Pedro Fernando Nery: O auxílio emergencial salva vidas?
Sem o auxílio emergencial talvez tivéssemos vivido a pandemia de forma mais parecida com o México, que não implementou nenhum benefício relevante; lá, como aqui, o presidente minimizou a pandemia
No debate sobre uma nova rodada do auxílio emergencial, tem-se apontado que o benefício teria sido exagerado em 2020. É que ele teria provocado um aumento da renda das famílias mais pobres, ao invés de apenas repor a renda perdida – um exagero que afetaria negativamente a própria economia diante da alta dívida pública. O argumento elide um ponto importante do auxílio emergencial – o seu caráter sanitário. Para além dos dados de renda, devemos nos perguntar: o auxílio salvou vidas?
Na sexta-feira, perguntado sobre a prorrogação do benefício, o presidente da República respondeu “cobra de quem determinou ficar em casa”. O raciocínio não deixa de ser coerente: o auxílio de fato foi concebido para ajudar as pessoas a ficarem em casa. A fala do Presidente ajuda a conjecturar o que teria acontecido sem um auxílio emergencial vigoroso: a perda de renda forçaria as pessoas a circular em busca de uma ocupação.
Além disso, tornaria parte da população um prato cheio para a desinformação. É muito mais fácil acreditar em mentiras no WhatsApp e se indignar contra as medidas de distanciamento quando há o medo de perda de renda na família. Na economia comportamental, chama-se de “viés de confirmação” a tendência que temos de selecionarmos as informações mais convenientes para os nossos valores.
Outro lembrete do negacionismo de autoridades brasileiras foi dado no domingo, quando o general ministro-chefe da Secretaria de Governo declarou que “o tal do fique em casa foi um erro”. Sem o auxílio emergencial talvez tivéssemos vivido a pandemia de forma mais parecida com o México, que não implementou nenhum benefício relevante. Lá, como aqui, o presidente minimizou a pandemia: neste caso o esquerdista Andres Manuel López Obrador (AMLO), coadunando com a “teoria de ferradura” (que prescreve que extremos do espectro ideológico não se afastam, mas se encontram).
O México, com AMLO e sem auxílio, conseguiu simultaneamente conquistar um aumento expressivo da pobreza e um número elevado de óbitos. A taxa de mortes é de 1.400 por milhão de habitantes, a maior da América Latina. Supera a brasileira de 1.100 por milhão, embora sua população seja mais jovem. A taxa mexicana aqui resultaria em dezenas de milhares de mortes a mais.
De fato, estudo do economista Marcos Hecksher (Ipea) mostra que muitos países da América Latina estão entre os piores do mundo quanto ao índice de mortes na pandemia – quando se pondera pela demografia, mais favorável do que em países com maior proporção de idosos (como os europeus). Entre os vizinhos que desbancam o Brasil, nenhum parece ter instituído proteção social relevante.
Um estudo divulgado no fim de janeiro pelo Instituto de Economia do Trabalho (IZA, da Alemanha) quantificou como na Itália vouchers instituídos na pandemia diminuíram de forma relevante a mobilidade dos cidadãos (Deiana et al., 2021): “programas de auxílio que mitigam a ruptura econômica da pandemia podem fomentar a observância de medidas de distanciamento social, limitando as necessidades de mobilidade de públicos-alvo e nutrindo a crença do público de que a gestão da crise é adequada e justa”.
Poderia se especular que um auxílio emergencial robusto poderia ter o efeito contrário, ao aumentar o poder de compra de tal forma que as pessoas se deslocariam mais para consumir como nunca antes – mas esta evidência não foi colocada. Para outros países, os resultados têm mostrado que mais ajuda é igual a mais isolamento.
Nos Estados Unidos, identificou-se que as medidas de distanciamento são menos cumpridas pelos mais pobres, e o equivalente do auxílio emergencial lá aumentou o distanciamento social (Wright et al., 2020). Com dados de smartphones, outros pesquisadores chegam a falar em “privilégio do distanciamento social” (Dasgupta et al., 2020). Já a análise de 241 regiões de 9 países da América Latina e na África mostrou que pobreza está associada a maior mobilidade (Bargain e Aminjonov, 2020).
Por aqui, os psicólogos Jéssica Farias e Ronaldo Pilati, da UnB, aplicaram questionários a mais de 2 mil pessoas para entender os fatores que influenciariam o respeito às medidas preventivas. Em uma exploração inicial, os desempregados e os de menor salário estariam mais inclinados a não respeitar.
Quanto à renda, o Brasil destoou do resto da América Latina, que observou em maior ou menor grau aumentos da pobreza: aqui, ela caiu por conta do auxílio. Por sua vez, o México ganhou quase 10 milhões de novos pobres – alcançando “níveis alarmantes de insegurança alimentar, particularmente nos domicílios com crianças”, avaliou neste mês o Centro para o Desenvolvimento Global (Blofield et al., 2021)
Se a redução temporária da pobreza é considerada por alguns um retrocesso do auxílio, que o seu impacto potencial sobre as mortes entre em consideração.
*DOUTOR EM ECONOMIA
Eliane Cantanhêde: Ruído entre STF e Forças Armadas, enquanto Bolsonaro se aproxima de antilavajatistas
Ruído entre STF e Forças Armadas, enquanto Bolsonaro se aproxima de antilavajatistas
O novo foco político está no mal-estar entre as Forças Armadas e o Supremo, após o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas confirmar, em livro-entrevista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o que me disse em 4 de abril de 2018 e publiquei no Estadão: suas mensagens no Twitter contra um habeas corpus para o ex-presidente Lula sair da prisão não foram pessoais, foram combinadas com o Alto Comando do Exército.
Na reportagem, depois da forte repercussão à sua manifestação pelas redes sociais, ele me disse que a sua fala “expressa a posição do Alto Comando do Exército e é exclusivamente a da Força”. Ou seja, o general não foi ao Twitter por conta própria, e sim pelo Exército. Só fez uma ressalva: que não combinou com Aeronáutica e Marinha.”
No livro Villas Bôas: conversa com o comandante (Editora FGV, 2021, 244 págs), de Celso Castro, o general detalhou em setembro de 2019: “O texto teve um ‘rascunho’ elaborado pelo meu staff e pelos integrantes do Alto Comando residentes em Brasília. No dia seguinte, remetemos para os comandantes militares de área. Recebidas as sugestões, elaboramos o texto final, o que nos tomou todo expediente, até por volta das 20 horas, momento que liberei (para divulgação)”.
O Alto Comando reúne os generais-de-Exército, de quatro-estrelas, que chefiam as regiões militares e os principais departamentos e secretarias da Força. Foram eles quem produziram os dois textos que Villas Bôas publicou em 3/4/2018, véspera do julgamento do Supremo sobre manter ou não Lula preso – o que faria, como fez, toda a diferença na eleição presidencial, meses depois.
Primeiro tuíte do general: “Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?” Em seguida: “Asseguro à Nação que o Exército julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia (...)”.
Assim como Villas Bôas não falou sozinho, a reação do decano do STF também não foi pessoal. Celso de Mello, hoje já aposentado, não citou o comandante, mas classificou a manifestação dele como “claramente infringente do princípio da separação de Poderes” e criticou “insurgências de natureza pretoriana que, à semelhança do ‘ovo da serpente’, descaracterizam a legitimidade do poder civil instituído e fragilizam as instituições democráticas”. Em nota de ontem, na mesma linha, o ministro Edson Fachin considerou “intolerável e inaceitável qualquer forma ou modo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário”.
À FGV, Villas Bôas, que é da reserva e sofre de ELA, uma doença degenerativa, disse que sua manifestação foi “um alerta, antes que uma ameaça”. Ele, porém, repetiu o que também já me dissera em sua primeira entrevista como comandante do Exército, publicada no Estadão em dezembro de 2016, um ano e quatro meses antes do julgamento do HC de Lula. Segundo ele, “tresloucados e malucos” batiam às portas das Forças Armadas (FA) pedindo a volta dos militares ao poder. Algo, dizia, que tinha “chance zero”.
O livro de Villas Bôas vem numa hora de noticiário desfavorável às FA e em que Bolsonaro, contrário a Celso de Mello, Fachin e Alexandre de Moraes, já identificou um elo no Supremo: o antilavajatismo. Por essas ironias da história, ou espertezas da política, o presidente que usou Sérgio Moro como troféu se une aos algozes de Moro e defensores de Lula para proteger filhos e Centrão. E que, eleito com um empurrão dos militares, usa símbolos das FA e libera o uso do nome delas, em vão, para insinuar golpes. Podem ser meras bravatas. Ou não.
O Globo: Decreto das armas divide Centrão e será primeiro teste da nova base aliada de Bolsonaro
Parlamentares da oposição já se movimentam para derrubar medidas assinadas pelo presidente
Jussara Soares e Paulo Cappelli / O Globo
BRASÍLIA — Duas semanas após ajudar a eleger Arthur Lira (PP-AL) como novo presidente da Câmara negociando emendas e cargos com partidos políticos, o presidente Jair Bolsonaro enfrenta o primeiro teste de fogo de sua aliança com o Centrão para sua agenda pessoal. Os quatro decretos editados na última sexta-feira para flexibilizar regras para compra e uso de armas no país sem passar pelo Congresso são questionados tanto por parlamentares de oposição como por deputados de siglas que compõem a nova base do governo.
A reação aos decretos das armas, segundo parlamentares ouvidos pelo GLOBO, vai dar a dimensão ao presidente de que, apesar de ter saído vitorioso na eleição no Congresso, não terá apoio irrestrito, mesmo do Centrão, em suas pautas. E sinaliza ao governo que a cada nova pauta a negociação deverá ser retomada do zero, principalmente nos projetos que tratam de costumes.
Lideranças de siglas como PL e PSD, duas das maiores do Centrão, e do MDB, já se manifestaram de forma contrária aos decretos. O Cidadania apresentou ontem um decreto legislativo para derrubar as novas normas, sob alegação de que o ato do presidente usurpa poderes do Congresso de legislar. Em sua primeira manifestação, Lira afirmou discordar dessa avaliação. Veja ao final desta reportagem os principais pontos dos decretos.
O posicionamento mais emblemático até o momento é o do vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), eleito na chapa de Lira com o apoio do Planalto. No Twitter, o parlamentar criticou o conteúdo dos decretos e afirmou que que Bolsonaro exacerbou sua competência.
“Mais grave que o conteúdo dos decretos (...) é o fato de ele exacerbar do seu poder regulamentar e adentrar numa competência que é exclusiva do Poder Legislativo. O presidente pode discutir sua pretensão, mas encaminhando um PL (projeto de lei) à Câmara”, escreveu. Em entrevista ao G1, Ramos disse que há “o uso da questão dos CACs (colecionadores, atiradores e caçadores) para dissimular o desejo de armar a população”.
Vice-líder do Cidadania, o deputado Daniel Coelho (PE) ingressou, ontem, com uma proposta de decreto legislativo (PDC) para derrubar o decreto 10.630, que julga ser o mais “amplo” dos quatro. Se aprovada, a medida poderá suspender boa parte dos atos de Bolsonaro que tratam de cadastro, registro, porte e compra de armas e munição, além do Sistema de Gerenciamento Militar de Armas e o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas. Para isso, Coelho precisará do apoio de três quintos dos votos.
O líder do PSDB na Câmara, deputado Rodrigo de Castro (MG), disse que o partido apoia a iniciativa do Cidadania e também estuda apresentar um PDC para derrubar os decretos do presidente Jair Bolsonaro.
— É um ato revestido de ilegalidade, um ato extemporâneo e é uma falta de noção muito grande por parte do governo, que não está olhando os pressupostos legais — disse o líder tucano na Câmara. — Somos radicalmente contra esse aumento (de armas), até porque ele é feio sem critérios.
O deputado Fábio Trad (PSD-MS) se posicionou contra os decretos e diz que no seu partido, embora tenha parlamentares armamentistas, não tem a ampla maioria apoiando a medida.
— O governo enfrentará resistência no Centrão. Eu, individualmente, sou contrário tanto por vício de iniciativa quanto pelo conteúdo, que me parece fora da prioridade do que o Brasil precisa. Não vejo coesão no Centrão hoje em relação a essas medidas — disse Trad.
Líder do MDB, Isnaldo Bulhões (AL) disse ser “totalmente inoportuno” o governo publicar decretos que ampliem o acesso a armas em meio à pandemia. A bancada do partido se reunirá na próxima terça-feira para tratar do assunto. A expectativa é que, salvo exceções, a maioria do MDB se manifeste contra os decretos publicados por Bolsonaro.
Outras lideranças aliadas de Bolsonaro no Congresso evitaram se posicionar diretamente e afirmam que ainda analisam os textos publicados na última sexta-feira. Aliado de Arthur Lira, o líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB), disse que o partido ainda fará uma reunião para consolidar uma posição majoritária sobre o tema. A bancada evangélica, grupo majoritamente contra ampliação da posse de armas, também ainda não se manifestou.
Bolsonaro já teve uma derrota semelhante no ano passado quando tentou, por decreto, flexibilizar as regras de posse e porte de armas. Um projeto de decreto legislativo (PDL) para derrubar a medida foi protocolado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e aprovado por 47 votos a 28. O texto seguiria para a Câmara, mas, antes disso, Bolsonaro recuou e revogou o decreto.
O presidente da Câmara, em entrevista ao G1, defendeu as medidas de Bolsonaro e disse que o Executivo não ultrapassou sua competência:
— Ele não invadiu competência, não extrapolou limites já que, na minha visão, modificou decretos já existentes. É prerrogativa do presidente. Pode ter superlativado na questão das duas armas para porte, mas isso pode ser corrigido — disse Lira.
Ontem, o ministro Luís Roberto Barroso liberou a continuidade do julgamento que analisará uma resolução do presidente Jair Bolsonaro que busca zerar a alíquota de importação de revólveres e pistolas. A medida entraria em vigor em janeiro, mas foi suspensa por liminar do ministro Edson Fachin após ação movida pelo PSB. O processo começou a ser discutido no plenário virtual da Corte no último dia 5, mas havia sido suspenso após Barroso pedir vista do processo. A expectativa é que, agora, o tema entre na pauta do plenário virtual desta sexta-feira ou da sexta da semana que vem.
Principais pontos dos decretos
Limite de armas
Agora o cidadão comum pode adquirir seis em vez de quatro armas, desde que preencha requisitos necessários. Esse limite sobe para oito no caso de policiais, agentes prisionais, membros do Ministério Público e de tribunais.
Porte de armas
Agora é permitido o porte simultâneo de duas armas, o que significa poder circular com elas.
Munição para CACs
Antes, caçadores, atiradores e colecionadores poderiam comprar, por ano, até mil munições para cada arma de uso restrito (submetidas a maior controle do Estado) e cinco mil para cada arma de uso permitido. Agora, poderão comprar também, por ano, insumos para recarga de até dois mil cartuchos nas armas de uso restrito e insumos para recarga de até cinco mil cartuchos nas de uso permitido.
Armas para CACs
Os caçadores, atiradores e colecionadores agora só precisarão da autorização do comando do Exército para comprar armas acima do limite estabelecido em decreto anterior: cinco unidades de cada modelo para colecionadores; 15 unidades para caçadores; 30 para atiradores. Essas quantidades valem tanto para as armas de uso restrito quanto para as de uso permitido.
Controle do Exército
Não serão produtos controlados pelo comando Exército itens como projéteis de munição para armas de porte ou portáteis, até o calibre máximo de 12,7mm — não vale para projéteis químicos, perfurantes, traçantes e incendiários; miras como as holográficas, reflexivas e telescópicas; armas de fogo obsoletas que tenha projeto anterior a 1900 e utilizem pólvora negra.
Muncab: Live-show celebra os 80 anos do poeta e compositor baiano José Carlos Capinan
Encontro reúne de conversa, arte poesia e música com Jards Macalé, Roberto Mendes e Gereba, na próxima sexta-feira, 19/2, às 19h, no perfil do youtube da Muncab. Na ocasião, será lançado a nova edição do Caderno de Música. A FAP (Fundação Astrojildo Pereira) apoia a divulgação do evento
O baiano José Carlos Capinan, poeta, músico e intelectual com trajetória extensa nas diversas linguagens artísticas e culturas, completa 80 anos na próxima sexta-feira, 19 de fevereiro, e será homenageado pelo Espaço Boca de Brasa Muncab (Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira) com uma programação recheada com o que ele mais gosta: arte, conversa e música. Para este momento que celebra a vida e obra dessa figura icônica da música popular brasileira, estão confirmadas as presenças dos artistas Jards Macalé, Roberto Mendes e Gereba.
O evento online “Palco Aberto Boca de Brasa” será transmitido a partir das 19h, no perfil do Muncab no Youtube e contará com a apresentação do jornalista Leonardo Lichote, especialista na área músical. Também será realizado o lançamento da edição do Caderno de Músicas com participação do artista - revista mensal focada em MPB e uma minissérie onde Capinam narra o surgimento de suas principais canções. “É uma honra poder mediar esse evento que homenageia um dos nomes eternamente expoentes da arte baiana e brasileira, que tanto influenciou e influencia a sociedade através da música, da arte e da linguagem, desde os tempos da ditadura até agora, com outros grandes nomes brasileiros”, enfatiza Leonardo.
Confira o evento ao vivo, dia 19/2, às 19h!
Para Capinan, seus oitenta anos são só o começo de tantas ideias que lhe permeiam para pôr em pratica. “Nunca me imaginei capaz dessa trajetória, fui fazendo, atravessando o tempo com parceiros, e acabou acontecendo. Criar é uma espécie de potência, um tesão pelo belo, divertida forma de se entender a vida, de compreender o humano. E a natureza do mundo, às vezes tão difícil que só pela arte se pode chegar perto do seu sentido”, destaca o poeta.
“A vida entendida na sua verdadeira dimensão nos obriga a um gesto humilde de celebrá-la. nada consegue reduzi-la, devemos nos render à sua grandeza e mistério, celebrando, agradecendo e abraçando-a”, finaliza.
O evento é realizado pelo Muncab (Museu Nacional da Cultura Afro-brasileira), a Amafro, o Espaço Cultural Boca de Brasa, da Prefeitura de Salvador, e conta com co-realização da Nubas e da Estandarte Produções e apoio do Caderno de Música.
Minissérie – Com cinco capítulos, a produção mostra Capinan narrando como foram produzidas suas canções mais icônicas, entre elas ‘Viramundo’, ‘Miserere nóbis’, ‘Soy loco por ti América’, ‘Papel Machê’, ‘Tempos quase modernos’ e ‘Yaya Massembá’. A direção é deJamile Coelho e produção da Estandarte Produções.
Cadernos de Música - A cada mês, uma das edições é dedicada a um nome consagrado da música brasileira e a outra/o artista reconhecida/o pela crítica e por seus pares. O conteúdo é formado por uma longa entrevista inédita (ou raríssima) com o músico e um ensaio sobre sua obra. O assinante recebe duas edições mensais, impressas em papel pólen, tamanho 17cm x 17cm, capa dura e formato quadrado (como a capa de um vinil).
Já foram publicados números de artistas como Elza Soares, Tom Jobim, Adriana Calcanhotto, Tom Zé, Jorge Mautner, Nara Leão, Hermeto Pascoal, Ana Frango Elétrico e Thiago Amud. A Cadernos de Música é vendida exclusivamente por assinatura e custa R$49 mensais. A obra pode ser adquirida através do site da plataforma Revistas de Cultura.
Sobre Capinan - Com passagem na comunicação, na gestão pública, na música, no cinema e nas artes, José Carlos Capinan é um daqueles nomes referência em diversos temas. Atualmente, dirige o Muncab e tem se concentrado em abrir as portas e a interatividade do Museu diante da pandemia e das dificuldades no setor cultural a nível federal.
Formado em Teatro, Medicina, Pedagogia e Direito tem na trajetória roteiros, letras e textos para a Sinfonia da Cidade de Salvador, produções de shows de Gal Costa, Macalé, Luiz Gonzaga, além de parcerias e composições com Tom Zé, João Bosco, Caetano Veloso, Edu Lobo, Fagner, Francis Hime, Geraldo Azevedo, Gereba, Gilberto Gil, João Bosco, Macalé, Moraes Moreira, Paulinho da Viola, Robertinho do Recife, dentre outros. Entre os seus muitos hits, destaque para alguns como Soy Loco Por Ti América, Papel Machê, Ladainha e Viramundo.
Serviço
O quê? Palco Aberto Boca de Brasa – 80 anos do poeta e compositor José Carlos Capinan (roda de conversa, música, arte, poesia e história) e lançamento do Caderno de Música.
Participação: Jards Macalé, Roberto Mendes e Gereba
Mediação: Leonardo Lichote (jornalista musical)
Quando: Dia 19 de fevereiro às 19h
Onde: Perfil do Muncab no Youtube
Informações: Estandarte Produções
Juan Arias: A macabra e psiquiátrica paixão de Bolsonaro pela pólvora
Talvez o mais grave dessa loucura do presidente seja o silêncio até agora das instituições do Estado frente aos novos decretos para aumentar o número de armas particulares
Se algo caracteriza a idiossincrasia de Bolsonaro é sua paixão pelas armas, por tudo o que cheira à pólvora. Além do tiro ao alvo ser um dos seus esportes preferidos, sua ânsia por armar até os dentes os brasileiros revela seguramente um distúrbio psiquiátrico que não sei se tem nome científico. Dizer que “o povo está vibrando” de felicidade por poder possuir tantas armas revela mais, talvez, sua obsessão macabra pela violência.
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Nos comentários à reportagem de Carla Jiménez e Regiane Oliveira sobre os novos decretos do Presidente que amplia de 4 a 6 o número de armas que uma pessoa pode possuir legalmente e os caçadores, até 40, foram muito significativos. “Menos armas e mais emprego”, “menos armas e mais educação”, “menos armas e mais vacinas”. Outros chegaram a fazer hipóteses que nessa pressa de Bolsonaro em armar a população pode significar que o que deseja é criar sua própria milícia para que o defenda no caso de tentarem retirá-lo do poder ou perca as próximas eleições, criando um clima violento no país de guerra civil.
É uma hipótese bem possível, mas acho que essa paixão desmedida por tudo o que cheira à pólvora e a tudo relacionado às armas de fogo pode fazer parte de sua personalidade de morte e destruição, de negacionismo e de mania de perseguição. E até de medo. Ele confessou que dorme com uma arma ao lado de sua cama, como se em sua residência presidencial não existisse segurança suficiente para defendê-lo. Esse amor pelas armas e pela violência pode explicar sua frieza às mortes da pandemia. Não sabemos como são os sonhos de Bolsonaro além de que dorme muito pouco porque sofre de insônia, mas certamente são povoados de armas e mortes.
Essa sua paixão desmedida por disparar armas de fogo fez com que em sua viagem oficial a Israel pedisse para realizar uma exibição de tiro ao alvo. E essa paixão pelas armas é evidente vendo suas fotografias imitando com as mãos o gesto de disparar. Três fotos são particularmente eloquentes e aterradoras a esse respeito: a dele e seus três filhos políticos juntos imitando disparar um fuzil e com os quatro sorrindo de orelha a orelha. A do hospital após a operação depois do atentado durante a campanha eleitoral ainda envolto em mistério. A foto o apresenta ainda se recuperando imitando com suas mãos o disparo de um fuzil. E a mais aterrorizante talvez seja a que o mostra com uma menina de cinco anos em seus braços enquanto a ensina a fazer o gesto de disparar um revólver com suas mãozinhas inocentes.
Bolsonaro querer agora que os brasileiros possam se tornar o país mais armado do mundo com até 600 armas para cada cem habitantes é uma aberração em um Brasil já martirizado com mais de 40.000 homicídios por ano. Não porque seja um país mais violento do que os outros e sim porque sofre uma carência crônica de segurança do Estado incapaz de defendê-lo.
Em um país em que as pessoas podem, se desejarem, ter até seis armas em sua casa é se esquecer que isso só é possível para os que podem se permitir esse luxo. Enquanto os de sempre ficarão mais expostos à violência, que costumam ser os negros, os jovens e as mulheres pobres assim como os habitantes das periferias que já são alvo a cada dia de cenas de morte e terror dos policiais e dos traficantes de drogas.
E talvez o mais grave dessa loucura do Presidente por sua paixão pelas armas e a violência seja o silêncio até agora das instituições do Estado frente aos novos decretos para aumentar o número de armas particulares. O STF, o Congresso e o Senado ficarão de mãos cruzadas? Não vão parar esses instintos de morte e violência de um Presidente que pode contribuir para aumentar ainda mais o rio de sangue inocente que corre pelas ruas do país?
Há silêncios que podem acabar sendo mortais. E o silêncio, quando não a cumplicidade das instituições do Estado com os instintos de morte do Presidente, podem acabar em uma tragédia nacional.
El País: Ministério da Saúde encurralado amplia tensão nos bastidores, e técnicos criticam falta de planejamento
Ministro tenta provar que não demorou a agir na crise de Manaus, enquanto investigação avança com anuência do STF e senadores cobram explicações. Funcionários reclamam que estão sendo enviados à cidade sem missão definida
Quase um ano depois da confirmação de seu primeiro caso de covid-19, o Brasil se vê diante de um Ministério da Saúde imerso em uma longa lista de desgastes. O cerco contra as ações do ministro Eduardo Pazuello se fechou ainda mais nesta segunda-feira, quando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski autorizou que a Polícia Federal realize diligências para apurar as ações do mandatário durante o colapso da saúde do Amazonas, quando faltou oxigênio para os doentes graves.
Entre as medidas autorizadas estão o acesso à troca de emails institucionais envolvendo o ministério e as secretarias estadual e de Manaus sobre os problemas, novos depoimentos da fornecedora dos cilindros, a White Martins, e o levantamento de gastos de aquisição e distribuição de cloroquina, hidroxicloroquina e de testes para detectar o coronavírus. Lewandowski determinou ainda a identificação e o depoimento dos desenvolvedores do aplicativo TrateCOV, que, conforme relatou reportagem do EL PAÍS, indicava o uso da cloroquina para qualquer tipo de paciente que acessava a planaforma.
O grave colapso do sistema de saúde de Manaus ―onde pacientes com covid-19 morreram asfixiados― e a abertura do inquérito de investigação na Polícia Federal para apurar se houve omissão de Pazuello elevaram a pressão sobre uma pasta já marcada por controvérsias no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. Enquanto o ministro da pasta mergulha em um malabarismo retórico para agora negar medidas como, por exemplo o estímulo ao tratamento precoce a partir do uso de medicações sem eficácia contra a doença e tenta convencer que não demorou a negociar vacinas, um novo elemento tem injetado mais pressão ao cenário: a possibilidade de abertura de uma CPI no Senado.
O clima de tensão vem repercutindo internamente no trabalho de técnicos da pasta, que criticam “missões atabalhoadas” para Estados do Norte, vistas por eles como uma estratégia de defesa para mostrar ações proativas diante das investigações. Nos bastidores políticos de Brasília, a sensação é a de que, por enquanto, as explicações dadas por Pazuello na semana passada ao Senado não foram convincentes o suficiente. O Planalto ainda trabalha para impedir a CPI.
Na última quinta-feira (12), Pazuello foi participou de uma sessão organizada por senadores governistas para dar a ele a chance de ser ouvido antes da decisão sobre a instalação da possível CPI. O ministro abraçou a missão. Chegou a comparar as derrotas da Alemanha nas duas grandes guerras mundiais para pedir aos senadores que não abrissem uma nova frente de combate à pandemia ―a política― e se ativessem a uma guerra técnica conjunta para enfrentar o vírus. Argumentou que um embate político neste momento poderia desarticular a estratégia do Governo. “Queria fazer o meu alerta: a Alemanha perdeu a guerra duas vezes porque ela abriu a frente russa. Todo mundo avisou ao ditador que não devia abrir a frente russa, e ele abriu. Não há como manter duas frentes”, afirmou o ministro. “Se nós entrarmos em uma nova frente nesta guerra, que é a frente política, nós vamos ficar fixados. Se fixarmos a tropa que está no combate, vai ser mais difícil ganhar a guerra.”
Para se defender de uma suposta demora nas ações para socorrer Manaus, Pazuello disse que após ouvir relatos de “gente se contagiando mais que o normal” feitos por amigos e familiares da cidade, reuniu sua equipe ainda em dezembro. Determinou a transferência de recursos ao Estado e decidiu enviar uma equipe técnica para analisar a situação no local. Mas o grupo, chefiado pela Secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mayra Pinheiro, chegou em Manaus apenas dias depois, em 3 de janeiro. A missão produziu um documento da pasta que reconhecia a “possibilidade iminente de colapso do sistema de saúde, em 10 dias”. Mas, segundo Pazuello, não houve nenhum alerta específico sobre um colapso de oxigênio. No dia 14 de janeiro, hospitais da cidade colapsaram e faltou até este insumo básico. Pessoas morreram asfixiadas.
Conforme contou Pazuello aos senadores, o problema de oxigênio começou a ser apresentado apenas em 7 de janeiro, quando recebeu uma ligação da Secretaria da Saúde pedindo ajuda para o transporte de oxigênio de Belém a Manaus. Um relatório de sua equipe dois dias depois apontou, conforme o ministro, que o foco de uma reunião no Estado havia mudado pelo relato de colapso dos hospitais e problemas técnicos na rede de oxigênio. Segundo Pazuello, técnicos afirmaram que o desabastecimento resultava de “problema na rede de gás do município” e de “deficiência na gestão dos hospitais”. “Rede de gases são os tubos de gases e não o oxigênio que vai dentro. Pressurização entre o município e o Estado é regulação entre um e outro.” E argumentou que só teria responsabilidade no colapso de Manaus se houvesse faltado recursos para a compra, mas não pelo desabastecimento.
“Os fatos relatados puros e secos indicam deficiência na gestão dos hospitais por colapso e dificuldades técnicas em redes de gases. Em momento algum fala sobre falta de oxigênio, colapso de oxigênio ou previsão de falta de oxigênio”, afirmou o ministro. Ele defendeu que, a partir do momento em que ficou clara a dificuldade de abastecimento do insumo hospitalar, agiu com apoio logístico para o envio de cilindros, requisitou usinas de produção e organizou a transferência de pacientes para hospitais federais de outros Estados, bem como abriu mais leitos. Segundo ele, a estratégia agora é fabricar oxigênio no Amazonas e em outros Estados do Norte que enfrentam problemas de abastecimento do insumo. A tentativa de explicar o colapso, no entanto, não parece ter arrefecido o clima no Senado, embora o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, esteja “protelando” a abertura da CPI, segundo um senador ouvido pelo EL PAÍS. Em entrevista à imprensa, ele disse que agora conversará com lideranças sobre a pertinência de instalá-la neste momento.
Pressão interna na atuação do Ministério
As críticas que já vinham sendo feitas às ações do Ministério da Saúde no combate à pandemia ganharam mais força a partir do colapso de Manaus e impactaram internamente nos trabalhos da pasta. Contribuiu para esta pressão a publicação de um documento assinado por Mayra Pinheiro, secretária que liderou a primeira missão de visita ao Estado, que contradiz o próprio ministro quando ele diz que não recomenda medicamentos sem eficácia comprovada para a covid-19. Em ofício enviado à Secretaria da Saúde de Manaus, ela dizia ser “inadmissível” a não-utilização de medicações como o antimalárico cloroquina e o antiparasitário ivermectina para controlar a pandemia em Manaus. A exposição do documento pela imprensa e a investigação sobre a atuação da pasta elevaram a pressão sobre outros secretários e diretores, responsáveis por assinar os documentos que oficializam ações e orientações da pasta.
Segundo funcionários do ministério ouvidos pelo EL PAÍS na condição de anonimato por medo de represálias, o nível de cobrança às equipes técnicas aumentou desde a investigação pedida pela PGR, especialmente aos que trabalham com o Centro de Operações de Emergência (COE). “Relatórios que tragam informações comprometedoras do dia a dia geram polêmica. Há um óbvio tensionamento no ar para que o ministro consiga justificar no inquérito que ele tomou as decisões que deveria. Está usando a estrutura do ministério de forma atabalhoada para dar conta de construir alguma justificativa plausível”, diz um funcionário que atua há mais de 10 anos na pasta.
Pazuello intensificou as viagens a Manaus desde a crise sanitária e a abertura das investigações. Um dia após a sabatina no Congresso ―onde alguns senadores avaliam que ele não conseguiu sanar dúvidas e convencê-los de sua atuação proativa―, ele anunciou que embarcaria outra vez para a capital do Amazonas para tratar da crise. Nas últimas semanas, o ministério também tem ampliado o envio de técnicos do Ministério da Saúde para apoiar gestores locais. Mas funcionários da pasta contam que estas viagens têm sido determinadas sem missões claras e coordenadas, como normalmente ocorria.
Um deles contou que técnicos estão sendo convocados para viajarem e só então verem com os gestores locais como poderiam ajudar no enfrentamento à crise. “Não tem um planejamento prévio do que se vai fazer lá. Uma colega enfermeira que trabalha com gestão contou que foi perguntada no Amazonas se ela poderia ajudar no hospital”, diz. Outro funcionário, que foi convocado para viajar, disse que o clima internamente já era tenso, mas piorou a partir da investigação. “A polêmica em relação a estas viagens é que foram decorrentes do inquérito. As viagens não têm plano. Servidores e até bolsistas são escalados de um dia pro outro. Há uma exigência equivocada de uma participação de pessoas de cada secretaria independentemente se têm relação com o problema a ser resolvido”, critica. Ele argumenta ainda que técnicos não estão preparados para resolver o problema de uma hora para outra e que as decisões estratégicas partem dos dirigentes. “É desproporcional para a responsabilidade de um técnico”, acrescenta.
Em meio à crise, as coletivas técnicas da pasta, que já vinham sendo espaçadas no ano passado, passaram a ser marcadas por um amplo hiato. A última aconteceu em 13 de janeiro, mesmo com uma nova variante do vírus potencialmente mais transmissível se espalhando pelo país. É neste momento que a pasta apresenta suas análises epidemiológicas de como a pandemia avança pelo Brasil. Geralmente, os encontros eram conduzidos pelos secretários, já que a frequência de Pazuello sempre foi pequena.
O Globo: Nova cepa do coronavírus se espalha pelo país e cientistas temem terceira onda
Tire as principais dúvidas sobre a variante de Manaus, que pode aumentar velocidade da pandemia no Brasil
Giuliana de Toledo e Johanns Eller, O Globo
RIO e SÃO PAULO — Já somam, de acordo com a Secretaria estadual de Saúde, 25 os casos de Covid-19 no estado de São Paulo provocados pela variante do coronavírus inicialmente identificada em Manaus. Desses, 16 são de pessoas que não estiveram no Amazonas nem em contato com quem tenha viajado pela região. Ou seja, a linhagem P1 está produzindo em número significativo infecções autóctones, que ocorrem sem “importação”.
Faça o teste: Qual é o seu lugar na fila da vacina?
O Ministério da Saúde informa que, além de Amazonas e São Paulo, essa mutação do vírus já atinge pelo menos Ceará, Espírito Santo, Pará, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Roraima e Santa Catarina. E, segundo autoridades de saúde locais, há registros na Bahia e houve um episódio autóctone registrado no Rio Grande do Sul.
O avanço da P1 pelo país é preocupante, pois, segundo cientistas, ela demonstra ser mais transmissível. O principal freio seria a vacinação em massa. Mas a campanha nacional de imunização sofre com a escassez de vacinas.
Leia mais: Variante do coronavírus preocupa, mas vacinação não deve ser interrompida, dizem pesquisadores
A própria eficácia dos imunizantes é outra incógnita. Não há estudos que indiquem o grau de proteção da CoronaVac e da vacina de Oxford/AstraZeneca contra essa cepa. O Instituto Butantan informa que testes já estão em curso e devem ser concluídos nas próximas semanas sobre a vacina chinesa. A AstraZeneca, parceira de Oxford e da Fiocruz, também iniciou estudos.
Para tentar conter a propagação, Araraquara, que concentra 12 dos 25 casos de São Paulo — os demais estão na capital (9), em Jaú (3) e em Águas de Lindoia (1) —, entrou ontem em lockdown por 15 dias.
Também para barrar as variantes (incluindo a britânica e a sul-africana), o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC) emitiu um alerta recomendando medidas de contenção como toques de recolher e lockdown.
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A reportagem procurou o Ministério da Saúde para entender a estratégia federal de contenção da nova cepa, sem retorno. E a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não respondeu se adotaria medida similar à da reguladora da União Europeia, que agilizará a liberação de vacinas eficazes contra novas mutações.
Como o Brasil pode evitar uma onda da nova cepa?
País corre risco de enfrentar terceira onda, afirma virologista
Para Fernando Spilki, virologista que coordena a Rede Corona-ômica (iniciativa do Ministério da Ciência para observar a evolução do coronavírus), diante do número elevado de casos, do ritmo lento da vacinação e da nova linhagem circulando, o país deveria considerar, “se não um lockdown completo”, medidas que restrinjam a circulação. A situação atual, ele alerta, nos encaminha para uma terceira onda, ainda mais preocupante, pois, agora, com variantes do vírus. Ele diz que vivencia-se hoje o efeito da falta de controle da movimentação de cidadãos no país.
Justiça: STF determina que Polícia Federal investigue gastos do Ministério da Saúde com compra de cloroquina
A variante é mais transmissível? É mais letal?
Estudos epidemiológicos podem demonstrar potencial de contágio
As mutações afetam a proteína S, que é determinante na propagação do vírus. Por isso, e pelo pico de doentes observados em Manaus, cientistas acreditam que a variante seja sim mais transmissível. O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, afirmou, em audiência no Senado, que “análises indicam que ela seja três vezes mais contagiosa", mas não informou a estratégia da pasta para evitar a disseminação da cepa. Ainda não se sabe se ela é mais letal. “Precisamos de estudos epidemiológicos e clínicos melhores”, explica Ester Sabino, da USP, que lidera sequenciamentos genéticos do vírus.
É possível a reinfecção pela nova linhagem?
Brasil deve considerar restrição de circulação, diz especialista
Sim. Quem já foi contaminado pode ser novamente infectado por essa variante do Sars-CoV-2. “Sabemos que a reinfecção está sim ocorrendo, mas ainda não sabemos com que frequência”, conta Sabino. Os pesquisadores se preocupam pela capacidade que essa linhagem do coronavírus parece ter em “driblar” o sistema imunológico de quem já superou a doença e deveria, em tese, ser resistente. Uma outra questão que não está respondida é a da intensidade da infecção em quem já adoeceu anteriormente: ela é mais, igualmente, ou menos forte?
Devo fazer teste para saber se estou com essa cepa?
Identificação só pode ser feita por exame ainda indisponível
É impossível descobrir por iniciativa própria se você está infectado com alguma variante, incluindo a de Manaus. A identificação das cepas só pode ser feita por sequenciamento genético, ainda indisponível nos laboratórios brasileiros. A Fiocruz do Amazonas anunciou que está criando um teste de PCR capaz de diferenciar a P1. “Hoje o sequenciamento só é feito em laboratórios de vigilância e pesquisa. Não há indicação para fazer o teste com o objetivo de saber que variante as pessoas têm”, diz Sabino. O tratamento contra a Covid-19 é o mesmo.
As vacinas usadas no Brasil são eficazes contra a cepa?
Imunizantes não divulgaram estudos que respondam sua ação diante da linhagem de Manaus
As duas vacinas em uso no Brasil, a da AstraZeneca/Oxford, produzida em parceria com a Fiocruz, e a do Butantan, em acordo com a Sinovac, não divulgaram estudos que respondam sua ação diante da linhagem de Manaus. O instituto paulista informa que testes para checar a eficácia nesses casos estão em curso e serão apresentados “nas próximas semanas”. O imunizante da AstraZeneca também está em avaliação contra a cepa brasileira. Procurada pela reportagem, a Fiocruz não respondeu sobre o estágio da investigação.
Detectamos com precisão mutações do vírus no Brasil?
Pesquisadores buscam concluir levantamentos sobre vigilância genômica
Não. Para Sabino, faltam recursos para o país conduzir um sequenciamento genético mais amplo de amostras de vírus que circulam aqui. Há vários grupos nacionais com esse enfoque, mas os esforços não estão bem distribuídos “no tempo nem no espaço", de modo que o retrato da epidemia acaba ficando incompleto. Spilki, por sua vez, destaca que, para além da vigilância genômica, o país não se vale de dados para criar estratégias, o que seria indicado “inclusive para questões de cicatrização do tecido econômico e de retorno à normalidade”.
Marco Aurélio Nogueira: Dilúvios à vista
Há muitos 'presidenciáveis' em cogitação, mas não há o fundamental: nem uma boa articulação democrática, nem um programa mínimo com que tirar o país do buraco em que se encontra.
O açodamento, em política, é inimigo do protagonismo inteligente. Hoje, faltando quase dois anos para as próximas eleições, andam todos em busca do candidato “campeão”, aquele que será capaz de bater nas urnas o capitão cloroquina, hoje tido como adversário de respeito e o mais forte no ringue.
Pelo centro e pela esquerda a especulação campeia, juntamente com balões de ensaio em profusão e muito movimento de ocupação de espaço. Há quem busque se cacifar com antecedência, caso de João Dória, que põe em curso uma operação desenhada para fracassar, seja pela falta de carisma do personagem, seja por sua baixa densidade nacional, seja pela incapacidade de ser um ponto de convergência consistente do centro liberal-democrático.
Há os que procuram um nome de “fora da política”, capaz de fornecer ao eleitorado uma perspectiva de renovação, derivada da ideia de que o eleitor médio está cansado dos mesmos de sempre. Chega-se mesmo a ventilar o nome da empresária Luiza Trajano, nome digno mas que está anos-luz distante de uma briga eleitoral mais profissional. Passa-se o mesmo com Luciano Huck, cuja juventude e cujo dinamismo podem estar sendo desperdiçados por falta de definições e bases sólidas de sustentação. Lula, por sua vez, incapaz de agir em articulação com os vários pedaços da esquerda, diz para Fernando Haddad “por o bloco na rua” e o ex-prefeito de São Paulo obedece, sem levar em conta os humores do próprio partido. Ciro Gomes mexe-se o tempo todo, mesmo que em silêncio e sem sair do lugar.
E isso para não falar dos que se aproveitam da conjuntura para atiçar a luta interna nos partidos.
Há nomes sendo cogitados, mas não há o fundamental: nem uma boa articulação entre as correntes democráticas, nem um programa mínimo com que tirar o país do buraco em que se encontra. Sem isso, nomes ficarão a flutuar, sem agarrar coisa alguma. E aquele que está mais assentado (no caso, o presidente da República) vai não só mantendo posição como pondo em curso o projeto de dividir e impulsionar a “implosão” dos partidos institucionalmente mais fortes (DEM, PSDB) do centro democrático. Até agora, ele está nadando de braçada.
Muitas águas vão rolar, com certeza, ao longo de 2021. Mas só promoverão dilúvios desagregadores se não houver esforços tenazes para construir diques democráticos de sustentação, que agreguem o que está sendo atacado pelo vírus demoníaco da divisão e do açodamento.
*Marco Aurélio Nogueira, professor titular, Teoria Política da Unesp
Celso Rocha de Barros: O centro democrático existe?
Como no caso da crise do DEM, a crise do PSDB é mais uma vitória de Jair Bolsonaro
Na semana passada, o PSDB resolveu fazer uma dessas coisas que tucano faz e isolou João Doria. Isso, o cara que comprou a vacina, o único tucano com um trunfo eleitoral para 2022.
Como resultado desse isolamento, Doria pode ficar sem a legenda do PSDB para concorrer em 2022. Se isso acontecer, o único sucesso de políticas públicas do Brasil desde a eleição de Bolsonaro —a compra das vacinas pelo estado de São Paulo— pode não ter qualquer peso na eleição presidencial de 2022.
Um dos fatores que parecem ter precipitado a briga foi a tentativa de Doria expulsar Aécio Neves, aquele do Joesley. Doria queria expulsá-lo porque Aécio seria um dos incentivadores dos tucanos que traíram a candidatura de Baleia Rossi na eleição da Câmara. Perdeu a briga. Aécio ainda controla uma máquina fisiológica em Minas Gerais, e, neste caso específico, estava defendendo o direito de os deputados se venderem, algo que a turma leva bastante a sério.
Além disso, uma ala do PSDB lançou o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, para disputar com Doria a candidatura de 2022. Leite começou a disputa afirmando que o PSDB não deve fazer oposição “sistemática” a Bolsonaro.
Foi uma declaração desastrosa. Ninguém discute que os tucanos podem apoiar as propostas de Guedes, mas abster-se de fazer oposição dura a Bolsonaro é perdoar o autogolpe, é perdoar as mortes da pandemia, é defender uma impunidade muito pior do que a que foi negociada no acordão que encerrou a Lava Jato. Leite, um político jovem, não precisava dessa declaração no currículo.
Como no caso da crise do DEM, a crise do PSDB é mais uma vitória que Jair Bolsonaro conquistou por ter ganho o Congresso para Arthur Lira. Mas a cabeça de Doria é um prêmio muito maior do que a de Rodrigo Maia.
O governador de São Paulo é o principal desafiante de Bolsonaro já no ringue. Tinha o trunfo da vacina, que, vamos repetir, é o trunfo que todo mundo queria ter: a vacina salva vidas. Só a vacina vai trazer a normalidade de volta, só com normalidade teremos crescimento econômico de novo. E todos sabemos que Bolsonaro só começou a comprar vacinas para competir com Doria.
Enfim, morreu de vez o argumento dos tucanos que dizem que votaram no Bolsonaro porque do outro lado era o PT. Não foram capazes de tomar uma posição clara contra Bolsonaro nem quando do outro lado eram eles mesmos.
Primeiro o DEM, depois o PSDB, o que sobrou do tal centro democrático? Ele existe? Talvez não. Talvez ele sempre tenha sido a direita incomodada com o fato de que Bolsonaro não havia lhe entregue nacos suficientemente grandes do governo, do orçamento, do poder.
Acho cedo para cravar esse diagnóstico. A popularidade de Bolsonaro é baixa para o padrão histórico de presidentes nesta altura do primeiro mandato. Se toda a rejeição a Bolsonaro fosse de esquerda, o segundo turno de 2022 seria entre Ciro e Haddad. Como isso não parece provável, imagino que haja, sim, um setor do eleitorado que é mais ou menos de centro e é contra Bolsonaro.
Se esse eleitorado existir, Luciano Huck pode herdá-lo sozinho. Não seria surpresa, aliás, se descobríssemos que os partidários de Huck no PSDB estavam entre os que manobraram para neutralizar Doria. Se não manobraram, certamente lucraram com a manobra.
El País: Decretos para aumento de venda de armas elevam insegurança com Bolsonaro. Tema pode chegar ao STF
Presidente assinou medidas na sexta, 12, para facilitar comércio de armas e afrouxar fiscalização. Entidades e lideranças políticas reagem para o que já é considerado um risco democrático, especialmente depois da invasão do Capitólio, que não foi condenada pelo mandatário brasileiro
Carla Jiménez e Regiane Oliveira, El País
O presidente Jair Bolsonaro aproveitou a sexta-feira, véspera de um quase Carnaval no Brasil, para assinar quatro decretos que facilitam ainda mais a venda de armas e reduzem a fiscalização pelos órgãos competentes. É o trigésimo ato normativo publicado nos últimos dois anos por Bolsonaro, dentro de uma política que ajudou a aumentar as armas em circulação no Brasil. O anúncio, feito pelo twitter do mandatário, gerou reações imediatas entre entidades ligadas a direitos humanos e lideranças políticas. “O populismo armamentista de Bolsonaro, além de agravar o problema [de violência], é uma cortina de fumaça para suas aspirações golpistas”, escreveu Marcelo Freixo, deputado do PSOL no Rio. Freixo anunciou um projeto para anular os últimos decretos de Bolsonaro e protocolou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal. “O presidente não pode legislar sobre armas via decreto”, reclamou o deputado.
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Um levantamento do jornal O Globo mostra que só a posse de armas nas mãos de civis deu um salto de 65% no país desde dezembro de 2018, pouco antes de Bolsonaro assumir o poder no dia 1 de janeiro. No final de janeiro eram mais de 1,1 milhão de armas nas mãos de cidadãos, número que deve subir facilmente caso os decretos do presidente não forem derrubados na Justiça, como esperam os especialistas em segurança pública. Dentre as normas previstas pelo Governo, estão o aumento de limite de compra de armas para cidadão, que passam de 4 para 6 armas. O número pode chegar a 8 para membros da magistratura, do Ministério Público e os integrantes de polícia e agentes e guardas prisionais.
Outras medidas preveem a redução de controle e rastreamento de armas e munições, um risco que coloca os armamentos mais próximos do crime organizado. Há facilidade para que atiradores e caçadores, por exemplo, comprem entre 30 e 60 armas, sem necessidade de autorização expressa do Exército. Projeteis e máquinas para recarga de munições e carregadores também deixam de ser controlados pelo Exército. Facilitação de acesso armas mais restritas, que interessam às milícias. “O aumento da venda de armas de maior potencial circulando inevitavelmente acaba inevitavelmente abastecendo o crime”, diz Carolina Ricardo, diretora do Instituto Sou da Paz. “Uma arma de um acervo de um atirador ou caçador pode ser roubada ou desviada e abastecer o mercado ilegal”, alerta ela, lembrando que a inexistência de rastreamento dificulta a investigação de crimes. No ano passado, uma portaria do Exército revogou regras sobre rastreamento de armas e munições, dispositivos de segurança e marcação de armas de fogo e munição no Brasil.
A política ostensiva de liberação de armas do Governo Bolsonaro tem gerado insegurança na sociedade, especialmente depois da invasão do Capitólio nos Estados Unidos, no dia 6 de janeiro. O presidente ultradireitista não condenou até hoje a invasão dos eleitores de Trump que não aceitaram o resultado da eleição. Bolsonaro também não perde uma oportunidade para reforçar o discurso de desconfiança sobre as urnas eletrônicas – sem evidências para tal — e de dizer que quer ver a população armada, antecipando uma crise que ele pode abrir no ano que vem, caso não seja reeleito nas presidenciais.
Em nota, o Instituto Igarapé, think tank que estuda a segurança pública, afirmou que o pacote de decretos “não só tem efeitos letais para o país que mais mata com armas de fogo no mundo, como reforça possíveis ameaças à democracia e à segurança da coletividade”. Segundo Michele dos Ramos, assessora especial Igarapé, “há muitas perguntas a serem respondidas pelas autoridades federais sobre as motivações políticas do descontrole de armas no país, uma vez que não há qualquer justificativa ou conhecimento técnico que embase as perigosas mudanças”.
Após divulgar a nota técnica, Ilona Szabó, cofundadora e presidente do Instituto Igarapé, foi bloqueada pelo presidente no Twitter. “Impressionante ver como a máquina do ódio é eficiente e está aparelhada para bloquear qualquer contestação à narrativa oficial. Isso só acontece em ditaduras. Já vivemos tempos de exceção”, disse.
O vice-presidente da Câmara dos Deputados Marcelo Ramos (PL-AM), aliado de Bolsonaro, criticou as novas medidas. “Mais grave que o conteúdo dos decretos relacionados a armas editados pelo presidente é o fato de ele exacerbar do seu poder regulamentar e adentrar numa competência que é exclusiva do Poder Legislativo. O presidente pode discutir sua pretensão, mas encaminhando PL a Câmara”, escreveu no Twitter.
Bolsonaro ignorou as críticas e ironizou que “o povo está vibrando” com as novas medidas. Ele publicou um vídeo em que comenta os decretos com um pequeno grupo de pessoas no sul do país. O deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), ex-presidente da Câmara, reagiu “Bolsonaro considera a parte pelo todo. Acha que seu mundo extremo representa o país. O povo não está vibrando. O povo não quer armas. A população anseia pelas vacinas”.
A crise de saúde pública da pandemia do coronavírus parece ter criado um cenário propício para o desmonte da política pública de combate às armas, uma promessa eleitoral que Bolsonaro tem se empenhado em cumprir com sua política de decretos pró-armamentista, que já conseguiu desconfigurar o Estatuto do Desarmamento, conjunto de leis voltadas ao controle de armas e responsável por salvar mais de 160.000 vidas, segundo estudos.
O Governo chegou até mesmo a zerar a alíquota de importação de armas com argumento de que isso iria estimular o comércio. O caso foi parar no Supremo, após um pedido do PSB, e o ministro Edson Fachin suspendeu a decisão. Ele considerou que, embora o presidente da República tenha prerrogativa para conceder isenção tributária, a opção de fomento à aquisição de armas por meio de incentivos fiscais colide com o direito à vida e à segurança, que são garantidos constitucionalmente.
A política armamentista de Bolsonaro vai na contramão da política pública que será adotada nos Estados Unidos no Governo de Joe Biden. O presidente norte-americano pediu neste domingo (14) que o Congresso aja “imediatamente” para limitar a circulação de armas de fogo em um comunicado que marca os três anos do ataque a escola de ensino médio em Parkland, Flórida, onde 14 estudantes e três professores morreram. “Este Governo não vai esperar pelo próximo tiroteio em massa para ouvir os apelos à ação”, afirmou Biden no comunicado.
Ricardo Noblat: O general Villas Bôas e o labirinto em que se meteu
Nota para intimidar o Supremo Tribunal Federal era mais incendiária do que foi
Reverenciado pela oposição e a mídia como um líder moderado e defensor da democracia à sua época de comandante do Exército, o general Eduardo Villas Bôas conta em livro de memórias que a nota que divulgou em abril de 2018 para coagir o Supremo Tribunal Federal a não beneficiar Lula era mais incendiária na versão original. Deixou de ser por pressão de seus colegas.Três ministros do governo Bolsonaro, todos, hoje, generais da reserva, foram consultados sobre a nota e, segundo Villas Bôas, o aconselharam a amenizá-la: Joaquim Silva e Luna, atual diretor-geral de Itaipu; Fernando Azevedo, então chefe do Estado Maior e agora ministro da Defesa, e Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria do Governo. Ramos respondia pelo Comando Militar do Leste.
No dia 4 de abril daquele ano, a seis meses do primeiro turno da eleição presidencial, o Supremo julgaria uma ação que, se aceita, revogava a possibilidade de prisão de condenado em segundo instância. Lula já fora condenado em segunda instância no processo do tríplex do Guarujá. Se o Supremo recusasse a ação, ele poderia ser preso e ficar impedido de concorrer com Bolsonaro.
A versão suavizada da nota de Villas Bôas, postada no Twitter na véspera do dia do julgamento, foi uma clara advertência aos ministros do Supremo: “Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?”
E concluía sem ter o cuidado de disfarçar a intenção golpista do seu autor: “Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”. Imagine a versão abortada da nota original…
Uma vez que o Supremo, por 6 votos contra 5, manteve a prisão de condenado em segunda instância, Lula foi preso e levado para Curitiba em 7 de abril, ali permanecendo por 580 dias. Liderou as pesquisas de intenção de voto até meados de agosto. Apoiou então a candidatura de Fernando Haddad. Bolsonaro venceu Haddad no segundo turno. Villas Bôas e os generais celebraram a vitória.
Missão que se propuseram (evitar que a esquerda voltasse ao poder), missão cumprida com êxito! Villas Bôas reconhece que Lula como presidente foi generoso com as Forças Armadas dando-lhes dinheiro para a compra de equipamentos. Critica Dilma por ter instalado a Comissão Nacional da Verdade que investigou casos de tortura e de mortos pela ditadura militar de 64.
A ojeriza dos militares brasileiros à esquerda é uma questão ideológica que data do início do século passado. A revolução comunista russa foi em 1917. O Partido Comunista do Brasil é de 1922. Em 1935, uma intentona comunista tentou depor o governo de Getúlio Vargas, mas fracassou. Na 2ª Guerra Mundial, militares brasileiros e comunistas russos lutaram contra Hitler.
Logo depois começou a chamada Guerra Fria entre os Estados Unidos e seus aliados, um deles o Brasil, e a União Soviética e seus aliados. Capitalismo x comunismo. A União Soviética desmoronou em 1991. O mundo tornou-se unipolar. A China se diz comunista, mas é tão capitalista quanto os Estados Unidos e, em breve, sua economia será a maior do planeta.
O comunismo, hoje, resiste em Cuba, na Coreia do Norte e onde mais? Serve de espantalho a governantes autoritários que querem se perpetuar no poder, e aos seus apoiadores, fardados ou não. Serve também de aríete para corroer a democracia mundo afora.
O Globo: Huck conversa com seis partidos para eleição em 2022
Apresentador avalia cenário, cercado de experientes interlocutores, mas só decide se concorrerá ao Planalto em setembro
Thiago Prado, O Globo
RIO — No domingo, dia 7, o ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) desembarcou no Rio para um encontro com o apresentador Luciano Huck. Ao deputado, interessava alinhar os seus rumos após a eleição do deputado Arthur Lira (PP-AL) para sucedê-lo e a briga pública com o ex-prefeito de Salvador ACM Neto (DEM-BA). A Huck, era importante ouvir um dos muitos interlocutores que passou a ter na política nos últimos tempos devido às articulações para se lançar candidato ao Planalto no ano que vem.
Desde 2018, quando seu nome já havia sido especulado para a disputa que elegeu Jair Bolsonaro, o apresentador tem relações explícitas com PSDB, DEM e Cidadania (na época chamado de PPS). O GLOBO apurou que, nos últimos meses, o apresentador também já abriu canal com PSB, Podemos e PSD como possibilidades para 2022. Ele até agora não indicou, entretanto, se de fato entrará na política e se adotará um perfil de centro-esquerda ou centro-direita.
Na conversa com Maia, Huck ouviu que o DEM não poderia mais hospedar um projeto antibolsonarista diante do alinhamento da bancada baiana na vitória de Lira na Câmara — dias depois, ACM Neto telefonou para o apresentador negando a informação. Naquela noite, o ex-presidente da Câmara queria saber dos planos de Huck e contou ao apresentador as suas duas principais hipóteses quando deixar o DEM: filiar-se ao PSL, dono de milionário fundo partidário; ou migrar para o PSDB de João Doria. Liderar uma fusão de Cidadania, Rede e PV, noticiado como possibilidade durante a semana, está em segundo plano para Maia. A ex-senadora Marina Silva resiste a dar fim ao Rede; já o PV vive uma crise interna com parte da sigla tentando desalojar do poder o presidente José Luiz Penna.
Huck mais uma vez não se comprometeu com respostas concretas a Maia. Tem sido este o conselho dado pelo seu principal consultor político, o ex-governador do Espírito Santo, Paulo Hartung. O ex-presidente do Banco Central, Arminio Fraga, exerce o mesmo papel na área econômica. O apresentador considera que haverá dois momentos de tomada de decisão: a entrada na política, por volta de setembro deste ano, quando o cenário econômico e social estará mais claro; e a filiação partidária no primeiro semestre de 2022 apenas.
Projeção de cenários
Hartung e Huck têm olhado com lupa todas as pesquisas recentes para decidir os próximos passos. O ramo das sondagens interessa tanto ao apresentador que ele abriu sua agenda em 5 de fevereiro para uma conversa com Murilo Hidalgo, dono do Paraná Pesquisas. Diante dos dados, o ex-governador do Espírito Santo projeta o seguinte cenário para Huck organizar o futuro: Bolsonaro perderá popularidade ao longo do ano. Mesmo criando um novo auxílio, o valor jamais será próximo aos R$ 600 pagos em 2020, o que alimentará a frustração de parte do eleitorado. Com o poder da máquina, Hartung imagina, contudo, que o piso da avaliação ótimo e bom do presidente não cairá de 25%, o que o tornará competitivo para estar no segundo turno em 2022.
A despeito da força do Planalto, pesquisas divulgadas neste início de ano, especialmente uma do Datafolha de janeiro, animaram Huck e o seu entorno. Em um índice de confiabilidade de figuras públicas brasileiras, o apresentador apareceu na frente do governador de São Paulo, João Doria, com ativos eleitorais que há tempos os tucanos encontram dificuldades de ter: entrada no Nordeste e na população de baixa instrução.
Baixos índices
Hartung chegou a fazer uma análise para Huck no fim do ano passado: a vacina Coronavac, do Instituto Butantã, poderia equivaler ao Plano Real para FH em 1994. Quase um mês depois do início da imunização no país, os índices de popularidade de Doria pelo Brasil profundo patinam. Os baixos números do governador de São Paulo coincidem com o movimento que ocorreu na semana passada no PSDB, de lançamento da pré-candidatura presidencial do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite.
No campo do que se convencionou chamar de centro na política brasileira, uma análise de Huck e seu entorno é diferente de praticamente todo o mundo político: o ex-juiz Sergio Moro ainda pode, sim, ser candidato devido aos seus altos e resilientes (embora em queda) índices de popularidade. Com Moro na urna, Huck estará fora do jogo de 2022.