Ivan Alves Filho: o Campo Democrático e as eleições presidenciais

Ivan Alves Filho, historiador.

Em 1984, quando o Brasil ainda vivia sob a ditadura militar, o Partido dos Trabalhadores se negou a apoiar a candidatura de Tancredo Neves para superarmos aquela situação. Esse o fato concreto, irrefutável.

Na outra ponta, a oposição mais consequente defendia que a saída deveria se dar pelo Colégio Eleitoral, uma vez que a emenda das diretas tinha sofrido uma derrota no Congresso Nacional.

Mas o PT ignorou completamente isso. Hoje, esse mesmo partido quer nos convencer que precisamos apoiar a candidatura de Lula da Silva para evitarmos uma nova ditadura.
Trata-se de uma instrumentalização da Democracia e da ideia de Frente Ampla.

Mais: Votar em Lula da Silva pode ser o melhor caminho para reeleger Jair Bolsonaro. Por uma razão simples: as pessoas tendem a imaginar que o ditador reprimiria seus eventuais opositores, mas o corrupto prejudicaria a população em seu conjunto. Certo ou errado, é assim que a banda toca.

Eis o que só reforça a necessidade de lutarmos por uma opção que reúna as forças do Campo Democrático, se possível com uma candidatura unificada.

Devemos pautar a nossa política pelo tripé Ética, Justiça Social e Democracia. Se a truculência do atual governo representa uma ameaça à Democracia e suas instituições, a corrupção que grassava nos governos do PT também colocava em risco a nossa Democracia. Era um atentado ao nosso convívio democrático, corroendo as bases da Nação. Tortura nunca mais.

Mensalão e Petrolão nunca mais também. A corrupção está para a economia como a tortura para a politica.


Nota de pesar – Lygia Fagundes Telles

Lamento, em meu nome e pelo Cidadania, a morte da consagrada escritora Lygia Fagundes Telles, um dos grandes nomes da nossa literatura. Vencedora dos prêmios Jabuti e Camões, traduzida em diversos países, Lygia teve seu talento e sua obra exuberantes reconhecidos em vida. Ela está imortalizada por livros como “As Meninas” e “Seminário dos ratos”, mas sua passagem é uma perda imensurável para a Cultura nacional. À família e aos amigos, os nossos sentimentos.

Roberto Freire
Presidente Nacional do Cidadania


Brasil 2022: a crônica da servidão consentida

Por José Luis Oreiro

No início de 2006 eu escrevi um artigo com o então Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP), Rodrigo rocha Loures (pai), e Carlos Artur Krueger Passos, então consultor da FIEP e professor da UFPR intitulado “Desindustrialização: a crônica da servidão consentida” (https://revistas.ufpr.br/ret/article/view/28936/18905) , o qual foi publicado no Vol. 04 do Boletim Economia & Tecnologia do Centro de Pesquisas Econômicas do Departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná, do qual eu era o Diretor-Presidente. O artigo começava com uma citação do teórico militar alemão Clausewitz : “Não é no que pensamos, mas no como pensamos, que reside nossa contribuição a teoria”. Nesse artigo alertamos o então governo do Presidente Luis Inácio Lula da Silva que o Brasil se encontrava num grave processo de desindustrialização, o qual acabaria por levar o país a estagnação econômica e ao retorno a condição de “colônia informal” dos países desenvolvidos. Nossa intenção nunca foi partidária: queríamos que o governo brasileiro da época fizesse uma mudança de rumo na sua política econômica, principalmente na política macroeconômica que aprisionava o país numa armadilha de juros altos e câmbio sobrevalorizado que estava matando o setor mais dinâmico da economia brasileira e fazendo com que o Brasil retornasse a condição de “fazendão” que prevalecia até a Revolução de 1930 liderada pelo maior presidente da história do país, Getúlio Dornelles Vargas. Infelizmente nossas considerações caíram em ouvidos moucos. A participação da indústria de transformação no PIB no Brasil, segundo dados do IPEADATA, de 17,35% do PIB em 2005 para 11,33% do PIB em 2021, uma queda de 6 p.p do PIB num período de 16 anos.

Fonte: IPEADATA. Elaboração do autor.

Essa profunda mudança estrutural negativa, a qual os economistas novo-desenvolvimentistas denominam de “regressão produtiva”, esteve associada com uma inequívoca redução do crescimento potencial da economia brasileira. Conforme podemos verificar na figura 2 abaixo, a média móvel de 10 anos da taxa de crescimento da economia brasileira após alcançar um pico de 4,03% em 2013, durante o primeiro mandato da presidente Dilma Rouseff, começou a apresentar um declínio acentuado atingindo a marca ridícula de 0,36% no terceiro ano do governo de Jair Messias Bolsonaro.

Fonte: Ipeadata. Elaboração do autor.

Para os economistas liberais como Marcos Lisboa, Samuel Pessoa, Marcos Mendes, Ana Paula Vescovi, José Márcio Camargo et caterva os dois fatos são (sic) não correlacionados. Esse grupo de economistas – que assessorou o governo do Presidente Michel Temer e, indiretamente, o governo de Jair Bolsonaro, devido ao acesso que tais economistas tem a grande mídia – o problema da estagnação da economia brasileira dos últimos 10 anos se deve a uma alegada “nova matriz macroeconômica” – expressão infeliz criada pelo secretário de política econômica do primeiro governo Dilma Roussef, Márcio Holland – que produziu (sic) um “excesso de intervenção do governo na economia” levando a uma má-alocação de fatores de produção, o que seria a causa causans do baixo crescimento recente. A hipótese de má-alocação de recursos é, contudo, uma teoria desprovida de evidência empírica ou uma evidência empírica desprovida de teoria conforme argumentei recentemente neste espaço (https://jlcoreiro.wordpress.com/2022/03/10/a-misallocation-explica-o-desenvolvimento-desigual-algumas-consideracoes-a-partir-da-literatura-de-crescimento-e-desenvolvimento-economico/). Esse grupo de economistas vem advogando desde 2016 a adoção de uma agenda de reformas econômicas como a reforma trabalhista, a reforma da previdência e o teto de gastos, a qual supostamente devolveria o dinamismo da economia brasileira, fazendo com que o “PIB privado” liderasse o crescimento econômico ao invés do “PIB do governo” como fora realizado durante as administrações petistas. Passados seis anos da adoção do novo modelo de crescimento para a economia brasileira, os resultados foram decepcionantes para dizer o mínimo. Enquanto a média de crescimento do PIB Brasileiro foi de 2,64% a.a entre 1980 e 2014, o crescimento médio no período 2017-2019 (período no qual a política econômica do Brasil foi conduzida totalmente pelos economistas liberais) foi de apenas 1,44% a.a, valor que corresponde a apenas 54,6% do crescimento do período 1980-2014. Os dados não permitem chegar a outra conclusão: o experimento liberal no Brasil foi um fracasso retumbante.

Confrontados com a realidade inescapável do seu fracasso, os economistas liberais reagem afirmando que o Brasil ainda não adotou todas as reformas que precisa. Além das reformas já realizadas é necessário um choque de privatização, com a venda do que resta das empresas estatais brasileiras, Petrobrás inclusa, e a adoção de uma reforma administrativa que (sic) modernize o setor público brasileiro.

O choque de “privatização” é uma má ideia já abandonada pelos países desenvolvidos. Conforme a figura 3 abaixo mostra, a onda de privatizações nos países desenvolvidos foi largamente revertida o período 2000-2017, ou seja, verificou-se um intenso movimento de reestatização devido as ineficiências manifestas das empresas privatizadas, as quais aumentaram os preços dos seus produtos ao mesmo tempo que reduziram a qualidade dos serviços prestados.

Figura 3 : A Movimento de “reestatização” nos países desenvolvidos (2000-2017)

Fonte: Transnational Institute.

A reforma administrativa, por seu turno, não tem por objetivo (sic) modernizar o serviço público no Brasil mas tornar os servidores públicos em serviçais dos políticos de plantão, conforme argumento em artigo publicado no Brazilian Journal of Political Economy escrito em co-autoria com meu orientado de doutorado em economia na Universidade de Brasília, Helder Lara Ferreira Filho (Ver https://www.scielo.br/j/rep/a/djDvQj9mJ9xQS5RcWw8sVbq/). Se a reforma administrativa for aprovada o Estado Brasileiro irá retornar aos padrões prevalecentes na “República Velha”, um retrocesso de quase um século!

A agenda econômica liberal proposta pelo governo Temer e, ao menos na esfera da retórica, pelo governo Bolsonaro nada mais é do que o retorno ao que o historiador econômico Erik Reinert (2016) denomina de “colonialismo”. Nas suas palavras

O Colonialismo é, antes de tudo, um sistema econômico, um tipo de integração econômica profunda entre os países. Não importa muito sob qual liderança política isso ocorre – independência nominal e “livre comércio” ou não. O importante é verificar que tipos de bens flui em qual direção. Pelo sistema de classificação acima as colônias são nações especializadas no “comércio ruim”, na exportação de matérias primas e na importação de bens de alta tecnologia, seja industriais ou vindos de um setor se serviços que faz uso intensivo de conhecimento” (p. 190).

O ponto que quero ressaltar é que o Brasil dos últimos 20 a 30 anos anos adotou, inicialmente de forma inconsciente, e depois de 2016 de forma deliberada, o modelo “colonialista”. A agenda de reformas não tem por objetivo emular as políticas econômicas que fizeram com que os países ricos se tornassem ricos (tema do livro de Reinert), mas sim produzir uma espécie de “acumulação primitiva de capital” por intermédio do retorno do país as atividades primário-exportadoras e a redução dos salários e benefícios trabalhistas, elevando assim a “mais-valia absoluta” para utilizar o conceito criado por Karl Marx. A reprimarização da pauta de exportações brasileira no período 2008-2014) fica bem clara na Tabela abaixo extraída de Oreiro e D´Agostini (2016):

Esse projeto tem por objetivo a recuperação da taxa de lucro do capital (ROE: return over equity ou retorno sobre o capital próprio) na economia brasileira, o qual se reduziu de forma significativa no período 2010-2014 devido a elevação dos salários reais acima do crescimento da produtividade do trabalho em função do sobreaquecimento do mercado de trabalho, conforme podemos verificar na Tabela abaixo extraída de Oreiro e D´Agostini (2016). Em suma, trata-se de um projeto para reverter o profit-squeeze por intermédia de uma sobre-exploração da força de trabalho.

Nesse contexto, no aniversário de 200 anos da independência do Brasil temos muito pouco a comemorar. Com efeito, o modelo econômico adotado nos últimos 15 a 20 anos (governos FHC incluso) abandonou o projeto “Varguista” de desenvolvimento econômico como instrumento para garantir a soberania e a independência de facto do Brasil. Os conselhos dados pelos economistas liberais não tem por objetivo tornar o Brasil uma nação rica e soberana; mas apenas reforçar os laços coloniais que o país voltou a ter a partir dos anos 1990 com as “reformas liberais” implementadas pelos governos Collor e FHC. As administrações petistas tentaram descobrir a “quadratura do círculo”, tentando conciliar os interesses coloniais de nossas elites com mecanismos de promoção de equidade social. Essa contradição inerente ao projeto petista – qual seja, “conciliar & desenvolver” – está na raiz do golpe parlamentar que tirou a Presidenta Dilma Rousseff do poder em 2016, sem que tenha havido motivação jurídica para o impeachment. Desde 2016 as rédeas da política econômica no Brasil tem estado com os economistas liberais, os quais depois de um período de serviços prestados ao colonialismo, exercendo altos cargos na administração pública, são regiamente recompensados com postos de trabalho altamente remunerados no setor financeiro privado. Ao fim e ao cabo, Clausewitz estava certo: a maneira como pensamos é fundamental. A tragédia do Brasil é que nossa elite econômica e política não está interessada em defender a construção de uma nação rica e soberana, mas apenas em satisfazer seus desejos privados de acumulação de capital, por mecanismos primitivos de sobre-exploração da força de trabalho conjugados com a devastação ambiental largamente promovida pelo governo Bolsonaro. Infelizmente nada teremos a comemorar no dia 07 de setembro de 2022.

Referências:

Oreiro, J.L; D´Agostini, L.M. (2016). “From Lula Growth Spectacle to the Great Recession (2003-2015): Lessons of the management of the macroeconomic tripod and macroeconomic challenges for
restoring economic growth in Brazil”. Artigo apresentado no workshop “Central Banks in Latin America: In Search for Stability and Development” realizado na Pontíficia Universidade Católica de Lima, Peru, no período de 12 a 13 de maio de 2016. Disponível em http://joseluisoreiro.com.br/site/link/eca7eac82f16c20f9c2c75cb375ecbc01489ea2f.pdf

Reinert, Erik. S. (2016). Como os países ricos ficaram ricos e por que os países pobres continuam pobres. Contraponto: Rio de Janeiro.


Alberto Aggio: História e política no “longo pós-guerra” da Itália

Itália em disputa de Giuseppe Vacca lançado entre nós recentemente é um livro magistral. Em 303 páginas Vacca analisa 35 anos da vida política italiana depois de ultrapassado o fascismo e a devastadora guerra que arrasou seu território. É sobretudo um excepcional livro de História Política que seguramente será muito útil aos estudiosos desse campo da História em nosso país, sem falarmos no leitor interessado em compreender os desafios da contemporaneidade.

Campanha eleitoral em 1948 evidenciava o embate entre PCI e DC

O subtítulo do livro “comunistas e democratas-cristãos no longo pós-guerra (1943-1978)”, dá a indicação explícita de que não se trata especifica e cronologicamente de um estudo sobre a I República, mas sobre as conexões e os embates políticos que compõe o pós-guerra na Itália: um momento de reconstrução do país e de luta em torno dos critérios e possibilidades da modernização da sociedade italiana. Essa luta implicou o estabelecimento da República e em seguida de uma nova Constituição para o país. Essa grande epopeia fez nascer e se estabelecerem duas grandes forças políticas no país: a Democracia-Cristã e o Partido Comunistas Italiano (PCI).

Esses são os dois atores centrais do livro de Vacca. A contraposição e o diálogo entre eles, a dura luta não apenas no Parlamento, mas também nas ruas e praças. Para além do confronto, a concordância entre ambos em diversos momentos e temas pontuais; embates e consensos que produziram como resultado a ampliação dos direitos dos trabalhadores, a unidade do país e a sua inserção no contexto europeu. Duas forças políticas populares, enraizadas no território, mas opostas ideologicamente. Elas iriam, surpreendentemente, produzir o consenso e as profundas mudanças culturais em torno do que viria a ser a Itália nas mais de três décadas do pós-guerra.

Duas forças políticas que, sem excluírem as outras de menor peso – dentre elas o Partido Socialista Italiano (PSI) –, souberam avançar a modernização e alterar as estruturas do país bem como a sensibilidade social e cultural dos italianos. Foram esses dois partidos, a DC inspirada no “personalismo cristão” e o PCI no “internacionalismo proletário”, que de fato se assumiriam, cada um a seu modo, a função ou o papel de um “partido da Nação”, conectados com os ditames da nova ordem mundial do pós-guerra. Para um dividido e conflituoso como a Itália, isso tinha um significado extraordinário, que acabaria se perdendo anos mais tarde.

De Gasperi e Togliatti em reunião do primeiro governo republicano na Itália do pós-guerra

Em torno desses dois atores, os diversos capítulos do livro asseveram que a hegemonia político-cultural desse processo esteve com a Democracia-Cristã e que o PCI jamais conseguiu destrona-la e, com isso, vencer as eleições e governar o país. A conjuntura internacional da Guerra Fria e a hegemonia católica impediam essa perspectiva e exigiam o realismo dos dirigentes comunistas. Isso ficou claríssimo em 1948, a primeira eleição para o novo Parlamento, na qual os comunistas se tornaram o segundo partido mais votado, levando uma política de classe contra classe, o que era impraticável para se assumir o governo naquela conjuntura.

De acordo com Vacca, o que dava sustentação ao sistema político que se montou com a Constituição republicana de 1948 não era a oposição entre direita e esquerda, mas uma dupla legitimação que envolvia aquelas duas forças políticas: o antifascismo, base do “campo democrático”, no qual estavam comprometidos tanto a DC quanto o PCI, e o anticomunismo, imprescindível para governar no período da Guerra Fria. Essa tese interpretativa explica efetivamente a capacidade hegemônica da DC e dá sentido ao predomínio desse partido nesse “longo pós-guerra”. Por essa razão nunca houve realmente a possibilidade de alternância na formação dos governos italianos desse período. Essa impossibilidade, dentre outros fatores, gerou o que mais tarde foi caracterizado como uma “democracia bloqueada”.

O livro de Vacca visa iluminar esse complexo período, examinando duas culturas políticas que plasmaram a sociedade civil italiana e determinaram a qualidade das suas classes dirigentes. O autor divide essas três décadas em duas partes: a reconstrução e o milagre econômico e, sucessivamente, o período no qual “se manifestou uma fragilidade orgânica do país e se puseram as premissas do subsequente declínio”. Vacca sintetiza essa passagem da seguinte forma:

na fase ascendente da República, DC e PCI foram duas forças políticas originais no panorama europeu, conscientes da própria função histórica e capazes de regular seus conflitos e valorizar sua complementariedade, tendo uma visão mais ou menos adequada da estrutura do mundo. O declínio da nação italiana deita raízes exatamente no desgaste, por causa da mudança do tempo, dessas capacidades” (p.16).

As razões fundamentais do declínio são sintetizadas em torno da não percepção da mudança do tempo histórico. Para Vacca, líderes importantes como Aldo Moro e Enrico Berlinguer, embora tivessem intuído “a aproximação do fim do longo pós-guerra”, tentando dar ou renovar a coesão do país por meio da convergência das duas maiores forças políticas (DC e PCI, o “compromisso storico”), “não tiveram percepção adequada da ‘grande transformação’ e não conseguiram evitar que a Itália fosse considerada um foco de instabilidade tanto a Oeste quanto a Leste” (p.18). E assim foi: a classe política desse glorioso período não sobreviveu ao fim da Guerra Fria e a emergência do Mercado Comum Europeu.

A partir dos anos 1990 e nas duas primeiras décadas do século XXI, tanto a regulação política interna quanto a adequação internacional, em função do fim da Guerra Fria, da emergência da globalização, etc., a Itália perde a capacidade de atualização ao contexto europeu: “as culturas políticas que ocupam a cena divergem daquelas dos principais países europeus, mais ainda do que nas décadas precedentes” (p.17).

Na leitura de Vacca, um país que não consegue formar “novas e robustas culturas políticas” acaba por se iludir com a ideia de que está participando ou construindo algo novo e, sem consciência, assume as mesmas faces ou máscaras da velha commedia dell’arte.

Para nós, brasileiros, o livro de Vacca é útil sob diversos aspectos, além daqueles mencionados acima. Metodologicamente, poderíamos mobilizá-lo para se pensar a fase ascendente do nosso processo de democratização, que gradativamente teve coincidência com as mesmas “mudanças do tempo” mencionada por Vacca. Nessa fase de ascensão democrática, conquistamos uma nova Constituição e a nossa classe dirigente soube enfrentar os diversos desafios políticos e econômicos que se seguiram: debelar a inflação e se preparar para uma integração ativa na globalização emergente. Os governos de FHC significaram o ápice dessa ascensão, que permaneceu inercialmente no primeiro governo de Lula.

Depois disso, a nossa trajetória é reconhecidamente descendente no plano político, com a ausência clara de uma nova classe dirigente e a deriva do país, até a desastrosa emergência da extrema-direita, com a vitória de Jair Bolsonaro em 2018. Como escrevi em outro artigo, a “perda de consenso em relação à ordem democrática, acarretando um recorrente antagonismo político, polarizações sucessivas e diversas, que perigosamente comprometem a unidade da Nação e suas perspectivas democráticas”[1] parece ter se tornado a tônica da vida política brasileira nos últimos tempos.

O livro de Vacca poderia ser, assim, um ponto de inspiração para que se desenvolvesse uma pesquisa sobre esses dois momentos na democratização brasileira, o ascendente e o descendente. Mas seria importante ressaltar que, ao contrário da Itália, no Brasil, dois atores, supostamente próximos, em disputa antagonística geraram uma polarização destrutiva e não colaborativa. Esse “Brasil em disputa”, dificilmente poderia olhar de maneira positiva para o passado, como faz Vacca, a despeito de todas as observações criticas. Contudo, estariam, Itália e Brasil, irmanados num presente que somente o “pessimismo da razão” aparece aos nossos olhos como uma dimensão ainda produtiva.

A Itália em disputa – comunistas e democratas-cristãos no longo pós-guerra (1943-1978), de Giuseppe Vacca, FAP/Unicamp, 2021, 303p., tradução de Luiz Sérgio Henriques.

(Resenha publicada simultaneamente em Revista Será?, de 01 de abril de 2022; https://revistasera.info/2022/04/historia-e-politica-no-longo-pos-guerra-da-italia/)


[1] A referência é de um artigo recentemente publicado que se pode acessar em https://horizontesdemocraticos.com.br/brasil-e-chile-uma-historia-comparada-de-golpes-autoritarismo-e-democracia/


Paulo Iotti: “Tentativa de censura ao Lollapalooza foi nefasta”

João Rodrigues, da equipe da FAP

A decisão do ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de proibir manifestações políticas no festival Lollapalooza, realizado no último fim de semana em São Paulo, causou revolta no meio artístico. Juristas e parlamentares dos mais diversos partidos classificaram a liminar do TSE como censura. Três dias após a decisão, o próprio ministro Raul Araújo revogou a liminar que proibia manifestações políticas no festival de música, depois que o Partido Liberal (PL), legenda do presidente Jair Bolsonaro, pediu a retirada da ação.

https://open.spotify.com/episode/3nHAtBEi0BmeniEkpwGuHF?si=aNX29b6AShOfCa4AFKzFyA&utm_source=copy-link

No entanto, o caso reacendeu na sociedade a importância sobre o direito à liberdade de expressão. Para analisar os impactos da tentativa de censura ao Lollapalooza, o podcast da Fundação Astrojildo Pereira (FAP) conversa com o advogado Paulo Iotti. Doutor e mestre em Direito Constitucional pela Instituição Toledo de Ensino, Iotti é especialista em Direito da Diversidade Sexual e de Gênero e em Direito Homoafetivo, além de professor universitário. Diretor-Presidente do GADvS - Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero, é ainda sócio do Instituto Brasileiro de Direito de Famílias (IBDFAM).

Censura prévia, falta de critério em decisões de tribunais superiores e a confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro também estão entre os temas do programa. O episódio conta com áudios da Jovem Pan News, O Povo Online, Multishow, TV Cultura e UOL.

O Rádio FAP é publicado semanalmente, às sextas-feiras, em diversas plataformas de streaming como Spotify, Youtube, Google Podcasts, Ancora, RadioPublic e Pocket Casts. O programa tem a produção e apresentação do jornalista João Rodrigues.




Luiz Carlos Azedo: Atitude de Silveira foi uma provocação ao Supremo

Ao se recusar a usar tornozeleira eletrônica, desafiando o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e buscar refúgio nas dependências da Câmara, exigindo solidariedade do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), o deputado Daniel Silveira (União Brasil-RJ) escalou uma provocação política, cujo objetivo era criar um ambiente de radicalização contra a Corte, com propósitos eleitorais e um viés golpista. Silveira somente recuou diante da multa de R$ 15 mil para cada dia sem tornozeleira, que lhe foi aplicada por Moraes em consequência da rebeldia.

Pressionado, Lira fora condescendente com Silveira: distribuiu nota na qual afirmava que o plenário da Câmara é inviolável e defendeu que o plenário do Supremo analise o pedido de revogação da decisão de Moraes feito pela defesa de Silveira. Réu no STF por estimular atos antidemocráticos e ameaçar as instituições, o parlamentar fluminense passou a madrugada de terça para quarta-feira em seu gabinete, depois de anunciar que não colocaria a tornozeleira; diante da decisão de Moraes e da nota do presidente da Câmara, se refugiou no plenário. O julgamento da ação penal contra Silveira está marcado para 20 de abril.

Aliado dos bolsonaristas da Câmara, que tiveram um papel importante na sua eleição, Lira assumiu uma posição ambígua em relação a Silveira: “Decisões judiciais devem ser cumpridas, assim como a inviolabilidade da Casa do Povo deve ser preservada. Sagrada durante as sessões, ela tem, também, dimensão simbólica na ordem democrática”, argumentou. Moraes atendeu a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que solicitou a aplicação de medidas restritivas ao deputado.

A atitude de Silveira mira os eleitores bolsonaristas, mas criou uma situação de choque entre os Poderes, porque desobedeceu a uma decisão do Supremo e transformou o plenário da Câmara num refúgio seguro contra uma decisão judicial que não interfere na sua atividade parlamentar. Às vésperas das eleições, foi um péssimo exemplo; há outros parlamentares que endossam suas atitudes. Até uma ridícula benção de deputados evangélicos houve na porta do gabinete de Silveira.

Congressistas somente podem ser presos em flagrante, por crime inafiançável. Mesmo assim, a Câmara e o Senado podem revogar a prisão. No caso de medidas cautelares, o STF já decidiu que, caso elas influenciem no exercício do mandato do parlamentar, o plenário da Câmara precisa se manifestar dentro de 24 horas para manter ou relaxar a medida. Em sua decisão, porém, Moraes afirma que a tornozeleira não impede o exercício do mandato de Silveira.

O deputado sinalizou uma linha de recrudescimento dos ataques e desafios ao STF por parte dos grupos bolsonaristas radicais. Aposta num ambiente de confrontação entre os Poderes, no qual a polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente Jair Bolsonaro projeta um cenário de radicalização política esquerda x direita nas eleições.

O gesto de Silveira foi estrategicamente pensado, pois coincidiu com o recurso encaminhado, ontem, ao Supremo por sua defesa, no qual pede a suspensão das medidas cautelares decretadas por Moraes. Também desgasta a Polícia Federal como polícia judiciária. Câmara e Senado têm sua própria polícia. Sua atitude incendeia as redes sociais bolsonaristas, pavimentando caminho para sua reeleição, ao mesmo tempo em que incentiva ataques ao Supremo, os mesmos que já o levaram à prisão.

Urna eletrônica

O superintendente da Polícia Federal no Distrito Federal, delegado Victor Cesar Carvalho dos Santos, foi à Câmara para notificar o deputado, mas não cumpriu a sua missão, porque não foi autorizado por Lira. É uma situação desmoralizante, mas tem tudo a ver com a atual situação da corporação, cada vez mais subordinada a Bolsonaro.

Ontem, em Parnamirim (RN), durante evento em clima de campanha eleitoral antecipada, o presidente voltou a questionar as urnas eletrônicas, ao afirmar que os votos “serão contados” e que “não serão dois ou três que decidirão como serão contados esses votos”, numa alusão aos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), entre os quais Alexandre de Moraes, que presidirá a Corte durante as eleições.

É o tipo de comentário que sinaliza aos grupos bolsonaristas que chegou a hora de uma nova temporada de ataques à Justiça Eleitoral. Os ataques de Bolsonaro às urnas eletrônicas são constantes e fazem parte de uma estratégia para questionar o resultado das urnas caso perca as eleições. Segue a cartilha adotada pelo ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, que não aceitou a eleição de Joe Biden. O presidente brasileiro foi um dos últimos chefes de Estado a reconhecer a vitória do democrata.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-atitude-de-silveira-foi-uma-provocacao-ao-supremo/

Conflitos internacionais marcam o 46º  Dia da Terra Palestina

A Palestina é um país banhado pelo mar Mediterrâneo e pelo Rio Jordão, com a extensão territorial de 27.000km2, mas que, desde 1948 sofre com a invasão do seu Solo Pátrio pelo Estado de Israel. São anos de violações dos direitos do povo palestino e de usurpação do seu território. Cerca de 25 Resoluções da Organização das Nações Unidas - ONU, do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral condenaram as ações de Israel na Palestina. Mas parece que, no caso palestino, as resoluções da ONU não tem efeitos reais.

O Dia da Terra tem a sua origem no ano de 1976, quando a sociedade palestina convocou a uma greve geral em protesto contra o roubo contínuo de suas terras por parte de Israel. Neste dia,  a entidade sionista pôs em ação mais um plano de expropriação de terras palestinas para criação de  novos assentamentos judaicos. Aproximadamente 4.000 policiais,  helicópteros e o   exército israelense foram enviados para a Galileia para reprimir  os protestos que culminou na morte de  seis manifestantes, milhares feridos  e centenas foram presos. Uma verdadeira ação de guerra, onde tanques e veículos blindados invadiram as estradas de várias cidades na Galileia.

O protesto não conseguiu impedir os planos de desapropriação de terras. O número de colônias criadas chegou a 26 em 1981 e 52 em 1988. Essas colônias, juntamente com as "cidades de desenvolvimento" de Alta Nazaré, Ma'alot-Tarshiha, Migdal HaEmek e Karmiel alterou significativamente a composição demográfica da Galileia. Atualmente, os planos de expansão e ocupação estão em pleno andamento em toda a Palestina. São ​​ confisco de terras, severas restrições à liberdade de movimento e discriminação racial e étnica. Cerca de 700 mil colonos israelenses vivem em assentamentos ilegais em Jerusalém Oriental e na Cisjordânia[1].  Recentemente, o bairro de Sheikh Jarrah foi alvo dos nacionalistas israelenses que reivindicavam a região. A ação israelense de despejo de famílias palestinas de suas casas no bairro Sheikh Jarrah deixou centenas de mortos e feridos. A legislação israelense confronta a ONU, que define o despejo e o deslocamento compulsório de famílias como crime de guerra. Essas políticas de destruição também são aplicadas ao caso de Khan Ahmar, onde o governo israelense anunciou a demolição da aldeia beduína de Khan al-Ahmar, localizada a leste de Jerusalém.

O Dia da Terra tornou-se mais uma forma de resistência em defesa da Pátria Palestina, encontrando apoio em diferentes partes do mundo, junto aos refugiados palestinos e aos ativistas da causa! O povo palestino luta de todas as formas contra a ocupação colonial! A justa reação dos palestinos em defesa de suas terras não é intimidada pela violência israelense.

A situação atual, em específico os conflitos vividos nestes últimos dias, revelam a incapacidade do Ocidente e a sua falta de vontade de abordar seriamente a realidade do que está acontecendo na Palestina. O comportamento da mídia ocidental na questão da Ucrânia parece fazer sumir todos os conflitos e questões históricas existentes.  Narrativas predominantes na imprensa levam ao discurso eurocêntrico racista contra os negros, indígenas, palestinos e contra as diversas comunidades étnicas. O jornalista Charlie D’Agata, da rede estadunidense CBS, por exemplo, afirmou que a situação é problemática por Kiev ser uma cidade “relativamente civilizada, relativamente europeia, ao contrário de lugares como Iraque e Afeganistão”, segundo suas palavras[2]. Esse discurso não é algo isolado, pois o tratamento da mídia sobre esse conflito demonstra seu desprezo pelas vidas não brancas, bem como o preconceito histórico contra os povos orientais e a diferença de tratamento às vítimas brancas e não brancas em território ucraniano.

Os mecanismos midiáticos alimentam o racismo sistêmico e global. Todas as vidas importam e, na história, muitas violências e guerras aconteceram devido à expansão territorial, resultando na morte de milhares de pessoas, mas essas reportagens são ocultadas pela imprensa internacional. É necessário a articulação das forças  progressistas  internacionais para o fortalecimento de mídias alternativas  e   para o  desenvolvimento de novas estratégias de comunicação para  furar o cerco da mídia imperialista. 

Outra forma de violência do cotidiano palestino são as prisões arbitrárias. Mais de 5.500 presos políticos palestinos estão em prisões israelenses.  Existem 51 prisioneiros detidos por mais de duas décadas, como a liderança Ahmad Sa'adat, preso em 2002 em Jericó pela Autoridade Nacional Palestina (ANP) e sequestrado em 2006 por forças israelenses e preso em  Israel. Devido ao sequestro, a Anistia Internacional declarou esta detenção ilegal, justificando novo julgamento ou ser libertado[3]. A cada ano, mais de 500 menores palestinos, alguns de até 12 anos, são presos pelas forças de segurança israelenses, alguns exemplos são Husam Abu Khalifa, Malak Al-Ghalit e Ahed Tamimi.

Neste Dia da Terra Palestina, reforçamos a defesa do nosso Solo Pátrio histórico com a capital Jerusalém, o direito do retorno dos refugiados palestinos e pela imediata libertação dos presos políticos! Defendemos a nossa unidade, a resistência palestina, nosso compromisso na construção da Palestina Livre, laica e democrática!

 Viva a solidariedade internacional à Palestina!

Dia da terra Palestina, março, 2022

Assinam este manifesto:

Comitê Catarinense de Solidariedade ao Povo Palestino

Comitê Palestino Democrático

Comitê de Solidariedade à Luta do Povo Palestino do Rio Janeiro

Comitê Gaúcho de Solidariedade ao Povo Palestino

Centro Cultural Árabe Palestino de São Paulo

Centro Cultural Palestino do Rio Grande do Sul

Sociedade Árabe Palestina Brasileira de Corumbá

Sociedade Árabe Palestina de Santa Maria – RS

Sociedade Palestina de Brasília

União Palestina da América Latina (UPAL)


[1] https://brasil.un.org/pt-br/156806-expansao-de-assentamentos-israelenses-fere-direitos-de-palestinos

[2] https://revistaforum.com.br/global/2022/2/27/correspondente-da-cbs-ucrnia-no-como-iraque-ou-afeganisto-civilizada-video-110749.html

[3] https://web.archive.org/web/20060811000257/http://web.amnesty.org/library/index/ENGMDE150962002


Amazônia: ecossistema de crimes favorece do desmatamento ao tráfico

José Maria Tomazela / O Estado de S.Paulo

SOROCABA - A Amazônia se tornou uma floresta de crimes. As atividades ilícitas praticadas há muito na região, e intensificadas nos últimos anos, são favorecidas por um ecossistema que interconecta crimes ambientais a delitos financeiros, tributários e, em última instância, até ao tráfico de drogas e a disputa de facções locais. Estudos desenvolvidos sobre operações na região mostram que o desmatamento não anda sozinho.

A derrubada da floresta está, assim, ligada a outras atividades diretas que visam ao lucro, como a grilagem de terras, a agropecuária em locais proibidos e a mineração clandestina. Uma análise de 369 operações da Polícia Federal nos últimos cinco anos mostrou que em 30% dos crimes ambientais havia suspeita de fraude, em 21% havia suspeita de corrupção e em 20%, suspeita de lavagem de dinheiro.  

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Em metade dos casos, foi possível identificar a atuação de uma organização criminosa, caracterizada pela atuação em grupo voltado à prática de crimes graves. O levantamento e a análise são do Instituto Igarapé, que divulgou o trabalho no último mês. No conjunto, os crimes com alguma dimensão de violência (armas, drogas, crimes contra a pessoa e trabalho escravo), estavam presentes em 29% das operações.

Para a diretora de pesquisa do Igarapé, Melina Risso, existe um ecossistema de ilicitudes ligadas a esse tipo de crime que tem profundas implicações para a segurança pública brasileira. “A ausência de uma resposta contundente por parte do poder público fomenta a entrada de novos grupos criminosos, provoca danos ambientais, sociais e econômicos seríssimos e atenta contra a integridade da floresta e das comunidades locais, sobretudo populações indígenas, quilombolas e tradicionais”, disse.

O estudo observou que os crimes ambientais são tratados como de “segunda categoria”, ignorando as evidências de que esse ilícito fomenta a entrada de novos grupos criminosos no País, provocando danos ambientais, sociais e econômicos. Além da madeira nobre, de alto valor nos mercados nacional e internacional, o subsolo amazônico contém pedras preciosas, ouro e outros minerais que atraem, além de aventureiros que sonham em fazer fortuna, criminosos de toda sorte.

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Agentes da Polícia Federal em operação contra a extração ilegal de madeira da Floresta Amazônica Foto: EXÉRCITO BRASILEIRO - 11/5/2020

A dinâmica segue a lógica do dinheiro: a grilagem de terras públicas por particulares, fenômeno antigo e constante na Amazônia, viola normas ambientais, agrárias, criminais e tributárias, gerando apropriação de recursos naturais de forma ilícita. O “grilo” associa-se ao desmatamento para a venda ilegal de madeira e exploração da agropecuária – a presença do boi é demonstração da posse, ainda que ilegal – e com a especulação fundiária.

A extração ilegal de madeira implica no corte seletivo de árvores valiosas, como cedros, maçarandubas, jacarandás e castanheiras, para comercialização nacional ou no exterior, violando os sistemas de regulação, como autorização para o corte, de transporte e de venda, com o uso de guias e documentos falsos e corrupção de agentes públicos. A atividade dá causa a conflitos e assassinatos.

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Para os autores da análise, o aumento na complexidade e na violência ligada ao crime ambiental na Amazônia aponta para desafios de governança, coordenação estratégica e inteligência, já que as cadeias ilícitas do ouro de da madeira ultrapassam fronteiras. “O desmatamento e a degradação da floresta Amazônica, comprometem o futuro e o bem estar das próximas gerações, e prejudicam o meio ambiente e a regulação do clima em escala planetária”, disse Ilona Szabó, presidente do Instituto Igarapé.

Deflagrada em 2019, em parceria com o Ministério Público Federal (MPF), no arco do desmatamento, no sul do Amazonas, a operação Ojuara prendeu 18 pessoas e outras 31 receberam medidas cautelares. Foram apreendidos R$ 800 mil em dinheiro vivo, máquinas agrícolas, sete mil cabeças de gado e um avião. Ao todo, 22 pessoas, entre elas servidores federais, foram denunciadas por crimes como corrupção, formação de milícia privada, divulgação de informações sigilosas, lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Um dos denunciados por lavagem de dinheiro usava a esposa como “laranja”, registrando em nome dela valores de até R$ 3,6 milhões obtidos com venda ilegal de madeira e gado. Conforme a denúncia do MPF, quatro policiais militares do Acre formaram uma ‘milícia privada’ para expulsar pequenos posseiros e extrativistas de áreas griladas por três fazendeiros. Os policiais usavam fardas, armas e viaturas da corporação - um dos PMs é conhecido pelo apelido de “Morte”. Entre outros crimes, eles são acusados de tentativa de homicídio, por terem baleado um catador de castanha, que sobreviveu.

A procuradora da República Ana Carolina Haliuc Bragança, que coordenou a Força-Tarefa Amazônia, disse que um dos saldos positivos das operações realizadas entre 2020 e 2021 na região amazônica foi a produção de conhecimento sobre as práticas delitivas empregadas por redes de crime organizado ambiental. “Houve a confirmação da hipótese inicial de que a criminalidade ambiental assumiu caráter de criminalidade organizada na Amazônia, associando-se a ilícitos vários, como lavagem de dinheiro, falsidades ideológicas e materiais, estelionato, grilagem de terras e corrupção”, pontuou.

Ela lembrou que é importante debater, no âmbito do Ministério Público e de instituições parceiras como a Polícia Federal, o fortalecimento estrutural e permanente das instituições na região norte para fazer frente a esse novo desafio da criminalidade ambiental conexa. “Cada vez mais temos operações voltadas não apenas às condutas específicas e pontuais, mas às verdadeiras redes criminosas que atuam nos diversos biomas do Brasil”, disse.

A análise mostra que a falta da devida responsabilização dos atores envolvidos em atividades com grande impacto no desmatamento, como grilagem de terra e posterior uso para atividades agropecuárias, estimula a continuidade das ações. “Apesar do esforço de alguns setores econômicos em promover o desenvolvimento sustentável da região, o desmatamento ilegal e a degradação da Amazônia continuam crescendo. É preciso avançar na identificação, dissuasão estratégica e responsabilização dos envolvidos nessas atividades ilícitas”, disse Andreia Bonzo Araujo Azevedo, diretora-adjunta de Segurança Climática do Igarapé.

Fenômenos são interligados pelo controle territorial por grupos armados

 O projeto Cartografia das Violências na Região Amazônica, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, apontou a crescente atuação de facções criminosas na disputa pelas rotas nacionais e transnacionais de drogas e de ouro, contribuindo para o aumento das taxas de mortes violentas nos Estados amazônicos. Enquanto no Sudeste a taxa de homicídio caiu 19,2% entre 1980 e 2019, no Norte houve crescimento de 260,3%.

Em 2020, foram reportadas 8.729 mortes intencionais nos municípios que compõem a Amazônia legal – a taxa de 29,6 mortes por 100 mil habitantes foi mais alta que a média brasileira, de 23,9 por 100 mil. Estados com maior pressão de desmatamento tiveram taxa de homicídios ainda mais alta: Amazonas (37,8), Amapá (51,4), Pará (53,2) e Roraima (71,8), a mais alta do Brasil na oportunidade.

O Amazonas assistiu a um aumento de 55% no número de homicídios em 2021. Foram 1.487 assassinatos contabilizados no ano passado frente a 957 em 2020, quando os homicídios no cenário nacional caminharam em sentido oposto e caíram 7%.

No Acre, facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC)Comando Vermelho (CV) e Bonde dos 13 atuam para controlar a entrada de drogas pela fronteira com o Peru. No Amazonas, berço da Família do Norte (FN), atuam também o CV e o PCC. Há ainda grupos de piratas que interceptam a droga pelo rio Solimões e seus afluentes, como o Família do Coari, causando conflitos entre as facções. No Amapá, agem a União Criminosa do Amapá (UCA) e a Família Terror do Amapá (FTA), esta aliada do PCC. A região é rota das drogas que seguem para o exterior, através das Guianas e do Suriname.

Conforme a equipe do projeto ‘Cartografia’, os números sobre a violência na Amazônia mostram que não faz sentido separar urbano e rural, ou cidade e floresta. “Os fenômenos são distintos, mas estão intrinsecamente interligados à dinâmica do controle territorial por parte de grupos armados. A preservação da Amazônia envolve a articulação de diferentes instâncias e atores para que políticas públicas e justiça social ocupem o lugar hoje exercido pela criminalidade organizada”, avaliou.

Ministério diz combater crime organizado

Ministério da Justiça e Segurança Pública, ao qual está vinculada a Polícia Federal, informou que realiza operações de combate ao crime organizado e crimes ambientais na região da Amazônia, em conjunto com outros órgãos federais e estaduais. “Outras ações duras de combate ao crime estão em planejamento e serão divulgadas oportunamente”, disse, em nota. Só nos primeiros 10 dias de março foram realizadas quatro operações importantes na região amazônica.

Os três Estados onde mais se observou a conexão entre desmatamento e criminalidade, segundo o estudo do Instituto Igarapé, informaram ter adotado ações recentes de combate a esses ilícitos. A Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do estado do Pará informou que, de 1º de agosto de 2021 a 3 de março de 2022, levando em consideração o ano Prodes – projeto que monitora por satélites o desmatamento por corte raso na Amazônia Legal – houve redução de 12% nos alertas de desmatamento.  Já a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup) informou que está desenvolvendo ações estratégicas de enfrentamento da criminalidade nos municípios de São Félix do Xingu e Altamira, reduzindo significativamente os indicadores de homicídios na região.

O governo do Amazonas informou que, desde abril de 2021, acontece nos municípios do sul do Estado a Operação Tamoiotatá, que visa combater o desmatamento e as queimadas naquela região do Estado. O governo do Estado de Rondônia, por intermédio da Secretaria da Segurança Pública, Defesa e Cidadania, iniciou no dia 20 de fevereiro a Operação Ordo, a fim de prevenir crimes contra a vida nas regiões do Cone Sul, do Café e Zona da Mata do estado, com reforço das ações da Polícia Militar. O objetivo é promover ações durante todo o ano. Segundo a pasta, a missão foi motivada pela necessidade de manter a preservação da ordem pública diante dos índices de criminalidade, especialmente crimes contra a vida. / COLABOROU BRUNO TADEU, ESPECIAL PARA O ESTADÃO

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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,amazonia-ecossistema-de-crimes-favorece-do-desmatamento-ao-trafico,70004022629


Desigualdade de gênero, barreira ao crescimento profissional das mulheres

Maria Nilce Mota / Correio Braziliense

A desigualdade de gênero persiste como um grave problema social no Brasil. A despeito de todos os avanços da sociedade é inquestionável a forte influência do patriarcado na nossa formação como indivíduos. A relação homem x mulher continua desigual (de maneira sistêmica e cultural) e está presente no meio social, profissional e familiar.

Apesar de as mulheres brasileiras representarem a maioria da população (51,7%), isso está longe de ser traduzido em empregabilidade. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, as mulheres lideram as taxas de desemprego e foram as que mais perderam oportunidades por conta da crise econômica desencadeada pela pandemia de covid-19. Quando falamos em cargos de liderança a disparidade na representatividade se torna ainda mais evidente. Ainda segundo dados do instituto, as mulheres receberam apenas 77,7% do salário dos homens em 2019.

Conforme escalamos a pirâmide hierárquica, a disparidade aumenta e as mulheres continuam a ter proventos menores, cerca de 61,9% do rendimento dos homens em cargos de gerência e diretoria. Àqueles que buscam desculpas para justificar o injustificável não poderão se utilizar do grau de instrução, uma vez que as mulheres ultrapassaram a escolaridade dos homens ainda em 1991, de acordo com Núcleo de Pesquisa em Gênero e Economia (NPGE), da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF). Avanço resultante meramente de decisões pessoais das mulheres, já que não foram desenvolvidas políticas públicas para facilitar maior acesso à educação.

O exercício da liderança ainda pressupõe combates recorrentes aos estereótipos sociais e culturais. A associação entre liderança e masculino ainda é potente na sociedade, e essa construção nunca levou em conta a jornada de trabalho não remunerado, tais quais, cuidados com as crianças, demandas domésticas e outras responsabilidades familiares, fazendo com que o esforço das mulheres para alcançar cargos de gestão seja maiores e mais desafiadoras.

Para alçar altos cargos, não é preciso apenas provar competência, é necessário comprovar repetidas vezes a sua capacidade pelo simples fato de ser mulher. A verdade indigesta é que as estruturas das organizações, historicamente, não nos consideram no papel de liderança, de poder ou influência. Os estereótipos normativos de gênero impregnados socialmente, em geral, remetem a liderança a características tidas como masculinas.

Soma-se, ainda, ao fato dessas referências históricas de liderança estarem atreladas ao masculino, não se levando em consideração os obstáculos que as mulheres enfrentam para se colocarem nessa posição. Contudo, também é preciso considerar e comemorar os avanços sem perder de vista o longo caminho ainda a percorrer. Para isso, além do combate aos estereótipos de gênero, é preciso aumentar a representatividade feminina no mundo do trabalho e nos cargos de liderança.

Temos como exemplo o Congresso brasileiro, em que a bancada feminina representa apenas 15% dos parlamentares, sendo que as mulheres constituem a maioria do eleitorado brasileiro. Segundo o Mapa das Mulheres na Política da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil ocupa o 140º lugar no ranking de representação feminina no parlamento e um dos objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil é justamente a igualdade de gênero. É necessário pensar em estratégias nas organizações, mas também envolver atores sociais e econômicos para atuarem na redução da discriminação de gênero.

Um futuro sustentável e igualitário permanecerá fora de alcance enquanto as mulheres não tiverem a garantia de participação, em igualdade de condições e oportunidades na vida política, social e econômica do país. E essa não deve ser uma luta das mulheres e de todos que desejam viver em uma sociedade com justiça social.

*Maria Nilce Mota é superintendente de Ação Social e Filantropia do Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee)

Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2022/03/4996538-analise-desigualdade-de-genero-barreira-ao-crescimento-profissional-das-mulheres.html


Decisões individuais fora do tom são armadilha no caminho do TSE

Eloísa Machado de Almeida / Folha de S. Paulo

Decisão liminar do ministro Raul Araújo considerou que a manifestação de artistas em festival de música criticando Jair Bolsonaro e manifestando apreço por Lula seria um tipo de ilícito eleitoral, uma propaganda eleitoral antecipada, e proibiu as mesmas no restante do festival, sob pena de multa.

Muitas das regras eleitorais têm por objetivo garantir alguma igualdade de condições entre candidaturas.

É a partir da noção de uma competição justa que o resultado das eleições é legitimado.

Por exemplo, se candidatos esconderam gastos de campanha (caixa dois), usaram a máquina pública a seu favor ou seu tempo para depreciar adversários, a lei diz que eles estariam se beneficiando de condições que os colocariam em posição de vantagem frente aos demais na corrida eleitoral.

As regras relativas à vedação da campanha antecipada compartilham do mesmo propósito: na competição por votos, nenhum dos candidatos pode sair na frente.

Absolutamente nada disso estava em questão no festival de música.

Gritar "Fora, Bolsonaro!", muito além do criticar sua candidatura, é exercício do direito ao protesto contra um presidente que está no cargo, em exercício. Não tem nada, absolutamente nada, com propaganda antecipada.

Da mesma forma, manifestação individual de apoio a um candidato é protegida pelo direito que todos nós temos de nos manifestarmos e nos posicionarmos politicamente.

Direito ao protesto e à manifestação política estão amparados pela Constituição e são centrais à democracia.

Não por outro motivo, o Código Eleitoral deixou bem claro que manifestações políticas e artísticas, que não impliquem pedido explícito de voto ou sejam feitas em eventos políticos eleitorais animados por shows, não configuram nenhum ilícito eleitoral.

Porém, mesmo diante da clareza da Constituição e o Código Eleitoral, a decisão monocrática do ministro Raul Araújo determinou "proibição legal, vedando a realização ou manifestação de propaganda eleitoral ostensiva e extemporânea em favor de qualquer candidato ou partido político por parte dos músicos e grupos músicas que se apresentem no festival", sob pena de multa.

O ministro entendeu que "os artistas e cantores referidos que se apresentaram no evento musical em testilha, além de destilar comentários elogiosos ao possível candidato, pediram expressamente que a plateia presente exercesse o sufrágio em seu nome", ainda que nem o requerente da medida de censura —o PL pelo qual o presidente Bolsonaro tentará a reeleição— tenha afirmado isso em sua representação.

Com isso, a decisão extrapolou os fatos e a causa de pedir indicados na representação.

Ao se afastar da legislação, da Constituição, da interpretação dos tribunais e do processo que regula a prestação jurisdicional eleitoral, a decisão do ministro Raul Araújo se tornou ato de censura. Censura judicial, mas ainda assim, censura.

A censura é vedada em nosso ordenamento jurídico e se torna ainda mais grave quando se dá no âmbito de críticas ao governo.

Criticar livremente um governo, ainda que de forma deseducada, não pode ser proibido por legislação eleitoral, por legislação de segurança nacional, não pode gerar dossiês de monitoramento nem representações criminais de poderosos contra seus críticos.

Não é por acaso que tudo isso tenha acontecido neste governo: está em curso uma retração do espaço cívico e democrático no país, muitas vezes protagonizado pelas instituições que deveriam contê-la.

E é nessa dimensão que a decisão liminar do ministro Raul Araújo se torna ainda mais grave: ela expõe o Tribunal Superior Eleitoral e toda a Justiça Eleitoral a críticas de seletividade, excessiva politização e interferência indevida no jogo político.

Cada decisão monocrática fora do tom será uma armadilha no caminho do TSE.

Seja porque não se cercou de cautelas básicas para assegurar que decisão teria o destinatário correto (erros na identificação da pessoa jurídica responsável pelo festival de música atrasaram a notificação), seja porque artistas assumiram o risco econômico da multa, o fato é que a decisão não surtiu efeitos concretos no último dia do festival de música e foi sonoramente descumprida.

Ruim para o ministro Raul Araújo, péssimo para o tribunal, que tem se esforçado para manter a integridade das eleições e de suas decisões, não obstante ataques orquestrados e organizados por apoiadores do presidente em exercício, Jair Bolsonaro.

A decisão liminar é monocrática e não representa a posição do tribunal como um todo, que deverá se reunir nas próximas sessões para rever os seus termos.

Colegiadamente, os ministros reunidos deverão enfrentar o desafio que o uso de monocráticas traz para o tribunal.

Há formas de sair dessa armadilha: quando o Supremo Tribunal Federal foi desafiado pela crise política e sanitária, reorganizou sua maneira de julgar: passou a decidir rápida, pública e colegiadamente, como pesquisa sobre a atuação do STF no enfrentamento à Covid já demonstrou.

Há, assim, aprendizado institucional para lidar com os desafios do Brasil em crise e o Tribunal Superior Eleitoral deve incorporá-los. Afinal, a quem interessa uma Justiça Eleitoral fragilizada nas eleições de 2022? ​

*Eloísa Machado de Almeida é professora e coordenadora do Supremo em Pauta FGV Direito SP

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/03/decisoes-individuais-fora-do-tom-sao-armadilha-no-caminho-do-tse.shtml


Bolsonaro tenta ampliar influência no Exército em ano eleitoral

Marianna Holanda, Vinicius Sassine e Ricardo Della Coletta / Folha de S. Paulo

O presidente Jair Bolsonaro (PL) quer aproveitar a reforma ministerial em abril para tentar ampliar sua influência no comando do Exército em ano eleitoral, quando disputará a reeleição.

Integrantes do governo dizem que uma promoção do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, atual comandante do Exército, para o cargo de ministro da Defesa serve a dois propósitos: colocar à frente das três Forças um nome que agrade o Exército, que reúne o maior número das tropas, e, principalmente, acomodar à frente da Força terrestre alguém alinhado ao Palácio do Planalto.

É dado como certo que o general Marco Antônio Freire Gomes assumirá o comando do Exército. Hoje, ele é comandante de Operações Terrestres.

O ministro da Defesa, Walter Braga Netto, já se filiou ao PL e deve disputar a campanha ao lado do presidente Jair Bolsonaro (PL), como seu vice.

Da esquerda para direita o almirante Almir Garnier, o ministro Braga Netto, o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e o brigadeiro Almeida Baptista Jr. durante apresentação os novos comandantes das Forças Armadas, em março de 2021 - Pedro Ladeira - 31.mar.21/Folhapress

A troca no comando está prevista para ocorrer ainda neste mês de março. Freire Gomes deve deixar o comando de Operações Terrestres na próxima quarta (30). No dia seguinte, ocorreria a troca de comandante do Exército, conforme os preparativos burocráticos em curso na Força.

Em 31 de março completam-se 58 anos do golpe militar de 1964. A troca de comandante poderá ser efetivada neste dia. Bolsonaro, no começo de seu mandato, determinou a comemoração da data, que foi rememorada em cerimônias nos quartéis.

Apesar da movimentação interna, ainda não há uma confirmação oficial da troca do comando do Exército.

Freire Gomes foi cotado para o posto no ano passado, quando da demissão do ex-ministro Fernando Azevedo da Defesa e dos comandantes das três forças. O presidente enxerga no general alguém mais próximo ao bolsonarismo.

Naquele momento, março de 2021, foi colocada na mesa a questão da tradição por antiguidade, em que assume o posto o mais antigo na carreira. Oliveira preenchia esse critério, enquanto Freire Gomes ainda não estava nas primeiras posições da fila.

Aliados dizem que Bolsonaro se "encantou" com Freire Gomes durante a viagem à Rússia, em fevereiro. O general acompanhou a comitiva presidencial representando o atual comandante, que não pôde comparecer.

Ainda que o presidente possa acreditar que ampliaria sua influência no Exército indicando Gomes, integrantes da Força disseram que ele é respeitado pelos colegas e não embarcaria em uma "aventura" em ano eleitoral, com contestação do resultado das urnas, por exemplo.

Depois de ter reduzido as críticas às urnas eletrônicas após os atos de raiz golpista do 7 de Setembro, Bolsonaro voltou a questionar o sistema eleitoral nas últimas semanas.

O novo mantra do mandatário é argumentar que as Forças Armadas apresentaram ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) uma série de sugestões para supostamente prevenir o risco de fraude no sistema eleitoral.

"Dá para você fazer umas eleições limpas desde que acolhidas em comum acordo essas sugestões por parte das Forças Armadas. Não podemos disputar umas eleições sob o manto da desconfiança, isso é ruim para o Brasil", declarou Bolsonaro, em entrevista em 21 de março.

Bolsonaro durante audiência com o ministro da Defesa, general Braga Netto - Clauber Cleber Caetano/PR

Integrantes do Alto Comando do Exército ouvidos pela Folha, sob a condição de anonimato, minimizam o impacto de mais uma possível troca na Força.

Para esses generais, a saída de Edson Leal Pujol no ano passado é tida como mais traumática.

Pujol foi dispensado do cargo de comandante no mesmo contexto da demissão do então ministro da Defesa, Fernando Azevedo. Foi a pior crise militar desde a década de 70.

Bolsonaro fez as mudanças, que incluíram as trocas dos comandantes de Marinha e da Aeronáutica, para ter maior controle das Forças Armadas.

Integrantes do Alto Comando acreditam que um novo comandante —o terceiro em menos de quatro anos— serviria apenas a um mandato tampão.

Os generais avaliam que haverá uma troca em 2023, seja em caso de deslocamento do poder, com eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ou em caso de reeleição de Bolsonaro, que partiria para um segundo mandato disposto a "zerar o jogo", na visão dos militares.

O que integrantes do Alto Comando já ouviram é que Bolsonaro está disposto a colocar um integrante do Exército no posto de ministro da Defesa, e que o ocupante seria o atual comandante.


(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 10/08/2021) Desfile Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 10/08/2021) Desfile Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 31/03/2021) Encontro com os novos comandantes das Forças Armadas. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 20/04/2021) Solenidade de Passagem do Cargo de Comandante do Exército, do General de Exército Edson Leal Pujol ao General de Exército Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.
(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Brasília - DF, 10/08/2021) Desfile Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
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(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 10/08/2021) Desfile Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 10/08/2021) Desfile Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 12/08/2021) Solenidade de Promoção de Oficiais-Generais. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 31/03/2021) Encontro com os novos comandantes das Forças Armadas. Foto: Marcos Corrêa/PR
(Brasília - DF, 20/04/2021) Solenidade de Passagem do Cargo de Comandante do Exército, do General de Exército Edson Leal Pujol ao General de Exército Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.
(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Resende - RJ, 14/08/2021) Cerimônia de Entrega de Espadim aos Cadetes da Turma Bicentenário do General João Manoel Menna Barreto.
(Brasília - DF, 10/08/2021) Desfile Operação Formosa 2021. Foto: Marcos Corrêa/PR
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Da Marinha, há movimentos para que o comandante, almirante Almir Garnier Santos, vire ministro.

Parte do Exército se diz incomodada com uma nova troca no comando da Força. Generais dizem, reservadamente, que a troca "vulgariza" a instituição e demonstra mais uma tentativa de ampliação da politização das tropas por Bolsonaro —ainda que se diga que isso não tem chances de ocorrer.

Durante a viagem à Rússia, o presidente voltou a adotar um tom similar ao de 7 de Setembro para criticar ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).

Em entrevista, ele reagiu a uma fala do ministro Edson Fachin em reunião de transição do comando do TSE. Fachin disse que a prioridade da Justiça Eleitoral deve ser a segurança cibernética, e que a Rússia é um exemplo de procedência desses ataques.

Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/03/bolsonaro-tenta-ampliar-influencia-no-exercito-em-ano-eleitoral.shtml