Bolsonaro cita risco de falta de potássio e defende explorar terras indígenas
Ingrid Soares / Correio Braziliense
O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta quarta-feira (2/3) que o potássio, um dos fertilizantes essenciais usados na agricultura brasileira, pode faltar ou ainda encarecer em razão da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Com isso, voltou a justificar a exploração do mineral em terras indígenas. Ele ainda defendeu que a "nossa segurança alimentar e economia exigem do Executivo e do Legislativo medidas que nos permitam a não dependência externa de algo que temos em abundância".
"O potássio e a nossa segurança alimentar: Em fevereiro de 2016, como deputado, discursei sobre nossa dependência do potássio da Rússia. Citei 3 problemas: o ambiental, o indígena e a quem pertencia o direito exploratório na foz do Rio Madeira (existem jazidas também em outras regiões do Brasil).
Nosso Projeto de Lei n° 191 de 2020, permite a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em terras indígenas". Uma vez aprovado, resolve-se um desses problemas. Com a guerra Rússia/Ucrânia, hoje corremos o risco da falta do potássio ou aumento do seu preço. Nossa segurança alimentar e agronegócio (Economia) exigem de nós, Executivo e Legislativo, medidas que nos permitam a não dependência externa de algo que temos em abundância", escreveu nas redes sociais.
Em coletiva no último dia 27, Bolsonaro também defendeu a exploração de fertilizantes e produção de energia em terras indígenas. Segundo o presidente, com o conflito no leste europeu, cai a produtividade de fertilizantes no país, e regiões como a foz do Rio Madeira, uma reserva indígena, poderia suprir essa demanda.
O presidente criticou então a quantidade de demarcações de terras indígenas existentes no país. Segundo ele, "o Brasil foi em parte inviabilizado no passado com a indústria da demarcação de terras indígenas".
"Nós temos fertilizante no Brasil, na foz do Rio Madeira, temos potássio em abundância, mas é uma reserva indígena, porque não exploramos isso daí", apontou.
O presidente também criticou o novo marco temporal, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). "Vamos supor que esse novo marco temporal seja reconhecido. O somatório dessas áreas que surgirão equivalem a uma região Sul", pontuou.
Segundo ele, “nós eliminaremos a possibilidade da agricultura funcionar. Ao termos outra área (demarcada) do tamanho do estado de São Paulo, nós trazemos problemas para nós mesmos".
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/03/4989622-bolsonaro-cita-risco-de-falta-de-potassio-e-defende-explorar-terras-indigenas.html
MDB se distancia de federação com União Brasil e cria plano para retomar controle do Congresso
Julia Lindner / O Globo
BRASÍLIA — Após um início de negociação que pareceu promissor, entraves estaduais e visões distintas sobre a eleição à Presidência distanciaram o MDB de uma federação partidária com o União Brasil. Hoje, o plano de uma ala dos emedebistas é estruturar um bloco de apoio que supere a força do Centrão e possibilite a retomada do controle do Congresso no ano que vem.
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O partido, que nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT) chegou a presidir simultaneamente Câmara e Senado, perdeu força e, na gestão de Jair Bolsonaro, não esteve à frente de nenhuma das Casas.
Dirigentes da sigla avaliam que, a partir das movimentações da janela partidária — o período de trocas começa amanhã e dura um mês —, será possível ter um mapa mais completo da construção das chapas nos estados. A legenda mantém o posto de maior bancada no Senado, com 16 integrantes, mas é a sexta em tamanho na Câmara, com 34 representantes.
Assim, as negociações com outros partidos seguem no radar, mas sem a amarração de uma federação — neste modelo, há a obrigação de atuação conjunta por quatro anos, o que inclui também a eleição municipal de 2024.
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— Os partidos estão procurando se fortalecer para disputar as presidências das Casas, as comissões mais importantes e as relatorias. Tudo isso ocorre em função do número de parlamentares — resume o senador Marcelo Castro (MDB-PI).
Com a federação ficando mais longe, emedebistas pretendem negociar a formação de um bloco parlamentar com o União Brasil e outras siglas. A ideia é buscar um “equilíbrio congressual”, com a aliança de legendas de centro e centro-direita — o objetivo seria superar os partidos de esquerda e o Centrão, principalmente na Câmara.
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No Senado, presidido pelo MDB ao longo de 30 anos desde a redemocratização, a costura passa pelo PSD. No governo Bolsonaro, os emedebistas foram derrotados duas vezes ao tentarem assumir a Casa: primeiro, por Davi Alcolumbre (União-AP), que derrotou Renan Calheiros (MDB-AL); depois, por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que superou Simone Tebet (MDB-MS).
Renan, que já presidiu o Senado quatro vezes, tratou do assunto com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, que sinalizou a possibilidade de um acordo para o emedebista voltar ao posto a partir do ano que vem. Kassab tem indicado a intenção de lançar candidatura própria ao Palácio do Planalto, mas, ao mesmo tempo, ensaia uma aproximação com o PT.
Embora ainda não tenha havido um anúncio oficial, Pacheco já sinalizou a pessoas próximas que não pretende entrar na corrida presidencial em 2022. Neste cenário, ele quer tentar a reeleição ao comando do Senado, que será sua prioridade ao longo do ano.Tudo vai depender, no entanto, de quem será o titular na cadeira do Palácio do Planalto.
O PSD tem a segunda maior bancada do Senado, com 11 integrantes, e nutre a expectativa de crescer no próximo ano. Por isso, a sigla é considerada crucial para definir o resultado do pleito que definirá o presidente do Senado no biênio 2023-2024.
Ainda dentro da estratégia de privilegiar a formação de bancadas, o grupo de Renan vai insistir na tese de que é importante apoiar Lula, em detrimento da candidatura própria de Simone Tebet. Um dos argumentos é que, em 2018, o desempenho ruim de Henrique Meirelles, que teve 1% dos votos, atrapalhou o partido nas disputas ao Legislativo. A postura de Renan, inclusive, foi um dos fatores de insatisfação de lideranças do União Brasil, que são contra qualquer alinhamento com o ex-presidente.
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Os cenários em São Paulo, Bahia, Paraíba e Ceará também dificultaram a formação de um consenso para a federação. Na Paraíba, por exemplo, o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB) deve disputar o governo do estado com o apoio de Lula, enquanto o deputado Efraim Filho (União) quer concorrer ao Senado com o endosso de Bolsonaro.
Contrário à federação, o ex-senador Eunício Oliveira (CE) explicita a dificuldade de um acordo amplo.
— Quem vai mandar em cada estado? E para qual lado a federação vai? Há um grupo que apoia Lula (no MDB), ao mesmo tempo em que há um partido com origem bolsonarista — pontua Eunício, em referência ao fato de o União Brasil ter deputados oriundos do PSL, partido pelo qual o presidente se elegeu.
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Debates em andamento
PT-PSB-PCdoB-PV
A federação esbarra principalmente em entraves locais entre PT e PSB, que não abrem mão de candidaturas a governos de São Paulo e Rio Grande do Sul. Nas outras siglas, a união é vista como forma de bater a cláusula de barreira este ano.
Rede-PSOL
Ambos tentam garantir a superação da cláusula de barreira e maior capilaridade. O principal entrave é a decisão do PSOL de apoiar o ex-presidente Lula (PT), algo que lideranças da Rede, como Marina Silva, não querem.
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Cidadania-PSDB
A cúpula do Cidadania já aprovou formar federação, e aguarda resposta dos tucanos. A acordo prevê que o PSDB tenha 80% da governança e que as siglas escolham uma entre as duas pré-candidaturas postas, de João Doria (PSDB) e Alessandro Vieira (Cidadania).
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/mdb-se-distancia-de-federacao-com-uniao-brasil-cria-plano-para-retomar-controle-do-congresso-25415143
Mensagens de Bolsonaro ao Congresso têm coletânea de promessas frustradas
Ranier Bragon / Folha de S. Paulo
O presidente Jair Bolsonaro (PL) distorceu informações, acentuou o tom ideológico de sua gestão e fez uma coletânea de promessas que ficaram pelo caminho nas quatro mensagens que, por lei, enviou ao Congresso em seu mandato.
Para além do relato de medidas adotadas em diferentes áreas e que devem ser entregues todos os anos a deputados e senadores, os documentos produzidos por seu governo são iniciados, como é praxe, por um texto que é lido pelo presidente ou por um representante na sessão anual de abertura dos trabalhos legislativos.
Nessas quatro introduções, de fevereiro de 2019, 2020, 2021 e 2022, Bolsonaro elencou o que considera feitos de sua gestão e atacou o PT em apartes ao que foi escrito por auxiliares.
Com um mês de mandato, Bolsonaro encaminhou o seu texto mais virulento aos deputados e senadores.
Como se recuperava de uma das cirurgias que fez em decorrência do atentado que sofreu durante a campanha de 2018, coube ao ministro Onyx Lorenzoni, então na Casa Civil, comparecer à solenidade representando o chefe.
Em linhas gerais, o discurso assinado por Bolsonaro dizia que o país havia sido sequestrado cultural e politicamente e que o combate à miséria se limitava a uma maquiagem de números.
A criminalidade, cujo combate foi um dos pontos altos de sua campanha, ganhava um destaque no documento que jamais teria nos três anos seguintes.
"O governo brasileiro declara guerra ao crime organizado. Guerra moral, guerra jurídica, guerra de combate. Não temos pena e nem medo de criminoso", afirmava.
Estava presente na solenidade o então ministro da Justiça Sergio Moro, padrinho da mais vistosa tentativa do governo federal de agir diretamente na questão da segurança pública —atribuição que cabe, prioritariamente, aos governos estaduais.
O "Em Frente Brasil" foi lançado em 29 de agosto de 2019 por Bolsonaro e Moro, em solenidade no Palácio do Planalto que contou com a presença de quase todos os ministros. Ele prometia promover em poucos meses um choque de segurança pública em cinco cidades escolhidas com base nos altos índices de criminalidade —Goiânia (GO), Ananindeua (PA), Cariacica (ES), Paulista (PE) e São José dos Pinhais (PR).
Um ano e oito meses após seu lançamento e em meio a um esvaziamento político promovido por Bolsonaro, o programa terminou sua fase de teste com resultados decepcionantes: atrasos, adiamentos, restrição orçamentária e estrutural e ausência de indicativos de que tenha nem sequer chegado perto de atingir seu objetivo, o de promover a redução substancial dos homicídios nas cinco cidades testadas.
Moro acabou demitido no meio do caminho, em abril de 2020, por desgastes com Bolsonaro e acusando o chefe de tentar interferir na Polícia Federal com interesses escusos.
Ainda na primeira mensagem ao Congresso de sua gestão, Bolsonaro afirmava que a fiscalização de crimes ambientais havia se tornado "bandeira ideológica, prejudicando quem produz e quem preserva" —segundo ele, as mesmas pessoas—, em um indicativo do que estaria por vir, o desmonte dos setores de preservação e fiscalização, o que coincidiu com recordes negativos na área ambiental.
Após pressão interna e externa, o discurso apresentado na última mensagem do mandato, o de fevereiro deste ano, traz afirmação de tom completamente diverso: o de que o combate ao desmatamento ilegal e às queimadas é pauta prioritária do seu governo, apesar da coleção de dados negativos.
Na economia, o primeiro discurso era de "mais Brasil, menos Brasília", com foco na aprovação da reforma da Previdência, o que ocorreria ainda naquele ano, mas graças em grande parte à liderança do então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), e sem a ideia de capitalização defendida por Paulo Guedes (Economia).
Bolsonaro destacava ainda que faria esforços para resgatar a qualidade da educação, pontuando que sua equipe ministerial era composta de técnicos altamente qualificados. "Um time de ponta!", como consta do texto.
Ricardo Vélez Rodríguez, o ministro da Educação, foi demitido por Bolsonaro dois meses depois da leitura da mensagem a deputados e senadores, após uma curta gestão de marcada por trocas de secretários e paralisia.
Seu sucessor, o economista Abraham Weintraub, durou 14 meses no cargo, em uma gestão coroada por controvérsias, insultos disparados contra os mais variados alvos, anúncio de projetos que não andaram, derrotas no Congresso, ausência de diálogo com redes de ensino e falta de liderança nos rumos das políticas públicas da área.
Além de Moro, dois outros ministros presentes na solenidade de 2019 seriam defenestrados nos meses seguintes, após divergências com a família Bolsonaro: Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral) e Santos Cruz (governo).
Em 2020, o segundo ano da gestão, Bolsonaro também mandou Onyx representá-lo. Na mensagem a deputados e senadores, o presidente disse que o viés ideológico havia deixado de existir nas relações internacionais, ignorando completamente o acentuado viés ideológico na área comandada por Ernesto Araújo e sob forte influência de um de seus filhos, o deputado Eduardo Bolsonaro.
O presidente da República foi pessoalmente ao Congresso entregar a mensagem somente em fevereiro de 2021, ocasião em que já havia se aliado ao outrora execrado centrão, grupo político que passou a ser a sua principal base de sustentação parlamentar.
Na ocasião, enfrentou um protesto de deputadas do PSOL, principalmente, que gritaram as palavras "genocida" e "fascista" momentos antes de ele começar a leitura do texto. "Nos vemos em 22", se limitou a responder o presidente.
Entre suas propostas, destacou as privatizações e as reformas administrativa e tributária, que ainda não saíram do papel.
No último dia 2, Bolsonaro entregou sua última mensagem, também pessoalmente.
Mais uma vez recorrendo ao mote de que atuou na pandemia da Covid-19 para "salvar vidas e proteger empregos", leu apenas um parágrafo de prioridade legislativas: a reforma tributaria, a portabilidade da conta de luz (que está com tramitação atrasada), e novo marco legal das garantias (setor imobiliário).
De improviso, faz críticas indiretas a Lula, dizendo que jamais irá propor a regulação dos meios de comunicação, uma das ideias indicadas pelo adversário.
O GOVERNO BOLSONARO, SEGUNDO MENSAGENS QUE ENVIOU AO CONGRESSO*
Ano 1, 2019, um mês de governo
Resumo da mensagem
O PT assaltou o estado, guerra total à criminalidade, reforma da Previdência e retomada da qualidade da educação
Bolsonaro se recuperava de uma cirurgia. Coube ao então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, entregar o texto ao Congresso. Entre os presentes, Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral), Santos Cruz (Governo) e Sergio Moro (Justiça); todos eles romperiam com Bolsonaro nos meses seguintes
Ano 2, 2020, um ano e um mês de governo
Resumo da mensagem
Fim do viés ideológico nas relações externas, reforma tributária, privatizações e equilíbrio das contas públicas
Novamente, coube a Onyx entregar a mensagem. Bolsonaro preferiu participar de compromissos em São Paulo
Ano 3, 2021, dois anos e um mês de governo
Resumo da mensagem
Salvar vidas na pandemia com preservação de empregos, reforma tributária, administrativa e privatizações
Pela primeira vez, Bolsonaro vai pessoalmente entregar a mensagem. Enfrentou protestos de parlamentares do PSOL. Em resposta, disse: "Nos vemos em 2022"
Ano 4, 2022, três anos e um mês de governo
Resumo da mensagem
Salvar vidas com preservação de empregos e apenas 1 parágrafo de prioridades legislativas, entre elas a reforma tributária
Bolsonaro entrega pessoalmente a última mensagem ao Congresso de seu mandato. De improviso, faz críticas indiretas a Lula, dizendo que jamais irá propor a regulação dos meios de comunicação
* A Constituição estabelece que compete ao presidente remeter mensagem e plano de governo ao Congresso na abertura da sessão legislativa, "expondo a situação do país e solicitando as providências que julgar necessárias"
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/03/mensagens-de-bolsonaro-ao-congresso-tem-coletanea-de-promessas-frustradas.shtml
José Luis Oreiro: A Ucrânia já ganhou? Comentários ao artigo de Luiz Carlos Azedo
José Luis Oreiro / José Luis Oreiro - Economia, Opinião e Atualidades
Em geral, gosto muito dos artigos do competente jornalista Luiz Carlos Azedo que sabe fazer análises refinadas sobre os bastidores da política em Brasília. Hoje, contudo, não foi o caso. Seu artigo intitulado “Nas entrelinhas: Não adianta ficar Putin, a Ucrânia já ganhou” publicado ontem (01 de março de 2022) [ ver https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/03/4989324-analise-nao-adianta-ficar-putin-a-ucrania-ja-ganhou.html%5D é um exemplo clássico do erro que o personagem Don Victor Corleone no filme “O poderoso Chefão 3” advertia ao seu sobrinho (que iria sucede-lo na chefia da famiglia Corleone) jamais deveria cometer: “não odeie seus inimigos, pois isso afeta o seu julgamento”. Independente dos sentimentos que cada um de nós possa ter por Putin e pela clara violação ao direito internacional que a Rússia cometeu ao invadir um país soberano, violando a Carta da ONU e todo o direito internacional, precisamos analisar os fatos com o cérebro e um coração de gelo, não com o fígado.
O artigo começa com a frase “política e moralmente, o Presidente Russo já está derrotado ; pode até ocupar Kiev (….) porém, cedo ou tarde terá que bater em retirada”.
Aqui o Azedo mistura alhos com bugalhos. O objetivo de uma guerra não é (necessariamente) ganhar pontos com a opinião pública mundial ou mostrar superioridade moral sobre o resto da comunidade de nações, mas (i) destruir as forças do inimigo e (ii) ocupar os objetivos estratégicos definidos nos planos de ação militar. No que se refere aos objetivos da guerra não só a Ucrânia está muito longe de alcança-los, como, ao contrário, é a Rússia que, após apenas 5 dias de conflito, está as portas de Kiev e Karkov, as mais importantes cidades do país e praticamente já cortou o acesso da Ucrânia ao mar de Azov e está prestes a conquistar todo o litoral da Ucrânia no mar negro, deixando o país sem nenhuma saída para o mar. A não ser que a OTAN esteja disposta a escalar o conflito, mandando tropas para lutar na Ucrânia, o que converteria o conflito na Terceira Guerra Mundial, é uma questão de tempo até que a Rússia assuma o controle das regiões que realmente importam na Ucrânia do ponto de vista militar. Nesse contexto, A Rússia, não a Ucrânia, já ganhou.
Para um observador externo a “demora” da Rússia em tomar Kiev e Kharkov é um sinal claro de que a resistência Ucraniana está sendo mais forte do que a esperada pelos russos. Isso pode ser em parte verdade, mas a história militar da segunda guerra mundial mostra ad-nausean que a tomada de um grande centro urbano exige combates rua a rua, casa a casa os quais tendem a cobrar um preço muito alto das forças invasoras. Para reduzir esse custo as forças atacantes devem lançar, inicialmente, uma pesada barragem de artilharia sobre a cidade a ser conquistada de forma a reduzir a pó a infraestrutura defensiva. Foi exatamente isso que o exército soviético fez sobre Berlim em abril de 1945 (vejam https://www.youtube.com/watch?v=1bMjda0rCjY) e mesmo assim levou quase um mês para conquistar a capital do III Reich. Uma hipótese plausível é que Putin não esteja querendo lançar, neste momento, um ataque dessa magnitude para não criar um ressentimento incurável entre os Ucranianos, os quais ele deseja que voltem a fazer parte do “Grande Império Russo” que ele planeja reconstruir a muito tempo.
Mas voltemos ao texto do Azedo. A segunda parte de sua argumentação é que “cedo ou tarde” a Rússia será obrigada a se retirar da Ucrânia. Ok, isso é uma hipótese possível. A questão a ser feita é: por que isso ocorreria? Aqui Azedo faz duas analogias históricas desprovidas de qualquer sentido. A primeira é com o Iraque na primeira guerra do golfo. De fato, o Iraque ocupou o Kuwait em 1991 e alguns meses depois foi obrigado a bater em retirada. Mas isso não ocorreu pela sublevação da população local mas pela ação militar coordenada pelos Estados Unidos, Reino Unido e França que concentraram na Arábia Saudita uma força militar várias vezes superiores – em número e qualidade do equipamento militar – as forças do Iraque. Não me parece que a OTAN esteja, no momento, disposta a intervir militarmente para salvar a Ucrânia, mas apenas a mandar pouco mais do que “apoio moral” para o país.
A segunda analogia sem sentido é com a retirada de Napoleão Bonaparte da Rússia em 1812. Aqui cabem algumas observações : (i) Le Gran Armeé nunca conseguiu destruir o exército russo, o qual constantemente se negava a dar combate ao invasor francês, ciente que a Rússia era grande o suficiente para fazer recuos táticos sem comprometer o curso da guerra e (ii) A França não estava preparada para uma guerra longa e muito menos para enfrentar o general “inverno russo”. Não me parece que nenhuma dessas situações está posta na guerra da Ucrânia, até porque se tem uma coisa que os russos estão bastante acostumados é com seu próprio inverno, o qual costuma ser mais ameno na Ucrânia dada sua posição mais ao sul.
Embora Azedo não tenha tratado no seu artigo, uma força que poderia levar Putin a bater em retirada seria o custo das sanções econômicas sobre a Rússia. O congelamento de parte das reservas internacionais do Banco Central da Rússia e a exclusão de ALGUNS bancos russos do sistema Swift produziram ontem (28/02/2022) uma corrida aos bancos na Rússia, uma forte desvalorização do Rublo e e o aumento da taxa básica de juros para 20% a.a, o que certamente irá elevar a inflação na Rússia e produzir uma contração do nível de atividade econômica, afetando de forma bastante negativa o povo da Rússia. Mas aqui cabem duas observações. Em primeiro lugar, existe muito jogo de cena nas sanções econômicas do Ocidente sobre a Rússia. A exclusão do sistema Swift não atingiu os pagamentos dos países europeus ao gás importado da Rússia, o que garante, por si só, a continuidade de parte importante das exportações da Rússia para a Europa. Além disso, o suposto congelamento dos ativos dos oligarcas russos atinge apenas os ativos que eles tenham em bancos na Europa e nos EUA, não o grosso de suas aplicações financeiras que estão em paraísos fiscais como as ilhas virgens britânicas, onde ministros da economia de países sul-americanos também costumam manter seu dinheiro para a aposentadoria.
Em segundo lugar, ao contrário do Brasil que amarrou as mãos dos policy makers com regras fiscais como o Teto de Gastos e com a “autonomia do Banco Central”, as autoridades russas podem lançar mão de vários instrumentos de política econômica – como a adoção de controles de saída de capitais do país, adotada ontem -sobre residentes na Rússia – para amortecer os efeitos dessas sanções sobre a economia Russa. Por fim, devemos deixar claro que as sanções econômicas tem um efeito boomerang sobre o Ocidente: o aumento observado ontem dos preços do petróleo, gás, trigo, milho, óleo de girassol e soja irá produzir um aumento da inflação não apenas na Rússia, mas no mundo inteiro, podendo obrigar os Bancos Centrais da Europa, Inglaterra e Estados Unidos a antecipar a elevação da taxa de juros prevista apenas para o segundo semestre. A elevação dos juros combinada com a aceleração da inflação seria um balde de água fria na recuperação das economias dos Estados Unidos e União Europeia após os efeitos dramáticos da crise da covid-19. Em outras palavras, as sanções econômicas do Ocidente sobre a Rússia também irão se voltar contra os países ocidentais.
O lado doméstico desse imbróglio é que as chances de reeleição de Jair Messias Bolsonaro irão virar pó nos próximos meses quando os efeitos econômicos da guerra da Ucrânia atingirem em cheio a economia brasileiro. É melhor o “Messias” já ir se acostumando com a ideia de ter que passar a faixa presidencial para Luis Inácio Lula da Silva em 01/01/2023.
Fonte: Blog José Luis Oreiro - Economia, Opinião e Atualidades
https://jlcoreiro.wordpress.com/2022/03/01/a-ucrania-ja-ganhou-comentarios-ao-artigo-de-luiz-carlos-azedo-no-correio-braziliense-de-01-03-2022/
Luiz Carlos Azedo: A crise da Ucrânia também tem sua Quarta-Feira de Cinzas
Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense
Misturar marchinha de carnaval ( no caso, o samba do Macarrão, que falava da Guerra do Iraque no carnaval do Bloco de Segunda de 1991) com análise da situação internacional, como fiz ontem, também tem seu dia de ressaca. Meu amigo José Luiz Oreiro, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), em seu blog, publicamente, não deixou por menos. Segundo ele, a coluna de ontem, intitulada “Não adianta ficar Putin, a Ucrânia já ganhou”, seria um exemplo clássico do erro que o personagem Don Victor Corleone no filme O poderoso Chefão 3 advertira ao seu sobrinho: “Não odeie seus inimigos, pois isso afeta o seu julgamento”.
Como trato os assuntos com objetividade, e não com o fígado, vou resumir as críticas de Oreiro, que discorda da tese de que Putin já perdeu a guerra do ponto de vista moral e político. Oreiro argumenta o seguinte:
1— O objetivo de uma guerra não é (necessariamente) ganhar pontos com a opinião pública mundial, ou mostrar superioridade moral sobre o resto da comunidade de nações, mas (i) destruir as forças do inimigo e (ii) ocupar os objetivos estratégicos definidos nos planos de ação militar. A Rússia, após apenas cinco dias de conflito, chegou às portas de Kiev e Kharkiv, as mais importantes cidades do país, praticamente cortou o acesso da Ucrânia ao mar de Azov e está prestes a conquistar todo o litoral da Ucrânia no Mar Negro, deixando o país sem nenhuma saída para o mar.
2— A não ser que a Otan esteja disposta a escalar o conflito, mandando tropas para lutar na Ucrânia, o que converteria o confronto na Terceira Guerra Mundial, é uma questão de tempo até que a Rússia assuma o controle das regiões que realmente importam na Ucrânia do ponto de vista militar. Nesse contexto, a Rússia, não a Ucrânia, já ganhou.
3— Uma hipótese plausível é que Putin não esteja querendo lançar, neste momento, um ataque dessa magnitude para não criar um ressentimento incurável entre os ucranianos. Não parece que a Otan esteja, no momento, disposta a intervir militarmente para salvar a Ucrânia.
4— As analogias com a Guerra do Iraque, na qual Estados Unidos e Reino Unido concentraram forças para um ataque arrasador, e com a retirada de Napoleão Bonaparte da Rússia, em 1812, após a conquista de Moscou, não têm sentido. O que poderia levar Putin a bater em retirada seria o custo das sanções econômicas sobre a Rússia.
Sanções econômicas
5— Existe muito jogo de cena nas sanções econômicas do Ocidente sobre a Rússia. A exclusão do sistema Swift não atingiu os pagamentos dos países europeus ao gás importado da Rússia, o que garante, por si só, a continuidade de parte importante das exportações da Rússia para a Europa. O suposto congelamento dos ativos dos oligarcas russos atinge apenas os que eles tenham em bancos na Europa e nos EUA, não o grosso de suas aplicações financeiras que estão em paraísos fiscais.
6— As sanções econômicas têm um efeito bumerangue sobre o Ocidente: o aumento dos preços do petróleo, gás, trigo, milho, óleo de girassol e soja irá produzir um aumento da inflação não apenas na Rússia, mas no mundo inteiro, podendo obrigar os Bancos Centrais da Europa, da Inglaterra e dos Estados Unidos a antecipar a elevação da taxa de juros, prevista apenas para o segundo semestre. A elevação dos juros, combinada com a aceleração da inflação, seria um balde de água fria na recuperação das economias dos Estados Unidos e União Europeia.
7— O lado doméstico desse imbróglio é que as chances de reeleição de Jair Bolsonaro irão virar pó nos próximos meses, quando os efeitos econômicos da guerra da Ucrânia atingirem em cheio a economia brasileiro. É melhor o “Messias” já ir se acostumando com a ideia de ter que passar a faixa presidencial para Luís Inácio Lula da Silva em 01/01/2023.
Os dois últimos comentários de Oreiro são sobre temas que não abordei na coluna. No primeiro aspecto, creio que precisamos aguardar um pouco mais para avaliar seus efeitos sobre a economia russa. As cadeias globais de produção e comércio, que hoje operam em rede, estão ancoradas na institucionalidade da economia mundial. Pela primeira vez, essa institucionalidade está sendo utilizada de forma coordenada pelos Estados Unidos, Canadá e a União Europeia, que operam um bloqueio comercial e financeiro em escala sem precedente contra a economia da Rússia.
Existe muita semelhança entre a narrativa política de Bolsonaro e a de Putin, mas o flerte do presidente brasileiro com o líder russo pode ter efeitos maiores do que apenas isolar o Brasil ainda mais entre os líderes mundiais e a opinião pública do Ocidente. Além dos efeitos gerais da crise ucraniana na economia global, as sanções econômicas contra a Rússia também podem afetar as cadeias de produção e comércio do nosso agronegócio.
Eis o texto de Oreiro na íntegra: https://jlcoreiro.wordpress.com/2022/03/01/a-ucrania-ja-ganhou-comentarios-ao-artigo-de-luiz-carlos-azedo-no-correio-braziliense-de-01-03-2022/
Felipe Salto: Vícios privados, malefícios públicos
Felipe Salto / O Estado de S. Paulo
É preciso reverter a perda de bem-estar social derivada da captura do Estado por verdadeiros caçadores do erário. É hora de escancarar os custos das políticas públicas, para que a sociedade possa colocar na balança e comparar, por exemplo, uma isenção fiscal para um grupo de empresas ao pagamento de uma transferência social. Surrada, mas inescapável, a palavra chave é transparência. E, a partir dela, ações de governo para rever gastos ruins e abrir espaço para o que importa.
A ideia de que a ação autocentrada pode levar ao progresso econômico tem quase dois séculos e meio. É a lógica da “mão invisível”, de Adam Smith, segundo a qual as forças da oferta e da procura seriam vetores suficientes para o funcionamento da economia, mesmo na presença do egoísmo, digamos assim. O bom funcionamento dos mercados é, de fato, a base para estimular a atividade produtiva, que gera emprego e renda.
Mas há uma condição: a existência de leis, regras e regulamentações da vida em sociedade e da economia. É o papel do Estado e da atividade política. Quando falham, quando a aplicação das leis é torta, lenta ou desigual e, sobretudo, quando a mobilização e a ação de certos grupos distorcem a alocação dos recursos públicos, então o bem-estar social diminui.
Atualmente, há um sem-número de benefícios tributários, regimes especiais, isenções fiscais e vantagens inscritas nos orçamentos públicos.
Isso inclui o pagamento de salários acima do teto constitucional remuneratório. O Estado mostrou, recentemente, que há contracheques, no Judiciário, de mais de R$ 440 mil mensais. O salário mínimo, hoje, está em R$ 1.212,00 e a renda média do brasileiro não passa de cerca de duas vezes esse valor.
A chamada Comissão do Extrateto, criada em 2016 pelo Senado Federal, produziu um bom projeto para resolver o problema. Ele foi aprovado, mas ainda tramita na Câmara dos Deputados. Essa força de setores do alto escalão do funcionalismo público relega a último plano a busca pelo interesse da coletividade. Prejudica, inclusive, a própria necessidade de valorização dentro do serviço público.
Em artigo para o Valor Econômico, em 16 de setembro de 2014 (Transparência e democracia), o economista Marcos Lisboa e eu escrevemos: “Mancur Olson, em A lógica da ação coletiva (1965), argumentou que a possibilidade de obter benefícios do Estado estimula a mobilização coletiva de grupos relativamente pequenos e homogêneos (...) A natureza difusa e pouco transparente dos custos dessas ações, no entanto, que recaem sobre o restante da sociedade, dificulta o debate democrático e a deliberação sobre o uso mais eficiente dos recursos públicos”.
Tal acesso privilegiado ao “poder” garante a perpetuação, por décadas, de programas ruins, além de ensejar a criação de outros. A apropriação de nacos do orçamento público ocorre na penumbra, onde todos os gatos são pardos. As crianças, as famílias pobres, os desempregados, a base do serviço público, os trabalhadores informais, os marginalizados e os seus interesses, que deveriam ser as prioridades de uma nação ainda tão desigual, são preteridos.
Quando não são preteridos, inserem-se no Orçamento, em geral, sem qualquer corte naqueles gastos de péssima qualidade. Aumentou-se, por exemplo, entre 2021 e 2022, o valor previsto para o Auxílio Brasil (sucessor do Bolsa Família), de cerca de R$ 35 bilhões para quase R$ 90 bilhões. Uma despesa nova necessária e legítima, a meu ver. Mas nem um centavo foi cortado em outras rubricas. Ainda, a despesa social serviu de desculpa para mudar o teto de gastos e abrir espaço para outras demandas não relacionadas ao social.
Para ter claro, não prego uma redução geral e irrestrita de gastos de pessoal e de políticas de incentivo à produção. Proponho, sim, transparência, para que a sociedade tenha conhecimento, por exemplo, de que os descontos autorizados no Imposto de Renda podem chegar a R$ 20 bilhões ao ano. Por que manter esse benefício para os ricos?
A Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal, há mais de cinco anos, tem contribuído para aumentar a transparência. Seu papel, no entanto, limita-se a mostrar custos e alertar. Há um segundo desafio, a partir disso, que é introjetar, na prática de governo e no cotidiano da política, a dimensão da responsabilidade com o dinheiro público. A Revisão do Gasto, ou Spending Review, pode ajudar. Amplamente adotada no âmbito da OCDE, essa boa prática propõe-se justamente a questionar a “base orçamentária” existente.
Vale dizer, no caso dos servidores, que há realidades completamente distintas coexistindo. De um lado, os supersalários, que parecem intocáveis. De outro, os baixos salários dos professores da educação básica. Qualquer reforma administrativa deve começar por este ponto: a extinção de todos os privilégios. Sem isso, não terá legitimidade.
Os vícios destes grupos de interesse, esta caça ao tesouro, precisam ser combatidos com veemência. Caso contrário, a necessidade de novos gastos públicos – já imposta pela demografia, pela pobreza e pela desigualdade – terá de ser suprida com mais e mais carga tributária e dívida pública. É preciso espantar os caçadores de renda para longe da administração pública.
*Diretor-Executivo da IFI
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,vicios-privados-maleficios-publicos,70003994095
Putin prepara assalto mais destrutivo após erros na guerra da Ucrânia
Igor Gielow / Folha de S. Paulo
Após enfrentar problemas logísticos e violar o manual das invasões militares, as forças de Vladimir Putin chegam ao sexto dia da guerra na Ucrânia numa nova etapa, potencialmente mais destrutiva para Kiev.
O surgimento do comboio de 64 km de comprimento rumo à capital ucraniana e a intensificação do bombardeio sobre Kharkiv, a segunda maior cidade do país, são o símbolo dessa mudança.
A resistência local deverá ter problemas para segurar o assalto que se ensaia. Não que ela não tenha tido seus momentos de glória, apesar da romantização exacerbada na mídia ocidental, mas eles parecem ter derivado mais de erros de Moscou do que de sua qualidade técnica intrínseca.
Em novembro de 2020, após a derrota armênia na guerra contra o Azerbaijão, o analista militar russo Konstantin Makienko, do Centro de Análises de Estratégias e Tecnologias, de Moscou, escreveu um texto profético no jornal Vedomosti. "A principal lição que Moscou deve tirar da tragédia [a Armênia é um aliado indócil russo, e o apoio de Ancara a Baku aumentou a influência turca no Cáucaso] é nunca subestimar o inimigo. Reina aqui uma atitude condescendente e irônica em relação ao Exército ucraniano", afirmou.
"Os militares ucranianos já possuem sistemas de armas que os russos não possuem. Mísseis antitanque de terceira geração e drones kamikaze. E, em breve, os drones turcos Bayraktar-TB2", completou.
Kostia, como era chamado pelos amigos, não viveria para ver a profecia realizada: morreu há um ano. Mas seus alertas eram precisos acerca das dificuldades que os russos encontraram. Mas não só essas.
Dois princípios de invasões terrestres foram violados por Moscou. O primeiro, o da finalidade: a mais bem-sucedida operação do gênero da guerra moderna, a expulsão do Iraque do Kuwait na Guerra do Golfo (1991), era desenhada com um objetivo só. O conflito que tirou Saddam Hussein 12 anos depois, também.
Não foi o que se viu agora. Putin deixou claro desde o começo que seu objetivo era Kiev: decapitar o governo de Volodimir Zelenski com o mínimo de danos civis, para provavelmente instalar um aliado que não enfrentasse uma guerra civil e manter apoio em casa.
Mas seu ataque foi extremamente complexo, envolvendo as forças irregulares do Donbass, a ação rumo a Kiev pela Belarus sem uma coordenação aparente com a força vinda mais do leste e uma ofensiva com rumos divergentes no sudeste do país: tropas que deveriam atacar Mariupol se dividiram no meio.
O segundo princípio é um corolário do primeiro: concentração de forças. Apesar de chegar às ruas centrais de Kiev no terceiro dia de ação, o fez apenas com infiltrações mínimas de militares aerotransportados. Isso sugere que Putin subestimou Kiev, acreditando que apenas sua chegada ao país forçaria a rendição de Zelenski, pintado na Rússia como um fantoche americano, uma versão vida real do comediante que vivia na TV antes se tornar presidente, em 2019.
Pedra angular da doutrina militar russa, o uso maciço de barragens de artilharia e mísseis não foi aplicado nas primeiras fases do conflito. Houve, claro, ataques mais fortes como os vistos em Kharkiv e Mariupol, mas ainda não configura o "choque e terror" do então secretário de Defesa dos EUA Donald Rumsfeld no Iraque de 2003.
A Força Aérea russa ainda não foi usada de forma decisiva, deixando o trabalho principal para mísseis de cruzeiro e balísticos. Apenas um punhado de aviões de ataque Su-25 e talvez algum modelo avançado Su-34, amplamente usados na guerra civil síria, foram vistos em ação. Helicópteros só foram observados na tomada do aeroporto de Hostomel. A ideia é destruir toda a defesa antiaérea ucraniana, e esse objetivo parece perto de sua conclusão, evitando assim o constrangimento de ver aeronaves abatidas.
Os drones turcos que dominaram a guerra de 2020, como Kostia previu, fizeram estrago. Até a última conta disponível, Kiev tinha recebido seis deles, e ao menos uma coluna de blindados russa foi destruída. Os russos, contudo, dizem que já praticamente abateram todos.
I will add, that in a number of areas the Russian mil effort is really embarrassing at the tactical level. For example, the recent spate of TB2 strikes shows UKR success in using drones, but also that some of the Russian military's decisions are just mind boggling. https://t.co/FdfcmQDf5r
— Michael Kofman (@KofmanMichael) February 28, 2022
"A operação inicial foi baseada em suposições terríveis sobre a capacidade e a vontade da Ucrânia de lutar e em um conceito operacional impossível. Moscou errou feio no cálculo. Mas suas forças ainda não entraram na guerra", escreveu no Twitter o americano Michael Kofman, diretor para Rússia do centro CNA.
"Houve dificuldades, claro. Mas a degradação das forças ucranianas é diária. É matemática, ao fim", afirmou Konstantin Frolov, analista político em Moscou.
Na segunda (28) e nesta terça (1º), o cenário mudou. O Kremlin não colocaria quilômetros de veículos expostos a ataques aéreos, o que mostra confiança em sua tática de supressão. E a intensificação dos bombardeios em Kharkiv, para onde foi enviada ao menos uma bateria do sistema de mísseis termobáricos TOS-1, quase uma arma de destruição em massa, prenuncia uma escalada. Não é casual, assim, as informações vazadas pelo Pentágono à mídia americana sobre a renovada ação do Kremlin.
Mais importante, tudo indica que as linhas de suprimento foram regularizadas. Este é um problema inerente a qualquer operação terrestre: os nazistas perderam a conquista de Moscou porque acabaram a gasolina, a munição e a comida às portas da capital soviética, em 1941.
Em 1991, a famosa "guerra das 100 horas" dos EUA contra Saddam só não perdeu o título porque soldados americanos foram feitos de motoristas de caminhões-tanque para levar combustível para a exaurida 1ª Divisão Blindada rumo a Bagdá.
O que se coloca agora é cálculo cruzado com o relógio correndo contra o Kremlin, pressionado sob todos os lados por sanções econômicas e políticas. Com o canal diplomático bem ou mal aberto em Gomel, na Belarus, os russos podem contar ainda com alguma chance de rendição ucraniana.
As promessas de ajuda militar dos vizinhos da Otan não parecem se materializar na velocidade para mudar a guerra: se Kiev de fato receber algum caça, não será em quantidade para mudar o rumo da ação.
I can't quite believe what I'm seeing here; a Ukrainian farmer apparently capturing an abandoned Russian 9K33 OSA surface-to-air missile system by simply hooking it up to his tractor and driving away with it.🇺🇦pic.twitter.com/vo6O5TQBrr
— Jimmy (@JimmySecUK) February 28, 2022
Mas Zelenski parece bastante firme em seu posto de defensor, dado o apoio que recebe no Ocidente. Nisso concordam Kofman e Frolov: Kiev tem enorme vantagem na guerra midiática, o que não é pouco no mundo das redes sociais. Enquanto o Kremlin basicamente tenta esconder a guerra em casa, proibindo até as TVs de chamarem o conflito dessa maneira, Zelenski tem vantagem mundo afora.
Putin se importa com isso? Enquanto sua posição interna não estiver ameaçada, parece que não. Mas uma intervenção prolongada traz riscos crescentes que sua retórica inflamada de guerra nuclear e confronto com a Otan indica.
O baixo número relativo de vítimas civis, central para o russo, dada a interligação entre seu povo e o ucraniano, também não ficará assim se ele usar mão pesada enquanto retém a iniciativa para subjugar a Ucrânia ou encontrar um cenário intermediário para manter o país dividido e fora da órbita do Ocidente.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2022/03/putin-prepara-assalto-mais-destrutivo-apos-erros-na-guerra-da-ucrania.shtml
O que deu errado para Vladimir Putin
The Economist / O Estado de S.Paulo
THE ECONOMIST - A invasão russa à Ucrânia não vai conforme o planejado. Em Kharkiv, a segunda maior cidade do país, as defesas ucranianas parecem ter repelido um grande ataque. No sul, as forças de Vladimir Putin tomaram território – em parte, porém, por evitar as cidades ucranianas. Na própria capital, o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, mostrou um semblante desafiador. Em contraste ao nazista viciado em drogas que Putin descreve em seus discursos, Zelenski assumiu seu lugar como líder do país, imbuído de coragem e patriotismo.
A guerra ainda está em sua primeira semana. O presidente russo pode convocar mais forças que poderia usar para cercar cidades ucranianas, incluindo Kiev, sob o terrível custo de vidas de civis e soldados de ambos os lados. Ainda se trata de uma guerra que Putin pode muito bem ganhar, na qual ele poderia impor um governo fantoche em Kiev ou Kharkiv, a capital original da Ucrânia soviética.
Ainda assim, num senso mais amplo, no momento em que Putin for obrigado a travar uma guerra de desgaste, ele já terá perdido. O espírito patriótico forjado na Ucrânia decorrente de Putin ter mirado contra as cidades e seus habitantes já garante que nenhum presidente que governe em seu nome seja considerado legítimo. E, domesticamente, ele poderá presidir uma sociedade sufocada por sanções e oprimida por seu regime repressivo.
Fissuras
Parece ainda mais evidente que a elite russa ficou estarrecida – e empobrecida – com a aventura paranoica de Putin. Quanto pior forem seus planos na Ucrânia, mais cedo começarão a aparecer fissuras em seu regime e mais russos tomarão as ruas em protesto. Se Putin quiser se manter no Kremlin, ele poderá ser obrigado a impor terror num nível que a Rússia não vê há décadas.
O primeiro erro de Putin foi subestimar o inimigo. Talvez ele acreditasse em sua própria propaganda: que a Ucrânia não é um país de verdade, mas uma nação falsa, erigida pela CIA e controlada por bandidos que são abominados pelo povo que governam. Se ele esperava que a Ucrânia entrasse em colapso na primeira mostra de força russa, não podia estar mais errado.
O segundo erro de Putin foi comandar mal suas próprias Forças Armadas. Sua Aeronáutica até agora não foi capaz de dominar os céus. Ele trabalhou para tranquilizar seu povo, afirmando que a Rússia não trava uma guerra, mas realiza, em vez disso, uma operação de “desnazificação”.
Os soldados, incertos sobre o que deveriam estar fazendo, chegaram à Ucrânia esperando ser recebidos como libertadores. Se ele ordenar aos seus militares que matem seus irmãos ucranianos em grandes números, eles poderão não obedecê-lo. Se muitos de seus soldados morrerem na tentativa de esmagar cidades ucranianas, como é provável, ele não conseguirá encobrir isso domesticamente.
E seu terceiro erro foi subestimar o Ocidente. Outra vez, talvez Putin acreditasse que o Ocidente estivesse decadente e autocentrado demais para conseguir organizar uma resposta. Como um ditador que pode achar difícil entender que a confiança das pessoas na democracia é genuína, ele quase certamente foi surpreendido pelo afloramento do apoio popular à Ucrânia – apoio que fez londrinos se levantarem em honra ao hino nacional ucraniano e iluminou o Portão de Brandemburgo, em Berlim, com o azul e o dourado da bandeira ucraniana.
Reação
Inspirados pela coragem ucraniana e instados por seus próprios cidadãos, governos ocidentais finalmente encontraram determinação para reagir. Corretamente, eles evitaram uma ação militar direta contra a Rússia, como impor uma zona de exclusão aérea. Em vez disso, em sua terceira tentativa, no sábado, eles concordaram em sanções genuinamente poderosas, contra o Banco Central da Rússia e seu sistema financeiro. Isso deverá bloquear acesso às reservas do país e minar seus bancos.
No dia seguinte, essas sanções foram afrontadas com uma furiosa resposta russa. Putin, após consultar seus comandantes militares, colocou as forças nucleares de seu país em alerta máximo. Ele equiparou sanções econômicas a guerra nuclear.
Isso não é apenas moralmente errado, mas também levanta o prospecto de uma escalada catastrófica. Isso não torna o uso de sanções pelo Ocidente um erro. A beligerância de Putin é evidência do quão perigoso ele é. Recuar com medo do que ele poderia fazer apenas convida o próximo exagero.
Em vez disso, o alerta da Rússia deve ser respondido com uma declaração clara no Conselho de Segurança da ONU e de todas as potências nucleares, incluindo China e Índia, de que ameaçar com armas nucleares é inaceitável. No mesmo momento, altos comandantes militares americanos devem manter contato próximo com seus homólogos russos, para alertá-los de que eles serão responsabilizados individualmente por suas ações. O mundo não pode permitir que Putin erre o cálculo novamente.
*Tradução de Guilherme Russo
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Fonte: O Estado de S. Paulo
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Contra invisível ameaça nuclear russa, não há chance de defesa; leia análise
Roberto Godoy / O Estado de S.Paulo
O perigo pode estar agora mesmo pronto para destruir um país. Invisível. Silencioso. A um toque de botão de despejar fogo mais quente que o calor do núcleo do sol sobre o alvo. Pessoas e prédios vaporizados, virando sombras apenas impressas no pouco que restar depois da onda de choque.
A devastação está contida em um tubo negro de metal de 170 metros de comprimento, parado debaixo da linha da água. Agora no Mar Negro, ameaçando cidades como Kiev e Kharkiv, os grandes submarinos russos da classe Borei, 24 mil toneladas de deslocamento, que levam a bordo 107 tripulantes e um poder apocalíptico: 16 mísseis Bulava, cada um deles com 6 cargas nucleares independentes – um inventário de 96 ogivas atômicas.
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É a maior ameaça efetiva da mobilização dos batalhões de ataque estratégico determinada pelo presidente Vladimir Putin. Há ainda outros recursos nessas forças, como os mísseis balísticos intercontinentais e as bombas “inteligentes” que procuram as coordenadas de impacto, transportadas por aviões de vários tipos, além de mísseis menores.
Contra esses há a possibilidade de defesa, embora sejam ações difíceis e vulneráveis em certa medida. Contra o Bulava, não. Ele é lançado de seu casulo com o navio submerso, em um ponto qualquer, o mais próximo possível do objetivo. Com 12 metros de comprimento e 40 toneladas de peso, cobre até 9,3 mil km.
Cada ogiva tem 150 kilotons de potência, 10 vezes mais que a da bomba que arrasou Hiroshima, no Japão, em agosto de 1945. Um kiloton equivale a mil toneladas de explosivos convencionais tipo TNT.
Rússia tem quatro navios Borei. Um deles está em manutenção. Dos outros três não se tem notícias. O arsenal da Rússia soma 6.255 armas nucleares – aproximadamente 1.750 em condições de emprego imediato, segundo o Instituto de Pesquisa para a Paz de Estocolmo. Os EUA acumulam 5.550 armas, 1.700 em prontidão máxima.
O grupo dos países com esse tipo equipamento tem na lista a China, com 350 unidades, França, com 290, o Reino Unido, com 225, Israel, com 200 – capacidade não assumida –, e a Coreia do Norte, que teria estocado entre 8 e 60 armas, número estimado pelas agências de inteligência da Coreia do Sul e do Japão.
A Suécia, advertida por Vladimir Putin de receber represálias militares caso insista em manter seu projeto de entrar para a Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan, desmantelou há 40 anos um ambicioso projeto nuclear de Defesa por causa de seu custo, alto demais.
Iniciado pouco depois da 2a Guerra Mundial, o programa concentrado na Foa, a Agência de Pesquisa da Defesa, dominou todo o ciclo do urânio é concentrou em dois reatores, Agesta e Marviken, a produção de plutônio para abastecer um lote programado de 100 artefatos de combate.
Ao mesmo tempo, a Foa investiu no desenvolvimento de dois aviões, o Saab 36 e depois o Viggen 37, para servir de vetores das bombas. A hipótese de emprego era em um eventual conflito com a então União Soviética. No final dos anos 60 o empreendimento começou a ser desmontado. Em 1972, foi desmantelado. A Suécia já tinha então todo o conhecimento científico e tecnológico para a produção das armas.
*É JORNALISTA
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Março será movimentado por janela partidária, que começa dia 3
Taísa Medeiros e Deborah Hana Cardoso / Correio Braziliense
O mês de março será movimentado para os deputados com planos de mudar de legenda para as eleições deste ano. Com o início da janela partidária, que ocorre de 3 de março até 1° de abril, os parlamentares estão autorizados a buscar novas siglas sem que isso acarrete na perda do mandato.
E não é só isso. Além da janela partidária, os integrantes da classe política precisam acompanhar as federações partidárias, que se somam neste imbróglio do poder. Com essas mudanças, deputados avaliam se compensa continuar na sigla que, eventualmente, pode se coligar ou federar com outra. Devem considerar, ainda, os interesses regionais nas negociações. Nesta equação, a meta é sobreviver ao sarrafo das urnas em outubro.
De acordo com a professora de direito da Universidade São Judas Carolina Dalla Pace, a janela partidária é importante para a reorganização das legendas. "É uma oportunidade para que busquem maior alinhamento político-partidário antes do pleito eleitoral, e vai fazer com que estejam com as siglas que melhor os representem", avalia.
O mestre em ciência política e professor da pós-graduação do Ibmec Brasília Danilo Morais considera a janela partidária um momento crítico de revisão da estratégia eleitoral. E comenta o fator complicador da federação. "A medida promove uma 'verticalização' das candidaturas, com um alinhamento necessário entre no plano local, regional e nacional, o que dificilmente se verifica na prática", destaca.
O Correio ouviu congressistas acerca dos obstáculos que se apresentam nesta temporada de transição partidária. Além dos problemas formais na composição de federações, eles contam as perspectivas para o pleito de outubro.
Marcelo Ramos (PSD-AM)
O vice-presidente da Câmara dos Deputados considera equivocada a regulamentação das federações partidárias e acredita que a decisão acarretará em um baixo número de partidos federados. “Tem dois problemas: um eleitoral e outro legal. Do ponto de vista eleitoral, o candidato se filia ao partido sem saber se haverá uma chapa própria ou uma chapa com outros partidos, se for para uma federação, e isso pode significar mudar tudo na eleição de alguém. E, em segundo lugar: as federações vão ter um programa, que é obviamente diferente dos partidos isoladamente”, argumentou. Segundo Ramos, a lei eleitoral assegura que o candidato possa deixar o partido caso existam mudanças programáticas. E isso pode causar confusão. “As únicas federações que estão se constituindo são aquelas em que os partidos pequenos estão obrigados a ir para uma federação para continuar sobrevivendo”, observou o recém-filiado ao PSD.
Ricardo Barros (PP-PR)
Na campo do Centrão e da esfera governista, o deputado e líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), estima que cerca de seis deputados da sigla deverão trocar de legenda. “É absolutamente previsível, agora que não tem mais coligação, tem regras novas, e as pessoas precisam se concentrar na hora de tomar essa decisão. Alguns partidos pequenos vão ficar combalidos com pouca representatividade. Quem apoia o governo está se alojando em partidos aliados, e quem é contra está buscando a posição que ficará mais confortável para si e para sua campanha”, explicou. Se, por um lado, já contabiliza as baixas, de outro, o PP considera a chegada de novos integrantes. Um dos cotados é a ministra da Agricultura, a deputada Tereza Cristina (União Brasil-MS). À frente do ministério que interage com um segmento importante de apoio a Jair Bolsonaro, a parlamentar chegou a ser cotada para ocupar a vaga de vice na chapa de reeleição do presidente da República.
Hildo Rocha (MDB-MA)
O deputado Hildo Rocha (MDB-MA) afirma que o partido já contabiliza desfiliações, mas espera adesões também, em movimentos equilibrados. “O MDB continuará do tamanho que está dentro da Câmara”, aposta o parlamentar. O emedebista acredita que o surgimento de forças importantes no Congresso, como o União Brasil, não diminuirá o protagonismo da legenda. Para ele, o MDB ainda tem muito peso eleitoral. “Somos o maior em filiações no país, em número de prefeituras, deputados estaduais, vereadores”, destacou. Ele reiterou que, no Senado, o partido é maioria. Na Câmara, a meta da sigla é ganhar corpo. “Nos manteremos independentes nesta legislatura e esperamos o pleito de 2022, torcendo e fazendo campanha pela Simone Tebet (MS)”, adiantou o deputado. Ele ainda afirma que a expectativa é selar uma aliança com o União Brasil, mas não federação. “No final, todos querem poder de decisão no Congresso. Todo partido quer poder”, conclui.
Sóstenes Cavalcante (União Brasil-RJ)
O líder da Bancada Evangélica na Câmara demonstra insatisfação com a falta de diálogo entre ele e as lideranças do União Brasil. “Eu não fui procurado pelo (Luciano) Bivar (presidente do partido) ou ACM (Neto, secretário-geral da legenda)”, reclama. Outro ponto de atrito, segundo o deputado, é o comando do antigo diretório estadual do DEM no Rio. Sóstenes vê chances consideráveis de mudar de legenda. “O diálogo com o PL está avançado, e esta deve ser minha próxima casa partidária”, disse. O interesse pelo partido está alinhado aos interesses estaduais. O governador do Rio, Cláudio Castro, se filiou ao PL no ano anterior. Sobre as movimentações internas, ele acredita que pelo menos 30 deputados irão se desfiliar do União Brasil. “Só da ala bolsonarista, sairão do PSL uns 25 parlamentares. Outros do DEM”. Ele citou as prováveis desfiliações dos deputados Pedro Lupion (PR) e Geninho Zuliani (SP).
Kim Kataguiri (Podemos-SP)
Até o momento filiado ao União Brasil, Kim Kataguiri pretende filiar-se ao Podemos, partido de Sergio Moro. Mas a entrevista na qual se manifestou sobre o nazismo atrapalhou os planos. Kataguiri afirma que jamais fez apologia ao regime de Hitler, contudo, integrantes do Podemos estão cautelosos em estabelecer um vínculo com o parlamentar após o episódio. Em relação à janela partidária, Kataguiri afirma haver uma disputa entre os deputados pela presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e para formar a maior bancada. Por isso, a expectativa pela transição partidária é grande: “É nela que os partidos irão medir suas forças para as eleições”. Ele cita negociações envolvendo o colega Juscelino Filho (MA), também filiado ao União Brasil. Katiguiri cita o parlamentar como exemplo de desfiliações em razão de interesses regionais. Em relação aos partidos governistas, o deputado menciona atritos entre o Progressistas e o Republicanos.
Fonte: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/03/4989323-marco-sera-movimentado-por-janela-partidaria-que-comeca-dia-3.html
Pré-candidatos à Presidência evitam se posicionar sobre legalização dos jogos
Guilherme Caetano / O Globo
SÃO PAULO — Enquanto o presidente Jair Bolsonaro diz que pretende vetar o projeto de lei que legaliza os jogos no Brasil, outros dos principais pré-candidatos à Presidência da República evitam se posicionar de forma incisiva sobre o tema. Além disso, enfrentam um problema parecido com o de Bolsonaro, que viu parte de sua base votar a favor da proposta, aprovada na semana passada pela Câmara dos Deputados. O Podemos, de Sergio Moro, o PDT, de Ciro Gomes, e o PSDB, de João Doria, racharam na votação.
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O texto libera atividades como cassinos, bingos, vídeo bingos, jogo do bicho, apostas em corridas de cavalos e atuação de plataformas digitais de apostas no Brasil. Pressionado pela bancada evangélica, Bolsonaro afirmou, na última quinta-feira, que vetaria a iniciativa e que “fez o que pôde” para derrotá-la em plenário. Apesar disso, aliados do presidente que se opõem à medida dizem que não houve empenho do governo para evitar sua aprovação. O PP, do líder do governo, deputado Ricardo Barros (PR), votou em peso a favor do projeto (34 a 1).
Na outra ponta, o PT deu 35 votos contrários ao projeto e nenhum a favor — 18 deputados do partido não se manifestaram. Procurada, a comunicação da pré-campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva repassou a questão para o diretório nacional, que encaminhou para a liderança na Câmara, a cargo do deputado Reginaldo Lopes (MG).
Faça o teste: Você conhece os pré-candidatos à Presidência em 2022?
Ele disse ter conversado sobre o assunto com a presidente da sigla, deputada Gleisi Hoffmann (PR), mas não com Lula. Para Lopes, sem mecanismos de controle, a legalização dos jogos poderia abrir espaço para sonegação fiscal e lavagem de dinheiro, e ser prejudicial para viciados em jogos e apostas. Ele também considera baixos os impostos sobre a atividade.
— É um debate que não está amadurecido na sociedade. Apesar de o projeto tramitar há 30 anos, nunca havia chegado a ser pautado — disse ele.
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Lula já proibiu bingos
Quando era presidente, Lula proibiu, em fevereiro de 2004, o funcionamento de bingos e caça-níqueis, na esteira da divulgação de vídeo no qual o então assessor da Casa Civil Waldomiro Diniz pedia propina a um empresário do ramo de jogos.
O pré-candidato do Podemos, Sergio Moro, também tem evitado se posicionar sobre a legalização dos jogos. Como ministro da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, ele sinalizou ser contrário ao aval quando tratou do assunto com parlamentares e interlocutores.
Agora, seus aliados têm apontado que um posicionamento deve ser encarado com cautela. O Podemos deu seis votos contrários. Entre os quatro favoráveis à legalização, estava o da presidente do partido, deputada Renata Abreu (SP).
Em busca de acenos a lideranças e fiéis de igrejas evangélicas, numa tentativa de atrair eleitores frustrados com Bolsonaro no segmento, Moro chegou a avaliar a inclusão, em uma carta a pastores, de um posicionamento contrário aos jogos. O documento, porém, não tratou do tema de forma explícita.
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No PDT, do presidenciável Ciro Gomes, a maioria dos parlamentares (15) foi a favor da liberação dos jogos. A bancada cearense, reduto de Ciro, foi majoritariamente a favor, mas também fez parte dos dez votos contrários. Procurado, ele não se manifestou. O presidente do partido, Carlos Lupi, afirma que o tema não é alvo de discussão interna na legenda e que não chegou a ser debatido com Ciro.
— Essa é uma questão de costumes, cada um vota conforme queira. Não tem questão ideológica. Nunca examinamos esse assunto em profundidade (com Ciro) — afirmou Lupi.
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O governador de São Paulo, João Doria, é outro presidenciável que evitou assumir uma posição. Sua assessoria de imprensa recomendou falar com Bruno Araújo, presidente do PSDB e coordenador da pré-campanha do tucano ao Palácio do Planalto. Este, por sua vez, passou a demanda para Rodrigo Maia, que deverá coordenar o programa de Doria. Secretário estadual de Turismo, Vinicius Lummertz já defendeu um modelo de jogos.
A maioria dos tucanos (15 contra 11) foi a favor da legalização, entre eles, três paulistas. (Colaboraram Bernardo Mello e Sérgio Roxo)
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/pre-candidatos-presidencia-evitam-se-posicionar-sobre-legalizacao-dos-jogos-25414261
Sérgio C. Buarque: Os sonhos atávicos de Putin
Depois de meses de ameaças e diferentes exigências aos países da OTAN, a Rússia invadiu a Ucrânia e seu presidente, Vladimir Putin, lançou uma ameaça aterrorizante ao mundo: “Quem tentar interferir, ou ainda mais, criar ameaças para o nosso país e nosso povo, deve saber que a resposta da Rússia será imediata e levará a consequências nunca experimentada na história”. Se não está anunciando cogumelos nucleares na Europa, pode estar próximo disto. Se Putin tinha motivos para estar incomodado com a adesão à OTAN de vários países do leste europeu, incluindo ex-repúblicas soviéticas, acabou de jogar fora toda a legitimidade que poderia ter para a negociação de um novo arranjo geopolítico na Europa. E, ao contrário do que pretendia, aumentou o receio destes países diante da poderosa e ameaçadora Rússia e o seu pedido de proteção pela OTAN. Mesmo assim, para deter a escalada de uma guerra continental, será necessário um esforço de negociação política que construção um novo sistema de segurança geopolítica global.
Putin parece ser um grande estrategista. Mas sua mente pode estar contaminada pelo sonho atávico do poderoso império russo, de Ivan a Stalin, que dominou vastos territórios da Eurásia. Neste sonho, a Ucrânia é o trunfo mais importante. Em pronunciamento recente, ele afirmou que a Ucrânia é “parte integral de nossa história, cultura, espaço espiritual”. E em artigo publicado no ano passado praticamente chamou os ucranianos de ingratos e incompetentes: “Os ucranianos desperdiçaram não só tudo que nós demos a eles durante o tempo da União Soviética, mas tudo que eles herdaram do império russo. Mesmo o trabalho de Catarina a Grande”. Tamanha arrogância e distorção histórica esconde a relação oposta: a exploração das riquezas ucranianas pelos impérios russos, especialmente a produção agrícola das terras férteis da Ucrânia que alcançou o paroxismo, nos anos 30 do século passado, com a brutal coletivização e o saque da produção agrícola ucraniana para financiar a modernização e a industrialização soviética.
No fundo, as preocupações geopolíticas de Putin se confundem com suas declaradas intenções de anexar a Ucrânia, “parte integral da história” russa que não passa de uma criação dos bolcheviques (frase dele). Desta forma, não basta que fique distante da OTAN, a Ucrânia deve voltar ao seio do império russo.
Fonte: Revista Será
https://revistasera.info/2022/02/os-sonhos-atavicos-de-putin/