Fernando Gabeira: Uma visão de campanha
Por enquanto, os candidatos hipnotizam com suas propostas. Não se preocupam em mobilizar, dividir papéis. Nesse sentido, é uma campanha analógica, embora, paradoxalmente, tenha invadido as redes sociais
Estou em Boa Vista, pela quarta vez visito a fronteira Brasil-Venezuela. No princípio era apenas um aviso de que algo poderia sair do controle. Nas últimas viagens, era uma certeza.
O chamado socialismo do século 21 foi pro espaço. Seus estilhaços caem dentro do território brasileiro, na forma de onda migratória, crise energética, revolta e violência. Logo no Brasil, arruinado por uma experiência de esquerda e hoje governado pelos parceiros eleitorais do PT.
Não sei se isso vai repercutir na campanha eleitoral brasileira. É tudo tão longe. E aqui não temos o hábito de avaliar criticamente o passado. A esquerda comporta-se como se nada tivesse acontecido. Sua proposta nostálgica é uma viagem ao início do século, voltar a ser feliz.
Não se discute o processo de democratização, sua esperança de usar o Estado para a redução das desigualdades, superar por meio de uma ação de governo todos os grandes problemas do País. A própria Constituição foi escrita nessa ânsia de promover a justiça social, com juros limitados a 12% e uma previsão de imposto sobre grandes heranças. Ficou no papel, mas revela um pouco do espírito da época, que acabou encontrando sua maior expressão no governo de esquerda.
Ainda hoje, a ilusão de que o governo vai resolver todos os grandes problemas sobrevive. Os próprios candidatos revelam seus programas, dizem o que vão fazer em cada área, como se estivessem vendendo o serviço que nos prestarão.
Há pouco espaço nesse tipo de discurso para a participação social, exceto consumir bens e serviços. O PT, por exemplo, tende a igualar felicidade ao aumento de consumo. Um bom exercício para seus militantes seria, por exemplo, refletir sobre esta questão: muita gente diz que votaria em Lula, mas quase ninguém, exceto CUT e MST, se mobiliza para tirá-lo da cadeia.
Minha hipótese é de que todos recebem bem a ideia de aumento de consumo, mas poucos se interessam por valores. No caso de Lula, pode até ser que não se movam baseados num valor: o respeito à independência da Justiça. Mas se isso é verdade, como explicar sua opção eleitoral?
Parto da esquerda para avançar no espectro e constato que a maioria dos candidatos se apresenta como alguém que vai realizar inúmeras tarefas, como se estivesse vendendo seus serviços a clientes cuja única missão é comprá-los. Dificilmente mencionam nos debates o papel que destinam à sociedade na grande tarefa da reconstrução. Basta votar certo, isto é, no orador, que tudo se vai resolver a partir do esforço e competência dele.
O interessante, sem querer criticar os candidatos, pois os tempos são duros, é que se apresentam como aspirantes a um cargo e prometem trabalhar bem. Mas não ousam exercer uma liderança, definindo as tarefas conjuntas de governo e sociedade. No momento em que a hipótese de interação aparece na campanha, ela é inadequada e, ainda assim, respondida com a tradicional afirmação: isso é tarefa do governo e não devemos envolver as pessoas.
Refiro-me à proposta de Jair Bolsonaro de liberar a compra de armas. É possível afirmar que não é o melhor caminho, mas com outro argumento: o de que a participação da sociedade deve focar a informação, a autodefesa com a ajuda da tecnologia, celulares, aplicativos.
Sempre vai aparecer alguém para dizer: e se um assaltante entra na sua casa, armado, de que adianta o telefone celular? De fato, nessa circunstância há pouco a fazer. Mas dentro de uma outra perspectiva, câmeras, vizinhos antenados, sistemas de alarme, tudo isso pode fazer um estranho ser detectado antes de entrar numa casa. É apenas um exemplo, até prosaico, para indicar a sensação de lacuna que sinto na campanha.
A sociedade brasileira teve esperanças e ilusões. Elas se perderam no caminho. Mas precisam de alguma forma ser renovadas.Um escritor espanhol costumava dizer que uma sociedade sem esperança e ilusões é como um monte de pedras na beira de um caminho. O que às vezes os candidatos parecem dizer é isto: reconheço seu ceticismo, mas vou trabalhar muito bem e quando concluir minhas tarefas o País estará novamente de pé.
O que a esquerda propõe é renovar as esperanças num projeto fracassado. Por seu lado, a direita nos remete ao dístico da bandeira: ordem e progresso. Ordem com uma política de segurança rígida e progresso por meio de uma economia liberal.
Uma simples frase inspirada no positivismo não é capaz de abarcar a complexidade do momento. Mesmo porque o progresso hoje é visto também com desconfiança, num momento em que as ameaças ao planeta se tornam visíveis. Progresso para continuar ou acabar com a sobrevivência humana.
O próprio conceito de ordem não se limita à segurança pública. A corrupção é uma desordem, o gasto irracional da máquina do governo é outra, assim como obras inacabadas, vulnerabilidade biológica com o colapso da saúde pública.
Reconheço que é muito difícil sintetizar num slogan uma saída para o Brasil. No passado, quando se tratava apenas do progresso, Juscelino nos propôs avançar 50 anos em 5. Tenho a impressão de que agora, num momento eleitoral, é preciso falar de crescimento para 13 milhões de desempregados.
Mas creio que cada vez mais amadurece entre as pessoas a hipótese de que a educação pode ser o motor dessa nova fase nacional. Seria preciso alguém afirmando que, além de suas tarefas presidenciais, nos levaria a uma sociedade mais bem educada, alguém que propusesse essa nova esperança, acreditasse mais na sociedade do que no próprio governo e a liderasse para esse objetivo.
Por enquanto, os candidatos hipnotizam com suas propostas. Não se preocupam em mobilizar, dividir papéis. Nesse sentido, é uma campanha analógica, embora, paradoxalmente, tenha invadido as redes sociais.
Como ela está no começo, merece o benefício da dúvida: são reflexões provisórias.
Fernando Gabeira: Meditando com Daciolo
Todos os líderes populares do momento se expressam nessa linguagem direta, cheia de incorreções, mas sem a frieza do texto
Quando vi o Cabo Daciolo subir a montanha, anunciando que iria expulsar a maçonaria e os illuminati do Brasil, cheguei a pensar: é uma campanha singular no planeta, um candidato na cadeia e outro caminhando para o hospício. Teosóficos, cabalísticos, neopagãos e rosacruzes que se cuidem.
Mas é inegável que ele tem uma coerência estratégica: quer entregar o país a Deus. Sua atuação parlamentar confirma, pois tentou alterar o texto da Constituição: todo poder emana de Deus, e não do povo.
Semana passada estava lendo por acaso um livro que falava do poder da transmissão oral . Todos os líderes populares do momento se expressam nessa linguagem direta, cheia de incorreções, mas sem a frieza do texto.
Um jornalista estrangeiro queria minha opinião sobre a campanha, baseada em dois nomes: Bolsonaro e Lula. Minha explicação para o Bolsonaro de hoje é a de que ele tenta encarnar duas grandes correntes: conservadores e liberais. Não era liberal em economia, mas se tornou liberal no caminho, unindo-se a economistas e intelectuais que expressam essa tendência.
Embora tenham pontos de convergência, como o respeito à propriedade privada, há um grande potencial de atrito nesse casamento. Na medida em que a economia avança, tende a se internacionalizar, levando a uma reação nacionalista, como a de Donald Trump.
Os liberais partem do indivíduo; os conservadores, da família. Esses pontos de partida potencialmente também conflitam. E digo isso não com a visão de um teórico, mas de alguém que observa a história dos costumes no Brasil.
Tive a oportunidade de andar nas ruas com o senador Nélson Carneiro. Testemunhei como as pessoas lhe agradeciam pela lei do divórcio. Na época, muitos achavam que seria um golpe mortal na família.
Hoje, creio, até os defensores da família tradicional podem constatar as mudanças na estrutura familiar, em muitos casos mantida apenas pela mulher. O próprio Jair Bolsonaro já se casou algumas vezes. A tensão entre o conservador e o liberal existe na própria vida particular do candidato.
Mas é uma aliança que alguns liberais querem. Um grupo chamado MBL, que aparece em inúmeras polêmicas, também tentou construir essa ponte, quando denunciou uma exposição com um artista nu.
Eles diziam que não condenam a nudez em si, mas uma exposição daquele tipo feita com dinheiro público. Buscaram um argumento republicano para estender a ponte entre as duas tendências, tão sonhada por alguns atores: conservar nos costumes, liberar na economia.
Essas tensões já existem no governo Trump. A tendência ao nacionalismo protetor já começa a assustar setores liberais. E, possivelmente, o comportamento pessoal de Trump, sua linguagem vulgar e aventuras com atrizes pornôs não devem ser um fator de orgulho para conservadores.
No campo da esquerda, vejo tensões de outra natureza. O PT foi obrigado a se radicalizar diante da prisão de Lula.
Se a direita já constitui uma espécie de rumo geral, ainda que contraditório, a esquerda liderada pelo PT se fixou na luta para liberar seu líder e, ao adotar um tom mais radical, parece resignada a perder a disputa pela aprovação da maioria. No meu entender, isso não significa um destino inescapável.
Há um caminho alternativo. Longo e difícil. Passaria, em primeiro lugar, por uma autocrítica da roubalheira que houve durante o governo do PT.
Em segundo lugar, de uma visão mais realista da conjuntura, sobretudo nas relações Estado e mercado. Entre os que querem privatizar tudo ou estatizar tudo, há sempre a possibilidade de discutir racionalmente o tamanho do Estado num momento histórico dado.
Finalmente, no campo cultural, das lutas identitárias, é preciso dialogar com as forças majoritárias, sem a pretensão de conquistá-las para suas ideias, mas sim de achar o momento exato de propor mudanças razoáveis, como Nélson Carneiro.
Finalmente, no campo político, era preciso renegar a afirmação de que os fins justificam os meios. Isto significa aceitar as regras do jogo, trabalhar dentro da lei.
Esse ponto é o mais difícil de ser compreendido no momento. Para salvar Lula, é necessário condenar a Justiça.
Fernando Gabeira: Eleger ou derrubar
Em plena campanha, não sei se estamos realmente escolhendo um presidente ou cavando uma crise para que ele se afunde, como afundaram seus antecessores. O Congresso votou uma bomba fiscal e o STF, um aumento que vai repercutir nas contas públicas. No calor da luta política, os candidatos falam em investir. Mas como, se as despesas da máquina do governo vão aumentar?
Tive de explicar a alguns amigos por que tenho uma relação cordial com Bolsonaro. Não sabiam que o conheço há duas décadas, e convivemos no Congresso durante 16 anos e inúmeras viagens Rio-Brasília. Foram 16 anos de divergência no campo dos costumes sem que se tenha perdido o diálogo.
Da mesma forma, conheço quase todos os outros candidatos. Admiro sua coragem. Nunca estive com o Cabo Daciolo, por exemplo, mas o considero uma versão light do russo Iorudivi, um louco de Deus.
Ele não usa correntes amarradas no corpo, mas tem as mesmas visões de cura. Daciolo afirmou que soube por Deus que a deputada Mara Gabrilli iria andar em breve.
São homens e mulheres que se dedicam a uma tarefa muito difícil. É possível que alguns não saibam o quanto. E que alguns tenham até más intenções.
Considero fundamental que todos possam apresentar suas ideias. Na última eleição entrevistei os que estavam fora do debate, porque não pontuaram o suficiente nas pesquisas.
Certamente o farei de novo, com a tática de sempre: nem cúmplice nem algoz. Tudo o que posso fazer é estender uma corda para que escalem a montanha ou se enforquem.
Quanto mais transparência, pelo menos teoricamente, chega-se mais facilmente a uma boa escolha. É possível dizer que nem sempre foi assim, e nem sempre será. Mas não há outra lógica melhor.
Nunca fui tao moderado, reconheço. Mas uma leitura cautelosa destas eleições mostra esquerda fragmentada, direita em ascensão, crise econômica. Para quem conheceu outros momentos históricos, essa combinação é perigosa.
O sistema político-partidário, do qual participei ao longo de alguns anos, está em frangalhos e só se sustenta movido a muito dinheiro público. Terminou um período de redemocratização que deixa grande número de descrentes na importância da própria democracia.
A primeira preocupação é não jogar fora o bebê com a água de banho. O processo democrático precisa se aprofundar, mas em novas bases.
De um modo geral, somos muito atentos aos golpes de Estado, mas subestimamos as outras formas que ameaçam a democracia através de sua erosão cotidiana. A melhor maneira que me ocorre é buscar algum consenso na análise de conjuntura. A esquerda comprometeu sua influência cultural em vários momentos. O mais grave deles foi a corrupção que atingiu sua credibilidade.
Mas, no meu entender, teve peso também aplicar políticas estatais que mexem com o cotidiano, sem um consenso majoritário, apenas por ter vencido as eleições. Essa suposição de que a minoria iluminada precisa conduzir o país em alguns temas da vida produz muitos ressentimentos.
O próprio Supremo, ao discutir a questão do aborto, corre o risco de decidir pelo Congresso, algo que não acontece em muitos países em que o Parlamento funciona. O argumento contrario é de que as coisas demoram a acontecer sem uma intervenção da vanguarda. No entanto, escolhas feitas por uma elite acumulam resistências que contribuem para movimentos contrários com resultados imprevisíveis.
Não tenho a pretensão de ter o segredo para repactuar o diálogo político no país. A única formula que conheço é tentar suprimir ofensas e se concentrar na troca de ideias.
As ofensas acabam reforçando emocionalmente soluções simples para problemas complexos. Ideias geram dúvidas, suscitam revisões — enfim, são o melhor veículo para sair dessa maré.
Os debates entre candidatos começaram. Ainda há pouco de linguagem egocêntrica, cada um repisando suas teses, sem levar em conta a pergunta. A tarefa agora é levá-los à maior clareza possível não só sobre o que vão fazer, mas como vão fazer e com que dinheiro, nesse pântano fiscal em que nos metemos.
Precisamos escolher alguém para eleger, e não para derrubar no ano seguinte.
Fernando Gabeira: Para onde correm os candidatos
Se a esquerda está resignada a perder agora para ressurgir adiante, é um equívoco
Tive a oportunidade de conhecer as posições de alguns candidatos à Presidência ao participar de uma sabatina. Tentarei um projeto, como realizei nas eleições passadas, de entrevistar todos os outros, independentemente da pontuação em pesquisa. De um ponto de vista jornalístico, é interessante saber o que se passa na cabeça de alguém que decide ser candidato num momento tão complicado no País. Mais do que ninguém, tenho dúvidas sobre o futuro do próximo presidente, sobretudo a partir de uma quase certeza de que a renovação do Congresso será modesta.
Minha visão da conjuntura recomenda algo que chamo, brincando, de catastrofismo emancipatório, expressão que o sociólogo Ulrich Beck usa diante das mudanças climáticas. Isso significa deixar de apenas falar do desastre, mas encarar a situação com a clareza de que o dilema é cooperar ou morrer.
Creio que a esquerda também conta com uma grande crise adiante. Mas ela se fragmentou e parece ter se resignado a perder as eleições e ressurgir adiante como alternativa. Se for isso mesmo, é um equívoco.
Não creio que uma próxima crise possa ser vista como um movimento de gangorra que alterne forças esgotadas do sistema político-partidário. Um período PSDB, outro período PT, como se a sucessão no poder fosse natural como o ritmo das estações de ano.
Para mim, vivemos uma ofensiva das forças tradicionais semelhante, em muitos aspectos, à que houve nos EUA. No Brasil, esse movimento vem de longe. A esquerda cultural sempre foi dominante. Mas, quando ela passa a ser também a cultura do governo, a contestação de suas ideias ganhou muito mais força. Isso porque a maioria no Brasil – acho eu com minha experiência de lutas minoritárias – é conservadora. Nem sempre o aval que ela dá para dirigir o País se estende a questões de comportamento. É um pouco como política externa. Você faz a política do país, e não a do partido vencedor.
Isso não significa conformar-se a uma situação estática. É possível em debates pacíficos encontrar soluções razoáveis.
Toco neste tema cultural por duas razões. A primeira, porque não é o mais importante quando se constata que a democracia brasileira está em risco. Em seguida, porque no fundo sou muito cético a respeito do poder da política sobre estes temas diante do impacto do avanço do capitalismo, da interconexão do mundo, do avanço tecnológico.
Um ponto central em que a política importa muito é na escolha do sistema educacional. Nesse campo, questionei Bolsonaro sobre seu projeto de escolas militarizadas. E certamente questionarei a esquerda sobre o método Paulo Freire. Mas isso é apenas um aspecto que pode evoluir para uma discussão mais ampla e, quem sabe, um quase consenso para seguir adiante.
É um lugar comum responder educação quando se pergunta por um grande problema no Brasil. E os candidatos respondem também com a mesma ênfase. No entanto, ela ainda não foi discutida com muita clareza e o tempo é muito curto.
Por que essa necessidade enfatizar programas diante de uma previsível crise que pode congelar as melhores expectativas? Porque programa é uma destas coisas que podem sobreviver à crise, como um elemento da nova fase.
O problema da segurança pública é outro que merece um esforço de cooperação. O próximo presidente tem de saber o que fazer, pelo menos um pouco mais que os anteriores, que subestimaram o tema.
Mas tudo isso se faz à sombra de uma dificuldade maior: as relações do eleito com o Congresso, algum tipo de reforma política.
É difícil de reformar uma estrutura entrincheirada, na qual a maioria quer manter os velhos vínculos franciscanos do toma cá, dá lá. Às vezes penso que uma solução francesa poderia ajudar. Consiste em separar as eleições presidenciais das parlamentares. Depois de eleger um presidente, a maioria teria a chance de dotá-lo de uma grande bancada de apoio.
Uma solução mais audaciosa seria escolher de uma vez o parlamentarismo. Traria a vantagem de resolver mais rápido as inevitáveis crises, e talvez por meio de sucessivas quedas de gabinetes pudesse surgir um senso de responsabilidade inexistente hoje.
Tenho apenas intuições. Mas é um problema que marcará a próxima Presidência. Os partidos conseguiram, por meio do dinheiro público, um passaporte para manter seu velho jogo. Naturalmente, vão clamar pela legitimidade do voto conseguido em circunstâncias desiguais.
Mais influenciável que o governo, o Congresso pode ser controlado também por pressão popular. Alguns desastres foram evitados assim. Nem todos. Em alguns momentos, decidem enfrentar a opinião pública, sobretudo quando seus interesses diretos estão em jogo.
A única possibilidade no horizonte seria uma pressão conjugada do eleito e da opinião pública. Ainda assim, isso demandaria uma grande sensibilidade para avançar sem romper.
Todo este cenário é envolvido numa situação econômica grave, com demandas sociais crescentes.
É com este olhar preocupado que sigo os candidatos à Presidência. Qualquer um deles vai enfrentar o problema. Quem achar que pode ir tocando o barco sem mudanças pode desembocar numa crise mais grave.
E quem achar que tira proveito dela para voltar ao poder vai se perder mais no caminho.
Talvez marcado pelas próprias experiências, um quadro de profunda crise, esquerda fragmentada e direita em ascensão me parece complicado demais para leituras equivocadas.
A viagem à Rússia reforçou em mim a ideia de que outras variáveis, às vezes, conseguem neutralizar nas pessoas os anseios por democracia. As pesquisas na América Latina já indicam um crescimento dos que a dispensariam na vida política de seu país.
É um momento distinto da alegria das Diretas Já. O processo político-partidário se degradou, afastou-se da sociedade. O segredo é não jogar fora o bebê com a água do banho. E, se possível, reanimá-lo.
Fernando Gabeira: Museu do Eclipse
Campanha de Bolsonaro produz nova palavra, o ‘heteroabraço’
Depois da Copa, começa a campanha eleitoral no Brasil. O momento é de composições, alianças, escolha de vice. Costumo defini-lo como um momento em que os jogadores ainda estão no vestiário, antes de saírem para o campo aberto sob o olhar da plateia.
Mas as notícias que vêm do túnel indicam um personagem que parece rivalizar com os candidatos: o centrão.
Participei de quase todas as campanhas até 2010. Estou procurando entender esta e vejo o papel do Congresso mais explícito. O Congresso provou o gosto de sangue através da fragilidade dos dois último governos, Dilma e Temer. Ambos precisaram muito dele para sobreviver. E o centrão ganhou força e vai usá-la para que tudo continue o mesmo, sobretudo a ocupação partidária da máquina, a troca de votos por verbas; enfim, o velho fisiologismo.
O centrão, com a fortuna do Fundo Partidário, preservara seu número de deputados e enfraquecera o presidente eleito com sua bomba fiscal.
É uma forma mais articulada do que no passado. Mas também eles têm mais medo do que no passado.
Enquanto os times não entram em campo, fora do túnel, no mundo real observe também algo mais novo nas eleições brasileiras.
Como no passado, algumas figuras da sociedade pensam em se candidatar e desistem. Desta vez, o número foi um pouco maior, e observe um grande peso das famílias na desistência dos possíveis candidatos. Sempre foi assim. Mas, no passado, a condição de político não repercutia tanto na vida da família, e a resistência era mais pela perda da proximidade do ente amado.
Agora pesa também, creio eu, além da ausência, o fato de que a pessoa vai transitar num universo ético desprezado, e isso repercute demais no cotidiano familiar.
Até os bancos brasileiros têm um pé atrás e classificam os parentes também como pessoas politicamente expostas.
Aproveitando que ainda estou no vestiário, cuido de alguns detalhes. É o período também em que surgem as denúncias. Uma delas me interessou não pelo conteúdo, mas pela palavra: museu do eclipse.
É um museu em homenagem ao maior eclipse da história, ocorrido em 1919 .
Quando li museu do eclipse, pensei: certas palavras não podem cair na minha frente, pois esqueço logo a trama política, aliás bem tediosa.
Por que um museu do eclipse em Sobral?
Atribui-se ao eclipse de 1919 uma grande importância científica, pois foi possível comprovar aspectos da teoria da relatividade, inclusive em Sobral, onde se concentrou um grupo de cientistas brasileiros e ingleses.
Um eclipse que trouxe luz, algo para comemorar.
Peço licença para usá-la num contexto mais amplo. A tendência a manter o velho estilo de governar diante de nossa carência de mudança vai transformar o Brasil num museu do eclipse.
As convenções que vi pouco falaram de uma perspectiva para o país. A sensação apocalíptica se acentua quando você vê conservadores discursando, mandando abraços héteros, confessando heteropaixões.
No passado, todo mundo mandava abraços e pronto. Ninguém se preocupava em definir sua orientação sexual.
O tema ganhou uma nova dimensão nos últimos anos, e tornou-se no discurso de Bolsonaro uma bandeira eleitoral.
Sem perceber o clima de intensa divisão, acaba produzindo uma nova palavra, o “heteroabraço”. E, consequentemente, o homoabraço.
Não haverá abraço possível entre um hétero e um homo, fica uma lacuna no vocabulário. A única saída é tentar reencontrá-la na sua forma mais simples e cristalina: abraço.
Com essas palavras, a gente vai construindo o museu do eclipse. Aliás, a fala do Ciro Gomes prometendo botar juízes e promotores em caixinhas e restabelecer a autoridade política. Essa vai na íntegra.
São apenas registros. Não vejo uma campanha como uma sucessão de bater e apanhar. Na verdade, no Brasil, todos apanhamos tanto da realidade que o ideal seria achar uma boa forma de discutir.
Vi uma entrevista do Alckmin no “Roda Viva”. Sua resposta sobre o crescimento do PCC em São Paulo e sua expansão pelo Brasil. Ele respondeu que todos os líderes do PCC foram presos.
Mas foi incapaz de elaborar que, apesar disso, a organização cresceu, que alguma coisa está errada, que os mecanismos de repressão ao crime organizado ainda são frágeis.
Claro que enfatizar um lado positivo faz parte do discurso de um candidato. Mas para mim, que vejo de fora, soa assim: nós prendemos os líderes; agora, se estão crescendo, isso é problema deles.
Se pudesse escolher outro cenário, certamente o faria. Mas esse é o que teremos, e será uma longa viagem não só num país muito estranho, mas também num mundo muito estranho.
Fernando Gabeira: Sísifo e o Centrão
Eleitores podem colocar a pedra lá em cima para vê-la, de novo, rolar montanha abaixo
Algumas coisas que deveriam estar juntas correm em dimensões ainda diferentes no Brasil, realidades paralelas: o aumento do índice de mortalidade infantil, como sintoma de decadência, e a campanha eleitoral no Brasil. O desencontro da vida real com a política se deve também ao momento em que campanha significa muito arranjo entre partidos, composições, definições de tempo de TV, escolha de vices. É como se o jogo ainda estivesse sendo discutido no vestiário, antes que saia para o campo aberto, diante da plateia.
Mas as notícias que vêm pelo túnel já nos dão matéria para pensar. O famoso bloco parlamentar chamado Centrão é uma das referências do quebra-cabeças. Esta semana, o Centrão decidiu apoiar Geraldo Alckmin. E o mercado reagiu positivamente à notícia.
Uma aliança com o Centrão significa a continuidade do que está aí: ocupação política dos cargos, troca de votos por verbas, enfim, um roteiro que não é necessário relembrar.
O mercado, que aparentemente almejava mudanças, acabou se conformando com a continuidade. Seria isso a manifestação de um senso comum? Não sei bem o que seria um senso comum. Aliás, Leonardo da Vinci tem um belo desenho de crânio em que apontou uma pequena cavidade onde seria o senso comum, o espaço para onde convergem todas as sensações.
Transplantado da fantasia física de Da Vinci para o campo social, o senso comum também poderia estar em outra manifestação: a das pessoas que dão as costas para a política porque rejeitam seus sórdidos métodos. Estas querem mudança, certamente, mas provocam a continuidade. O oposto do que desejam.
A rigor, continuidade dificilmente haverá. Se o mesmo esquema for mantido, as coisas vão piorar. O Congresso já armou uma bomba fiscal que certamente tornará um novo presidente mais vulnerável.
A experiência recente do Congresso foi a de tratar com dois presidentes fracos que precisavam dele para sobreviver no cargo. Dilma caiu, mesmo tentando negociar. Temer teve êxito na negociação para escapar. A correlação de forças entre presidente e Congresso foi alterada por essas experiências recentes. E isso, é claro, vai repercutir no ano que vem. Não importa o presidente vitorioso, de qualquer forma, ele terá de atravessar essa barreira de troca de votos por cargos e verbas.
O mundo real continuará em perigosa decadência. Até gripe se tornou mais letal, num país onde o sarampo reaparece.
Os custos de serviços públicos ineficazes foram sentidos em 2013 e expressos no desejo de ver o dinheiro dos impostos ser mais bem empregado. O impacto da corrupção foi sentido a partir de 2015, com os primeiros lances da Operação Lava Jato. Existe o perigo de que todo este processo de tomada de consciência se sinta frustrado com o desenrolar de uma eleição que pode prolongar a crise.
Impossível prever muitos lances à frente, no entanto torna-se mais claro que, embora o foco se ache na eleição presidencial, é no Congresso que se armam algumas bombas, inclusive a tentativa de acabar com a Lava Jato.
Não vejo saídas brilhantes num cenário em que os partidos, cheios da grana, vão permanecer no poder. Exceto uma atenção maior na eleição para o Congresso e a tentativa de criar uma minoria que defenda a sociedade deste mecanismo vampiresco.
Ainda assim, num tipo de luta como este, a minoria tende a ser isolada e as vitórias se contam em desastres evitados, picaretagens abortadas. O rumo, mesmo, é difícil de mudar.
Nem tudo é sombrio. Graças à Lava Jato, aumentou o risco nos processos de corrupção. Nas composições políticas de agora dificilmente vai entrar dinheiro vivo. É um avanço relativo, porque o rateio dos cargos públicos pode se tornar uma máquina de fazer dinheiro.
Nesse raciocínio, algo que talvez pode ser útil é enfatizar no debate a importância da relação presidente-Congresso e tentar liberá-la, ainda que parcialmente, de seu caráter fisiológico.
Não é uma solução do tipo “seus problemas acabaram”, mas cairia bem no Brasil o sistema francês: eleições parlamentares na semana seguinte à eleição presidencial. O calendário fortalece uma aproximação programática, a tendência dos eleitores é a de garantir maioria para seu presidente eleito.
Isso nem sequer foi pensado numa reforma política, cujo principal objetivo foi o de perpetuar as forças existentes com seus mecanismos de poder. Duas tímidas exceções foram a adoção de uma cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais.
O quadro descrito aqui não é um destino inexorável. Mas o fato de que o Centrão negocia em bloco antes mesmo das eleições e está preparado para exercer uma influência decisiva nos anos que seguem é preocupante. Desde já, aparece como um dos nós a serem desatados.
Como o jogo está sendo discutido no vestiário, não veio ainda a campo aberto e o grande público não se manifestou, ainda existe esta variável da reação popular em aberto.
Mas algumas das regras foram escritas pelos próprios jogadores: até mesmo a latitude dessa variável foi reduzida.
Restam apenas a crise e sua dolorosa pedagogia, sobretudo quando se torna mais aguda. De um modo geral, atinge os mais vulneráveis, e o sistema político, por meio de aumento de impostos e outros sacrifícios sociais, tenta se manter incólume.
Caminhamos para o futuro com um modo de governar chamado governo de coalizão que contém todos os vícios do passado. Como Sísifo, a maioria dos eleitores brasileiros pode colocar a pedra lá em cima para vê-la, de novo, rolar montanha abaixo.
Os filósofos discutem uma saída para essa maldição entre suicídio e revolta. Em termos políticos, certamente haverá muitas nuances, mas algum tipo de revolta é inevitável no horizonte.
A Venezuela está se derretendo e terá inflação de um milhão por cento. Parece ficção, mas já aconteceu na Alemanha em 1923 e na Rodésia no princípio do século.
Dominados por predadores, da esquerda ou da direita, os países se tornam quase inviáveis.
Fernando Gabeira: Livrai-nos de tanta loucura
No Brasil, Congresso decide quebrar o país, em meio à crise; nos EUA, Trump critica aliados europeus e se põe aos pés de um líder autoritário
Nos últimos dias, tenho a impressão de que estão enlouquecendo nas altas esferas do poder e talvez não possamos fazer muito a respeito. No Brasil, o Congresso aprovou um pacote de benesses de mais R$ 100 bilhões. Considerando a crise, isso representa grandes problemas em 2019: falta de recursos, atraso em pagamentos, quebradeira. E os candidatos à Presidência não protestaram. Protestar contra a farra de gastos tira votos. E eles dividem o tempo com precisão: uma coisa é o período eleitoral, outra, o mandato. Não percebem que, ao se calarem agora, perdem a possibilidade de resistir lá na frente. Isso pode significar não só crise política séria, mas até impeachment.
De qualquer forma, o futuro imediato do Brasil está comprometido por essas aventuras irresponsáveis. Há pouco o que fazer, exceto votar bem, mas ainda assim por mais que se acerte aqui e ali, o conjunto do Congresso será assustador. A pesada máquina do atraso continuará esmagando as chances de crescimento sustentável, renovação política e recuperação da confiança. Lá fora, a loucura ainda é maior. O presidente dos EUA critica duramente os aliados europeus e vai se prostrar aos pés de um líder autoritário russo. A manobra de Trump, assim como a dos deputados brasileiros, é uma ação disruptiva. Não usaria o termo subversiva, pois ele implica alteração da ordem. O que está acontecendo é apenas algo destinado a bagunçar, criar as bases instáveis para a chegada do caos.
Os parlamentares brasileiros querem apenas alguns votos para garantir sua permanência no poder. Eles já articularam uma reforma que lhes garante o dinheiro público para disputar as eleições. Insatisfeitos, cavam o próximo abismo sabendo que dinheiro não lhes faltará. Em último caso, há sempre o aumento de impostos. O problema é que a sociedade brasileira parece aceitar. A suposição de que o Estado pode gastar ilimitadamente ainda é fato na cabeça de muitos, mesmo na dos que não são diretamente interessados em conquistas corporativas.
O que torna a questão mais angustiante, ainda: a loucura dos dirigentes não é apenas um descaminho lógico em suas cabeças, mas algo que tem base na própria tolerância social. Da mesma forma, o que acontece na conjuntura mundial não revela apenas um desvario individual. Dizem que os russos têm documentos que comprometem Trump, daí sua subserviência em Helsinque. Creio que a interpretação mais correta passa pelo fascínio de Trump por governos autoritários. Ao mesmo tempo, ele representa a democracia mais poderosa do mundo.
Muitas coisas estão mudando. Rejeitar os laços culturais e políticos com uma Europa que sempre foi referência parece-me tão iconoclástico para o Ocidente como os talibãs destruindo estátuas budistas. É assim que o mundo caminha. Salvaguardas existem no Brasil e nos EUA. É sempre possível atenuar o estrago. Mas é preciso muita água para apagar um incêndio que vem de cima. Quando deputados decidem quebrar o país e Trump coloca-se ao lado da Rússia contra aliados e o próprio serviço de Inteligência americano, entramos num espaço mais difícil do que o de combate à corrupção e à incompetência.
Não basta supor que estejam enlouquecendo. É preciso entender como as sociedades não só convivem como, de certa forma, sustentam essa loucura. Não se trata de realizar um esforço idealista para afirmar que exista uma razão inequívoca e que ela triunfará sobre os desvarios do poder. Tudo que nos resta é trocar de ilusão na tentativa de nos aproximarmos mais da realidade. A ideia de que é possível gastar sem limites, no entanto, parece-me um componente de tragédia. Hegel dizia que na tragédia há um conflito entre o certo e o certo. Muitas vezes, no entanto, ela é apenas o resultado da imprudência humana.
Fernando Gabeira: Manhã de domingo
Tentativa de libertar Lula exige um debate sério sobre os rumos do país, mas parte substancial da esquerda se fixa no líder petista
Há uma velha música regravada pelo Faith No More chamada “Easy” (like Sunday morning). O easy, na canção, significa tranquilo, leve, descontraído. Ao pé da letra, quer dizer fácil. Creio que os três deputados do PT acharam que seria fácil, como a manhã de domingo, libertar Lula de sua prisão em Curitiba. Acompanhei tudo a 12 mil quilômetros de distância, incrédulo e bastante frio em relação ao desfecho. Cheguei a pensar que estava ficando blasé, ou mesmo que tinha perdido contato com a realidade do país. Só me desfiz do complexo de culpa quando soube que, no olho do furacão, Lula pensava mais ou menos da mesma maneira: não vai ser fácil me tirar da prisão — teria dito ele para seus deputados.
Mais tarde, minha sensação se confirmou no vídeo em que José Dirceu comemorava a saída de Lula na cadeia. Ele estava tão emocionado quanto estaríamos depois de uma vitória do Brasil contra o Panamá. Seu ar era muito mais de travessura do que de vitória. Concluí, mesmo vendo tudo de tão longe, que estávamos diante do que os russos chamam de provokatsiya, uma tentativa contundente de colocar um tema na agenda, independentemente do resultado. Como a imprensa, de todos os horizontes, precisa eletrizar sua plateia, mantê-la colada ao desenrolar de um fato, só se falou nisso no domingo. E não foi por acaso que alguns jornalistas estrangeiros compararam o fato a uma novela.
A origem disso está numa análise mais realista do PT, segundo a qual seu grande líder só teria chance de ser libertado se houvesse uma grande comoção popular. Isso não aconteceu nos primeiros meses. A própria solidariedade internacional é minguante, quando não acontece nada no país. Isso vale para prisioneiros em diferentes posições no espectro político. Faz um abaixo-assinado, como de um defensor dos direitos humanos na Chechênia, mas com o tempo só resta escrever: não podemos esquecer nosso preso, lembrem esse nome etc. A vida continua, outros presos entram em cena, alguém faz greve de fome na Crimeia, de novo a advertência: cuidado que pode morrer etc., mas ainda assim a vida continua.
Diante desse quadro desolador para ele, o PT decidiu arriscar um golpe de mão. Como na sua cabeça a Justiça é partidarizada, não resta outra saída exceto usá-la quando um juiz amigo estiver de plantão. O resultado, em termos eleitorais, foi ocupar o espaço de debate no fim de semana. Candidatos, presos ou não, costumam comemorar a ocupação de espaço, sem analisar o conteúdo. Seu nome fica na boca do povo. No entanto, ao escolher uma tese de partidarismo na política, o PT deixou muitas pessoas com medo, não só do que seria capaz, se voltasse ao governo. Mas com a possibilidade de cada grande partido tirar um dos seus nos plantões de fim de semana. O Brasil seria uma terra sem lei. No fundo, não aconteceu nada e o país discutiu esse não acontecimento durante toda a semana. Ele ocupou o espaço pós-Copa do Mundo, precisamente o espaço necessário para o início de um debate sério sobre os rumos do país. Até o momento, uma parte substancial da esquerda está ausente dele, porque se fixou na libertação de Lula.
O próprio PSOL, através de seu candidato Guilherme Boulos, fez uma intervenção que sensibiliza quem está na Rússia. Disse que Moro saiu da praia de tanguinha para manter a prisão de Lula. Não havia evidência de que Moro estava na praia, muito menos que usava tanga. O que Boulos quis insinuar com isso? Não é por acaso o candidato do partido que defende os gays? Não tem um deputado gay no Congresso e um ícone na figura da vereadora assassinada do Rio Marielle Franco?
Na vida política do Brasil, parece que tudo se derrete no ar. E, no entanto, temos toda uma reconstrução pela frente.
Fernando Gabeira: A Copa da realidade
Saindo do País vemos como nos atrasamos e como em alguns pontos estamos retrocedendo
Sempre que uma Copa do Mundo é realizada, suscita em mim uma ingênua pergunta: é possível canalizar a energia nacional para outro tema que não seja o futebol? A reconstrução do Brasil, por exemplo?
A pergunta é ingênua porque uma Copa do Mundo é competição internacional com objetivos bem definidos e regras claras. É fácil torcer pelo Brasil e a vitória se mede de forma inequívoca a favor de quem marca mais gols.
Os observadores da História recente da Rússia - escrevo de Moscou - indicam que o país vivia uma crise muito grande na virada do século e essa crise se caracterizava também por falta de uma ideia unificadora. Foi quando surgiu Putin prometendo recuperar a grandeza perdida.
Nunca chegamos a ser uma potência mundial. Não temos, portanto, a nostalgia de glórias pretéritas. No entanto, mesmo descontando a megalomania e o voluntarismo do período do petismo, podemos ser mais importantes do que somos no momento.
Num processo eleitoral com tantas divisões, é irreal pensar numa unidade que nos arrebate como a possível conquista da Copa do Mundo. Mas quem sabe não seja possível buscar essa visão quase utópica comendo pelas beiradas, como se diz na gíria política.
A CNI produziu uma série de documentos e produziu debates entre os candidatos, buscando algum nível de consenso entre as suas propostas para o país. Assim o farão outras entidades de classe. O comandante do Exército recebeu os candidatos não para propor políticas, mas para ouvi-los e preparar a instituição para trabalhar com aquele que entre eles for o eleito pelo processo democrático.
Ao menos na aparência, a tarefa do eleitor será escolher bem seu candidato. Mas não creio que a tarefa se esgote aí, entre nós, eleitores com alguma experiência. É possível traçar um roteiro que nos leve a alguns pontos de unidade, a algumas saída em que, não importa quem seja o vencedor, o Brasil saia ganhando.
Por exemplo: quando ouvimos a opinião de milhares de brasileiros sobre o que o País precisa, é muito grande o número dos que apontam obras inacabadas como um dos nossos grandes problemas. É possível levar os candidatos a se comprometerem, nos primeiros cem dias de governo, a apresentar um plano de conclusão dessas obras. É simplesmente impossível desejar que o mesmo plano valha para todos, um vez que as prioridades de cada um são diferentes. Mas o simples fato de obter um compromisso nesse campo, contando com as diferenças individuais, já seria uma vitória.
Da mesma forma, é possível destacar o saneamento como um tema nacional, tão inequívoco como a necessidade de derrotar em campo a Sérvia ou a Costa Rica. Cabem aí tantas variações quanto os palpites num bolão, escalar Gabriel de Jesus ou Firmino, usar 4-3-3 ou 4-4-2, não importa. O que realmente importa é ganhar essa partida. E nossos candidatos como um técnico de seleção têm de apresentar seu projeto e ser cobrados por ele.
Outro tema que nos pode unir é o combate à corrupção. Sei que alguns o desprezam. Mas são tão poucos como os que não se importavam com uma vitória do Brasil na Copa.
Aqui também, apesar da aparente unanimidade, há opiniões diversas. O projeto de iniciativa popular, dilacerado na Câmara, tem muitos pontos questionáveis, até mesmo à luz da Constituição. No entanto, uma resposta ao problema também é uma questão nacional, se consideramos as opiniões em todos as enquetes populares do tipo o Brasil que eu quero. A esquerda brasileira despreza esse tema, mas, assim como em 1992 em nosso país, ele foi um dos mais importantes nas eleições mexicanas, em que Obrador triunfou.
Enfim, embora não seja fácil impulsionar alianças dos candidatos, e, de qualquer forma, duas visões diferentes vão se encontrar no segundo turno, talvez seja possível costurar uma aliança de expectativas dos eleitores. Pessoalmente, conheço todos os principais candidatos. Não me sentiria confortável apontando seus defeitos ou exaltando suas qualidades. Meu esforço é escapar disso e encontrar uma área de atuação em que, de certa forma todos ganhem.
Os mais empolgados veem nisso uma forma de subir no muro. É uma ilusão: nada mais fácil do que acionar a metralhadora giratória num leque tão vulnerável de candidatos. O problema é que, saindo do Brasil, ainda que por um curto de período de tempo, é possível sentir como nos atrasamos e como em alguns pontos estamos retrocedendo.
De certa forma, os benefícios da Copa do Mundo escorreram entre os dedos em 2014. Os russos aproveitaram melhor. As cidades, como Moscou, viveram um momento de florescimento urbano real.
É cada vez mais necessário sentir a urgência de retomar o caminho das reformas econômicas e políticas. Os mais combativos verão o caminho através do conflito e das contradições. E até certo ponto têm razão. O problema é que nos últimos tempos essa tática acabou aprofundando a divisão do País e nos afastando cada vez mais de uma ideia unificadora.
Não seria o momento de uma inflexão? Do reconhecimento de que, apesar das divergências, é preciso trabalhar nos temas unitários para atingir um objetivo não tão inequívoco como vencer uma Copa do Mundo, mas pelo menos estar entre os melhores?
Temos tudo para isso: talento, extensão, recursos naturais, cultura. Claro que nessa lista estou omitindo nossos defeitos. Mas é exatamente disso que se trata: fixar nas qualidades e tentar um passo à frente.
Num simples artigo não é possível abordar todos os pontos em que uma expectativa unitária possa ser construída. Mas é em torno dessa ideia que pretendo trabalhar depois desta passagem pela Rússia, no momento em que arrumo as malas para cair na real.
Como sempre, ao som de Antonio Carlos Jobim, minha alma canta.
* Fernando Gabeira é jornalista
Fernando Gabeira: Com alma
Hoje, no Brasil, só se fala no jogo com o México. Talvez o mesmo não seja verdadeiro por lá. Ontem foi dia de eleições presidenciais, e a esquerda estava bem à frente, com Andrés Manuel López Obrador. No passado, as eleições mexicanas eram decididas nos bastidores de um partido, o Revolucionário Institucional (PRI). Agora, são para valer.
Foram eleições sangrentas, pois lá, como aqui, a violência é um fato cotidiano. Quarenta e oito pessoas — candidatos ou pré-candidatos — foram assassinadas no processo, entre elas, oito mulheres. O México que joga contra o Brasil talvez não esteja preocupado com Cavani, Lukaku ou Mbappé, e sim com o presidente Trump, que é o principal adversário no horizonte.
Os argentinos deram adeus. Ao contrário de grande parte dos brasileiros, tenho simpatia por eles. Pelo menos no passado, jogavam com alma, e isso é o bastante para me conquistar. Assim como Santo Agostinho em relação ao tempo, sei o que é alma, mas, se me perguntarem, não consigo definir.
Talvez possa falar de algumas expressões de alma, uma centelha, um brilho, uma garra, que não são idênticos ao talento e à técnica. Desde menino observo a alma, essa substância invisível, translúcida, e todos os golpes que o avanço econômico aplicou nela. A rígida divisão de trabalho, burocráticos prazos, tudo isso contribui para que se façam as coisas sem alma.
Charles Chaplin, de certa forma, toca no tema no filme “Tempos modernos”, de 1936. Hoje, a situação não é a mesma, mas o trabalho tornou-se supérfluo. Como buscar sentido no ofício, se o futuro aponta para a sua destruição?
Não queria tratar desse tema com pretensões intelectuais. Baseio-me na torcida do Flamengo, que não pode ser acusada de grandes voos teóricos. Basta olhar a história do clube para constatar que muitos ídolos não o foram precisamente pelo talento e pela técnica.
Celebrizado pela canção de Jorge Ben, Fio Maravilha chegava ao gol com emoção e raça. Só não entrava com bola e tudo por humildade. Fio Maravilha, nós gostamos de você. Depois dele, Obina, com o mesmo jeito atrapalhado, mas uma grande vontade e o carinho da torcida, apesar da técnica precária e de uma tenebrosa pontaria.
O futebol, como tudo, evoluiu, tornou-se mais ensaiado, mais cientificamente estudado. Talvez não exista mais lugar para Fios e Obinas. Fio Maravilha tornou-se entregador de pizza em São Francisco. Se conseguir se divertir com os bondes como se divertia com a bola, subir ladeiras abraçado numa marguerita com o fervor com que entrava nas áreas, nem tudo estará perdido.
Não se trata de negar a excelência e o avanço científico. Suspeito que o hipotético encontro de um time de hoje com um time do passado resultaria em goleada. Não creio que a vida possa ser sintetizada num jogo. Mas, se pudesse, o futebol seria muito melhor candidato do que o xadrez.
Num dia como hoje, portanto, ganhem ou percam, mas, por favor: com alma. Isso é decisivo não só contra o México, mas sobretudo contra os belgicanos, como dizia um locutor antigamente.
Talvez realize-se aí o duelo entre os dois melhores do mundo na atualidade. Há pouco espaço para cai-cai, estilista, limpeza de pele, pensem que no sofri etc. Seremos nós contra eles, e o mundo dos amantes do futebol olhando.
Fernando Gabeira: Uma janela para o mundo
Só existe um perdedor com o silêncio dos candidatos sobre política externa: a sociedade
Escrevo de São Petersburgo. Afinal, qual é o papel do Brasil no mundo? É o de tipo de assunto do qual muitos correm. Já temos problemas demais no âmbito doméstico, por que não deixar isso com os especialistas, concentrando na violência urbana, na corrupção ou mesmo nas peripécias da campanha eleitoral?
Para quem está fora, mesmo por um curto período, o tema não é tão marginal assim. Impossível ignorar o drama dos refugiados. Só se fala nisso, crise nos Estados Unidos por causa da decisão de Trump, arestas entre Franca e Itália, crianças separadas da família, ciganos na mira da expulsão na Itália. É o tipo de problema sem solução em curto prazo, com viés de agravamento.
Se consideramos nossa fronteira setentrional, lá também essa questão se vem complicando ao longo dos três últimos três anos. Apesar de a Colômbia ser ainda o destino preferido, por causa do idioma comum, os refugiados da Venezuela entram em massa por Roraima. Essa presença já produziu alguns atritos entre o governo local e Brasília.
Forçou a elaboração de um plano e jogou as Forças Armadas em parte de sua execução.
Nos Estados Unidos, mais precisamente na fronteira mexicana, vivemos um problema inverso, no momento em que Trump decide adotar normas mais rígidas para conter o processo migratório. Na verdade, talvez seja essa a contradição mais importante no mundo contemporâneo: a fluidez dos capitais e mercadorias ante as barreiras crescentes ao movimento da força de trabalho.
Todo país deve ter sua política sobre o tema. Mas é preciso admitir que soluções mais amplas dependem de muitos atores internacionais. Minha hipótese para uma política de longo prazo é de que países como Brasil e Canadá, por suas dimensões, poderiam representar um alívio para o tenso clima associado ao tema dos refugiados.
São países com condições diferentes. O Brasil vive uma crise econômica, tem quase 14 milhões de desempregados, na verdade, mal consegue cuidar dos seus, quanto mais receber gente de fora. No entanto, embora os países do norte já tenham esgotado sua capacidade de administrar o problema, não esgotaram seus recursos financeiros. Uma grande troca, escalonada no tempo, poderia liberar volumosos recursos para o Brasil receber refugiados.
Imagino que isso possa causar reações, até essa hipótese ser descartada por absurda, descabida, fora da realidade. Mas, no caso presente dos refugiados venezuelanos, o Brasil já está sobrecarregado e deveria pedir ajuda internacional. A partir dessa experiência, talvez fosse possível formular um plano estratégico de maior alcance, que atraísse grande volume de capitais e um novo impulso para o desenvolvimento.
Outro ponto que me levou a pensar no papel do Brasil foi ver imagens da população haitiana celebrando a vitória da seleção brasileira na Copa. Nos vídeos, a pequena multidão desfilava as cores verde e amarela, hasteou uma bandeira do Brasil e cantou o hino do Haiti.
Naturalmente, essa proximidade foi estimulada pela presença brasileira nas tropas de paz da ONU. Mas deixa bem claro que o futebol, não só nessa região do mundo, é um componente válido do chamado soft power que o Brasil, potencialmente, pode projetar no mundo.
Encontrei em Moscou um maestro que vivia na Sibéria, ouviu Manhã de Carnaval e, depois, algumas composições de Tom Jobim. Tornou-se um grande admirador da música brasileira e já gravou numerosos trabalhos inspirados nela para o público russo. Apesar da confusão e mesmo da desgraça que às vezes nos atinge no Brasil, não deixa de ser animador ser recebido com um sorriso de simpatia quando revelamos nosso país de origem.
Mesmo que minhas ideias sejam descartadas, a tese básica é de que precisamos voltar a discutir nosso papel no mundo: achar um pequeno espaço da campanha eleitoral para tratar do tema. Numa campanha americana é bem maior, porque o tamanho corresponde aos interesses e à presença deles no mundo. Numa dimensão mais modesta, seria interessante que os candidatos avaliassem os principais problemas internacionais, alinhassem nossas vantagens e desvantagens e formulassem um roteiro para o papel do Brasil no mundo.
Não há condições para tratar o País na campanha como uma ilha de prosperidade ou mesmo de decadência. Estamos ligados ao mundo e como a campanha começa logo depois da Copa, vale a pena introduzir essa dimensão no debate.
Na verdade, ela existe, sim, de forma fragmentária. Bolsonaro apoiou a saída dos Estados Unidos da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas. Ficaremos com a visão de Trump ou com a do conjunto de países que insistem no diálogo e na conciliação, mas dentro da ONU?
Ciro Gomes afirmou no programa Roda Viva que a oposição na Venezuela é fascista. Será isso mesmo? Como a vemos? Como vemos o governo Maduro, tão distante da democracia? Esses temas não definem quem ganha ou perde a eleição. Mas alguns votinhos, como o meu, pedem definições bem claras.
Pelo que vejo daqui, da Rússia, os debates entre candidatos serão mais raros no primeiro turno. A saída talvez seja consultar os programas, se é que já estão completos. Assim, ao lado de saúde, educação, segurança, talvez possamos incluir política externa.
A ausência de clareza sobre o tema não indica que os candidatos a deixarão de lado. Ao contrário, tendem a fazê-la de forma autocrática. Como acho que foi realizada, ao longo do tempo, a política do PT, focada nos países vizinhos com tendência bolivariana, gastando milhões com a ideia de projetar seu líder na América Latina e na África. E levando algum das empreiteiras.
São tópicos que fazem sentido na política da esquerda, no entanto, não foram discutidos amplamente. Os investimentos eram semiclandestinos e só vieram à tona com a eclosão da Lava Jato. Só há um perdedor com o silêncio sobre o tema: a sociedade.
Fernando Gabeira: Dura escalada
Exigimos muito dos nossos craques, mas é difícil controlá-los a partir da nossa ansiedade
Chego a Sochi num dia de sol. O Brasil escolheu bem o seu lugar na Copa: calor e vista para o mar. A minha está um pouco limitada por um prédio muito alto. O espírito da Barra da Tijuca está por toda a parte. O homem mais poderoso do mundo, Trump, é construtor de arranha-céu.
Queria dar uma escapada à Abecásia, mais precisamente a Gagra. Mas seria abusar dos patrocinadores. O pequeno país teve uma queda brutal em seu produto interno, e o desemprego ronda os 90%. Mas o lugar tem vistas maravilhosas diante do Mar Negro e produz tangerinas.
Tudo o que eu queria nestes dias de intenso trabalho: sol, mar e tangerina, como as que a gente compra nas estradas do Brasil. Vim pensando no caminho como é difícil a escalada para a conquista da Copa. Tive essa ideia ao ver as pessoas subindo a rampa para olhar o panorama de São Petersburgo, no alto da Catedral de São Isaac.
Como os torcedores e jornalistas se preocupam, sobretudo com suas estrelas. Messi está ansioso? Ficou mais calmo? Cristiano Ronaldo começou a dar porrada? Neymar caiu, não caiu, sentiu dores? Salah está zangado com a exploração política na Chechênia?
Cada detalhe é um Deus nos acuda. Neymar mancou, Messi vomitou, Salah vai deixar o time, o que deu no Cristiano Ronaldo?
Lembra-me um pouco o poema de Vinicius sobre filhos:
“Cocô está branco/ cocô está preto/ bebe amoníaco/ comeu botão”.
A recepcionista do hotel perguntou por minha Fan ID. Disse a ela que gostava, mas não era fan.
Os fans sofrem muito. Vi argentinos cantando pela manhã no aeroporto. Creio que emendaram uma grande festa, porque ouvi o barulho no hotel.
Neste momento em que escrevo, os alemães foram derrotados pela Coreia do Sul, eliminados da Copa. Imagino a grande tristeza.
O treinador da Argentina disse que Messi vibra como um verdadeiro argentino. Certamente havia dúvidas sobre sua condição de argentino. Com nossas preocupações, acabamos levando mais dúvidas ainda para os craques. Sei disso porque, quando começam a perguntar, é porque têm dúvida e projetam essa dúvida em você.
Andei passando material por WeTransfer para a tevê. Demorou 36 horas. De vez em quando, o próprio aplicativo perguntava: não se ofenda, mas você não é um robô?
Sempre respondi não, claro. Mas, às vezes, não acreditam e mandam você marcar nos quadrinhos onde há um carro, uma ponte, uma fachada de loja.
Às vezes, a pergunta muda de forma: você é 100% humano?
De tanto perguntarem, comecei a duvidar de mim mesmo e ansiar por algum tipo de resposta na coluna do meio: um pouco robô, quase 100% humano.
Creio que exigimos muito dos nossos craques. Não são robôs, pelo contrário: 100% humanos. E, nessa condição, podem xingar a mãe do juiz, devolver um pontapé, cometer erros grotescos — tudo é possível.
Verdade é que ganham fortunas. Não têm medo de perder o emprego, de faltar dinheiro no fim do mês, como a maioria dos mortais. Mas o dinheiro não é uma blindagem perfeita.
Paul McCartney contou que uma vez a mãe dele apareceu num sonho e disse: deixa rolar. E ele fez “Let it be” com base nessa frase. A impressão que tenho é que, se deixarmos rolar, nossos times acabarão por chegar ao alto da montanha. Ou então se perderão no caminho.
É muito difícil controlá-los a partir da nossa própria ansiedade. Os coreanos, pelo que vi, não jogam tanto futebol. No caso deles, é apenas deixar correr. E correm como se o Kim Jong-un estivesse atrás deles com um foguete atômico.
Aconteça o que acontecer, vou tentar achar umas tangerinas em Sochi. A última vez em que vi os sérvios de perto foi na Croácia, quando avançavam com seus tanques ornados por uma estrela vermelha.
Os jogadores suíços multados por um gesto político ainda se lembram deles no Kosovo. Deviam ter deixado rolar, seguindo nosso mestre Didi: fazer apenas a bola correr, sem nenhum gesto adicional