimento a qualquer custo. Discutem-se no Congresso e no Executivo vários puxadinhos de Nova Matriz Econômica.
Como exemplos, temos:
a) reajustes nas faixas de renda e de financiamento dos instrumentos públicos de financiamento (financiamentos do FGTS para compra de imóvel, faixas de renda elegíveis ao Minha Casa, Minha Vida);
b) ampliação do volume de crédito direcionado subsidiado;
c) não devolução antecipada de empréstimos do BNDES ao Tesouro, para aumentar o funding de créditos subsidiados do banco;
d) subsídio para a renovação da frota de veículos (a pretexto de tirar veículos antigos e poluentes das ruas, o governo subsidiaria a troca de carro usado por novo);
e) novo modelo de subsídio à indústria automobilística para substituir o Inovar-Auto, com alguns penduricalhos para disfarçar os subsídios, tipo estimular indústria 4.0 e reduzir impacto ambiental;
f) medidas de compensação à indústria nacional fornecedora da cadeia de petróleo, a pretexto de perdas geradas pela redução do conteúdo local etc. A criatividade vai longe.
Como vimos de 2009 a 2014, essas medidas geram pouco crescimento e, por outro lado, criam inúmeros problemas a médio prazo. Adicionalmente, essas medidas impedem que o Banco Central alongue de forma sustentável o ciclo de queda dos juros.
Ou seja, com exceção de uma vitória de Pirro contra o baixo crescimento, puxadinhos de "Nova Velha Matriz Econômica" só produzem tristeza.
A economia brasileira tem um seriíssimo problema de baixa produtividade. A dificuldade da recuperação é consequência do estrago que a desastrosa condução da política econômica, principalmente entre 2009 e 2014, promoveu na economia real.
Os únicos antídotos são sangue-frio, a aprovação das reformas - para alongar o horizonte do cálculo empresarial- e deixar que as seguidas surpresas desinflacionárias coloquem a Selic em mínimas históricas de forma sustentável.
Novamente houve, na sexta (9), surpresa positiva na inflação, no IPCA de maio. O número de 0,31% foi 0,18 ponto percentual abaixo do que se esperava. Sem puxadinhos e solucionando a crise política, podemos divisar Selic muito baixa, e de forma sustentável, à frente.
* Samuel Pessôa é físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV.