Sessão Deliberativa no plenário da Câmara do Deputados em agosto de 2022 - Elaine Menke/Câmara do Deputados

Regra eleitoral impulsiona novas fusões e extingue partidos tradicionais

João Pedro Pitombo | Folha UOL

O endurecimento das regras eleitorais no pleito deste ano impulsionou três novas fusões partidárias desde o fim da disputa, reduzindo para 20 o número de partidos que terão representação no Congresso Nacional a partir de 2023.

Ao todo, 23 partidos elegeram ao menos um deputado federal nesta eleição, número que já representava uma redução da fragmentação partidária comparado a 2018, quando 30 partidos tinham representação no Congresso.

Mas apenas 16 legendas —7 delas unidas em três federações— superaram a cláusula de desempenho, também conhecida como cláusula de barreira.

Sessão Deliberativa no plenário da Câmara do Deputados em agosto de 2022 - Elaine Menke/Câmara do Deputados

Outros 16 partidos não atingiram a cláusula, incluindo 6 que haviam superado o patamar mínimo de votos em 2018. Destes, 5 decidiram por fusões ou incorporações, que ainda devem ser avaliadas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Para cumprir a cláusula de barreira em 2022, os partidos deveriam conquistar ao menos 2% dos votos a deputado federal, com o mínimo de 1% dos votos em nove unidades da Federação, ou eleger ao menos 11 deputados em ao menos nove estados ou Distrito Federal.

Os partidos que não atingem esse patamar mínimo seguem existindo, mas sofrem restrições: ficam sem acesso ao fundo partidário, sem tempo de propaganda na televisão e no rádio e sem direito a uma estrutura de bancada na Câmara dos Deputados. Os deputados eleitos por esses partidos também podem trocar de legenda sem sofrer punições.

O movimento mais recente de incorporação partidária foi o anúncio de que PSC (Partido Social Cristão) será absorvido pelo Podemos. Caso a união se concretize, o novo partido terá 18 deputados e a oitava maior bancada da Câmara.

A incorporação marca o fim do PSC, um dos partidos mais tradicionais do campo conservador, fundado em 1985 e com mais de 400 mil filiados. Também será o segundo partido incorporado pelo Podemos em quatro anos —em 2018, a sigla já havia absorvido o PHS.

Presidente nacional do PSC, Pastor Everaldo diz que a incorporação foi a saída possível diante das novas regras partidárias e destaca que não haverá arestas na união entre as duas legendas.

"Temos a mesma base ideológica e os mesmos princípios que o Podemos. Sou um cara otimista, para mim está tudo ótimo", afirmou.

O PSC já abrigou Jair Bolsonaro entre 2016 e 2017, mas recuou do projeto de lançar o então deputado federal como candidato à Presidência. Ainda assim, teve um desempenho histórico em 2018 ao eleger dois governadores: Wilson Witzel no Rio de Janeiro e Wilson Lima no Amazonas.

Desde então, contudo, o partido perdeu parte de seus quadros, que migraram para legendas mais robustas como PL e União Brasil. A despeito de se alinhar a Bolsonaro na legislatura, optou por não fazer parte da coligação do presidente.

Outro partido tradicional que deixa de existir é o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), que decidiu por uma fusão com o Patriota para criar uma nova legenda que se chamará Mais Brasil.

Ligado à tradição do trabalhismo, o PTB foi criado em 1945 por Getúlio Vargas e se manteve ativo até 1965, quando foi extinto pela ditadura militar.

Foi refundado em 1979 em meio a uma disputa pelo nome da sigla entre Ivete Vargas e Leonel Brizola, na qual prevaleceu a sobrinha-neta de Getúlio. Desde então, a legenda se afastou do trabalhismo e se tornou uma sigla de perfil fisiológico.

Em 2021, deu uma guinada para o campo ultraconservador, flertou com falanges integralistas e iniciou um processo de expurgo de seus líderes comandado pelo presidente Roberto Jefferson, preso em outubro após atirar contra policiais federais.

Neste ano, o PTB lançou Jefferson como candidato à Presidência, que teve candidatura indeferida e foi substituído por Padre Kelmon, que atuou como linha auxiliar de Bolsonaro. Na disputa pelo Congresso, teve um desempenho vexatório e elegeu apenas um deputado federal.

O Mais Brasil terá cinco deputados federais, quatro deles eleitos pela Patriota, legenda que em 2019 já havia incorporado o PRP.

Outros dois partidos que não atingiram a cláusula de desempenho e decidiram se unir são o Solidariedade e o Pros, ambos partidos criados na década de 2010 e que participaram de apenas três eleições para o Congresso Nacional.

Neste ano, as duas siglas fizeram parte da coligação de apoio a Lula, mas tiveram desempenho aquém do almejado: o Solidariedade conseguiu eleger quatro deputados federais e o Pros apenas três.

Com a fusão, a legenda manterá o nome de Solidariedade, mas será comandada por Eurípedes Júnior, hoje presidente do Pros.

O partido Novo é a exceção entre os partidos que atingiram a cláusula em 2018, mas não tiveram sucesso na eleição deste ano. A legenda não cogita fusão e deve se manter ativa mesmo com as restrições de acesso a fundo partidário e tempo de televisão.

A despeito de ter reeleito o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, que saiu das urnas fortalecido e cotado como possível candidato a presidente em 2026, a legenda elegeu apenas três deputados federais, contra oito da eleição de 2018.

Professor da Universidade Federal do Piauí, o cientista político Vítor Sandes afirma q ue a fusão ou incorporação são saídas encontradas por líderes partidários para driblar a cláusula de barreira e manter relevância no jogo político com acesso a recursos de fundos públicos para financiamento dos partidos.

"É uma forma de se fortalecer em um mercado eleitoral que é extremamente competitivo e garantir acesso a mais recursos. Diversos estudos apontam que quanto mais dinheiro os candidatos têm, maior a probabilidade de serem eleitos", avalia.

A cláusula de desempenho foi implantada em 2018 e ficará ainda mais rígida até as eleições de 2030. A partir daí, cada partido deverá ter ao menos 3% dos votos para a Câmara Federal, sendo ao menos 2% em nove unidades da Federação, ou eleger ao menos 15 deputados federais.

Desde a aprovação da cláusula de desempenho em 2017, sete fusões ou incorporações partidárias foram realizadas, reduzindo o número de partidos em atividade no país de 35 para 29 neste período.

Também foram aprovadas três federações partidárias para eleição deste ano, ferramenta que mantém as legendas vivas, mas obriga uma atuação partidária conjunta por ao menos quatro anos. PT, PC do B e PV atuarão em parceria, assim como PSOL e Rede, além de PSDB e Cidadania.

Para Vítor Sandes, a tendência é de uma redução ainda maior da fragmentação partidária caso as regras eleitorais sejam mantidas. A consequência deste novo cenário é um sistema partidário mais simples e coeso ideologicamente.

"Existe bastante pragmatismo entre os partidos. Mas, ao contrário do que diz o senso comum, a ideologia importa. Partidos mais próximos ideologicamente têm mais facilidade de se fundir porque conseguem pactuar consensos em relação às políticas que eles perseguem."

Matéria publicada originalmente na Folha UOL


Conservadores que apoiam a República Islâmica também cumprem papel no monitoramento do comportamento do públicoFoto: Vahid Salemi/AP/picture alliance

A polícia da moralidade do Irã foi realmente desativada?

Shabnam von Hein | DW Brasil

Na noite de sábado (03/12), o procurador-geral iraniano, Mohammad Jafar Montazeri, disse que a polícia da moralidade do país não tinha "nada a ver com o Departamento de Justiça" e foi "encerrada por aqueles que a criaram".

Sua declaração foi reportada pela agência de notícias estatal ISNA, e levou a relatos em todo o mundo de que a República Islâmica estaria respondendo à pressão pública após meses de protestos antigoverno deflagrados pela morte de uma jovem curda, Mahsa Amini.

A jovem morreu em 16 de setembro depois de ter sido detida pela polícia da moral por supostamente usar um lenço de cabeça de hijab "de forma inapropriada". As autoridades negaram acusações de que ela foi espancada e afirmaram que a jovem de 22 anos morreu de um ataque cardíaco.

Declaração "retirada do contexto"

Nesta segunda-feira, a emissora estatal iraniana Al-Alam reportou que as declarações de Montazeri haviam sido retiradas do contexto, e que o Departamento de Justiça do Irã "continuaria a monitorar o comportamento público".

O Irã "não tem uma 'polícia da moralidade', mas uma 'polícia de segurança pública' e o Departamento de Justiça não tem planos de aboli-la, nem dará um passo nessa direção", informou a mídia local sobre a versão do órgão a respeito do que Montazeri havia de fato afirmado.

A ativista iraniana dos direitos da mulher Mahdieh Golroo disse à DW que essas declarações reproduzem uma prática "testada e aprovada" da estratégia de informação da República Islâmica.

"Primeiro, eles afirmam algo e envolvem a mídia para criar esperanças de que este sistema é capaz de aprender e reformar", disse a ativista de 36 anos de idade, que vive na Suécia.

Ela afirmou que, embora as unidades móveis da polícia da moral pudessem muito bem ser alteradas em relação à forma atual, isso não requer uma mudança na estratégia do uso do poder estatal para controlar o comportamento público, como exigir que as mulheres usem lenços de cabeça.

A rede de "espiões da moralidade"do Irã

Mesmo se a polícia da moral fosse desmantelada, "outro grupo poderia assumir esta tarefa de controlar as mulheres em público", diz Golroo.

A mídia iraniana tem noticiado controles mais rigorosos sobre os estritos códigos de vestuário, especialmente o hijab, realizados por uma organização cujo nome em Farsi significa, em tradução livre para o português, Escritório para Impor o Bem e Proibir o Mal.

Essa organização opera em paralelo com a polícia da moralidade. Fundada em 1993, é chefiada por um clérigo em Teerã e conta com financiamento do Estado para realizar seu trabalho.

Seus quadros são em sua maioria voluntários que fornecem informações sobre supostas violações das regras de "moralidade" a um de seus 500 escritórios em todo o Irã.

Histórias de infrações "morais" são reportadas em agências de notícias pró-regime como a Tasnim News, que publicou recentemente uma reportagem sobre "uma vendedora de ingressos em um playground coberto de Teerã que não [usa] um lenço de cabeça. Como resultado, o playground foi fechado".

Histórias como estas são um exemplo das consequências enfrentadas pelas empresas e instituições se as mulheres que lá trabalham não usarem um hijab, como determina a lei islâmica.

Outro caso relatado na semana passada, ocorrido na província de Qom, ao sul de Teerã, envolveu um diretor de banco demitido após ter atendido uma mulher que não usava um lenço de cabeça. O atendimento foi gravado em vídeo pelo circuito fechado de câmeras e circulou amplamente em redes sociais antes de ser reportado a um escritório da Impor o Bem e Proibir o Mal.

O secretário do grupo, Mohammad Saleh Hashemi Golpayegani, acredita que a polícia da moralidade e suas unidades móveis, que podem ser fotografadas e filmadas por cidadãos durante a detenção de mulheres, são contraproducentes.

Ele sugeriu em uma declaração após a morte de Mahsa Amini que, em vez de usar os esquadrões da polícia da moralidade para impor "códigos de moralidade", a polícia deveria contar com o apoio voluntário da "população de confiança".

Golpayegani acrescentou que seria necessário apenas um melhor financiamento para a Impor o Bem e Proibir o Mal,  e disse que 3 milhões de cidadãos estão dispostos a apoiar sua organização.

Arte publicada originalmente no DW Brasil


Parte da população tem sido obrigada a retirar água de barreiros, pequenos açudes por onde circulam animais - Pedro Stropasolas

Governo Bolsonaro interrompe Operação Carro-Pipa e deixa famílias sem água em Pernambuco

Redação | Brasil de Fato 

Desde a última quinta-feira (1), famílias que moram na cidade de Pesqueira, no agreste pernambucano, estão sem acesso a água levada por caminhões-pipa contratados pelo Exército. Com isso, pessoas que vivem na localidade de Salobro, zona rural da cidade, têm duas alternativas: comprar água (ao custo de R$ 35 por galão) ou recorrer a pequenos açudes por onde circulam animais, os chamados barreiros.

A Operação Carro-Pipa ficou sem recursos por determinação do Governo Federal em novembro. O Exército informou que 1,6 milhão de pessoas em oito estados nordestinos ficaram com o abastecimento de água prejudicado.

"A gente nunca passou essa seca aqui, nunca, nunca, nunca. Nós não podemos beber água de barreiro, de esgoto, nós somos seres humanos", afirmou a agricultora Vilma Lúcia Tavares da Silva, moradora de Salobro.

https://youtu.be/s3kifXQ9ze0

Segundo a Confederação Nacional de Municípios (CNM), diversas cidades nordestinas denunciaram paralisações iniciadas a partir de 14 de novembro. A entidade acionou o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, solicitando medidas urgentes para conter o desabastecimento.

Parte da população tem sido obrigada a retirar água de barreiros, pequenos açudes por onde circulam animais / Reprodução

Em nota, o MDR informou que a Operação Carro Pipa "já está retomando à normalidade". Um crédito de R$ 21,4 milhões foi liberado. Segundo o Ministério, a ação havia sido suspensa por falta de recursos.

Em localidades de estados como Alagoas e Paraíba, o programa foi suspenso devido ao fim dos decretos de emergência relativos à condição de seca.

"A operação, executada pelo Exército Brasileiro, é uma ação de socorro e não um programa social contínuo. Para que haja liberação dos recursos, no caso disponibilização de carros pipa, é imprescindível que seja solicitado o reconhecimento federal por seca ou estiagem, por meio do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres - S2ID", complementou a nota.

A operação seria retomada em Pesqueira a partir desta segunda-feira (5), mas com apenas 40% dos recursos necessários para atender toda a zona rural do município. Além disso, o serviço reduzido está garantido apenas até 16 de dezembro.

No município, 18 mil pessoas dependem da operação para ter acesso a água potável. Segundo a secretaria de desenvolvimento da cidade, 30 veículos fazem o abastecimento em toda a zona rural.

Em Salobro, há um detalhe que torna a situação ainda mais crítica sem os carros-pipa: nenhum poço artesiano é de água doce. É dai, inclusive, que vem o nome da localidade.

"A prioridade aqui é água, que água é vida, né? Se tiver a possibilidade de trazer água pra gente seria o que a gente mais precisa", afirmou o líder comunitário Cláudio Rodrigues.

"O campo de trabalho aqui é pouco. Como é que essa comunidade, que só arruma o que comer, vai comprar água? Para o consumo da família não tem como. A gente precisa e precisa muito dessa água. Não tem como comprar água para o consumo", alertou a agricultora Gilca Muniz Cintra.

Edição: Nicolau Soares

Matéria produzida originalmente no Brasil de Fato


Análise: Ministro civil é chave para “desmilitarizar” o governo

Luiz Carlos Azedo | Nas Entrelinhas

A criação do Ministério da Defesa como uma pasta civil nunca foi bem aceita pelos militares, em cuja concepção seria algo equivalente ao antigo Ministério da Guerra ou ao Estado-Maior das Forças Armadas durante o regime militar. Teria a função de coordenar a atuação conjunta das forças, sob comando de um general de quatro estrelas, e não subordinar Exército, Marinha e Aeronáutica a um poder civil. Reestruturar o Ministério da Defesa é uma questão chave para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva “desmilitarizar” o governo.

Derrotados na eleição de Tancredo Neves, em 1985, os militares operaram uma retirada em ordem do poder, que havia sido iniciada com a “anistia recíproca”, de 1979. Foi uma estratégia política bem-sucedida, apesar dos percalços, e concluída durante o governo do presidente José Sarney. Eleito presidente, porém, Fernando Henrique Cardoso resolveu erradicar a influência militar da política nacional e criou o Ministério da Defesa, com objetivo de otimizar o sistema de defesa nacional, formalizar uma política de defesa sustentável e integrar as três Forças, racionalizando as suas diversas atividades.

Em 1 de janeiro de 1999, já no seu segundo mandato, o senador Élcio Álvares (PFL-ES) foi nomeado ministro extraordinário da Defesa. O ex-governador do Espírito Santo foi o responsável pela efetiva implantação do órgão, como espelho da experiência norte-americana e europeia. Em seis meses, a pasta foi criada, mas seu ministro deixou o cargo por causa de uma secretária que fazia tráfico de influência e foi substituído pelo então advogado-geral da União Geraldo Quintão.

Os dois mandatos de FHC são um trauma para as Forças Armadas, porque nunca se sentiram tão desprestigiadas. Os militares também perderam privilégios na reforma administrativa e da Previdência, e tiveram salários achatados com o ajuste fiscal do Plano Real. Seus equipamentos, muitos dos quais remanescentes da Segunda Guerra Mundial, foram ainda mais sucateados.

Durante o governo Lula, diante do vácuo doutrinário decorrente da Guerra das Malvinas, quando os Estados Unidos apoiaram a Inglaterra contra Argentina, e o fim da Guerra Fria, com a auto-dissolução da antiga União Soviética e a queda dos regimes comunistas do Leste europeu, tentou-se elaborar uma nova doutrina, que viria a se traduzir na Política Nacional de Defesa, durante a gestão do ministro da Defesa Nelson Jobim. A ideia era ambiciosa: fomentar a formação de um complexo industrial-militar, para dar às Forças Armadas um papel internacional compatível com os planos de projeção do Brasil na política mundial.

O submarino nuclear, o novo cargueiro KC-390, o satélite de comunicação e vigilância, o desenvolvimento de novos blindados e de lançadores de foguetes estavam nesse pacote. A relação com a presidente Dilma Rousseff com as Forças Armadas, porém, foi um desastre. Ela não disfarçava o justo ressentimento com as torturas que sofreu na prisão durante o regime militar. Além disso, seu ministro da Defesa, o ex-governador e senador Jaques Wagner (BA), empoderou uma secretária-executiva que se comportava como se fosse um marechal.O troco veio durante o impeachment: o então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, recomendava aos políticos: “resolvam isso aí”.

Transparência

A volta do Ministério da Defesa ao pleno controle dos militares, porém, viria ocorrer durante o governo Michel Temer, após o impeachment de Dilma. Enfraquecido devido às denúncias do procurador-geral da República Rodrigo Janot, com base numa delação premiada do empresário Joesley Batista — que gravou uma conversa com o presidente da República —, temendo o impeachment, Temer nomeou para o ministério da Defesa o general Joaquim Silva e Luna, que mais tarde viria ser presidente da Petrobras no governo Bolsonaro, com quem rompeu por causa da política de preços dos combustíveis e deixou o cargo.

Na Presidência, Bolsonaro transformou o Ministério da Defesa num instrumento do seu projeto político iliberal, primeiro com o ministro Walter Braga Netto, que viria ser seu vice, depois com o atual ministro, Paulo Sérgio Nogueira. Antes, porém, teve que defenestrar o general Fernando Azevedo, que havia nomeado inicialmente para o cargo, e no embalo o então comandante do Exército Edson Pujol, ambos contrários à politização dos quarteis.

Lula evitou um confronto com os atuais comandantes militares ao indicar para o Ministério da Defesa um político tradicional, de origem conservadora: José Múcio Monteiro. Entretanto, precisa promover uma reforma da Defesa que atenda aos objetivos de consolidar a pasta como um instrumento de poder civil e, ao mesmo tempo, modernizar as Forças Armadas, dando lhes mais eficiência e transparência.

A primeira providência será proibir atividades políticas dentro de organizações militares, o uso de posições oficiais, adoção ou rejeição de posicionamentos políticos, os comentários depreciativos acerca de lideranças políticas por militares da ativa e o exercício por militares da ativa de funções públicas não ligadas ao setor de defesa. Uma quarentena de 12 meses para que fardados transferidos para a reserva remunerada ocupem cargos públicos na administração civil seria suficiente.

É preciso evitar tanto o uso político das Forças Armadas como a partidarização política em organizações militares, mantendo-as leais ao sistema político vigente no país. São medidas que aprimoram as instituições democráticas e a profissionalização dos militares.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/analise-ministro-civil-e-chave-para-desmilitarizar-o-governo/

Foto: reprodução DW Brasil

Mundo gasta mais com armas, apesar de crise econômica

Anne Höhn | DW Brasil

O ano passado não foi um bom ano para a economia: falta de mão de obra, cadeias de suprimentos interrompidas e mercadorias que chegavam atrasadas ou sequer chegavam. Como no ano anterior, o principal motivo para isso foi a pandemia de covid-19.

Mas apesar das dificuldades, os 100 maiores produtores de armas do mundo conseguiram faturar juntos 592 bilhões de dólares (R$ 3,1 trilhões) em 2021, o que corresponde a um aumento de quase 2% em relação ao ano anterior.

Os EUA ainda respondem pela maior parcela disso. Fabricantes de armas americanos respondem por cerca de metade das vendas globais. No entanto, as vendas no mercado americano caíram ligeiramente em 2021.

 "Os problemas causados pelas interrupções das cadeias de suprimentos atingiram as empresas americanas com mais força", explica Xiao Liang, um dos autores do mais recente relatório anual do Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Sipri, na sigla em inglês), sediado na Suécia.

Ele vê o motivo da retração em uma espécie de "covid longa" da economia, que ainda não se recuperou. "Além disso, há também a alta inflação nos EUA em 2021. Esses são os dois principais motivos."

Europa continua se armando

Por outro lado, as vendas na Europa cresceram 4,2% no ano passado. E isso ainda foi antes da invasão da Ucrânia pela Rússia, em 24 de fevereiro de 2022. De acordo com o Relatório Sipri 2022, a guerra de agressão russa fez disparar a demanda por armas na Europa e nos Estados Unidos.

"Com todas as armas que são enviadas para a Ucrânia, os EUA e a Europa foram esgotando seus estoques, que agora têm que ser reabastecidos", analisa Liang. "Temos certeza de que haverá mais encomendas, mas é muito cedo para dizer com certeza se isso se traduzirá em receitas maiores já em 2022."

Atualmente, no entanto, só o fabricante alemão Rheinmetall espera para sua divisão de defesa um salto de 30% a 40% na entrada de pedidos em 2023. Esse prognóstico é baseado na necessidade de reabastecer os estoques de veículos blindados que foram enviados à Ucrânia.

Falta tempo

Não faltam encomendas futuras, o que falta agora é outro recurso: tempo. Um exemplo disso é a encomenda dos EUA de mísseis antitanque Javelin. Até o final de outubro de 2022, os EUA entregaram 8.500 desses mísseis à Ucrânia, o equivalente a entre três e quatro anos de produção. "Portanto, é um desafio para as empresas: elas recebem mais pedidos, mas será que conseguem atender e entregar todas as encomendas?", pondera Liang.

Quanto mais tempo durar a guerra, mais urgente se tornará a questão sobre quantas armas os países ocidentais enviarão para a Ucrânia. "Vemos que alguns países já estão tentando encontrar esse equilíbrio", diz Liang. "Se trata de equilibrar as próprias necessidades com o apoio à Ucrânia. Mas ao mesmo tempo sabemos que os estoques estão baixando e que é preciso repô-los."

Alguns países da União Europeia (UE) estão se armando massivamente em resposta à guerra de agressão de Putin. A Polônia quer dobrar seu número de soldados em cinco anos, a Finlândia está fortalecendo suas defesas aéreas. Grécia, França e Itália estão comprando novas armas por bilhões de euros.

Logo após o início da guerra, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, anunciou um fundo especial de 100 bilhões de euros para a Bundeswehr, as Forças Armadas da Alemanha.

Empresas russas estão estagnadas

E a própria Rússia? "A indústria de defesa da Rússia cresceu apenas minimamente em 2021, mas isso não é novidade", diz Lang. De acordo com o relatório do Sipri, uma razão para isso é a ordem dada pelo governo russo ao complexo militar-industrial em 2016 para aumentar a produção civil.

A invasão da Ucrânia pela Rússia provavelmente reverterá essa tendência, segundo Lang, pois a indústria de defesa precisará apoiar o esforço de guerra. Atualmente, entretanto, faltam componentes para a produção de armas.

As sanções econômicas impostas pelos países ocidentais impedem à Rússia a importação irrestrita de chips e semicondutores, peças urgentemente necessárias para a produção, incluindo a fabricação de foguetes e tanques.

China e Oriente Médio

Em relação a Ásia e Oriente Médio, chama a atenção que o Oriente Médio esteja experimentando o crescimento mais rápido. As cinco empresas com sede na região registraram a maior taxa de crescimento de todas as regiões representadas no top 100 em 2021.

Uma tendência contínua na Ásia é que a China, em particular, está acelerando o ritmo de produção. Nos últimos anos, o país tornou-se o segundo maior produtor de armas do mundo, sendo que apenas os EUA produzem atualmente mais. O aumento nas vendas de armas reflete a extensão da modernização do equipamento militar chinês e a meta do país de se tornar autossuficiente na produção de todas as principais categorias de armas.

Entre 2017 e 2021, a China, assim como Índia, Egito e Argélia, adquiriram a maior parte de suas armas da Rússia. Entretanto, o especialista do Sipri diz ainda ser cedo para se saber exatamente como a invasão da Ucrânia pela Rússia está mudando o mercado a esse respeito. "A guerra continuará influenciando a dinâmica nos próximos anos", afirma Liang.

Matéria publicada originalmente no DW Brasil


Araújo afirmou que os protestos já teriam sido desobstruídos pelas forças de segurança pública

PGR rejeita multa a manifestantes golpistas, STF derruba ação de Bolsonaro contra Moraes e mais

Caroline Oliveira | Brasil de Fato

A vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, se posicionou contra a aplicação de multas e apreensão de bens de manifestantes apoiadores de Jair Bolsonaro que vêm promovendo atos golpistas, na última quinta-feira (1º).

Em sua resposta ao pedido do Ministério Público de Mato Grosso, Araújo afirmou que os protestos já teriam sido desobstruídos pelas forças de segurança pública "sem a necessidade do uso de força".


Bolsonaristas questionam o resultado das urnas que derrotou o atual presidente / Foto: Arquivo Pessoal

"Informou-se, a respeito, que as Forças de Segurança do Estado de Mato Grosso estariam desde o início das manifestações atuando em conjunto com a Polícia Rodoviária Federal e que a operação integrada teria logrado desobstruir os bloqueios em vias e rodovias sem a necessidade do uso de força", escreveu Araújo.

Liea também: PL que anistia manifestantes e financiadores de atos golpistas é inconstitucional, diz ABJD

"Assim, vê-se que medidas pleiteadas pelo postulante podem plenamente ser adotadas em outras vias, o que afasta o cabimento da presente formulação em sede de ADPF."

No pedido, o procurador-geral de Justiça de Mato Grosso, José Antônio Borges Pereira, pediu a aplicação de multas entre R$ 20 mil e R$ 100 mil para pessoas físicas e jurídicas, respectivamente, além da apreensão de todos os móveis utilizados nas manifestações.

STF forma maioria contra ação de Bolsonaro para investigar Moraes

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para confirmar a decisão do ministro Dias Toffoli que negou uma ação protocolada por Jair Bolsonaro (PL) contra Alexandre de Moraes.

Além de Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Edson Fachin, Luiz Fux e Roberto Barroso votaram por rejeitar a ação. Já Moraes, por ser uma das partes envolvidas, não pode votar.


Alexandre de Moraes / Nelson Jr./SCO/STF

Bolsonaro acusou o ministro de abuso de autoridade após ser investigado por tentar deslegitimar a segurança do processo eleitoral, durante uma de suas transmissões ao vivo nas redes sociais, em julho de 2021.

Para Toffoli, no entanto, não há crime nas decisões de Moraes. "Os fatos descritos na 'notícia-crime' não trazem indícios, ainda que mínimos, de materialidade delitiva, não havendo nenhuma possibilidade de enquadrar as condutas imputadas em qualquer das figuras típicas apontadas", afirmou.

Rosa Weber agenda julgamento do orçamento secreto 

A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, agendou para a próxima quarta-feira (7) o julgamento das ações de constitucionalidade sobre o pagamento das emendas do relator. O mecanismo passou a ser conhecido como orçamento secreto por não conter o detalhamento das transferências.

No ano passado, Weber chegou a suspender a efetivação das emendas e solicitou ao presidente Jair Bolsonaro um relatório com detalhes dos pagamentos. Após um pedido dos presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no entanto, Weber liberou o pagamento.


Apesar de a Presidência do STF ter uma duração de dois anos, Weber deixará o cargo em outubro do ano que vem, quando completará 65 anos / Carlos Moura/STF

Agora, os ministros devem votar analisando a inconstitucionalidade do orçamento secreto, que já tem uma previsão de R$ 19,4 bilhões de pagamentos para o ano que vem.

Pacheco pauta análise da PEC da Transição para quarta-feira 

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), agendou para a próxima quarta-feira (7) a análise da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, elaborada pela equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Para ser votada, no entanto, ainda existe uma pendência: a Comissão de Constituição e Justiça precisa anunciar o relator da proposta. Segundo o presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), o anúncio deve ser feito nesta segunda-feira (5).


Rodrigo Pacheco / Pedro Gontijo/Agência Senado

A PEC será utilizada para viabilizar o pagamento de R$ 600 do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família, com um adicional de R$ 150 por criança na família.

O projeto já tem o apoio de 54 parlamentares, mais do que os 3/5 do total de cadeiras do Senado necessários para a aprovação.

STF anula sentença de Moro contra André Vargas 

A Segunda Turma do STF anulou, na última sexta-feira (2), a sentença do ex-juiz Sergio Moro (União-PR) contra o ex-vice-presidente da Câmara André Vargas, proferida em 2015.

Vargas foi condenado a 14 anos e quatro meses de prisão por ter recebido pelo menos R$ 1,1 milhão da agência de publicidade Borghi/Lowe, num suposto esquema de desvio de recursos.


André Vargas / Agencia Câmara

A defesa do ex-petista solicitou ao STF, no entanto, a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, uma vez que o caso não guarda relação com o esquema de corrupção na Petrobras e a Operação Lava Jato.

Anulada a sentença, agora o STF enviou o processo para a Justiça Federal do Distrito Federal.

Bolsonarista que matou petista em Foz do Iguaçu vira réu 

O policial penal bolsonarista Jorge Guaranho virou réu, após o juiz Gustavo Germano Francisco Arguello, da 3ª Vara Criminal de Foz do Iguaçu, acolher, na última quinta-feira (1º), o pedido do Ministério Público do Estado do Paraná sobre o assassinato do guarda municipal petista Marcelo Arruda em Foz do Iguaçu, em julho deste ano.


Nas redes sociais, o agente penitenciário federal Jorge José da Rocha Guaranho tem publicações nas redes sociais com demonstração de apoio contumaz ao presidente Bolsonaro / Reprodução/Facebook

O juiz também decidiu que o policial irá a júri popular.

Segundo o magistrado, foi "demonstrada a materialidade e a presença de indícios de autoria" do crime, suficientes para dar prosseguimento ao caso. Ele ainda afirmou que a motivação do crime pode indicar uma "personalidade conflituosa, beligerante e intolerante" de Guaranho.

O policial foi denunciado pelo Ministério Público por homicídio duplamente qualificado.

Edição: Nicolau Soares

Matéria publicada originalmente no Brasil de Fato


Bolsonaro e militares forcas armadas | Foto: Shutterstock

Nas entrelinhas: A “ambição de poder” e a volta dos militares à caserna

Luiz Carlos Azedo | Nas Entrelinhas

A volta dos militares às suas funções constitucionais específicas é o caminho para despolitizar as Forças Armadas, historicamente contaminadas pela velha compreensão positivista de que são a expressão armada e a liderança moral do povo brasileiro desde a vitória de Guararapes contra os holandeses, o mito fundador do Exército nacional. Em razão disso, muitos militares ainda acreditam que, em nome do povo, devem exercer a tutela sobre os Poderes republicanos e as demais instituições da vida pública.

Essa compreensão vem dos governos de Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, que consolidaram o regime republicano e operaram uma transição na qual o poder político do país saiu das mãos da aristocracia imperial e passou aos grandes fazendeiros de café, não apenas por isso, mas quase que como uma indenização pela abolição da escravidão pela monarquia constitucionalista. Mas havia uma compreensão clara na República Velha, a partir do governo de Prudente de Moraes, de que a democracia era um poder civil, apesar de todos os problemas.

A Revolução de 1930 virou tudo de pernas para o ar. Foi um golpe de Estado que depôs o presidente Washington Luís, em 24 de outubro de 1930, articulado pelos estados de Minas Gerais, da Paraíba e do Rio Grande do Sul para impedir a posse do presidente eleito Júlio Prestes, sob alegação de fraude eleitoral. A crise econômica de 1929, que repercutiu fortemente na economia cafeeira, e o assassinato do político paraibano João Pessoa — um crime passional que se transformou numa catarse política — embalaram a conspiração liderada pelo gaúcho Getúlio Vargas com apoio do mineiro Antônio Carlos. Lideranças oriundas do movimento tenentista deram ao golpe a sustentação militar de que precisava.

Em 3 de outubro, militares liderados por Getúlio Vargas, no Sul, e Juarez Távora, no Nordeste, convergiram para o Rio de Janeiro. Getúlio Vargas tornou-se chefe do Governo Provisório com amplos poderes, revogou a Constituição de 1891 e governou por decretos. Nomeou seus aliados como interventores nos estados. Os políticos esperavam que o novo presidente convocasse eleições gerais para formar uma assembleia constituinte, mas não foi o que aconteceu. Com a derrota da Revolução Constitucionalista de 1932, na qual os paulistas tentaram destituir Vargas, a ditadura se consolidou, principalmente, a partir de 1937, com o chamado Estado Novo.

A ditadura Vargas durou 15 anos, mas não foi um regime militar, apesar do amálgama positivista do florianismo com o castilhismo gaúcho. Getúlio era um populista, que contava com grande apoio popular, por criar o salário-mínimo e instituir a legislação trabalhista. Por ironia da História, após a redemocratização de 1945, o golpismo que o levou ao poder migrou para um partido de origem liberal, criado em São Paulo para se opor a Getúlio, que passou a contar com forte apoio militar, a União Democrática Nacional (UDN). Com a fim da guerra e a destituição de Getúlio Vargas, o país passou por sucessivas crises, nas quais os militares tutelaram a política como se fossem um “poder moderador” que, na monarquia, fora exercido por D. Pedro II.

Poder civil

Mas não havia ainda uma “ambição de poder” consolidada nas Forças Armadas como instituição. Isso somente viria a ocorrer após o golpe militar de 1964, que resultou numa ditadura na qual os generais se revezaram na Presidência da República. Com a redemocratização, após a eleição de Tancredo Neves, em 1985, e o governo de José Sarney, os militares voltaram gradativamente aos seus afazeres constitucionais, porém, numa espécie de limbo doutrinário: a Guerra das Malvinas e o fim da Guerra Fria, respectivamente, subverteram os seus vetustos planos de Estado Maior, que viam na Argentina e na antiga União Soviética (e nos comunistas, por meio de uma “guerra interna, subversiva, psicológica e permanente”), os inimigos da Nação.

A eleição de Jair Bolsonaro exumou velhos conceitos e fez renascer das cinzas a “ambição de poder” da geração de militares saudosos dos 20 anos de ditadura, nos quais a carreira era uma via de ascensão política para mandar e desmandar no país. Esse é o problema com que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva se depara ao assumir o governo, porque há uma contradição entre esse sentimento agora difuso nas Forças Armadas, reforçado pela suposta presença de 8 mil militares, aproximadamente, em cargos comissionados do governo federal, e a democracia como poder civil, consagrada pela Constituição de 1988.

“Desmilitarizar” o governo e reposicionar as Forças Armadas não será uma tarefa fácil, ainda mais se uma nova doutrina militar mais democrática, já esboçada na Política Nacional de Defesa, não for consolidada. O próprio Ministério da Defesa, como instituição civil, precisa ser reformado, assunto para outra coluna. Militares geralmente são austeros, disciplinados, estudiosos, leais, patriotas e probos, mas muitos têm cacoete mandonista e nem sempre estão preparados para exercer funções tipicamente civis. Reformados, são cidadãos com os mesmos direitos de qualquer servidor público e, portanto, aptos a permanecer no governo, se for preciso, desde que para exercer cargos compatíveis com a respectiva formação. O principal problema são militares da ativa em cargos públicos não ligados à Defesa e em desvio de função, como foi o caso do general Pazuello, hoje deputado federal eleito, no Ministério da Saúde, e a militância política por militares da ativa, dentro e fora das organizações militares, que subvertem a hierarquia e a disciplina. Isso não deveria ocorrer.

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Após PT apoiar Lira, Bolsonaro age contra orçamento secreto

DW Brasil

O presidente Jair Bolsonaro (PL) encaminhou ao Congresso nesta quarta-feira (30/11) um projeto de lei para remanejar os recursos das emendas de relator para despesas obrigatórias previstas no Orçamento deste ano.

Tais emendas foram usadas nos últimos dois anos no âmbito do chamado orçamento secreto, para assegurar apoio de parlamentares do Centrão ao governo.

O Ministério da Economia argumentou que a proposta visa assegurar o pagamento de despesas obrigatórias previstas no Orçamento sem furar o teto de gastos.

De acordo com reportagem do Estado de S. Paulo, o presidente determinou a suspensão de todos os pagamentos de emendas de relator. Segundo o jornal, além do projeto encaminhado ao Congresso, um decreto editado pelo presidente nesta quarta visaria efetivar a decisão.

O decreto em questão autoriza o secretário Especial de Tesouro e Orçamento a remanejar, bloquear ou propor o cancelamento de dotações orçamentárias discricionárias (não obrigatórias).

Segundo o portal G1, no entanto, técnicos do Congresso avaliam que o decreto não garante o cancelamento de emendas de relator. Eles argumentam que as verbas do orçamento secreto estão previstas na Lei Orçamentária, que precisaria ser alterada por meio de projeto de lei.

Retaliação

De acordo com a imprensa, parlamentares veem no projeto encaminhado ao Congresso uma retaliação de Bolsonaro a uma aproximação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e sobretudo com o da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que foi um dos principais aliados do atual governo.

Nesta quarta, Lira e Pacheco reuniram-se com Lula em Brasília. Na véspera, o PT e seus companheiros de federação PV e PCdoB anunciaram apoio à recondução de Lira à presidência da Câmara.

"O próprio presidente Arthur Lira foi o primeiro a reconhecer a legitimidade das urnas, do voto popular, e nós entendemos que é fundamental essa estabilidade institucional", destacou o líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG).

Antes da eleição presidencial, a atuação de Lira vinha sugerindo uma tentativa de aumentar cada vez mais os poderes do Legislativo frente ao Executivo, sendo o ponto central dessa estratégia o orçamento secreto. E que o futuro presidente, fosse Lula ou Bolsonaro, teria que negociar com o líder do Centrão.

À DW, Thomas Traumann, analista político e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), definiu Lira como "o presidente da Câmara mais poderoso da história".

O orçamento secreto

O chamado orçamento secreto foi criado em 2020, no segundo ano do governo Bolsonaro. O mecanismo foi revelado pelo jornal O Estado de S.Paulo em maio de 2021.

Por meio do esquema, o governo e o comando da Câmara e do Senado distribuíram verbas públicas para atender interesses dos deputados e senadores que os apoiaram. 

As autorizações para destinar essas verbas foram incluídas no Orçamento depois de ele já ter sido aprovado, por meio das emendas parlamentares. As usadas no orçamento secreto foram as emendas de relator. Elas costumavam ser usadas apenas para fazer pequenas correções no Orçamento, até uma nova regra de 2020, que mudou isso.

As emendas de relator passaram a destinar bilhões de reais para obras, compras de veículos e diversos outros gastos, sem transparência e às vezes ligados a indícios de corrupção.

A mídia batizou o mecanismo de orçamento secreto porque é impossível identificar em alguns casos qual deputado ou senador é o responsável pela criação da emenda. No começo, também era muito difícil identificar o destino do dinheiro.

Em agosto, Simone Tebet, candidata derrotada do MDB a presidente e que apoiou Lula no segundo turno, disse que o orçamento secreto poderia ser o "maior esquema de corrupção do planeta Terra".

lf (DW, ots)

Matéria publicada originalmente no DW Brasil


Foto: reprodução Agência Brasil | Arquivo/ Marcelo Camargo

Relatório do Unaids marca Dia Mundial de Luta contra a doença

Agência Brasil

Atingir o compromisso global de encerrar a pandemia de aids até 2030 passa pelo combate às desigualdades e estigmas que acompanham essa emergência de saúde pública desde o seu surgimento, há 41 anos, destaca o relatório Desigualdades Perigosas, divulgado esta semana pelo Programa das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) para marcar o Dia Mundial de Luta Contra a Aids, celebrado hoje (1°). Especialistas e ativistas reforçam que, mesmo com o avanço dos medicamentos disponíveis, a discriminação contra grupos vulneráves e pessoas que vivem com HIV reduz o acesso à saúde, impede o diagnóstico precoce e causa mortes por aids que poderiam ser evitadas com tratamento.

Em mensagem divulgada para marcar a data de combate à doença, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, alertou que o mundo ainda está distante de eliminar a Aids até 2030 e afirmou que as desigualdades perpetuam a pandemia da doença.

"São necessárias melhores legislações e a implantação de políticas e práticas voltadas para eliminar o estigma e a discriminação que afetam as pessoas que vivem com HIV, sobretudo aquelas em situação de vulnerabilidade. Todas as pessoas têm o direito de ser respeitadas e incluídas", disse. 

Segundo o Unaids, 38,4 milhões de pessoas viviam com HIV em todo o mundo em 2021. Esse número é maior que a população do Canadá ou que a soma de todos os habitantes dos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais. No Brasil, o número de pessoas vivendo com HIV passava de 900 mil no ano passado, de acordo com o Ministério da Saúde, e, desse total, cerca de 77% tratavam a infecção com antiretrovirais. A efetividade do tratamento disponível gratuitamente no país é reiterada pelo percentual de 94% de pessoas com carga viral indetectável entre as que fazem uso dos medicamentos contra o HIV. Quando o paciente em tratamento atinge esse nível de carga viral, ele deixa de transmitir o HIV em relações sexuais.

Desde o início da pandemia de Aids, em 1980, até dezembro de 2020, o Brasil já teve mais de 1 milhão de casos da doença, que causaram 360 mil mortes. A taxa de detecção vem caindo no Brasil desde o ano de 2012, quando houve 22 casos para cada 100 mil habitantes. Em 2020, essa proporção havia chegado a 14,1 por 100 mil, o que também pode estar relacionado à subnotificação causada pela pandemia de covid-19.

HIV ou Aids?

O vírus da imunodeficiência humana (HIV) é um agente infeccioso que pode entrar no corpo humano por meio do sexo vaginal, oral e anal sem camisinha; por meio do uso de seringas e outros objetos cortantes ou perfurantes contaminados; pela transfusão de sangue contaminado; e da mãe infectada para seu filho durante a gravidez, o parto e a amamentação, se não for realizado o tratamento preventivo. Quando se instala no corpo humano, esse vírus tem um tempo prolongado de incubação, que pode durar vários anos, e sua atividade ataca o sistema imunológico, responsável por defender o organismo. Se essa infecção não for detectada e controlada a tempo com o uso de antirretrovirais, o HIV pode enfraquecer as defesas do corpo humano a ponto de causar a Síndrome da Imunodeficiência Humana (aids). Portanto, a sigla HIV se refere ao vírus, e a sigla Aids, à doença causada pelo agravamento da infecção pelo HIV.

O uso de preservativos masculinos e femininos e gel lubrificante estão entre as principais ações preventivas contra o HIV. Também já estão disponíveis a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), que consiste no uso de antirretrovirais para prevenir a infecção caso a pessoa venha a ser exposta ao vírus, e a Profilaxia Pós-Exposição (PEP), que pode impedir a infecção caso seja administrada até 72 horas após a exposição. Mesmo no caso de haver uso dessas profilaxias, a camisinha continua importante, pois previne também outras infecções sexualmente transmissíveis, como a sífilis e as hepatites virais.

Ao menos 30 dias após uma possível exposição ao HIV, é fundamental fazer um teste para a detecção do vírus, exame que pode ser realizado em unidades da rede pública e nos centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). O diagnóstico precoce da infecção e o início rápido do tratamento protegem o sistema imunológico da pessoa infectada, já que esse será o alvo do HIV quando a carga viral aumentar.

Diretor médico associado de HIV da GSK/ViiV Healthcare, Rodrigo Zilli explica que os antiretrovirais usados hoje para o tratamento das pessoas que vivem com HIV são menos tóxicos para o corpo humano, causam menos efeitos colaterais e são administrados em quantidade bem menor de comprimidos. A farmacêutica é a fornecedora do Dolutegravir e outros medicamentos usados no Sistema Único de Saúde (SUS) para combater o vírus. Desde 1996, o Brasil distribui gratuitamente os antirretrovirais a todas as pessoas que vivem com HIV e necessitam de tratamento, contando atualmente com 22 medicamentos em 38 apresentações farmacêuticas diferentes.   

“O tratamento hoje é muito menos tóxico. Nem se usa mais a palavra coquetel, porque não é um conjunto enorme de remédios como se tinha antigamente. E, se a pessoa descobre o HIV a tempo de não ter desenvolvido a imunodeficiência, ela tem chance muito grande de ter uma vida totalmente normal tomando remédios diariamente”, afirma o infectologista. Ele reforça que a pessoa com HIV pode ter expectativa de vida até maior do que pessoas que não foram infectadas pelo vírus. “Essa pessoa que está em tratamento está acompanhando todas as doenças praticamente. Então, ela faz check-ups periódicos, faz exames periódicos, tem aconselhamento para manter um estilo de vida saudável, e acaba podendo ter uma vida mais saudável do que alguém que não tem HIV e não faz acompanhamento médico”. 

Mesmo com esses avanços no tratamento contra o HIV e a disponibilidade gratuita dos medicamentos, o acesso à saúde ainda é marcado por desigualdades, pondera Zilli. “Por mais que se tenha um programa 100% público, o acesso à informação e aos serviços não é totalmente igualitário”, lembra o infectologista. 

Questões sociais

O coordenador do Grupo Pela Vidda-RJ, Márcio Villard, avalia que o combate terapêutico à Aids avançou mais do que a superação dos preconceitos que afetam as pessoas que vivem com HIV. Mesmo com medicamentos menos tóxicos e uma expectativa de vida maior, questões sociais afastam pessoas com HIV de uma vida plena. 

“Quando a gente fala em qualidade de vida, não pode entender somente a questão terapêutica e biomédica. É preciso também entender as questões sociais que envolvem a pessoa com HIV, porque enfrentamos ainda muitos problemas relacionados a estigmas, preconceitos e exclusão social que interferem na qualidade de vida”, afirma. "O que acontece é que o HIV sempre traz consigo uma condenação. De alguma forma, a sociedade vai te condenar, seja pelo seu estilo de vida, seja pela sua orientação sexual, seja por você pertencer a um determinado grupo da sociedade. Praticamente ninguém escapa, até uma criança que nasce com HIV vai ser estigmatizada por isso. Infelizmente, esse cenário não mudou".

O ativista explica que a estigmatização das pessoas com HIV tem raízes ligadas à LGBTfobia, já que os primeiros surtos de HIV se deram na população homossexual, bissexual e transexual nos Estados Unidos, e a imprensa da década de 80 reforçou a associação entre a população LGBTI e o HIV, chamando a aids até mesmo de câncer gay.

“Isso começou nos Estados Unidos, se espalhou pelo mundo e acabou virando um selo. Aqui no Brasil, até o ano passado, homossexuais não podiam doar sangue, independentemente de ter ou não o vírus”. 

O Pela Vidda-RJ foi fundado em 1989 pelo sociólogo e ativista Hebert Daniel e atua desde então na luta por direitos das pessoas que vivem com HIV. Às 11h de hoje, o grupo vai promover ato público na Praça Mauá, no centro do Rio de Janeiro, com o tema Viver com o HIV é possível. Com o preconceito, não. Entre as principais demandas atuais da população que vive com HIV, Villard conta que estão a assistência jurídica para garantir direitos previdenciários e trabalhistas. Os problemas incluem processos seletivos que eliminam candidatos que testam positivo para HIV, enquanto essa testagem é vedada por lei em qualquer exame admissional, periódico ou demissional. Fora esses direitos, as pessoas com HIV também procuram a organização não governamental para receber acolhimento afetivo.

“A maior dificuldade ainda é a questão do estigma. Quando a pessoa tem esse diagnóstico, ela tem dificuldade de lidar com ele. E, ao se colocar para a família, no trabalho e para os amigos, vai enfrentar discriminação. São raros os casos em que a pessoa consegue viver tranquilamente, independentemente de sua sorologia”.

Angústia e cura

A dificuldade de encontrar informação e acolhimento depois do diagnóstico foi o que moveu o influenciador João Geraldo Netto a compartilhar sua experiência na internet desde 2008.

"Inicialmente, eu falava de uma maneira mais oculta, não falava especificamente que eu vivia com o vírus. Mas aí eu senti a necessidade de falar sobre isso mais abertamente. Eu descobri que, falando, eu me curava de certa forma. Sentia algo muito positivo quando falava sobre os dramas, os medos que eu tinha de fazer tratamento, de morrer, de adoecer. E eu vi que aquilo era muito bem recebido. Isso foi me dando força", conta.

O jornalista acrescenta que a maioria das pessoas que entram em contato nas redes sociais está angustiada, seja porque acredita que se expôs ao risco de infecção ou porque já recebeu o diagnóstico e está tentando lidar com ele. João Geraldo acredita que o peso social do HIV afasta as pessoas do teste e do diagnóstico precoce, porque muitas não se percebem parte de um suposto grupo social que poderia ser infectado e outras preferem não saber o resultado do teste por medo. 

“A questão do preconceito é algo tão forte que atrapalha de fazer o teste, de procurar ajuda e tratamento e impede que a pessoa tome o medicamento todo dia. Então, o grande problema do HIV hoje não é mais um problema clínico, é um problema social”, diz. “As pessoas que chegam ao meu canal mais angustiadas são aquelas que passaram por situação que consideram moralmente errada e acreditam que é uma punição para elas. E a pior punição que elas conseguem imaginar é uma doença como a Aids. Então, isso é muito doloroso, sabe? Porque você vê que está conversando com uma pessoa que acha que a pior coisa que pode acontecer na vida é o que você tem”.

Em suas postagens nas redes sociais, o influenciador comenta sobre HIV e temas do dia a dia e de sua vida pessoal, como fotos de viagens, reuniões com amigos e declarações de amor ao namorado. Em um de seus perfis, chamado Superindetectável, ele deixa a seguinte mensagem: “Respira fundo! Pela frente ainda tem muito mundo. Agora pode não estar, mas tudo pode ficar bem”.

Edição: Graça Adjuto

Matéria publicada originalmente na Agência Brasil


PL continua na pauta de votação na próxima reunião da Comissão - Reprodução/Youtube

Votação do Estatuto do Nascituro na Comissão da Mulher na Câmara é adiada após tumulto

Thamy Frisselli | Brasil de Fato

Na tarde desta quarta-feira (30) a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher na Câmara Federal, em Brasília, realizou reunião, entre outras pautas, para votar o PL 478/2007 que dispõe sobre o Estatuto do Nascituro e dá outras providências.

Na prática, o projeto pretende instituir os direitos da vida desde a concepção e conceder às mulheres e meninas, vítimas de violência sexual, uma “bolsa estupro” que as obrigariam a levar adiante a gravidez.  

Em um debate tumultuado, a inversão da pauta da reunião chegou a ser aprovada para que o PL entrasse logo em votação. Para a deputada federal Sâmia Bonfim (PSOL/SP) “o projeto desconsidera acúmulos da ciência, da bioética e do Direito, podendo retroceder na interrupção de gestações fruto do estupro”.

:: Casos de aborto previstos em lei devem ser mantidos ou ampliados, defendem 74% dos brasileiros

Durante a reunião, o deputado Pastor Eurico (PL/PE) tentou, aos gritos, interromper as falas das parlamentares contrárias ao projeto. Em vídeo que circula nas redes sociais, é possível ver o parlamentar batendo na mesa. “Os fundamentalistas e bolsonaristas usam de todo tipo de violência para tentar intimidar as mulheres parlamentares na Câmara. Que saibam: não nos calam”, destacou Sâmia.

Representantes de movimentos feministas e também daqueles que se denominam pró-vida lotaram o plenário da sala da Comissão. “Criança não é mãe” e “Estuprador não é pai” eram algumas das palavras de ordem ditas pelas mulheres de organizações e movimentos feministas que acompanhavam a discussão. As deputadas federais Erika Kokay (PT/DF), Talíria Petrone (PSol/RJ), Aurea Carolina (PSOL/MG), Vivi Reis (PSOL/PA) e Fernanda Melchiona (PSOL/RS) também acompanharam a sessão.

Sem a possibilidade de continuidade do debate, o PL do Estatuto do Nascituro continua na próxima reunião da Comissão, no dia 7 de dezembro. Presidente da Comissão, a deputada federal Policial Kátia Sastre (PL/SP) disse que a presença de público estará proibida.

No Brasil o aborto é permitido em três situações: estupro, risco de vida para a mulher e em casos de anencefalia. O Estatuto do Nascituro está em análise desde junho de 2017, mas tramita na prática desde 2007, com outras autorias, redações minimamente distintas.

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“É bem de praxe que projetos desse tipo tramitem na Câmara no final do ano, ainda mais em final de legislatura. É uma forma que eles encontram de engajar suas bases mais conservadoras, religiosas, tirar um pouco a tensão de temas que envolvem orçamento, emendas parlamentares, formação de base do novo presidente, para tirar o peso de questões importantes que podem afetar sua popularidade esses parlamentares mais conservadores trazem esses projetos à tona”, destaca a cientista política e pesquisadora do Núcleo de Estudos de Sexualidade e Gênero da UFRJ, Priscilla Brito.

De acordo com dados do Ministério da Saúde, reunidos pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), são mais de 19 mil nascidos vivos por ano de mães com idade entre 10 a 14 anos.

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Para Priscilla Brito, se aprovado, o Estatuto resultaria em um crime contra a humanidade das mulheres e das meninas.

“Já tem aumentado a criminalização das mulheres que sofrem abortos espontâneos pela desconfiança que se tem de que eles possam ter sido provocados, que envolve toda uma desumanização do atendimento às mulheres, fazendo com que mulheres sejam constrangidas nos postos de atendimentos isso é bem resultado do crescimento da pauta conservadora no Brasil. E ainda teríamos como outro resultado desse Projeto, a imposição para que meninas prolonguem a violência sexual. Apesar de parecer um projeto que parece quase inofensivo, é com certeza um projeto violento, atingindo diretamente os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, por isso é tão combatido pelas organizações de mulheres de todo país”.

Matéria publicada originalmente no Brasil de Fato


‘População não aguenta mais bancar privilégios para uma pequena casta do Judiciário”, afirma deputado (Foto: Reprodução)

Ressucitar penduricalho para juízes é absurdo, diz Rubens Bueno

Congresso em Foco

Relator do projeto aprovado pela Câmara que barra os supersalários no serviço público, e que está parado no Senado desde agosto do ano passado, o deputado federal Rubens Bueno (Cidadania-PR) criticou nesta terça-feira (29) a intenção do Senado de votar ainda nesta semana uma proposta que cria mais um penduricalho para engordar os salários do Judiciário e do Ministério Público.

“É um absurdo. Mais uma vez estão cedendo ao lobby do Judiciário. Aprovamos na Câmara um projeto que barra os penduricalhos que permitem salários acima do teto constitucional. Agora, em vez de aprovarem esse projeto no Senado, para dar um basta nessa farra, querem criar mais um. A população não aguenta mais bancar privilégios para uma pequena casta do Judiciário”, afirmou Rubens Bueno

A Proposta de Ementa a Constituição (PEC 63/2013) foi colocada na pauta da próxima quarta-feira (30) do Senado e tem o objetivo de ‘ressuscitar’ o chamado quinquênio, que é um acréscimo de 5% nos salários de juízes e integrantes do Ministério Público a cada cinco anos. O PL 6726/2016, que no Senado recebeu o número 2721/2021, está há mais de um ano na CCJ do Senado sem sequer a indicação de um relator.

Rubens Bueno também criticou decisão do decisão do CJF (Conselho de Justiça Federal) que reestabeleceu o benefício do quinquênio com efeito retroativo. O ‘penduricalho’ havia sido extinto em 2006.

“Esse tipo de decisão em benefício próprio é um escárnio”, reforçou.

Supersalários

O projeto que barra os supersalários no serviço público, aprovado em julho de 2021 na Câmara, pode gerar uma economia de R$ 3 bilhões a R$ 10 bilhões por ano. Para isso, explica Rubens Bueno, foi feito exatamente o que determina a Constituição.

“Restringimos as verbas indenizatórias que podem ultrapassar o teto. Fora dessa lista, tudo será alvo do abate teto. E são centenas de rubricas que antes eram consideradas indenizatórias e que com a aprovação final do projeto serão alvo do abate teto”, explica Rubens Bueno.

Matéria publicada originalmente no Congresso em Foco


Imagem: reprodução / Correio Braziliense

Nas entrelinhas: Projeto prevê controle de conteúdo da internet

Luiz Carlos Azedo | Nas Entrelinhas

A equipe de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva tenta adiar para o próximo ano a votação do projeto de lei de autoria do deputado federal João Maia (PL-RN), que estabelece regras para atuação das plataformas digitais no país e só falta ser incluído na pauta pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A proposta confere à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) superpoderes para controlar a internet, inclusive seu conteúdo. “No Projeto de Lei nº 2.768/2022, proponho uma regulação na linha da Comissão Europeia, mas de forma bem menos detalhada. Isso porque estamos lidando com questões de extrema relevância, que exigem respostas regulatórias ao mesmo tempo novas e muito rápidas”, argumenta Maia.

Segunda a proposta, em vez de um novo órgão regulador, a Anatel seria empoderada para tratar de todas as questões relativas à internet. Há dúvidas sobre isso, embora Maia argumente que o órgão já possui expertise muito próxima da requerida para a missão de regular plataformas digitais. Na linha da União Europeia, o projeto distingue usuários profissionais e finais. Também estabelece critérios para a definição de operadores de plataformas digitais, que serão considerados como detentores de poder de controle de acesso essencial (receita operacional anual igual ou superior a R$ 70 milhões).

O projeto reduz o poder e a autonomia das chamadas big techs, as grandes empresas de tecnologia, principalmente Google, Facebook, Amazon e Apple, todas norte-americanas. A influência das plataformas e redes sociais nas eleições tem despertado o interesse dos políticos, sobretudo depois do escândalo da Cambridge Analytica, decisiva na campanha do Brexit, na Inglaterra, e da atuação de hackers russos nas eleições norte-americanas em favor de Donald Trump, eleito em 2016.

Aqui no Brasil, em 2018, o presidente Jair Bolsonaro surpreendeu os adversários ao estruturar sua campanha e focar o marketing eleitoral nas redes sociais, sem que houvesse qualquer controle da Justiça Eleitoral. Neste ano, porém, foi diferente. Um inquérito aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) investiga bolsonaristas responsáveis pela produção de fake news nas redes sociais, com objetivos antidemocráticos.

As principais críticas ao modelo proposto por Maia parte da ideia de que o setor se desenvolve de forma disruptiva e esse tipo de regulação seria absorvido pelas big techs, mas mataria o desenvolvimento das startups. O termo startup, do inglês, significa “começar algo novo” e é comumente relacionado à inovação no mundo dos negócios. Portanto, uma startup é uma empresa que está em seu início, sem plano de negócios ou produto completamente definido, mas que tem algo novo a mostrar ao mercado. Aplicativos como Uber, Airbnb, Instagram e Pinterest já foram startups antes de se tornarem companhias multimilionárias. Nubank, GuiaBolso, QuintoAndar, Loggi, Contabilizei, Creditas e Amaro são startups genuinamente brasileiras.

Obrigações e multas

O mercado da internet é muito verticalizado. As big techs estão sendo questionadas por ampliarem seu poder na atividade principal para mercados adjacentes, com base no fato de a primeira ser, muitas vezes, um insumo para os segundos, no chamado self-preferencing. É o caso dos aplicativos em celulares deGoogle e Apple, da ferramenta de busca horizontal do Google, ao Buy Box da Amazon ou aos dados acumulados nas redes sociais, como fotos e postagens do Facebook.

Nos últimos 20 anos, houve grande concentração de mercado. Em vez de dúzias de mecanismos de busca, o Google. No lugar de milhares de lojas, a Amazon. Nos Estados Unidos, o American Innovation and Choice Online Act, que proíbe o self-preferencing, empacou no Congresso. Na Comissão Europeia, o Digital Markets Act (DMA), direcionado aos chamados “controladores de acesso” (gate keepers) no mundo digital, foi aprovado em 2022, mas gerou um contencioso com os Estados Unidos. A China investiu bilhões nas suas próprias plataformas e redes para manter o controle social, porém as manifestações que estão ocorrendo no país mostram que isso não é tão fácil.

Maia propõe um Fundo de Fiscalização das Plataformas Digitais — FisDigi, com fontes constituídas por uma nova taxa de fiscalização das plataformas digitais, dotações do Orçamento Geral da União, créditos especiais, transferências e repasses, entre outras. A taxa de fiscalização das plataformas digitais será devida anualmente pelos operadores de plataformas digitais que oferecerem serviços ao público brasileiro, detentores de poder de controle de acesso essencial, correspondente a 2% da receita operacional bruta.

Além dos recursos do FisDigi terem como destino o financiamento aos novos serviços prestados pela Anatel, prevê a possibilidade de o Poder Executivo destinar parte dos valores ao Fundo de Garantia de Operações — FGO para serem utilizados como garantia ao desenvolvimento de produtos e serviços digitais inovadores, o que financiaria um “FGO Digital”. As sanções seguiriam a lógica de “regulação responsiva”, com multas pesadíssimas.

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