Fernando Gabeira: Um cão no supermercado

Percorrer o Brasil atenua o impacto das más notícias. A imprensa não pode deixar de divulgá-las: são parte da realidade

Florianópolis. De novo na estrada. Glória a Deus. Digo isso porque no período eleitoral entrevistei o Cabo Daciolo. No final da entrevista, me convidou para ser ministro de seu governo. Daciolo esperava vencer, no primeiro turno, com 51%. Aceitei o convite mas lembrei: “Olha, Daciolo, Deus costuma escrever certo por linhas tortas.” Tínhamos que estar preparados para a derrota.

Portanto, glória a Deus: de novo peregrinando pelo Brasil, constato o valor dessa escolha.

No meio da semana, telefonei para casa e soube de uma notícia triste: um cachorro foi morto a golpes de barra de ferro, no supermercado Carrefour. Logo na semana em que o cachorro do velho Bush comoveu o mundo deitado defronte ao caixão de seu dono.

Estava no meio de um trabalho com cachorros. Não podia fugir desse tema. Passei a tarde seguindo um cão-guia e seu dono pelas ruas de Camboriú, Itajaí e Navegantes.

É uma história sobre a escola de cães-guia Helen Keller, em Camboriú. A cadela se chama Alegria e é tão importante para o seu dono que ele tatuou no braço o nome e a pata de sua amiga. Impressionante segui-los, pois ela é muito concentrada, ignora latidos, paqueras e segue no caminho de casa perto do hospital de Navegantes.

Esta semana, conheci também Atobá, um labrador de cara grande. Ele é chamado de Doutor Atobá no Hospital Joana de Gusmão, onde faz um trabalho. Brinca com crianças com câncer e às vezes as acompanha nos seus dias finais.

Além disso, Atobá ajuda na terapia de crianças que sofreram paralisia cerebral ao nascer e ajuda os que têm problema de mobilidade.

Atobá vive na casa do cirurgião plastico Luís Augusto. É essencial para seu filho, que sofreu uma doença grave. Ele acredita que uma das qualidades terapêuticas do cão é despertar amor e lembra que na simbologia chinesa coração e cachorro se equivalem.

Foi uma longa conversa. Tenho espaço apenas para lembrar um detalhe essencial. Como cirurgião plástico num hospital infantil, ele conhece duas faces do cachorro, o amor da vida de seu filho, mas também as inúmeras reparações que teve de fazer em vítimas de mordidas de cão feroz.

Percorrer o Brasil atenua o impacto das más notícias. A imprensa não pode deixar de divulgá-las: são parte da realidade. Mas é animador ver experiências como a formação dos cães-guia, ainda tão poucos para a grande demanda nacional. É bom ver o país com seus lados diferentes, como o doutor Luís Augusto vê os cães. E continuar gostando muito.

Finalmente, numa semana dedicada a eles, não posso me esquecer dos cães farejadores de maconha no Colorado: foram aposentados com a legalização da cannabis. Espero, pelo menos, que tenham boas lembranças de seu longo período do labor olfativo.

De uma certa forma, voltarão à realidade assim como o Brasil no princípio do ano, quando o governo começa de fato. Por enquanto, as notícias dos bastidores são um pouco complicadas. Rusgas no partido do governo, intrigas entre generais e políticos. E as pautas-bomba no Congresso, ministro do STF prendendo gente em avião.

Uma nota sobre as atividades financeiras de um assessor do então deputado Flávio Bolsonaro: movimentou R$ 1,2 milhão em 12 meses e vive de salário.

Para os mais velhos, é uma cantiga que assombra, e esperamos que seja apenas uma alucinação de cães farejadores aposentados. O ano que vem trará as respostas. A cadela Alegria tem um método de trabalho que me encanta. É toda atenção quando é necessário. No momento de poupar energia, não vacila: encosta a cabeça no chão e olha demoradamente para o vazio, fecha os olhos, abre de novo.

Em termos políticos, pode ser um bom programa para as festas de fim de ano. Uma semana de trégua, se tanto, já bastaria.

A transição de governo foi um processo um pouco confuso. Os índios devem estar mareados com os balanços do barco da Funai. A nova ministra de Direitos Humanos declara que índio é gente. Pensei que isso estava resolvido há séculos, quando os religiosos perguntavam se índio tinha alma.

O ano que vem será quente mesmo para quem acha que o aquecimento global é uma invenção marxista.


Fernando Gabeira: Cuidado com dezembro

Agora é juntar os cacos, abastecer o motor econômico do Rio com o petróleo que restou, e subir de novo a montanha

O indulto de Temer e Pezão na cadeia são dois temas já batidos nesta manhã de segunda. Vejo um elo entre esses dois fatos, próximo de uma teoria conspiratória, mas não há razão para ocultá-lo. Tanto Temer quanto Pezão já trabalham de alguma forma com a ideia de uma passagem pela cadeia. É como se ja estivessem pensando numa próxima eleição, xerife da cela, quem sabe.

Temer sabe muito bem que incluir corruptos no seu indulto de Natal vai abrir um abismo maior ainda entre ele e a sociedade, que condenou pelo voto as velhas práticas da política brasileira. Mas, por outro lado, vai aumentar seu crédito junto aos presos, não só os que participavam da aliança no governo, mas também os do seu próprio partido: ex-ministros e parceiros.

Pezão declarou que tinha saudades de Sérgio Cabral e gostaria de abraçá-lo na cadeia. Disse também que gostaria de encontrar Lula. Nunca se sabe para onde vão te levar após a prisão.

Não é correta, se essa ideia for verdadeira, a tese de que os políticos brasileiros não veem um palmo diante do nariz. Quando houver tempo, poderemos até investigar os reflexos da passagem de tantos dirigentes pelas cadeias que alguns até ignoravam como funcionam.

Por enquanto, ainda temos que lidar com os seus rastros em liberdade. O indulto é um deles. É possível indultar presos por corrupção? A maioria dos ministros disse sim, afirmando que não há restrições a esse crime. Tratam de um presidente abstrato. Temer é investigado, duas vezes a Câmara lhe forneceu uma blindagem. Ele vai libertar presos da Lava-Jato, a mesma operação que desmantelou toda a quadrilha da qual é um dos principais remanescentes em liberdade.

Nessas circunstâncias, só resta o protesto nas ruas. Mas, ainda assim, o tema nos colhe num mês ingrato para protestos. Há 50 anos, o regime militar lançou o AI-5, endurecendo sua política e realizando a censura nos jornais com a presença de seus agentes no interior das redações.

O aniversário de meio século do AI-5 será no dia 13. Uma das lembranças mais nítidas que tenho do período foi, precisamente, a dificuldade de protestar. Não nos prendiam por isso, mas era um período de Natal: o “blim blão” dos sinos, o farfalhar de papéis enrolando presentes, o panetone em promoção. Ninguém queria saber de AI-5. Ainda bem que dezembro de 68 está longe, tanto o país quanto o Natal devem ter mudado nesse período. De qualquer forma, cuidado com dezembro.

Mais próximo de minha memória está a aventura de ter feito política no Rio de Janeiro e tentar, de alguma, forma derrubar a máfia bilionária que acabou arruinando o estado.

Em 2010, por exemplo, Cabral já gastava fortuna com robôs na internet. Chegamos a reunir documentos para oferecer à imprensa. Os robôs não falavam inglês, mas tinham um forte sotaque, escreviam frases grosseiramente traduzidas. Ninguém se interessou. O tema era muito abstrato naquela época. Era o mesmo que falar do rombo na camada de ozônio: ninguém o notava a olho nu.

Apesar de tudo, não restou ressentimento. Sobretudo no caso de Pezão. Em muitos desastres, o encontrei trabalhando. Sérgio Cabral não visitava os locais de tragédia. Como jornalista, entretanto, não pude deixar de comentar um tema, naquela época do escândalo dos guardanapos. O apartamento de Pezão tinha sido assaltado no Leblon e, segundo a notícia, foram levadas muitas joias. Soou estranho para mim que um homem aparentemente simples tivesse muitas joias em casa. O tempo passou, eles foram sendo presos aos poucos, hoje quase todo o governo está na cadeia, inclusive sua base parlamentar.

O Rio quebrou, foi preciso uma intervenção federal na segurança pública, o estado elegeu um homem desconhecido do grande público até as vésperas da eleição. Às vezes tento esquecer todo esse período sinistro. Os principais atores estão presos. Isso conforta parcialmente a opinião pública. Mas o legado ainda vai nos assombrar durante muitos anos. Foi uma calamidade que passou em nossas vidas e algumas consciências se deixaram levar. Agora é juntar os cacos, abastecer o motor econômico do Rio com o petróleo que restou, e subir de novo a montanha. Pra cima, é preciso fôlego.

Pezão entrou, outros serão soltos por Temer, que um dia será preso também. Não é um caminho linear. Murilo Mendes tem um verso em que diz: “Ainda não estamos habituados com o mundo/ Nascer é muito comprido.”

No caso do Brasil, então, o parto é muito prolongado.


Fernando Gabeira: Mais médicos, menos fantasia

Organizações humanitárias mostram que estar ao lado dos mais fracos não é, unicamente, consequência da visão socialista

Os cubanos foram embora. O Programa Mais Médicos não existe mais, tal como foi criado no governo Dilma. Sou otimista quanto ao futuro do programa. Talvez possa ser feito de uma forma melhor.

Breve, a discussão ideológica ficará para trás, e então poderemos nos concentrar no que realmente interessa: a saúde de milhões de brasileiros.

A grande oportunidade que está diante de nós é a ida de milhares de jovens médicos brasileiros para o interior. As condições salariais são atraentes. O dinheiro ficaria no Brasil. Mas não é esse o principal ganho. O encontro de milhares de jovens da classe média urbana com os rincões do Brasil pode representar para eles um grande aprendizado.

Já houve grandes momentos históricos em que esse encontro se deu. Na Rússia, no século XIX, quando milhares de estudantes foram compartilhar o cotidiano dos camponeses. Havia muito romantismo, ideias revolucionárias, uma visão idealizada dos pobres do campo. Embora o resultado tenha sido revoluções esmagadas, foi um período rico para a própria cultura russa.

Aqui, no Brasil, as idealizações não são as mesmas. Minha impressão é que os brasileiros vão encontrar no interior surpresas positivas sobre as pessoas que vivem lá. Os russos se decepcionaram porque esperavam ver nos camponeses um reflexo de suas fantasias urbanas.

A ida dos médicos brasileiros teria o mesmo valor pedagógico que a carreira oferece aos militares: percorrer diferentes pontos do país, sentir a diversidade, acreditar mais ainda no potencial do Brasil.

Não há contraindicação ideológica. Ouso dizer mesmo para uma juventude de esquerda dos grandes centros: o choque cultural seria benéfico. Certamente, sairia mais realista.

Meu primeiro trabalho na TV, creio em 2014, foi sobre uma cidade do Maranhão chamada Buriti Bravo. Já era uma aproximação com o Programa Mais Médicos. Uma visita às cidades mais desamparadas, no Maranhão e no Amapá.

Semana passada, procurei algumas pessoas como o escritor Antonio Lino, que fez uma dezena de viagens para escrever sobre o Mais Médicos. E também o sanitarista Hermano Castro, da Fiocruz.

Minhas primeiras conclusões: o programa é essencial para as cidades cobertas; ele pode ser feito majoritariamente por brasileiros, o que não significa que alguns estrangeiros não possam participar, dentro das regras do jogo. Constatei também que o gargalo é a formação desse tipo de médico. Isto estava previsto no programa de Dilma, mas não foi bem desenvolvido. É preciso ser realista. Apesar dos salários, ainda é muito difícil fixar um jovem médico no interior. A realidade me leva de novo ao mundo das ideias.

A única maneira de atenuar realmente o problema é uma valorização simbólica desse tipo de trabalho. Transmitir um pouco, por exemplo, a chama que ilumina um grupo como o Médicos Sem Fronteiras, que leva ajuda a pessoas em grandes dificuldades. No caso, o governo comprar essa ideia talvez não ajude tanto quanto se fosse aceita pelo mundo cultural. Não proponho heróis positivos, são pessoas de carne e osso que merecem um reconhecimento maior.

Tanto os cubanos quanto a esquerda encaram esse trabalho como o produto de uma visão socialista, e desafiamos a verem na medicina um mercado, e não adotarem suas teses.

Esquecem que a exportação de serviços médicos é um importante item no comércio exterior cubano. É um negócio de Estado. Não só o Médicos Sem Fronteiras, mas inúmeras organizações humanitárias no mundo demonstram que essa presença ao lado dos mais fracos não é, unicamente, uma consequência da visão socialista.

Para completar a semana, ouvi uma conferência do ministro alemão Cristoph Bundscherer num painel sobre indústria 4.0. Paradoxalmente, ele falava de um futuro tecnológico com diagnósticos à distância, portanto, com menos médicos.

Se combinarmos a formação dos novos médicos com uma abertura para o mundo tecnológico, é possível atenuar esse grande problema brasileiro.

No momento, temos um pepino. No futuro, talvez nos lembremos da passagem dos cubanos apenas como um doloroso aprendizado. É raro um contrato ser rompido assim, numa área tão sensível, sem que tenhamos salvaguardas. Isso faz parte do legado. Ideologias se interessam pelas ideias, não pelas pessoas.


Fernando Gabeira: Sobreviver ao ano que vem

Não sei se exagero, mas sinto-me como se fosse a luta pela sobrevivência de um país viável

É um momento de escolha de ministros, definição da estrutura do governo. Não importa o que saia daí, o que nos espera no ano que vem é inescapável: o Brasil pode quebrar. A reforma da Previdência não é só um momento de alívio para o governo Bolsonaro, mas também para 14 Estados em profunda crise financeira, entre eles Rio de Janeiro, Minas e Rio Grande do Sul.

Visitei Minas para ver melhor o que aconteceu nas eleições. Inédita na História, a vitória de Romeu Zema, do Partido Novo, contou com 71,8% dos votos. Foi um salto no escuro, preferível para os eleitores aos velhos partidos que dominaram o Estado: PSDB e PT.

A melhor forma de começar uma nova época é realizar a reforma da Previdência. Não resolve tudo, mas indica que o mais difícil foi feito. Paradoxalmente, a reforma é a maneira de seguir vivo até 2022, mas significa, no primeiro instante, uma perda de popularidade. Na Rússia, a reforma previdenciária roubou muitos pontos de aceitação do governo Putin. Sufocada pela Copa do Mundo, a resistência manifesta-se também numa desconfiança, uma sensação de perda.

Segundo o Moscou Times, essa reforma foi decidida por Putin, mas seu déficit talvez pudesse ser facilmente coberto pelos excedentes do petróleo. Mas e os investimentos, a defesa? O governo precisava se antecipar.

No caso grego, a reforma talvez não tenha desgastado tanto a esquerda no poder. Era claramente inevitável. E havia a pressão da União Europeia. O ressentimento acabou canalizado para Angela Merkel.

No caso brasileiro, a reforma da Previdência tem uma chance singular. Ela é claramente uma forma de neutralizar o processo de transferência de renda dos mais pobres para os mais ricos. Ela tem um quê de Robin Hood, mas esse encanto sozinho não basta para emplacá-la. Em primeiro lugar, será preciso convencer os pobres de que, no fundo, estão ganhando com as mudanças; em segundo lugar, e isso é colossal, vencer a resistência das corporações, algumas articuladas com partidos da esquerda.

O ajuste fiscal será a primeira grande prova tanto para Bolsonaro como para Zema.

O ano que vem marca o início de uma fase triunfante do liberalismo. Ele bateu o marxismo no terreno, mas também partilha com ele um certo idealismo. Um vê no Estado o caminho da salvação, o outro vê no mercado. Como observa John Gray na sua crítica à Nova Direita na Inglaterra, ambos ignoram que são construções humanas e, como tal, imperfeitas.

Uma conclusão de Gray é que essas correntes idealistas veem a vida política de uma forma que conduz a derrotas. Elas tendem a investir num projeto de esperanças transcendentais, numa época sem fé. O conselho realista de Gray é baixar a bola, aceitar a humilde tarefa de uma improvisação sem fim, em que um bem é comprometido para salvar outros, uma espécie de equilíbrio entre os males necessários da vida humana e a perspectiva sempre presente do desastre a ser despachada para outro dia.

Não chego a tanto. Ele teorizava sobre os liberais que concluíam sua passagem pelo governo. Aqui, os vencedores precisam pôr suas ideias em ação.

Mas não consigo esquecer a experiência vivida no Congresso. Vi muitos grandes projetos. E vi sua trajetória real. Alguns deles costumo comparar com o grande peixe pescado pelo velho Santiago no romance O Velho e o Mar, de Hemingway. Comido aos pedacinhos, chegou à praia apenas como um grande esqueleto.

Assim como foi com o marxismo, os liberais vitoriosos correm o risco do que se chama húbris ideológico. Húbris é uma palavra grega que traduzimos como excesso de autoconfiança. De modo geral, esse excesso de autoconfiança é inerente à nossa prática de perseguir princípios universais, esquecendo a política como uma humilde discussão racional, uma acomodação mutual, em busca de um modus vivendi.

De qualquer forma, o Estado brasileiro é uma carga pesada nas costas da sociedade.

Lembro-me de que há quase uma década já discutíamos isso, da ineficácia de algumas estatais aos gastos escandalosos da máquina. Numa das comissões temáticas, questionei os gastos anuais do governo com viagens: R$ 800 milhões. Naquela época já havia um leque de possibilidades tecnológicas, do Skype às teleconferências. Essa escolha liquidaria os gastos. Mas reduziria os ganhos do funcionalismo com diárias.

A relação dessa gigantesca máquina político-partidária com a sociedade precisa ser resolvida em favor das pessoas.

O aumento dos juízes do STF vai nos custar R$ 6 bilhões. É um preço alto, caro, em bens e serviços. Mas tem um lado pedagógico: ficou claro para todo mundo como a elite burocrática se apossa de uma parte maior do bolo, numa sociedade mergulhada na crise econômica.

Creio que muitas pessoas votaram contra isso. Se minha presunção é verdadeira, está em curso uma modesta revolução cultural. Muitas pessoas que viam no Estado um provedor, e de certa forma a Constituição o moldou assim, começam a vê-lo como um obstáculo, sanguessuga.

Isso é o caminho para que seja revisto, de acordo com as circunstâncias históricas e culturais do Brasil de hoje. Não será necessariamente mínimo, que é uma construção ideal. Ele será o que resultar desse que, para mim, é o grande embate de 2019.

No passado, quando terminavam as eleições as pessoas se voltavam para seus problemas, o que é saudável. A verdadeira força transformadora, no entanto, virá da sociedade, e não de esquemas ideais. É possível que, num quadro de crise, ela continue alerta, pois agora começa a viver as consequências de sua escolha.

Não será um ano fácil. Aos que podem, é recomendável ao menos uma semana de férias. Isso porque a economia é apenas uma variável. Além dos 12 milhões de desempregados, parte do território urbano é ocupada por grupos armados, as cadeias são um barril de pólvora, a corrupção se estende pelo interior.

Não sei se exagero, mas sinto-me como se fosse a luta pela sobrevivência de um país viável.


Fernando Gabeira: Sonhos e realidade

Associação entre o PT e as minorias trouxe para elas a desconfiança do homem comum

A vitória de Bolsonaro não é idêntica à de Trump. Mas antes e depois das duas eleições há pontos de contato. Não servem para explicar tudo, mas ajudam.

Um dos livros em que encontro as semelhanças é de Mark Lilla, uma crítica aos liberais com um subtítulo interessante: Depois das políticas de identidade. A julgar pelo livro de Lilla (The Once and Future Liberal: After Identity Politics), a vitória de Trump suscitou o mesmo movimento nos EUA e no Brasil: resistência. Lilla põe essa palavra entre aspas, pois significa uma oposição a tudo o que Trump representa, sem ainda uma visão clara de futuro.

A vitória de uma figura controvertida acabou despertando nos EUA uma grande solidariedade entre os derrotados, campanhas, marchas, abaixo-assinados. Mas ainda são raras aqui, no Brasil, onde Bolsonaro acaba de vencer, as visões críticas do período que abriu o caminho para que ele triunfasse.

Lilla fala no descaminho dos democratas por se terem fixado nas políticas identitárias: mulheres, homossexuais, indígenas e negros. Não que seja contra essas lutas.

Sua análise da campanha republicana mostra que na maior parte do tempo ela se fixava em temas nacionais, que interessam a todos. O exame do site democrata, no entanto, revela grande peso às lutas fragmentárias, que interessam a setores bem específicos do eleitorado.

Lilla considera um erro a fixação nas lutas identitárias porque elas afastam um pouco as pessoas dos temas mais amplos, que envolvem o bem comum. As pessoas mergulhadas nessas lutas têm tendência menor a defender temas nacionais, sair para uma conversa nas ruas sobre o que ele chama o bem comum.

Coincidência ou não, eu já tinha manifestado em artigos a mesma reserva quanto ao alcance das lutas identitárias na eleição brasileira. Também na minha crítica ressaltava a ausência da ênfase no bem comum, só que nos meus textos não usava essa expressão, mas a adesão a um projeto nacional.

Num artigo afirmava que as lutas que ainda chamam das minorias tendem a criar a necessária solidariedade de grupo, regras e objetivos próprios. Mas ela se dá em oposição a uma sociedade que ainda não reconhece esses direitos.

Torna-se muito difícil conversar com o homem comum, encontrar um assunto que mobilize todos, e não apenas alguns setores da sociedade. No caso brasileiro, os três grandes temas nacionais em jogo passaram um pouco ao largo das forças de esquerda. Um deles era a corrupção. A esquerda o subestima de modo geral e o escamoteia especificamente quando o PT é o maior acusado.

Um segundo grande tema nacional foi a segurança. A visão clássica e tradicional da esquerda é condicioná-la à melhoria das condições econômicas, da educação, da renda. Como a expectativa é de respostas em curto prazo, o discurso cai no vazio e é facilmente ironizado.

Um terceiro tema, mais intelectualizado, foi a discussão sobre o tamanho e o papel do Estado na economia. Também aí a perspectiva privatizante pareceu mais atraente. E não só pela teoria. As manifestações de 2013, em parte, revelaram a precariedade dos serviços públicos.

A corrupção também passou a ser uma chave para explicar o fracasso do governo. Tenho a impressão de que é a conversa na rua quando não se tem nada a dizer sobre aqueles temas.

Uma das características da luta identitária é a autoexpressão: sou gay, negro ou indígena e tenho orgulho de minha condição. Isso é irretocável na posição pessoal. No entanto, Lilla observa em seu livro que numa campanha eleitoral não é a autoexpressão que conta, mas a persuasão.

O exemplo que usa para definir o comportamento dos liberais nos EUA talvez seja aplicado também à esquerda brasileira. Lilla compara as eleições à pesca. É preciso acordar cedo e pescar até tarde, lá onde o peixe existe, e não onde você gostaria que estivesse. Se o peixe morde a isca e se debate, dê linha e espere que se acalme.

Mas, para o escritor, os liberais ficaram na praia discorrendo sobre os problemas do mar, sobre a necessidade de a vida aquática abrir mão de seus privilégios. Tudo na esperança de os peixes confessarem coletivamente seus pecados e nadarem mansamente para ser pescados. Se esse é o seu enfoque da pesca, lembra Lilla, o melhor é se tornar vegetariano.

Nesta altura, não se podem comparar totalmente as táticas. No caso brasileiro, se, de um lado, a luta identitária pode ter dificultado um pouco a conquista da maioria, o caminho eleitoral das minorias acabou comprometendo o seu futuro. Isso simplesmente porque no tema central, a corrupção, o PT, embora não seja o único, é o maior acusado. A associação entre o partido e as minorias acabou trazendo para elas também a desconfiança do homem comum.

Não sei ainda como as coisas se vão recompor. Se as lideranças minoritárias fizerem uma análise do que se passou, creio que um dos seus passos será libertar-se de governos. Para isso é preciso ter uma nova visão da importância dos recursos materiais na política. O período que se encerra foi marcado por campanhas milionárias. O PT venceu com uma em 2002 e não reaprendeu o caminho da austeridade.

A vitória de Bolsonaro, a julgar pela de Trump, deve suscitar um grande movimento, que até lembrou aos liberais americanos que eles têm mais energia do que suspeitavam.

Aqui, no Brasil, enquanto estiverem gravitando em torno de um partido acusado de corrupção, os simpatizantes da esquerda podem até descobrir uma energia insuspeitada. No entanto, a chance de essa energia se dissolver em vão é muito grande, sobretudo se as pessoas não pararem um segundo para pensar, achando que o momento é como a Quarta-Feira de Cinzas em Salvador, onde todos saem às ruas cantando e dançando as mesmas músicas do carnaval que passou.

Faria bem um tempo de reflexão, estudos e debates. Foi tudo tão rápido e, para alguns, tão surpreendente que, a rigor, nem o governo nem a oposição sabem precisamente o que fazer.


Fernando Gabeira: Uma virada à direita

Ganhar a eleição é difícil; derrotar forças poderosas, mais ainda. Mas dificuldades começam mesmo quando se chega ao governo

A roda rodou. Já vi muitos presidentes, subindo e descendo a rampa. Um deles descendo ao fundo da terra, Tancredo. Collor chegando e saindo de nariz erguido. Lula com tantas promessas.

Itamar, encontrei antes da posse, no Hotel Sheraton. Ele ainda não era o presidente, e eu tentava convencê-lo de que seria. Conheci Itamar desde a Rua Halfeld, a mesma onde Bolsonaro tomou a facada. Era um homem decente, tomava religiosamente uma sopinha ao entardecer. Ousou assinar o Plano Real.

Agora, sobe Jair Bolsonaro. Não foi uma rodada simples, dessas em que PT e PSDB se revezam. Foi mais ampla, como foi a de 64, só que agora sem Guerra Fria, num contexto democrático.

Senti a ascensão de Jair Bolsonaro. Impossível ignorá-la correndo o Brasil, observando as redes sociais. Quando levou a facada em Juiz de Fora, pensei: facada e tiro, quando não matam, elegem.

Se nossa cultura produziu essa certeza, isso quer dizer que a condenação da violência política tende a ser consensual. O presidente eleito deveria encarnar e expressar essa condenação. Não é um conselho, apenas uma leitura do Brasil. Os últimos dias de campanha foram ameaçadores. Prisão, desterro, banir da face da terra. Alta tensão. As universidades podem ser invadidas por ideias, não pela polícia.

O novo governo tem uma agenda brava, e só me resta usar esses meses de transição para estudar melhor e criticá-la com fundamento.

Outro campo de estudo se abre. A frase de Mano Brown — é preciso encontrar o povo — foi endereçada ao PT. Mas não vale também para o sistema partidário, a academia, a mídia, os especialistas? Como reconciliá-los com o homem comum?

Minha atitude com Bolsonaro será a que sempre adotei nos anos de convivência: respeito ao argumentar nos pontos divergentes e estímulo aos seus movimentos positivos. Alguns leitores condenam essa visão, sob o argumento de que normaliza a barbárie.

Mas se era assim com o deputado, por que não seria com o presidente, cujas ações mexem com nosso destino e com a imagem externa do Brasil?

Na minha visão de mundo, é impensável ofender os eleitores que escolheram outro caminho. O pressuposto é apostar na boa-fé da maioria do povo brasileiro.

Farei uma oposição sem truques ou medo, das que não visam ao poder. Apenas um desejo de ver o país retomando democraticamente os trilhos, um pouco também por filhos e netos. A sensação de continuidade ao lado da poesia são os territórios em que desafiamos a morte.

Ganhar a eleição é difícil; derrotar forças poderosas, mais ainda. No entanto, as dificuldades começam mesmo quando se chega ao governo. As qualidades para ganhar a eleição são diferentes das que impulsionam o governo. Para vencer, é preciso falar a linguagem do povo.

O grande talento nesse campo nem sempre nos socorre, quando a necessidade impõe grande esforço intelectual para a tomada de decisões. Da mesma forma, o tom agressivo de campanha é o inverso da generosidade que se espera de um eleito.

Bolsonaro não é um raio em céu azul. O panorama político no Brasil mudou. Pensadores de direita surgiram no cenário. Jovens liberais, propagandistas religiosos ocuparam as redes.

As manifestações de 2013 colocaram na rua multidões com uma aspiração difusa de melhores serviços. As de 2015 afunilaram na denúncia da corrupção, impulsionaram a queda de Dilma.

Uma esquerda, sem élan para se reinventar ou base teórica para vislumbrar o horizonte, tornou-se uma presa fácil no debate de ideias.

Foi uma campanha da era digital. Hoje, todos falam, compartilham. Baixo nível? Talvez. Mais democrático? Sem dúvida. Foi também facada, fake news, acusações, brigas entre famílias, amigos, ansiedade, tentativas de suicídio — um psicodrama nacional.

Fiz tudo para manter a cabeça fria. É natural levar caneladas dos dois lados. Caneladas e balas perdidas são parte do jogo.

Outro dia, alguém escreveu sobre mim: se ficar como ele, peço aos amigos que me ajudem numa eutanásia. Não tenho por hábito contestar essas coisas da rede. Nesse caso, a resposta seria simples: obrigado por morrer em meu lugar. É uma gentileza nesses tempos sombrios.

É preciso viver um pouco mais para ver um país mais tranquilo, fraternal. Não sou ingênuo a ponto de imaginar esquerda e direita de mãos dadas. Não se trata de lirismo. As emoções da campanha ofuscaram um pouco a gravidade de nossos problemas.

Agora, voltamos à vida real.


Fernando Gabeira: O capitão e o navio

Bolsonaro sentiu que a guerra cultural seria um caminho não só para ampliar votos no Rio, mas para projetá-lo nacionalmente

Não é uma simples segunda-feira de primavera. Neste momento, já se sabe que Bolsonaro venceu o primeiro turno das eleições e mais ainda: como se compõe o novo Congresso.

As pesquisas me divertem. As projeções do segundo turno são exercícios fantásticos. Saber que a rejeição a Eymael caiu de 19 para 13 pontos coloca um enigma de interpretação: o que Eymael fez na semana para reduzir o saldo negativo? Na superfície, ele continua o mesmo Eymael, um democrata cristão: zero por cento.

Imagino que comece hoje uma discussão sobre as causas que levaram Bolsonaro a vencer o primeiro turno. E também a ampla distribuição de culpa entre seus adversários.

É uma discussão importante. Mas, se for isolada do resto, tende amostrar Bolsonaro como um alienígena que simplesmente aterrissou num país em crise.

Isso tende a omitir seu papel pessoal. Bolsonaro foi o deputado mais votado no Rio, em 2014. Ele teve 464 mil votos, cerca de 6% do total, um feito extraordinário em eleições proporcionais. Naquele momento, ele já estava em ascensão batendo, principalmente, em duas teclas: corrupção e segurança pública.

Sua proposta em segurança tem uma vantagem sobre todas as outras. Reconhece a limitação do Estado e envolve o indivíduo, que teria sua própria arma. Já a critiquei e propus uma outra forma de participação social: a informação, através dos novos recursos tecnológicos.

Concordamos num ponto em que os outros silenciaram: sema adesão da sociedade, fica difícil atenuar o problema da violência. Bolsonaro sentiu também que a guerra cultural seria um caminho não só para ampliar seus votos no Rio, mas para projetá-lo nacionalmente.

Percebeu também que não bastava brigar com Jean Wyllys para se popularizar. Ele encontrou um flanco: a educação sexual nas escolas. Bolsonaro sabe que a maioria das famílias quer ter a primazia de educar sexualmente os filhos.

Ao lançar cartilhas e distribuí-las sem o controle das famílias, a esquerda tornou-se vulnerável porque pareceu querer substituir a orientação familiar, em vez de negociar com ela.

Ainda vou escrever muito sobre Bolsonaro, inclusive sobre os 16 anos em que estivemos juntos em algumas comissões da Câmara, divergindo nos costumes e concordando na denúncia da corrupção.

A grande dificuldade com Bolsonaro é que, essencialmente, é anticomunista e tende a combater todas as lutas lideradas pela esquerda, como se tivessem sido inventadas por ela. Ele tem dificuldade em distinguir direitos humanos e exploração ideológica, movimento das mulheres das visões radicais, meio ambiente e ameaça à propriedade privada e, no caso amazônico, cobiça internacional.

Algumas de suas ideias sobre meio ambiente, sobretudo as de fundo nacionalista, são compartilhadas pelas Forças Armadas. Será, portanto, um tema que demanda muita sensibilidade para evitar que se reproduza aquela profunda divisão do tipo nós e eles, brasileiros e lacaios do imperialismo.

Em outras palavras, o estigma que a esquerda criou, na economia, para quem defende a abertura ao capital estrangeiro tende ase repetir, agora, na esfera ambiental nocam poda cooperação planetária. Só que as pancadas virão da direita.

Com todas essas divergências, creio que será possível estabelecer um diálogo. Pessoalmente, sempre conversei com Bolsonaro ao longo de 16 anos.

Nos seus primeiros discursos na Câmara, ele pedia minha prisão porque eu era um sequestrador do embaixador americano. Ele queria reproduzir o debate sobre a luta armada. Os tempos eram outros, tínhamos um novo país para construir.

A esquerda me considera um traidor que ocupa um espaço na lata de lixo da história. Sou aquele jogador que já foi do time e a torcida vaia sempre que toca na bola.

Mas esquerda e direita são forças missionárias que tentam universalizar seu conceito de boa vida. Numa sociedade complexa como a nossa, precisamos reconhecer as diferenças e navegar com cuidado, administrando os problemas recorrentes.

A ideia de um país dominado pela Bíblia ou pelo “Capital” de Marx não deixa de ser legítima. Apesar da importância que ambos dão aos seus textos, eles são apenas um modesto guia. O mundo ultrapassa os velhos esquemas mentais. Ou, em linguagem bem brasileira: o buraco é mais embaixo.


Vera Magalhães: Lula ou Jair? Ulysses

A Constituição é o antídoto tanto para a corrupção quanto para as tentações autoritárias

“Qualquer governante deste País pode ganhar as eleições e não cumprir aquilo que prometeu porque é mais um e o povo já sabe. Nós não podemos.” A frase é do histórico discurso de Luiz Inácio Lula da Silva na Avenida Paulista na madrugada de 27 para 28 de outubro de 2002. O petista havia sido eleito presidente da República em sua quarta tentativa desde 1989, a eleição que retorna agora, 30 anos depois da promulgação da Constituição, para testar da maneira mais cabal até aqui sua capacidade de resistir a tentativas de solapá-la.

A frase parecia conter a consciência da responsabilidade, do ineditismo histórico que representava sua eleição num País como o Brasil e dos riscos que haveria caso ele falhasse. E ele não falhou, apenas.

Lula deliberadamente optou por outro caminho, que seu companheiro Antonio Palocci definiu como “sonho mirabolante”, mas que na verdade foi um projeto deliberado de assalto ao País para perpetuar seu projeto político no poder.

Agora, diante da queda desse projeto pela Lava Jato e sua prisão, não fez o que disse que faria, no mesmo discurso, caso “errasse”: “Pode ficar certo que eu não terei nenhuma dúvida de ir pra televisão pedir desculpas ao meu povo”. Não pediu, urdiu uma narrativa falsa e atentatória à Justiça e às instituições de que era um perseguido político, arquitetou um plano infalível para voltar ao poder a despeito de tudo e nos trouxe até aqui.

Preso, Lula abriu a porta para a possibilidade, antes considerada remota, de eleição de Jair Bolsonaro – e tudo que ela representa de negação da história que vai da redemocratização à sua própria chegada à Presidência.

Pela arrogância de se auto conceder a condição de “uma ideia”, Lula ignorou que o mal que causou com os crimes que cometeu era tão profundo que fez fermentar a ideia oposta à sua, num caldo que mistura a legítima repulsa à corrupção com ideias fascistas que antes não ousavam ser ditas em voz alta.

E aqueles que não são coniventes com os crimes do PT nem condescendentes com a relativização da democracia presente no projeto de Bolsonaro, como chegam a este 7 de outubro? Perplexos, amedrontados e algo descrentes no tal dia seguinte que escrevi há algumas semanas que chegaria. O que Bolsonaro e Fernando Haddad, o representante de Lula nesse repeteco de 1989, têm a dizer a essas pessoas? Até aqui, nada.

A última entrevista de Bolsonaro foi uma reafirmação de suas ideias rasas sobre como um conservadorismo jeca e opaco será a base “filosófica” de seu governo e como o fato de ter uma mãe, uma filha ou um sogro seriam provas de que não é racista nem misógino.

No mesmo dia, a participação de Haddad no debate da Globo foi uma reafirmação cínica dos crimes do PT, do “L” com os dedos ao cumprimentar os telespectadores à arrogante incapacidade de reconhecer mínimos erros, quando inquirido por Marina Silva, ou a mentira pura e simples de que os governos do PT foram responsáveis fiscalmente ou valorizaram a Petrobrás.

Diante de tamanha incapacidade dos dois líderes nas pesquisas – esses que foram escolhidos por Lula da prisão – de apontar o caminho que seguirão a partir de amanhã (se um deles for eleito ou se os dois forem disputar o segundo turno), resta ao País e aos que têm a democracia como bem inalienável se fiar em outro discurso, de outro outubro: o de Ulysses Guimarães em 5 de outubro de 1988.

“República suja pela corrupção impune tomba nas mãos de demagogos que, a pretexto de salvá-la, a tiranizam.” A arma para enfrentar corruptos e demagogos é a mesma: a Constituição que Ulysses promulgou naquele dia. Esperamos por ela como o “vigia espera a aurora”, como ele disse. Trataremos de zelar para que não venha o crepúsculo. Com ela nas mãos.


Fernando Gabeira: Uma campanha à deriva no mundo

A política externa é nacional, não pode ser definida por uma visão estritamente partidária

Mais ou menos conforme previa, a situação internacional teve pouco peso na campanha de 2018. Não se parou para pensar na sua complexidade e nas consequências no futuro próximo do Brasil. O tema ficou reduzido às relações com os países vizinhos: a Venezuela ocupou o centro, uma vez que seu drama atravessa a fronteira.

É um debate desconfortável para a esquerda, que apoia Maduro, pois milhões de pessoas na estrada julgam com os próprios pés o governo bolivariano. Mas se olhamos um pouco mais amplamente, há outros traços que favorecem a esquerda. A ascensão de Donald Trump já se dava num quadro de relativo declínio da supremacia americana, atenuada pela tática do soft power de Obama.

Trump optou por um caminho isolacionista, cortando vínculos multilaterais e abrindo mais espaço para a China, que o ocupa com rapidez. Embora expresse o temor dos americanos com a globalização, Trump ainda vive um processo de aprendizado, cheio de erros.

Os chineses, a julgar pela visão de Henry Kissinger, planejam por gerações, a escala de tempo de seu projeto é algo que supera de longe os planos de um só presidente. Além de ocupar os espaços abertos pelos EUA, a China se aproxima da Rússia, que, por sua vez, ampliou seu poderio militar. Um dado dessa força foi o anúncio de Putin sobre as novas armas nucelares, em março de 2018.

Consegui perguntar a alguns candidatos sobre a relação com a China, que já é o maior parceiro comercial do Brasil e vive um momento de expansão. Existe um debate sobre o papel da China como investidora em países da África. Alguns consideram que ela exerce um forte poder político por meio da presença econômica, interferindo até nos marcos regulatórios. Outros afirmam que a fragilidade desses países não pode ser atribuída à ação chinesa, mas ao precário sistema jurídico local. Este argumento é interessante, porque os europeus parecem abertos e até felizes com a atração dos capitais chineses.

Essa questão ficou mais ou menos no ar, a partir de um consenso de que o capital chinês é bem-vindo. Bolsonaro afirmou que os chineses podem comprar e vender no Brasil, mas não comprar o Brasil. Não ficou claro se sua restrição é apenas à compra de terras ou se falava de um Brasil menos material do que o chão, matas e rios.

A verdade é que a correlação de forças muda no mundo e o peso econômico da China será cada vez maior. Mas não é conveniente subestimar não só o poder econômico, mas a influência cultural norte-americana.

Se olharmos a guerra cultural que se travou na campanha entre esquerda e direita, veremos que ela não é só influenciada pelos norte-americanos, como também se entrelaça com o debate de lá. Vários artistas americanos opinaram sobre a eleição brasileira por encontrarem pontos de identidade com a luta que travam contra Donald Trump.

China e Rússia não veriam com bons olhos manifestações de gays e mulheres em seu território. Nesse campo cultural, ambas se colocam num campo oposto ao que se chama de visão de esquerda no Brasil.

A esquerda soube se aproximar das lutas identitárias e carimbá-las como uma decorrência de sua visão de mundo. Pessoalmente, reconheço que tive um papel nisso.

Mas algumas dessas lutas em outro contexto, como o russo, por exemplo, nascem no reduto liberal. E é compreensível, porque quase todas elas tratam, no fundo, de liberdades individuais.

Na campanha brasileira as coisas não aparecem com nitidez. De um lado, uma aliança entre conservadores nos costumes e liberais na economia. É um encontro que tende a produzir faíscas. Em recente entrevista, Vargas Llosa criticou o economista liberal Paulo Guedes por se associar a Bolsonaro. Ele acha que são visões incompatíveis.

De outro, na esquerda, a análise da queda de Dilma parece ter concluído que era preciso não apenas ganhar as eleições, como tomar o poder. O que significa reduzir os poderes que a confrontaram: Justiça e imprensa. Dificilmente a tendência autoritária na visão de governo não se chocará com as pessoas que votaram apenas porque temiam Bolsonaro.

Para mim, todas essas peças que se juntam e se opõem precisam ser mais bem avaliadas. Minha conclusão momentânea é que, no poder, só uma direita soft ou uma esquerda soft evitariam a turbulência.

Li uma frase engraçada sobre eleições: são como um bufê, você não pode pedir um ovo frito. Mas depois das eleições, quem sabe? O vencedor será o presidente de todos os brasileiros. Nem todos cabem no figurino dos ideólogos.

Quanto à política externa, que ficará ainda por ser mais bem discutida, é essencial que seja compreendida como algo nacional e não definido por uma visão estritamente partidária. Não só porque a estreiteza exclui um consenso interno mais amplo. É que a complexidade do mundo assim o exige.

No passado, quase nunca discutíamos o papel do Brasil no mundo. Pelo menos, antes de avaliarmos que mundo é esse a que nos referimos. Se a campanha não fizer isso no segundo turno, certamente o problema reaparece no ano que vem.

Um dos pontos que devem ser muito bem pesados é a política ambiental. Bolsonaro tem proximidade com Trump nesse tema. Porém adotar a mesma política no caso brasileiro significa um grande impacto internacional.

Certamente foi grande o impacto da saída dos EUA do Acordo de Paris, por exemplo. A importância dos norte-americanos na política ambiental decorre muito de sua importância econômica, seu papel na redução de emissões. No caso brasileiro, qualquer passo atrás será visto com sobressalto. É como se uma potência ambiental deixasse de se unir ao esforço planetário para atenuar as mudanças climáticas.

Tudo isso em véspera de eleição fica um pouco em suspenso como uma camada de pó. Quando a poeira baixar... Vamos esperar o que dizem as vozes de domingo. São o farol que vai clarear o novo pedaço do caminho.


Fernando Gabeira: Duelo ao entardecer

Os moderados foram engolidos pela onda. Isso não significa que não terão importância no futuro

“Satanás, pegue tudo o que é seu e deixe esta nação.” Esta frase do Cabo Daciolo diante da fogueira era apenas um lembrete de que estas eleições parecem um sonho dentro de sonhos.

Posso imaginar o Satanás, posso vê-lo retirando seus pertences como um passageiro após a aterrissagem. Não consigo imaginar o que Satanás tem de carregar, esse tudo o que é seu.

Não tenho tempo para divagar sobre isso. Prefiro esperar a saída dele e, ao me dar conta das coisas que estão faltando, possa concluir que foram levadas por Satanás.

Outro dia, algumas pessoas me xingavam na rede. E não eram as mesmas de sempre. Descobri que foi um delírio do Ciro Gomes.

Numa entrevista a um repórter de esquerda, ele confessou que salvou Lula do mensalão e que para isso falou com várias pessoas. Eu, inclusive. Nunca houve essa conversa. Trabalhava na CPI dos Sanguessugas, que, aliás, foi bastante dura. Ciro contou essa história para impressionar o PT. Já foi punido porque o PT lançou Haddad.

E as pessoas que me xingaram, essas também estão perdoadas porque carregam o fardo cognitivo de acreditar em bravatas de campanha.

Vamos à realidade que também parece um sonho: as pesquisas apontam para um duelo entre dois líderes populares, um na cadeia, outro, no hospital.

Claro que o duelo entre os dois envolve visões diferentes de mundo, conflitantes realidades. Eles apenas encarnam fortes correntes na sociedade

Tanto Lula quanto Bolsonaro, além de suas personalidades, representam também o êxito da comunicação verbal, com seus encantos e defeitos.

São nomes falados em todo o território nacional. Escapam do círculo relativamente pequeno do universo político e se entendem com quem querem se entender.

Às vezes, um milionário, estimulado por marqueteiros, faz uma investida, mas descobre logo que o mar é imenso, quantos não morrem alguns metros além da praia? Ao que tudo indica, os dois personagens encarnam multidões, ávidas por mudanças e pela continuidade.

Depois de anos de dominação da esquerda, a grande interrogação do processo é saber se continua ou dá lugar às forças de oposição que cresceram no combate ao governo petista.

Isso me parece a realidade. Mas, como o processo é imprevisível, o fato de se encarnar em duas pessoas aumenta sua imprevisibilidade.

Tenho a impressão de que essas grandes tendências se movem de uma forma tão autônoma que não vejo espaço para a ação individual detê-la, embora ache que os candidatos devam continuar lutando, os eleitores votando no que acharem o melhor etc.

Mas, por via das dúvidas, creio que o mais prudente é se preparar para uma nova realidade, onde uma dessas forças será a vencedora.

Em termos eleitorais, os moderados foram engolidos pela onda. Isso não significa que não terão importância no futuro. Apesar de tudo, a moderação é a única força capaz de empurrar os vencedores para a ideia de um projeto nacional mais abrangente, superar o clima nostálgico de Guerra Fria que envolve os contendores.

Apesar dos excelentes livros sobre o declínio da democracia, esse enredo foi vivido intensamente no Brasil. O Congresso, de baixo nível, tende a não se renovar. O Supremo se desgastou ao vivo e a cores.

Cabo Daciolo convida para uma luta contra principados e potentados. Adoraria estar junto, mas dificilmente terei tempo na vida real.

O cenário que se desenha não é o melhor para um grande projeto de reconstrução. No entanto, precisamos sair dessa maré. De qualquer forma, a nova conjuntura vai inspirar cuidado. Esta palavra é sempre associada aos mais velhos.

De fato, na juventude, cuidado não era assim tão valorizado. Pura irresponsabilidade? Parcialmente, por acreditar na destruição construtiva, uma vontade de virar a mesa.

Assim como Satanás, segundo o Cabo Daciolo, tem que preparar suas coisas e deixar a nação, fico me perguntando que coisas tenho de juntar para a fase que se aproxima.

Uma delas, certamente, é saber que, apesar de sua decadência, não podemos passar sem a democracia, que, por sua vez, precisa evoluir.

A realidade está aí. É possível se perguntar onde tudo começou, dizer “bem que avisei”, buscar os culpados. Suspeito que não nos dará tempo para divagações. Em outras palavras: apertar os cintos.


Fernando Gabeira: Estreitos horizontes

Não sei quanto custará tirar o nome dos devedores do SPC. Só sei que é mais uma sedução pelo consumo

Uma das coisas de que não gosto nessas minhas viagens semanais é me sentar na poltrona do meio. São trechos longos, como Macapá ou Boa Vista-Rio. Preciso trabalhar, mas o espaço fica muito contraído, e detesto incomodar o sonolento vizinho do corredor quando preciso ir ao banheiro.

Jamais pensei que faria um texto cujo tema é o assento 23B. Mas essa sensação de estar meio espremido, sem horizontes, lembrou-me de minhas inquietações espaciais na Rússia.

Fotografei muitos prédios em todos os estilos, mas queria ressaltara arquitetura stalinista, sobretudo um grupo de arquitetos surgidos na época do Plano Diretor, quando tudo deveria se submeter aos desígnios do Estado.

Os intelectuais eram chamados de engenheiros das almas, e esse grupo de arquitetos projetou inúmeros prédios onde tudo era coletivo. Todos os que conhecem a história recente da Rússia sabem que a vidas e tornou muito difícil nessa atmosfera desenhada e que as pessoas costumavam até comer na cama, desesperadas por uma nesga de privacidade.

Vejo agora que uma escola de Tocantins, da cidade de Formoso do Araguaia, ganhou um prêmio internacional de arquitetura, o melhor prédio escolar do ano. As fotos das estruturas de madeira são bonitas. A história, mais reveladora ainda. O projeto da escola, na Fazenda Canuanã, foi realizado pelo designer Marcelo Rosenbaum e o escritório de arquitetura Aleph Zero.

Os autores contaram coma ajudados alunos que moravam no prédio e indicaram as linhas por onde deveria ser melhorado. Eles diziam que moravam na escola. Agora, não dizem mais. Um traço da mudança foi abrir mais espaços para a privacidade individual.
Portanto, o êxito dos arquitetos brasileiros avançou exatamente no sentido oposto ao dos stalinistas. Certamente, foram ajudados pela opinião dos estudantes.

Mas a simples inquietação como espaço não me levaria a escrever sobre o 23B. O assento parece o lugar adequado para pensar no Brasil: estreito, sem grandes horizontes.

Já vivemos os grandes horizontes do país do futuro. Hoje está tudo tão apertado. Um copo d’água, um pacote de biscoitos salgados, penso na eleição presidencial: vejo apenas o estreito caminho que o Congresso abrirá ao vencedor.

Projetos, projetos, mas não vejo de onde virá o dinheiro. Um dos temas mais popular e sé a promessa de tirar o nome dos devedores do SPC. Não entro no mérito, porque não sei quanto custará. Sei apenas que é mais uma sedução pelo consumo, não muito diferente da visão que nos arruinou.

Mesmo no campo do delírio, Cabo Daciolo medes apontou. Foi para amontanha falar com Deus. Não esperava que, no seu encontro com Deus, produzisse lindos poemas místicos como as freiras Mariana Alcoforado e Sor Juana Inés de la Cruz. Mas ele recebeu uma vulgar teoria da conspiração, que está em qualquer lugar da internet.

Deus mesmo, quando vier, que venha armado. Essa frase de Guimarães Rosa deve ter inspirado a política de segurança de Bolsonaro.

Deixo para trás Roraima com seu impasse. Não há como fechar a fronteira nem recursos para aguentar as consequências de sua abertura. Tudo muito 23B.

O que me salva é um livro de Antônio Damásio, “A estranha ordem das coisas”. Falade mini organismos, de como as bactérias sentem o ambiente e reagem deforma organizada para sobrevivera ele. Elas fazem alianças até com inimigas, para sobreviver.

Essa sabedoria bacteriana, essa capacidade de realizara homeostase, equilibrar diferentes variáveis, seria fundamental num momento em que estamos comum a perspectiva de dias piores ainda.

Crescimento econômico e mais consumo não bastam. Será preciso reativar valores, pois foi sua falência que nos trouxe à ruína. Enquanto não soara consciência do perigo à frente, mesmo consumindo mais, nossas esperanças no país continuarão baixas.

No 23B, estreitos cenários do segundo turno, as promessas de reforma política, mas ninguém combinou com os russos. Ainda nem sabemos quem serão os russos, a suspeita é de que sejam os mesmos de sempre.

Certamente, acharemos a saída. É pouco mais difícil achá-la aqui no 23B. Estamos chegando, vejo o Rio de Janeiro, minha alma canta. Canta de teimosa no estreito assento do meio. Crivella baixou a taxa municipal de exumação. Depois da morte, não é que a vida melhorou?


Fernando Gabeira: O Brasil de De Gaulle

Ideia de virar ‘pais sério’ assusta. Somos leves e alegres. Candidato com esse objetivo tende a ser mal interpretado

Até hoje não se sabe ao certo se a frase foi dita ou não. Em 1962, no auge da guerra da lagosta, o general De Gaulle teria afirmado que o Brasil não é um país sério. Não havia, na época, rede social como conhecemos hoje. Ainda assim, a frase foi tema de amplos debates.

Jamais conversei sobre o tema com o amigo Luís Edgar de Andrade, que teria enviado a notícia de Paris. Muita gente afirma que a frase de De Gaulle jamais foi dita. Vou tomá-la como verdadeira porque esta semana, ao ler “Lições dos mestres”, de George Steiner, creio que posso fazer uma nova leitura da frase.

A França foi humilhada em 1870 e 1871 pela derrota diante dos alemães. E o país se descobriu ávido de “seriedade”. A constatação mais importante: a vitória prussiana não dependeu de superioridade bélica, mas sim de uma escolaridade sistemática, que a colocava à frente em ideias científicas e humanísticas.

O Gymnasium alemão, as universidades depois das reformas de Humboldt, os padrões de qualidade das pesquisas e publicações eruditas deixaram expostos a frivolidade e o amadorismo francês. Alexandre Dumas, em 1873, escreveu: “já não se trata mais de ser espirituoso, leve, libertino, zombeteiro e alegremente inconsequente. A França deve agora haver-se com o ‘muito sério’. Caso contrário, sucumbirá.”

Evidentemente, a França conseguiu dar a volta por cima, na época, modernizando seu ensino. De Gaulle, como conhecedor profundo da história de seu país, possivelmente estaria pensando nessa definição de sério, quando se deparou com as vacilações burocráticas do governo brasileiro.

Mesmo que a frase não tenha sido dita e existam enormes diferenças entre a França do fim do século XIX e o Brasil de hoje, De Gaulle poderia ser reinterpretado na sua definição de país sério.

Não fomos derrotados pelos alemães, mas por nós mesmos. Mas, certamente, o caminho de nos tornarmos um “país sério” passa pela educação.

Reconheço que a ideia de virar um “país sério” assusta. Afinal, o Brasil é leve e alegre. Um candidato com esse objetivo estratégico tende a ser mal interpretado.

Há razões para isso. Costumo citar uma frase de Samuel Beckett: não se passa um dia sem que algo seja acrescido ao nosso saber. A Bíblia tem algo parecido no Eclesiastes 1:18: “aquele que aumenta o seu saber, aumenta o seu pesar.”

Mas creio que Beckett chegou à conclusão por conta própria. Como Freud, ao afirmar que civilização entristece porque depende da repressão aos instintos. Mas nada disso significa um elogio à ignorância. No caso brasileiro, o clima e a natureza são fatores que garantem uma dose de leveza e alegria.

Será que os candidatos querem mesmo fazer do Brasil um país sério? Não fomos arrasados por uma guerra, mas a confiança está num nível muito baixo.

Uma grande virada na educação, não apenas humanística, mas científica e tecnológica, pode ser o grande objetivo nacional. Enquanto isso não acontece, passaremos nossos dias sobressaltados com pesquisas eleitorais, tentando adivinhar de que lado virá o desastre.

Certamente, os candidatos falam no tema, têm planos. Mas se colocam como alguém que pretende trabalhar e têm, na ponta da língua, os principais tópicos de seu programa. Eles se apresentam como prestadores de serviço. Raramente, se colocam como líderes que vislumbram uma trilha e propõem conduzir a sociedade por ela.

Pelo menos, fica essa possível sugestão de De Gaulle, que já encontrou a França com o problema educacional resolvido, e a conduziu pelos difíceis caminhos na guerra e depois dela.

No sentido que dou à sua possível frase, não há nenhuma ofensa, nada que possa agitar nossas inquietas redes sociais. É apenas um rumo, direção para o esforço coletivo, uma constatação de que temos diante de nós um problema que pode nos fazer sucumbir, como dizia Dumas.

Apesar da enorme importância da infraestrutura, dos investimentos na saúde e na segurança pública, nada disso nos tira do pântano senão compreendermos que o Brasil precisas e torna rum país sério, reconhecera educação como a sua grande derrota.

Não faltou quem se lembrasse disso ao longo dos anos. Ouvimos, concordamos, mas, no calor da história, simplesmente deixamos de lado.