Luiz Carlos Azedo: A revoada dos perus

O “distritão” seria um retrocesso institucional, pois os parlamentares serão eleitos sem praticamente nenhum vínculo partidário, a não ser o elo financeiro da partilha dos recursos do “fundão”

A aprovação do chamado “distritão” (depois explico) e do fundo de financiamento eleitoral de R$ 3,6 bilhões pela comissão especial que discute a reforma política na Câmara pode despertar forças que estavam adormecidas desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, a começar pelo movimento Vem Pra Rua, que convocou manifestação de protesto para 27 de agosto intitulada “Marcha Contra a Impunidade”, em todo o país. A reação às duas propostas é tão forte que alguns políticos já estão se descolando da reforma, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que criticou os dois projetos.

Na Câmara, a reação de grande número de deputados parece uma revoada de perus às vésperas da ceia de Natal, para voltar à analogia avícola. Todos os deputados que se sentiram ameaçados pelo “distritão” (sistema no qual são eleitos os deputados mais votados, independentemente da votação de sua legenda) estão contra a mudança. São em número suficiente para barrar a emenda constitucional que viabilizaria a medida. O “distritão” é um retrocesso institucional, pois os parlamentares serão eleitos sem praticamente nenhum vínculo partidário, a não ser o elo financeiro da partilha dos recursos do “fundão”, digamos assim.

O novo sistema está sendo criado para viabilizar a reeleição dos atuais deputados e blindar os políticos enrolados na Operação Lava-Jato. Não é o caso aqui, mas seria um bom exercício checar a lista de votação das eleições passadas e verificar quem hoje manteria o mandato e quem o perderia. No caso de São Paulo, por exemplo, seriam beneficiados os 70 mais votados; de Minas, os primeiros 53; do Distrito Federal, oito. Os votos nos demais candidatos da legenda seriam desprezados, o que mudaria completamente as características da Câmara, que bem ou mal representa hoje 100% do nosso eleitorado.

Deve-se ao diplomata e jurista Assis Brasil a criação do atual sistema proporcional, idealizado em 1932, mas somente sacramentado na Constituinte de 1945. Fundador do Partido Libertador, com Raul Pilla, só apoiou a Revolução de 1930 porque Getúlio Vargas havia se comprometido a aceitar o voto secreto. “Menino, todo homem tem seu preço. O venal se deixa comprar por dinheiro. O meu preço é o Código Eleitoral. E como vale mais a pena ladrar dentro de casa do que fora dela, aceito o ministério”, disse, ao justificar sua breve passagem pelo Ministério da Agricultura no Governo Provisório, ao qual renunciou em protesto pelo empastelamento do Diário Carioca.

Na sua obra Democracia representativa: do voto e do modo de votar, Assis Brasil antevia uma “máquina de votar”, o que seria hoje a nossa urna eletrônica. No sistema proporcional, cada estado (ou distrito eleitoral) elege um determinado número de representantes de acordo com sua população. O objetivo do sistema proporcional é garantir um grau de correspondência entre votos e cadeiras recebidas pelos partidos em uma eleição. Por exemplo, um partido que tenha recebido 15% dos votos teria direito a cerca de 15% das cadeiras. Nesse sistema, o partido apresenta uma lista de candidatos para as eleições; a distribuição das cadeiras é feita de acordo com os votos dados em cada lista.

Mas há outros métodos, como o voto distrital clássico, no qual o estado seria dividido em vários distritos, e cada distrito elegeria um deputado por maioria simples, isto é, 50% dos votos mais um. Assim, o candidato mais votado é eleito. E o distrital misto, uma combinação do voto proporcional e do voto majoritário. Neste caso, os eleitores têm dois votos: um para candidatos no distrito e outro para as legendas (partidos). Os votos em legenda (sistema proporcional) são computados em todo estado ou município, conforme o quociente eleitoral (total de cadeiras divididas pelo total de votos válidos). Já os votos majoritários são destinados a candidatos do distrito, escolhidos pelos partidos políticos, vencendo o mais votado.

“Fulanização”

O sistema proporcional teve como objetivo viabilizar a existência dos partidos, num país que emergia do Estado Novo e cuja tradição de “fulanizar” a política é tão velha como o costume de comer castanhas e perus na ceia de Natal. Essa cultura vem das primeiras câmaras municipais, que surgiram a partir de 1532. Eram compostas por 3 ou 4 vereadores, denominados “homens-bons”, geralmente grandes proprietários de terras. Escravos, judeus, estrangeiros, mulheres e degredados não podiam se tornar vereadores.

Essa “fulanização” era mais do que presente na época da Constituinte de 1945, na qual um mito político deixava o poder, Vargas, e outro era libertado da prisão, o líder comunista Luiz Carlos Prestes, de mãos dadas pelo “queremismo” (Constituinte com Getúlio), que fracassou. No século passado, ambos foram “reencarnações” do nosso velho sebastianismo, movimento místico secular que surgiu após a morte do rei português D. Sebastião, durante a batalha de Alcácer-Quibir, no ano de 1578. Como não possuía herdeiros, o trono de Portugal ficou sob o controle do rei Filipe II, da Espanha.

Como o corpo de D. Sebastião nunca foi encontrado, o sebastianismo se traduziu na esperança da vinda de um salvador, em meio à inconformidade e ao sentimento de insatisfação com a situação política da época, mesmo que para isso acontecer fosse necessário um verdadeiro milagre, como a ressurreição do rei morto. No Brasil, o sebastianismo influenciou movimentos populares desde o Rio Grande do Sul até o Norte do país, sendo representado como alegoria nas folias de reis, principalmente no Nordeste. Não é exagero dizer que o “distritão” leva água para esse moinho.

 


Luiz Carlos Azedo: A crise dos partidos

Três grandes partidos derivaram para o patrimonialismo e o clientelismo. Com seu transformismo, ameaçam garrotear a democracia brasileira

A crise de representação dos partidos políticos não é um fenômeno exclusivo do Brasil. Ocorre em todo o mundo, em consequência de vários fenômenos, alguns mais antigos, como o surgimento dos meios de comunicação de massas, outros mais recentes, como o crescente papel das redes sociais na formação de opinião. Mas, no caso brasileiro, tem ingredientes que são bem característicos da nossa formação política.

Os partidos políticos, tal como os conhecemos, surgiram após a Revolução Francesa e na sociedade industrial estruturada em classes mais ou menos definidas. Sua transformação em partidos de massa, com características ideológicas definidas, a partir do final do século XIX, decorreu de projetos programáticos e do surgimento de democracias de massa, mas não se pode dizer que estivessem intrinsecamente comprometidos com elas. Os partidos comunista e fascista, por exemplo, foram vocacionados para assaltar e manter o poder pela força, não para exercê-lo no âmbito da democracia representativa.

No Brasil, onde as ideias políticas acabam sempre mitigadas, os partidos já nasceram dissociados de seus objetivos programáticos. No Império, por exemplo, a luta de liberais (luzias) e conservadores (saquaremas) gravitava em torno do tema centralização/descentralização, ou seja, do exercício e controle do poder nas províncias; do ponto de vista programático, porém, ambos eram monarquistas e intransigentes defensores da escravidão. O movimento abolicionista desenvolveu-se à margem dos partidos; assim como o movimento republicano, era mais bem representado pela Escola Militar da Praia Vermelha do que pelo minúsculo partido ao qual emprestava o nome.

De certa maneira, o mesmo fenômeno se repete na crise da República Velha, na qual as elites regionais se digladiaram na luta pelo poder, até que as sucessivas crises da economia do café e o grande debate “agrarismo e/ou industralização” implodiram o pacto perverso das elites oligárquicas e seu sistema excludente e elitista de partidos regionais que se revezavam no poder a partir do eixo Rio-São Paulo.

A opção da elite cafeeira paulista pela industrialização gerou uma disjuntiva na qual o eixo da modernização se deslocou da República Velha para o Estado Novo, depois da Revolução de 1930, da fracassada Revolta Constitucionalista de 1932 e do incipiente levante comunista de 1935. A tentativa de constituir um sistema de representação corporativista na Constituinte de 1937, claramente de inspiração fascista, com a entrada do Brasil na guerra contra o nazifascismo, morreu no nascedouro.

Com a redemocratização, em 1945, a Guerra Fria se encarregou de fraudar o sistema representativo da Segunda República. O Partido Comunista (PCB), que ressurge no pós-guerra como um partido de massas, foi posto na ilegalidade, o que reforçou sua vertente golpista; e a antiga União Democrática Nacional (UDN), que nasceu da resistência à ditadura de Vargas, derivou de forma irreversível para o golpismo. Os três partidos de vocação verdadeiramente democrática eram o Partido Social-Democrata (PSD), conservador, elitista e ligado às oligarquias; o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), um partido de massas, nacionalista e populista; e o pequeno Partido Socialista Brasileiro (PSB), uma pequena agremiação de intelectuais progressistas.

Depois do golpe

Esses partidos protagonizaram os melhores e piores momentos da vida nacional, até o golpe de 1964, após o qual foram todos expurgados da vida política, com a reforma partidária imposta pelos militares, uma tentativa frustrada de implantar o bipartidarismo no Brasil. O projeto de institucionalização do regime autoritário, que havia derivado para o fascismo após o Ato Institucional no. 5, era uma espécie de “mexicanização” do país, no qual a hegemonia absoluta da Arena seria a via de transferência do poder para os civis.

Esse projeto sofreu sucessivas derrotas eleitorais — 1974 e 1978 — e foi sepultado com a anistia e a volta do pluripartidarismo, em 1979. Nova derrota do regime nas eleições de 1982, nas quais a oposição conquistou os principais governos estaduais, e a campanha das Diretas, Já!, apesar de frustrada, resultaram na derrota definitiva do regime, com a eleição de Tancredo Neves, em 1985, que não assumiu, mas cujo vice, José Sarney, convocou uma Constituinte e completou a transição.

O regime partidário que resultou da Constituição de 1988, cuja marca é a ampla liberdade para formação de partidos, já surgiu, porém, em meio às mudanças no mundo descritas no começo desse artigo, embora com a aparência de que algo novo estava nascendo. O PMDB emergiu da ditadura como o grande partido político liberal democrático. Com o colapso do socialismo real no Leste Europeu, o surgimento do PT como partido de massas, ligado aos sindicatos e aos movimentos sociais, sinalizava, porém, uma ruptura com o comunismo e o populismo. Fundado por políticos e intelectuais progressistas, o PSDB oferecia à sociedade brasileira um programa social-democrata moderno, em sintonia com as necessidades de modernização do país.

Esses três grandes partidos, mas não somente, derivaram para o patrimonialismo e o clientelismo. Com seu transformismo, ameaçam garrotear a democracia brasileira, como principais artífices de uma reforma política cujo objetivo principal é salvar seus quadros enrolados na Operação Lava-Jato de uma degola eleitoral, em vez de renovar os costumes políticos do país.

 


Luiz Carlos Azedo: A gaiola dos perus

O que mais assusta os deputados é a proposta de “distritão”, uma velha tese do presidente Michel Temer, ressuscitada pelo relator da reforma, deputado Vicente Cândido (PT-SP)

Por causa da reforma política, o clima na Câmara ontem era de gaiolas de perus às vésperas da ceia de Natal. A algazarra era grande porque a proposta de mudança das regras do jogo nas eleições — do atual sistema proporcional uninominal para não se sabe ainda qual o modelo — pôs em risco a sobrevivência de muitos, principalmente os que conquistaram seus mandatos graças aos votos da respectiva legenda. O que mais assusta os deputados é a proposta de “distritão”, uma velha tese do presidente Michel Temer, ressuscitada pelo relator da reforma, deputado Vicente Cândido (PT-SP), que virou uma espécie de magarefe dos colegas. O “distritão” consiste na eleição dos deputados mais votados de cada estado, não importa a votação dada aos demais candidatos de cada partido. Foi aprovado na comissão especial por 17 a 15 e agora vai a debate em plenário.

O sistema só existe em quatro países: Afeganistão, Jordânia, Vanuatu e Pitcairn. Teoricamente, beneficiaria os campeões de votos e acabaria com o que é considerado por muitos como a uma grande distorção, a eleição de deputados graças à proporcionalidade da distribuição de cadeiras entre as legendas, de acordo com a ordem de votação em cada partido. Isso faz com que campeões de votos, em alguns estados, não consigam uma cadeira porque seu partido não alcançou a votação necessária, enquanto outros deputados são eleitos com votação irrisória beneficiados pelo voto de legenda. Isso faz com “puxadores” de legenda, como Tiririca (PR-SP), por exemplo, carreguem com a sua votação deputados menos votados do que os que não passaram a linha de corte da proporcionalidade entre as legendas.

A proposta caiu como uma bomba na comissão especial da reforma, que se reuniu ontem. É resultado de um acordo entre os caciques do PMDB, PSDB e DEM, que tentam blindar as legendas do desgaste da Operação Lava-Jato, mas o PT roeu a corda e, de olho nas alianças de 2018, resolveu liderar a reação contrária à proposta, que inviabilizaria os pequenos partidos de esquerda e outras legendas menores. “Nós já contamos com 200 deputados e vamos chegar a 250”, anunciou o líder da Minoria, deputado José Guimarães (PT-CE).

Na base do governo, a reação negativa também é grande. O líder do PPS, Arnaldo Jordy, também anunciou que a bancada é contra o “distritão”. Até mesmo dentro do PMDB, PSDB e DEM, há deputados que veem a proposta como uma ameaça eleitoral. Com isso, cresce a possibilidade de permanência do sistema atual, que tem sobrevivido a todas as tentativas de reformá-lo, com o fim das coligações e a cláusula de barreira. Outra possibilidade é a adoção do sistema distrital misto, no qual uma parte dos deputados é eleita pelos critérios atuais e a outra, pelo distrito eleitoral.

Passando do habitat das aves para o dos mamíferos, a alegria dos deputados tem o pomposo nome de Fundo Especial de Financiamento da Democracia, com ampla aceitação. O aumento do fundo partidário para 0,5% da receita corrente líquida da União, o que corresponderia hoje a cerca de R$ 3,6 bilhões, é como perguntar a macaco se quer banana. Com o fim do financiamento privado, a cobiça dos deputados em relação a esses recursos gerou uma espécie de leilão na Câmara, pois a divisão do fundo partidário é feita entre os partidos de acordo com o número de integrantes de cada bancada. Com isso, cada deputado valeria R$ 7,01 milhões. A conversa de bastidor na reforma política, por causa da janela para troca de partido que será aberta, na maioria dos casos, é na base de quanto cada um vai levar do botim ao entrar ou mesmo ficar em cada legenda. A orientação programática das siglas vale muito pouco nesse tipo de conversa.

Imunidades

Atualmente, a Constituição define que o presidente da República não pode ser preso por crimes comuns enquanto não houver sentença condenatória, nem pode ser investigado por fatos anteriores ao exercício do mandato. Em caso de indício delituoso, se for denunciado, o processo no Supremo Tribunal Federal (STF) depende de prévia aprovação da Câmara. Essa regra, pelo relatório de Vicente Cândido, seria ampliada para toda a linha sucessória da Presidência da República: vice-presidente da República e presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF). A proposta faz parte do conjunto de medidas que visam blindar a cúpula do Congresso contra a Lava-Jato.

A propósito, pegou mal o encontro da nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, com o presidente Michel Temer na noite de terça-feira, fora da agenda oficial, para tratar da sua cerimônia de posse. Cogita-se que seja no Palácio do Planalto e não na sede do Ministério Público Federal. Até aí nada demais, pois uma das posses do atual procurador-geral, Rodrigo Janot, também foi lá, durante o governo Dilma Rousseff. O problema é que o encontro não constava da agenda da Presidência e a conversa derivou para a queda de braços entre Temer e Janot, o que desgastou a nova procuradora-geral da República entre seus colegas de MPF.


Temer joga com as brancas

Temer sinalizou para o PMDB que o prefeito de São Paulo, João Doria,  pode ser uma alternativa para o partido na sua própria sucessão

O encontro de ontem do presidente Michel Temer (PMDB) com o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), para sacramentar a transferência de parte da área do Aeroporto Campo de Marte, na Zona Norte da capital paulista, foi mais do que um ato administrativo. Como quem joga com as brancas, Temer mexeu a primeira peça do tabuleiro do xadrez da própria sucessão. “Tenho orgulho de me equiparar às atitudes de João Doria para que nós tomássemos atitudes que estavam paralisadas há muitíssimos anos (…) Isso é fruto da ideia porque tenho um parceiro e um companheiro. João não tem uma visão só municipalista, mas nacional”, disse Temer, ao transferir um terreno muito cobiçado, que será destinado a um parque municipal.

Ao dar à questão local uma dimensão nacional — afinal, trata-se apenas de um terreno destinado a um parque municipal —, Temer sinalizou para o PMDB que o prefeito de São Paulo pode ser uma alternativa para o partido na sua própria sucessão. E, com isso, começa a resolver um grande problema: a “sombra de futuro” curtíssima. O presidente da República escapou do afastamento pela Câmara dos Deputados porque a denúncia do Ministério Público Federal foi rejeitada, mas saiu do embate menor do que entrou: a base do governo diminuiu de tamanho e o desgaste político causado pelo episódio é de difícil reversão. Além disso, seu mandato durará mais 16 meses, apenas.

Com a popularidade atual, Temer não tem a menor perspectiva de fazer um sucessor filiado ao PMDB, embora existam ambições na equipe ministerial, como as do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, por exemplo. Em termos de expectativa de poder, ou arranja um candidato competitivo para sua sucessão ou em breve começará a tomar café frio, como se diz no jorgão palaciano. O lance de ontem foi uma espécie de “Abertura Réti”, jogada de xadrez que recebeu esse nome por causa de seu autor, Richard Réti, que quebrou a invencibilidade de oito anos do famoso enxadrista Capabranca, ao controlar, por antecipação, o centro do tabuleiro, com uma ação de flanco para capturar os peões adversários e dominar o jogo. Temer não economizou elogios a Doria: “Sempre agregou, sempre somou”.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, não participou da solenidade. O prefeito paulistano foi uma invenção política do tucano, mas agora criatura e criador andam se estranhando. Alckmin não moveu uma palha para demover os deputados paulistas de votarem a favor da denúncia do Ministério Público contra Temer, que agora deu o troco incensando Doria. Nos bastidores da política nacional, os dois tucanos já estão em guerra pela vaga de candidato a presidente da República pelo PSDB.

Reformas

Doria também não se fez de rogado em relação a Temer: “A parte mais difícil já passou e agora há pouco campo para fazer oposição ao governo. O PSDB tem de fazer as reformas. Agora, não é mais o caso de discutir se é contra ou a favor de Temer, mas de puxar o Brasil para a frente, porque já chega o que os partidos de esquerda puxam para baixo”, disse. E defendeu a permanência dos tucanos na equipe de governo: “O PSDB tem quatro ministros muito bons que atuam no governo com muita eficiência, com destreza, são prestigiados, e, a meu ver, podem continuar o seu trabalho onde estão. E entendo também que o PSDB é um grande partido, composto por boas cabeças, que emitem suas opiniões nem sempre coincidentes.”

Além de se reposicionar em São Paulo, cuja política conhece bem, Temer neutraliza um pouco o protagonismo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que passou a ser o polo decisivo para aprovação das reformas e a própria estabilidade do governo, conforme ficou claro na votação da denúncia. Maia é hoje o principal fiador da aprovação das reformas política, previdenciária e tributária, quando nada porque manda na pauta da Casa que lidera. Ao lado do prefeito de Salvador, ACM Neto, Maia opera para resgatar o antigo poderio do DEM, incorporando à legenda os dissidentes do PSB e de outros partidos que votaram com Temer.


Luiz Carlos Azedo: O mundo de Neymar  

As democracias do Ocidente precisam reduzir a pressão sobre os orçamentos, reduzir suas dívidas e os impostos, investir em infraestrutura, combater a corrupção e renovar a política.

O Paris Saint-Germain contratou o atacante Neymar Júnior no maior negócio da história do futebol. A rescisão com o Barcelona custou € 222 milhões (R$ 812 milhões). O dono do clube é Nasser Ghanim Al-Khelaifi, de 43 anos, cuja ambição é ganhar a Liga dos Campeões. O dinheiro vem do fundo de investimentos Catar Sports, controlado pelo emir do Catar, Tamim ben Hamad Al Thani, ex-dirigente da Autoridade de Investimento do Catar, o fundo soberano do país. Antes de investir no clube parisiense, Al-Khelaifi era presidente do grupo de mídia “beIN”, canal esportivo que arrebatou os direitos de transmissão de grandes torneios. Chegou ao comando do PSG em 2011, após a compra do clube francês.

O Catar é um emirato absolutista, comandado pelos Thani desde o século XIX. Foi um protetorado britânico até conquistar a independência, em 1971. Desde então, tornou-se um dos estados mais ricos da região, devido às receitas do petróleo e gá. Tem uma população de 1,9 milhão de habitantes, dos quais apenas 250 mil são árabes. Os demais são trabalhadores estrangeiros: indianos, nepaleses, paquistaneses e filipinos, principalmente. Chanceler supremo, o emir possui o poder exclusivo de nomear e destituir o primeiro-ministro e o Conselho de Ministros, que é a autoridade executiva suprema no país. Doha, a capital do Catar, sede da rede de televisão Al Jazeera, é um paradigma da moderna arquitetura urbana do Oriente e um dos principais centros financeiros do mundo. O pequeno e rico Catar quer ser um polo da economia do conhecimento no mundo.

Recentemente, a Arábia Saudita, Egito, Barein, Emirados Árabes Unidos, Líbia, Iêmen e Maldivas cortaram os laços diplomáticos com o Catar. A justificativa dos países é que o emirato daria suposto apoio ao terrorismo, devido às relações do emir com a Irmandade Muçulmana e o Hamas, considerados uma ameaça às demais monarquias do Golfo Pérsico. O emir do Catar usa a mesma estratégia do rei Addulla II, da Jordânia, que mantém boas relações com o Hamas para os palestinos não desestabilizarem seu próprio regime. A compra do Paris Saaint-Germain e sua transformação na maior potência esportiva da Europa é uma grande jogada de marketing. Curiosamente, a camisa do clube é patrocinada pela Emirates Airlines, que chegou a cancelar seus voos na crise, e não pela Catar Airways, uma das companhias aéreas que mais cresce no mundo.

Corrida mundial
O Catar é um dos paradigmas de gestão para a nova escola de formação de dirigentes partidários, administradores públicos e executivos de empresas estatais da China. Outro paradigma é Cingapura, a cidade-estado da península da Malásia, com 5 milhões de habitantes, que tem um governo forte, experiente e altamente qualificado, apoiado por um serviço especializado civil e um sistema de educação com ênfase na realização e na meritocracia. O parlamento é controlado pelo Partido da Ação Popular, que governa o país com mão de ferro desde a independência. Catar e Cingapura participam da corrida mundial para reinventar o Estado, da qual a China pretende fazer parte, em meio à disputa com os Estados Unidos pelo controle do comércio mundial, cujo eixo se deslocou do Atlântico para o Pacífico. Levam a vantagem de não terem que lidar com a crise da democracia representativa e o colapso do Estado de bem-estar social do Ocidente.

Não é o caso da França, de Emmanuel Mácron. O presidente francês rompeu a bipolaridade da política francesa do pós-guerra, derrotando a esquerda e a direita, com um discurso no qual propõe a reforma democrática do Estado e a reinvenção da economia francesa. “Parabéns, soube que trouxe boas notícias”, disse o presidente francês a Al-Khelaifi, o presidente do PSG, referindo-se à chegada do craque brasileiro. O ministro francês das Contas Públicas, Gérald Darmanin, celebrou a fortuna do jogador, por causa dos impostos que vai pagar na França: “É melhor que pague aqui em vez de pagar em outro lugar”, afirmou.

Neymar deixou o Barcelona num momento em que cresce a campanha pela independência da Catalunha, de forte tradição republicana. Há um plebiscito convocado pelo parlamento local para 1º de outubro, mas que não é reconhecido pelo governo da Espanha, que atravessa um dos seus piores momentos. As democracias do Ocidente precisam reduzir a pressão sobre os orçamentos governamentais, reduzir suas dívidas e os impostos, investir em infraestrutura, combater a corrupção e, principalmente, renovar a política. Como no Brasil de Neymar.


Temer passa à ofensiva

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para mobilizar o apoio dos agentes econômicos, anunciou que o governo pretende aprovar a reforma da Previdência até outubro

Livre da denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, até o fim de seu mandato, o presidente Michel Temer pretende passar à ofensiva no Congresso, com objetivo de aprovar uma extensa pauta legislativa, cujo nó górdio é a reforma da Previdência. O Palácio do Planalto conseguiu mobilizar o apoio de 263 deputados para congelar a investigação, mas precisará de pelo menos 308 votos para aprovar essa reforma, considerada crucial para restabelecer o equilíbrio das contas públicas. Para isso, acena para os dissidentes da base do governo com a promessa de perdão por terem votado a favor de seu afastamento.

Ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para mobilizar o apoio dos agentes econômicos, anunciou que o governo pretende aprovar a reforma da Previdência até outubro. Meirelles minimizou a diferença de votos a ser alcançada. “São decisões diferentes. Acreditamos sim na viabilidade de aprovação”, disse. Na prática, são 45 deputados que precisam ser conquistados se não houver nenhuma defecção na base hoje existente. Mas anunciou também que o governo pretende aprovar a reforma tributária ainda este ano, o que não é fácil.

O maior aliado de Temer para aprovação das reformas é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que não compartilha o mesmo otimismo, embora esteja engajado plenamente nessa agenda. Maia comemorou a rejeição da denúncia, mas disse que o resultado não era bom para as reformas pelo fato de que a manifestação a favor de Temer não alcançou o quórum equivalente ao de aprovação de emendas constitucionais. De certa forma, revelou certa surpresa com o número de votos contra Temer.

O PSDB rachou na votação da denúncia contra o presidente Michel Temer: dos 47 deputados da bancada, 22 votaram a favor do presidente e 21, contrários. Quatro estavam ausentes. Esse resultado fragilizou a posição do PSDB na Esplanada, sendo que a pasta das Cidades, ocupada pelo deputado Bruno Araújo (PE), é o objeto de desejo do chamado Centrão (PP, PR, PSD e PTB), que reúne 142 deputados. Mas o grupo também não votou monoliticamente: houve 32 deputados dissidentes, sendo 14 do PSD, cuja bancada tem 38 deputados. No PMDB, somente sete dos 63 deputados votaram contra Temer, mesmo com o partido fechando questão. Temendo punição, já procuram outras legendas.

No caso dos tucanos, a tensão na legenda é grande. O presidente interino, Tasso Jereissati (CE), ontem, disse que a permanência dos ministros tucanos no governo é um problema do presidente da República e não da legenda, que não precisa de cargos para aprovar as reformas. O senador Aécio Neves (MG), licenciado da presidência da legenda por causa da Lava-Jato, foi um dos artífices da vitória de Temer. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, passou a defender publicamente o desembarque do governo. Segundo ele, a permanência do PSDB na administração federal perderá o sentido depois da reforma da Previdência.

Reforma política

Uma extensa agenda legislativa já está definida para o Congresso, mas a intenção do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-EJ), é pôr em votação na próxima semana a reforma política. As principais propostas em discussão são a instituição do financiamento público de campanhas; o sistema de listas partidárias preordenadas para as eleições proporcionais; o fim das coligações; a perda de mandatos majoritários por infidelidade partidária; e cláusula de barreira. A proposta mais polêmica em discussão, porém, é a criação do chamado “distritão”, uma jabuticaba plantada pelo presidente Michel Temer quando ainda era vice da presidente Dilma Rousseff.

O “distritão” acaba com a eleição proporcional, em vigor desde as eleições de 1945, e absolutiza o voto uninominal. Serão eleitos os deputados mais votados em cada estado, independentemente da votação de seus respectivos partidos. Não é fácil a aprovação dessa proposta no plenário da Câmara, porém, porque a mudança altera profundamente as condições para a reeleição dos atuais parlamentares, acostumados com as regras atuais. Outra discussão aberta com a reforma política é a adoção do parlamentarismo. O impeachment de Dilma Rousseff e as agruras de Michel Temer, que assumiu seu lugar, para muitos parlamentares, são a demonstração de que o chamado presidencialismo de coalizão é um sistema falido, que joga o país em longas crises quando o governo perde sua base parlamentar.

 


A nova base de Temer

A vitória (262 votos contra 227, 2 abstenções e 19 ausências) demonstrou que o presidente da República tem força para governar sem depender da cúpula tucana e outros aliados da antiga oposição

O resultado da votação de ontem na Câmara, que rejeitou a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o presidente da República, inaugura uma nova fase do governo Temer. O novo Centrão cobrará o preço do apoio com olho grande nas pastas sob controle do PSDB, cuja bancada rachou na votação da denúncia (22 votos contra, 21 a favor e 4 ausências). Mesmo que Temer seja magnânimo e resolva lamber as feridas da base, como deu a entender no pronunciamento de ontem à noite, nada será como antes. A vitória (262 votos contra 227, 2 abstenções e 19 ausências) demonstrou que o presidente da República tem força para governar o país até 2018 sem depender da cúpula tucana e outros aliados da antiga oposição, ainda que para isso tenha que negociar caso a caso as medidas que exigirem quórum qualificado.

Quem vacilou não estará inteiramente fora do jogo, quando nada porque há compromisso programático dessas forças com as reformas, principalmente a da Previdência, mas passará à condição de aliado de segunda classe. Os preferenciais são os que votaram “sim” na noite de ontem. A reforma da Previdência, que subiu no telhado, será uma espécie de rubicão. Se não for aprovada, o presidente da República será visto como uma espécie de “pato manco”, a expressão usada pelos norte-americanos para se referir aos presidentes sem apoio no Congresso. Aprová-la será a maior demonstração de que governo foi capaz de reagrupar a base.

A atual composição do governo Temer espelha as articulações e acordos feitos pelo presidente da República para isolar e afastar do poder a ex-presidente Dilma Rousseff. A maioria dos partidos aliados ao PT permaneceu no governo após o impeachment, mas o aliado principal de Temer passou a ser o PSDB, o que se reflete na ocupação de posições estratégicas na Esplanada dos Ministérios. A posição da metade da bancada tucana a favor da aceitação da denúncia, porém, terá como consequência alterar a relação do partido com Temer, reduzindo a influência da legenda.

Um ator importante nesse processo é o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que em todos os momentos defendeu a posição de que o PSDB não deveria abandonar o governo. Entretanto, não moveu uma palha para obrigar os tucanos paulistas a votarem contra a denúncia. Quem trabalhou fortemente para rejeitar a denúncia foi o presidente licenciado do PSDB, senador Aécio Neves (MG), que atua para retomar o controle da legenda.

Se antes a hegemonia na base do governo era das forças que lhe defendiam a responsabilidade fiscal e as reformas, agora passou aos setores interessados em contingenciar ao máximo a Operação Lava-Jato e se viabilizar eleitoralmente por meio de liberação de cargos e verbas, ou seja, o velho toma lá da cá. A consequência é o descontrole dos gastos públicos. Será muito difícil o governo alcançar a meta fiscal deste ano, um deficit primário de no máximo R$ 139 bilhões, se a economia seguir lenta, como no primeiro semestre, e a arrecadação continuar decepcionante. Ainda neste mês o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deverá decidir se uma nova meta para 2017, mais acessível, que terá que ser submetida ao Congresso.

Lava-Jato

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, voltou à carga contra o presidente da República. Pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que inclua Michel Temer como investigado no inquérito que apura se integrantes do PMDB formaram uma organização criminosa para desviar recursos da Petrobras e de outros órgãos públicos. O pedido será analisado pelo relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Luiz Edson Fachin.

Assim, a Operação Lava-Jato continua sendo um espectro que ronda o Palácio do Planalto e a cúpula do PMDB. A investigação contra Temer no caso JBS foi congelada pela decisão da Câmara, mas será retomada quando a acabar o mandato. A poderosa coalizão formada para barrar a denúncia atuará no sentido de contingenciar a investigação, o que já vem acontecendo. Os sinais de inflexão na Lava-Jato vêm de todos os lados.

A “delação premiada” do publicitário Marcos Valério, já encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela Polícia Federal, foi um sinal de enfraquecimento de Janot. A nomeação da nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge sinaliza essa inflexão a partir do próprio Ministério Público.

No âmbito do governo, medidas administrativas foram tomadas para reduzir a equipe da Polícia Federal que atua em Curitiba e redistribuí-la para outros estados. A grande mudança, porém, será a substituição do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra, que já arruma as gavetas e negocia a sucessão.

 


O julgamento é político

Para uma parte da oposição, como é o caso do PT, alongar a crise e desgastar o governo pode ser melhor até do que afastar Temer

A votação de hoje na Câmara dos Deputados sobre a admissibilidade da denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o presidente Michel Temer é um julgamento político. Não tem nada a ver com a consistência ou não das acusações, uma atribuição do Supremo Tribunal Federal (STF), que julgará Temer se a denúncia for aceita ou congelará o processo até que seu mandato acabe.

Essa é a regra do jogo, estabelecida pela Constituição de 1988, para garantir o equilíbrio entre os poderes e o Estado de direito democrático. Ou seja, para evitar que um poder não eleito, no caso o Judiciário, provocado pelo Ministério Público Federal, afaste um governante eleito com apoio de uma maioria eventual no Congresso. Pela mesma razão, todo presidente da República é blindado pela Constituição: não pode ser investigado por atos cometidos antes do exercício do mandato.

Essa blindagem, porém, foi rompida quando Temer recebeu o empresário Joesley Batista em sua residência oficial, o Palácio do Jaburu, e por este foi gravado em conversa privada e nebulosa, supostamente para acertar propina, segundo a denúncia do procurador-geral Rodrigo Janot. Com a delação premiada do dono da JBS, Temer ficou na berlinda. Caso a denúncia seja rejeitada, como tudo indica, uma pedra será colocada temporariamente sobre o assunto, apesar do burburinho das ruas. A blindagem estará restabelecida.

É bem verdade que outra denúncia está sendo preparada por Janot, mas nada indica que isso modificará a situação no Congresso. É bom lembrar que a Constituição de 1988 foi elaborada durante o governo Sarney, que amargou grande impopularidade depois do fracasso do Plano Cruzado, até concluir seu mandato em 1989. Ou seja, foi concebida para evitar crises políticas que levem a rupturas institucionais. É preciso a total falta de governabilidade para que o afastamento do cargo ocorra, como aconteceu nos impeachments de Collor de Mello e Dilma Rousseff. Basta o apoio de 172 deputados para barrar qualquer intenção de destituição do presidente da República.

Nos bastidores do Congresso, consta que Temer somente não renunciou ao mandato porque foi aconselhado a resistir pelo ex-presidente José Sarney, o político mais longevo em atividade no país, cuja influência no governo se mantém, mesmo já estando sem o mandato de senador. Sarney viveu todas as crises políticas desde 1955. Temer foi incentivado a usar todo o poder de que dispõe na Presidência para barrar a denúncia. E não está vacilando nisso.

Maioria
Hoje, 11 dos 12 ministros que são deputados devem voltar à Câmara para votar a favor de Temer (a exceção é o da Defesa, Raul Jungmann, que é suplente). É uma sinalização de que o jogo está mesmo pesado e aqueles que não conseguirem mobilizar suas bancadas ficarão lá mesmo, na Câmara, não voltarão aos seus cargos. O partido que ficou na maior saia justa foi o PSDB, cuja bancada federal é majoritariamente a favor da denúncia. A cúpula da legenda, porém, trabalha para rejeitá-la , inclusive o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Não interessa ao governo adiar a votação; somente à oposição. Para uma parte da oposição, como é o caso do PT, alongar a crise e desgastar o governo pode ser melhor até do que afastar Temer. Mas o Palácio do Planalto tem interesse em encerrar o assunto ainda hoje, com a maior demonstração de força possível. Mesmo com a certeza de que a denúncia será barrada, um resultado no qual o governo não mostre músculos poderosos pode ser o começo do fim. Outra denúncia será apresentada por Janot, antes de completar seu mandato, em setembro, e há muitas medidas provisórias que precisam ser aprovadas no Congresso.

Temer precisa do apoio de pelo menos 257 deputados para demonstrar que tem força para barrar a denúncia e também para garantir a sua governabilidade. Essa contabilidade é importante diante da sua agenda legislativa. Não se trata apenas da reforma da Previdência, que para muitos subiu no telhado. Com o estouro das contas públicas, o governo precisa aumentar impostos e mudar a meta fiscal, cujo deficit previsto é de R$ 139 bilhões, mas já estourou. Se não mudar a meta, Temer pode ser enquadrado em crime de responsabilidade. E aí a situação se complica ainda mais.

 

 


O eleitor espreita

A mais de um ano das eleições, os políticos não querem ficar no sereno. Precisam da máquina estatal para fazer política nos seus estados e municípios

Uma das características da política brasileira é o fato de que somos uma democracia de massas, do ponto de vista da escala de eleitores e do voto direto, secreto e universal; ao mesmo tempo, temos um sistema eleitoral e partidário que bloqueia o seu desenvolvimento no sentido da renovação de costumes políticos, o que nos faz presas fáceis do patrimonialismo e do clientelismo. Esse tipo de contradição já nos levou a algumas rupturas institucionais e, neste momento, submete a duro teste de resistência o regime constitucional vigente desde 1988, pois as vísceras da nossa política estão expostas pela Operação Lava-Jato.

Na verdade, é um velho dilema nacional: de um lado, a política controlada pelas elites; de outro, a sociedade civil, na qual os cidadãos têm um caminhão de direitos, mas permanecem na arquibancada. É aí que surge um fenômeno que marca o nosso desenvolvimento: a busca de espaços na estrutura do Estado para influir nos destinos do país, uma vez que os partidos políticos mantêm a sociedade à margem da política.

A crise na base do governo Temer reflete isso. Em circunstâncias normais, um governo com 5% de aprovação popular não teria a menor chance de sobreviver, mas não é o que acontece. A mais de um ano das eleições, os políticos não querem ficar no sereno. Precisam da máquina estatal para fazer política nos seus estados e municípios.

Muito provavelmente, o Palácio do Planalto conseguirá barrar a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o presidente da República, cuja admissibilidade está na pauta do Congresso para ser votada, quiçá amanhã mesmo. Se houver quórum para votação, bastará Temer ter um de 342 votos para os governistas rejeitarem a proposta. Por essa razão, setores da oposição não pretendem dar quórum para votação enquanto não estiverem em número superior a isso, o que é improvável. Previsões conservadoras do Palácio do Planalto garantem que há pelo menos 250 deputados federais fiéis a Temer.

O imponderável
Historicamente, no Brasil, o liberalismo tem duas vertentes: uma conservadora, que evoluiu do escravagismo para o neoliberalismo; e outra radical-democrática, que evoluiu do abolicionismo republicano para o nacional-desenvolvimentismo. Mas é o positivismo castilhista que acabou levando a melhor na configuração do Estado brasileiro, graças à Revolução de 1930 e ao golpe de 1964. Por causa disso, a forte presença na máquina pública, desde a República Velha, é o principal instrumento de participação política para as camadas “mais esclarecidas” da população.

Positivistas reconhecem os direitos civis e sociais da grande massa trabalhadora, mas não valorizam e prestigiam a democracia representativa. Preferem atuar como poderosas corporações na máquina administrativa ou como “tecnocratas sem partido”. Apostam no paternalismo e na intervenção do Estado para resolver os problemas da sociedade. Há que se considerar também o fato de que o positivismo no Brasil desaguou no nacional-populismo. Sua recidiva mais recente ocorreu nos governos Lula e Dilma, nos quais o jacobinismo foi abduzido pelo “transformismo” petista.

A redemocratização do país, com a Constituição “Cidadã” de 1988, ampliou tremendamente os direitos sociais — desenhou um Estado de bem-estar social que só existe no papel —, mas não resolveu o problema do exercício democrático da cidadania. E ainda “estatizou” os partidos políticos, seja pela via dos meios de funcionamento regulados pela Justiça Eleitoral, seja pela forte presença de seus militantes e quadros na máquina do Estado, que é partidarizada.

Resultado: é muito fácil cooptar os partidos e seus quadros para o governo, mesmo impopular; e muito difícil fazer política e conseguir uma vaga no parlamento estando fora da máquina pública, seja federal, estadual ou municipal. Mesmo partidos robustos, com uma proposta política moderna, têm dificuldade para fazer política fora da estrutura do Estado.

Em contrapartida, devido ao nosso sistema eleitoral e partidário, que privilegia os grandes partidos e o controle dos seus caciques sobre as legendas, cada vez mais o chamado voto de opinião tem dificuldade para se fazer representar no Congresso. Mas isso é agora uma contradição tremenda, haja vista o peso e a influência crescente das redes sociais.

Dois momentos são significativos quanto a isso: as manifestações espontâneas de 2013 e a campanha do impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Nas eleições municipais passadas, o imponderável rondou o status quo e um tsunami varreu da cena política prefeitos candidatos à reeleição e seus candidatos; o imponderável de 2018 é um fenômeno parecido. Na verdade, o eleitor “astucia coisas” e espreita a política.


Entre a ordem e a malandragem

As Forças Armadas estão empregando o conceito de “guerra assimétrica” . Isso tem a ver com combate ao terrorismo. Faz sentido, o tráfico de drogas atua como uma espécie de guerrilha urbana

Desde sexta-feira, mais de 10 mil homens das forças federais reforçam a segurança no Rio de Janeiro, por decisão do presidente Michel Temer, que resolveu enfrentar o problema da violência e do crime organizado no estado. Em entrevista coletiva, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, afirmou que o decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) permitirá a atuação das Forças Armadas (são 8,5 mil homens do Exército e Marinha, principalmente) com poder de polícia, em caráter permanente, até o fim de 2018 (renovado), com ações de inteligência, operações especiais e patrulhamento preventivo, para desmantelar o crime organizado e desalojá-lo dos territórios que hoje controla.

Há muitas questões envolvidas nessa intervenção que merecem reflexão, a começar pelo fato de que as Forças Armadas, desta vez, estão empregando plenamente o conceito de “guerra assimétrica”. Na doutrina militar, isso tem a ver com combate ao terrorismo. Mas faz sentido, se levarmos em conta que o tráfico de drogas no Rio de Janeiro reúne as condições ideais para atuar como uma espécie de guerrilha urbana: dispõe de uma topografia favorável, uma base social robusta e uma fonte permanente de financiamento.

A iniquidade social nos territórios ocupados pelo crime organizado facilita o recrutamento permanente de crianças e adolescentes, que logo se tornam soldados do tráfico. Além disso, a proximidade de um mercado consumidor com alto poder aquisitivo, principalmente na Zona Sul do Rio, faz da venda de drogas uma atividade econômica importante na economia informal; a recessão e a crise fiscal, porém, fizeram o movimento cair e a alternativa dos traficantes para financiar suas atividades são o roubo de carga e os arrastões em praias, túneis e avenidas da cidade.

Pura ironia da história. Onde fracassou Carlos Marighella, o líder da guerrilha urbana contra o regime militar, vence o traficante Fernandinho Beira-Mar. Com a diferença de que o primeiro foi assassinado pelos órgãos de segurança e o segundo está muito bem protegido de seus inimigos num presídio de segurança máxima. Depois do colapso das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), os morros do Rio de Janeiro voltaram ao controle dos traficantes. Quem mostra bem a realidade do tráfico nas favelas cariocas é jornalista Caco Barcelos, num livro intitulado Abusado, o dono do Morro Dona Marta.

Malandragem

Os cariocas sempre glamourizaram a malandragem e prezam uma cultura de transgressão, o que naturalmente também tem suas consequências. Uma delas é a dificuldade para estabelecer uma justa relação entre a questão da segurança pública e a defesa dos direitos humanos. A esquerda carioca, por exemplo, odeia as forças de segurança pública.

As origens da Polícia Militar do Rio de Janeiro estão bem descritas num clássico do romantismo, Memórias de Um Sargento de Milícias, de Manoel Antônio de Almeida. Escrito em meados do século 19, a trama do livro ocorre no tempo de Dom João VI. Leonardo, o protagonista principal, é um jovem irrequieto e transgressor, que se envolve com a mulata Vidinha e passa a sofrer as perseguições do major Vidigal, um caçador de malandros e vagabundos (àquela época só havia traficantes de escravos). Para não ser preso, é forçado a se alistar. Mas continua arruaçeiro e desobedece seguidamente ao major. Por isso, acaba preso. Entretanto, consegue a liberdade graças à ação de uma ex-namorada de Vidigal, Maria Regalada, que lhe promete, em troca, a retomada do antigo afeto. Leonardo não só é solto, como é promovido. Com a ajuda do Major, se torna sargento de milícias. Os arquétipos de Leonardo e Vidigal estão vivíssimos na tropa e na oficialidade da PM fluminense.

O problema é que, agora, depois do fracasso das UPPs, o pacto perverso entre a banda podre da polícia e os traficantes se rompeu. Em consequência, policiais militares estão sendo mortos com muita frequência pelos traficantes, que resolveram escorraçá-los de seus territórios. A crise financeira do estado e a desmoralizaçao completa da elite política local levaram a segurança pública ao colapso. A alternativa encontrada para restabelecer a ordem, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, foi a intervenção das Forças Armadas.

Nessa intervenção, porém, além das inúmeras questões aqui suscitadas, existe um ingrediente político importante. A ação é vista no Palácio do Planalto como uma grande jogada de marketing político, na qual o presidente Temer acredita que pode melhorar a sua popularidade, ao empunhar as bandeiras da ordem e do combate ao crime organizado. A população aplaude a iniciativa e espera que dê os resultados almejados. De fato, não deixa de ser uma oportunidade para reposicionar sua imagem, em meio ao desgate provocado pelas denúncias da Operação Lava-Jato e às vésperas da votação do pedido de admissibilidade da denúncia contra o presidente da República pela Câmara.

 

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Janot esvazia as gavetas

Raquel Dodge assumirá a PGR com a mesa cheia de processos polêmicos. A presença de procuradores considerados “xiitas” pelos políticos na equipe de transição assustou alguns integrantes do governo

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, promete esvaziar suas gavetas em agosto, antes de concluir seu mandato à frente do cargo. O ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), já está trabalhando em Brasília, se preparando para a retomada das sessões da Corte, em linha com a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia. Nos meios políticos, por causa disso, especula-se que a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer pode ser encaminhada ao Congresso na próxima segunda-feira, véspera do dia marcado para a votação da primeira.

Janot pretende encaminhar todos os pedidos de investigação e denúncias baseados nas delações premiadas da Lava-Jato até a passagem do cargo para a nova procuradora-geral, Raquel Dodge, marcada para 18 de setembro. No Ministério Público Federal, há grande expectativa quanto à equipe de transição montada por ela, que deverá se assenhorar dos casos previstos e ficará com um tremendo abacaxi nas mãos. Raquel Dodge assumirá a Procuradoria-Geral da República com a mesa cheia de processos polêmicos, que deverá arquivar ou dar seguimento. A presença de procuradores considerados “xiitas” pelos políticos na equipe de transição assustou alguns integrantes do governo.

Nesse meio-tempo, a temperatura política deve subir, com o acirramento do choque entre o governo e o MPF. Ontem mesmo, houve um bate-boca entre o procurador federal Athayde Ribeiro Costa e o ministro da Justiça, Torquato Jardim. Na entrevista coletiva sobre a prisão de Aldemir Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras, Costa acusou Jardim de não procurar saber quais são as necessidades da Operação Lava-Jato ao fazer mudanças na equipe da Polícia Federal em Curitiba, extinguindo o grupo que atuava exclusivamente na força-tarefa local: “Sequer consultou a força-tarefa sobre o quanto de investigação tinha e o quanto de necessidade de efetivo havia. É uma responsabilidade dele essa diminuição, e temos que fortalecer a Polícia Federal”, afirmou o procurador.

Segundo Costa, no Ministério Público Federal, está claro que a Lava-Jato é prioridade. “É assim com o doutor Rodrigo Janot e certamente será com a doutora Raquel Dodge”, disse. Desde 6 de julho, a equipe passou a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (Delecor). O ministro da Justiça rebateu as críticas: “Vejo a crítica como infundada. Basta olhar o meu passado profissional (…), você não encontrará nenhum gesto de crítica ou desapreço à Lava-Jato”, disse Torquato Jardim. E tirou por menos o fato de não ter visitado a força-tarefa em Curitiba: “Não me constava do protocolo do ministério que eu devesse fazer visita oficial à Lava-Jato. Se ele acha isso necessário, vamos combinar um café”, declarou. Segundo Jardim, a Lava-Jato atua em 16 capitais e em Brasília, por exemplo, já é maior do que em Curitiba.

Homem da Dilma

O ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras Aldemir Bendine, homem da confiança da ex-presidente Dilma Rousseff, foi preso na manhã de ontem na 42ª fase da Operação Lava-Jato, batizada de Cobra. Ele foi um coringa à frente do banco e da petroleira. Suspeito de receber R$ 3 milhões da Odebrecht, acabou sendo detido na casa da filha, em Sorocaba (SP), às vésperas de viajar para Portugal. O executivo só tinha uma passagem de ida, marcada para hoje. O Ministério Público descobriu sobre a viagem por meio de escuta telefônica legal.

“É importante destacar que o MPF encontrou apenas a passagem de ida, não significa que não havia a passagem de volta”, ressalvou o procurador Athayde Ribeiro Costa. Segundo ele, a prisão foi motivada também pelo fato de Bendine ter nacionalidade italiana e de haver indícios de atividade criminosa após a deflagração da Lava-Jato. O executivo é acusado de pedir R$ 17 milhões à Odebrecht para rolar uma dívida da empresa com o Banco do Brasil, mas não recebeu o valor. Na véspera de assumir a Petrobras, teria pedido R$ 3 milhões para não prejudicar os contratos da estatal com a empreiteira, segundo delação de ex-executivos da empresa. O valor teria sido pago em 2015.

Pesquisa

Pesquisa do Ibope divulgada ontem mostra nova queda na avaliação do governo do presidente da República, Michel Temer (PMDB). Segundo o levantamento, a aprovação de 5% é o menor índice desde o início da série histórica do instituto, que começou em março de 1986. Antes do resultado de Temer, o pior havia sido o do ex-presidente José Sarney, que, em junho/julho de 1989, teve 7% de ótimo/bom. O instituto de pesquisa ressaltou que, por conta da margem de erro da pesquisa de dois pontos percentuais para mais ou para menos, tecnicamente Temer e Sarney estariam empatados. O governo foi considerado “regular” por 20% dos entrevistados, e “ruim/péssimo”, por 70%. O levantamento do Ibope, encomendado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), foi realizado entre 13 e 16 de julho e ouviu duas mil pessoas em 125 municípios.

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A queda de braços

O atabalhoado lançamento do Plano de Demissões Voluntárias (PDV) para servidores públicos federais atropelou a equipe econômica e gerou tensão entre a Fazenda e o Planalto

Os números divulgados ontem pelo Banco Central e pela Secretaria do Tesouro representam, respectivamente, um passo à frente, dois atrás. Explico: o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu, por unanimidade, baixar os juros básicos da economia brasileira de 10,25% para 9,25% ao ano. Foi o sétimo corte seguido na taxa Selic, o que já era esperado pelo mercado. Um passo à frente para a economia. No mesmo dia, as contas do governo registraram um deficit primário de R$ 56,09 bilhões no primeiro semestre deste ano, segundo a Secretaria do Tesouro Nacional. Foi o pior resultado para o período desde o início da série histórica, em 1997, ou seja, em 21 anos, o que não se esperava. Vale dois passos atrás.

A política monetária mira a meta de inflação, que despencou por causa da recessão; já a política fiscal visa controlar o deficit público, que não para de subir. Até então, o maior rombo para esse período havia sido registrado em 2016, chegou a R$ 36,47 bilhões no primeiro semestre. É o terceiro ano seguido em que as contas ficam no vermelho. O resultado primário considera apenas as receitas e despesas, não leva em conta os gastos do governo federal com o pagamento dos juros da dívida pública. Ou seja, o governo está gastando mais do que deveria, onde não deveria; e deixando de fazê-lo em áreas vitais.

Essa situação reflete uma queda de braços entre a equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o do Planejamento, Dyogo Oliveira, que atua em sintonia política com o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ex-titular da pasta, e o núcleo político do Palácio do Planalto. O atabalhoado lançamento do Plano de Demissões Voluntárias (PDV) para servidores públicos federais, por exemplo, atropelou a equipe econômica e gerou muita tensão entre Meirelles e Dyogo, que ontem ganhou a queda de braços, ao emplacar no plano a isenção de Imposto de Renda e de pagamento de INSS para quem aderir, o que pode ser inconstitucional (mais um privilégio para servidores em relação aos demais assalariados).

A decisão sinalizou para os agentes econômicos que a política econômica está com a blindagem fragilizada no Palácio do Planalto. O ministro do Planejamento, desde o desbloqueio das contas inativas do FGTS, tem levado a melhor, graças ao apoio do núcleo político do governo, principalmente Jucá, que conhece o Orçamento melhor do que ninguém no Congresso. Os números, porém, são muito teimosos. De acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional, as receitas totais recuaram 1,2% em termos reais (após o abatimento da inflação) de janeiro a junho deste ano, na comparação com igual período de 2016, para R$ 664,8 bilhões. As despesas totais, ao contrário, avançaram 0,5% em termos reais, na comparação com os seis primeiros meses do ano passado, para R$ 604,27 bilhões.

Previdência

Na verdade, a Fazenda opera numa faixa muito estreita de manobra, por causa das despesas obrigatórias. Além disso, o rombo da Previdência Social avançou de R$ 60,44 bilhões, nos seis primeiros meses de 2016, para R$ 82,86 bilhões no mesmo período deste ano, um aumento de 37,1%. Para 2017, a expectativa é um resultado negativo de R$ 185,7 bilhões.

Enquanto os economistas do governo fazem projeções considerando a frieza dos números, o Palácio do Planalto analisa os riscos. No momento, o pior dos mundos para o governo é a admissibilidade da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Temer, não o problema fiscal. Passada essa ameaça, teoricamente, a questão da Previdência passa a ser uma prioridade capaz de reagrupar a base governista. O governo acredita que terá condições de aprovar a reforma no Congresso e, assim, sair da armadilha fiscal. É uma aposta no ponto futuro.

O problema é que os humores do Congresso no segundo semestre já não serão iguais aos do primeiro, porque as eleições de 2018 estão logo ali e o governo amarga grande impopularidade. Dependendo da forma como a denúncia da PGR for rejeitada pelo Congresso, como é mais provável, o governo pode não ter força para aprovar uma reforma da Previdência que enfrente o deficit no curto prazo. Mitigada em razão das alianças para rejeitar a denúncia contra o presidente da República, a reforma da Previdência pode ser mais uma fuga pra frente e ter caráter meramente simbólico, ou seja, mostrar que Temer mantém a narrativa das reformas.

 

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