Eliane Cantanhêde: Coisa de lunático
No mundo político, só se fala em vices; no mundo real, nem se fala nos presidenciáveis
Os eleitores demonstram profunda indiferença pela eleição e não estão nem aí para os próprios candidatos à Presidência da República, quanto mais para aqueles que disputam as vagas de vice. Mas, no mundo político, só se fala nisso, freneticamente: quem vai ser vice de quem?
As pesquisas em São Paulo – São Paulo! – mostram que muita gente ainda nem sabe que Geraldo Alckmin, ex-governador do Estado por três vezes, é candidato novamente à Presidência. E elas vão se preocupar com o vice? Sem Josué Gomes da Silva, que nove entre dez presidenciáveis disputavam, está aberta a disputa entre PP, PR, DEM, Solidariedade e PRB para indicar o (ou a) vice. Sem esquecer o PSD.
Já o caso do PT de Lula e do PSL de Jair Bolsonaro é ainda pior. Oficialmente, o PT nem candidato a presidente tem, com Lula preso em Curitiba e Fernando Haddad rouco de tanto dar entrevistas, mas só como “coordenador do programa”. As opções para vice dependem do cabeça de chapa e de alianças que, até agora, não vieram.
Já Bolsonaro convive com uma profusão de nomes para a vice, um mais engraçado do que o outro. Os últimos são o do “príncipe” Luiz Philippe de Orleans e Bragança e do astronauta Marcos Pontes. Os marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto devem estar se remoendo no céu, ou na cova, diante desse namoro de um capitão reformado do Exército com a monarquia, derrubada a duras penas. E o que dizer de um astronauta na vice? É piada pronta, ou coisa de lunático.
Bolsonaro já pensou em ter na vice o senador Magno Malta, pastor evangélico, e dois generais reformados, Augusto Heleno e Hamilton Mourão, mas a preferida é a professora Janaina Paschoal, uma das autoras do impeachment de Dilma Rousseff – e que chorou quando o próprio pedido deu certo.
Se Bolsonaro tem essa profusão de opções, Ciro Gomes está no lado oposto: rejeitado pela esquerda e pelo Centrão, não consegue fechar alianças e chega à reta final sem nenhum nome forte para a vice. Vai depender das negociações do PDT com o PSB – que está dividido entre apoiar Ciro, agarrar-se a Lula ou liberar geral para cada um fazer o que bem quiser.
E Marina Silva, que era vice de Eduardo Campos e assumiu a cabeça de chapa com a morte dele, só acena com nomes da própria Rede, o que equivale a chover no molhado. Chapas puro-sangue (com candidato a presidente e a vice do mesmo partido) são próprias de siglas fortes, com estrutura, boas bancadas e tempo de TV. Não para pequenos partidos isolados, sem nenhuma dessas condições ou vantagens.
Mas, afinal, por que esse frenesi pela definição da vice, se nem os próprios candidatos a presidente empolgam? Primeiro, por uma questão prática: vice consolida alianças, traz tempo de TV, “agrega valor” regional, ou de gênero, ou financeiro, às campanhas. Segundo, por uma questão mais simbólica, hipotética: a história registra que José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer só viraram presidentes por impedimento dos titulares. Um golpe de sorte? Só tem sorte quem está bem colocado, no lugar certo e na hora certa.
Os próprios eleitores já encamparam a ideia de que impeachments não são bichos de sete cabeças e podem muito bem acontecer. São parte do jogo. Aliás, pesquisa estimulada Record-Real Time detectou que 33% se declaram “muito preocupados” e 17% “razoavelmente preocupados” com a possibilidade de o futuro presidente seguir a trajetória de Collor e Dilma e sofrer impeachment. E lá viria mais um vice.
A advertência do juiz Sérgio Moro no Fórum Estadão de quarta cai como uma luva nesse contexto: o resultado da eleição não pode pôr em risco a Lava Jato. Senão, o pau vai comer e o vice é que vai se dar bem.
Eliane Catanhêde: Não brinquem com elas
As mulheres viraram feras para defender o Judiciário de ‘instabilidade e descrédito’
A cúpula feminina do Judiciário e do Ministério Público ganhou espaço e respeito ao pôr as coisas nos seus devidos lugares depois do domingo passado, quando novos “aloprados” petistas se aliaram ao desembargador Rogério Favreto para passar por cima do TRF-4, do STJ e do próprio STF na tentativa de libertar o ex-presidente Lula a qualquer custo.
Laurita Vaz, uma goiana de Anicuns, pouco conhecida, pouco polêmica, reproduziu de forma contundente o que boa parte do Judiciário pensa, mas não pode dizer. E ela não foi contundente numa nota ou entrevista, mas numa decisão oficial, em que negou habeas corpus para soltar Lula, desferiu duras críticas a Rogério Favreto e defendeu a atuação do juiz Sérgio Moro, acusado de “perseguir” o ex-presidente por não cumprir o ato estapafúrdio do desembargador.
Laurita classificou Favreto de “manifestamente incompetente” para conceder HC para Lula num mero plantão, disse que é “óbvio e ululante” que os argumentos dele não fazem sentido e concluiu que sua ação “causa perplexidade e intolerável insegurança jurídica”. Para a ministra, Moro reagiu “com oportuna precaução” ao consultar o presidente do TRF-4 para saber o que deveria cumprir, a decisão do tribunal (que mandou prender Lula) ou o HC monocrático de um desembargador (para soltá-lo).
Se Favreto chocou o País com sua audácia, Laurita Vaz surpreendeu o mundo jurídico, o mundo político e a mídia com sua decisão duríssima. Não bastasse, completou o serviço no dia seguinte, quarta-feira, ao derrubar de uma canetada só 143 pedidos de habeas corpus para Lula que tinham o mesmo formato, o mesmo jeitão, os mesmos argumentos, só mudando o autor. O Judiciário, reclamou, “não pode ser utilizado como balcão de reivindicações e manifestações políticas ou ideológico-partidárias”. O tom foi de advertência, de “bronca”.
Nos estertores de sua passagem pela presidência do STJ, que assumiu em setembro de 2016, Laurita Vaz vem se juntar a um time de mulheres que têm posições, se expõem e dão exemplos de coragem no Judiciário, como Cármen Lúcia, presidente do STF, e Rosa Weber, que já deu um voto na Corte que tem tudo a ver com o imbróglio detonado agora por Rogério Favreto.
Depois de se recusar a pôr em pauta pela quarta vez uma mesma questão, a prisão após segunda instância, Cármen Lúcia agora soltou nota, já no domingo, lembrando a impessoalidade e o respeito à hierarquia no Poder Judiciário. E, numa votação de HC para Lula, Rosa Weber jogou luzes num princípio precioso que Favreto jogou no lixo. Ela votou contra o HC, apesar de contrária à tese da prisão em segunda instância, ensinando que, num colegiado, derrotados seguem a decisão da maioria. “Vozes individuais devem ceder em favor de uma voz institucional”, lembrou. Senão, vira bagunça.
Ainda na quarta-feira, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, encaminhou a Laurita Vaz o pedido de instauração de inquérito judicial contra Rogério Favreto. Num tom tão duro e contundente quanto o usado pela própria Laurita, Raquel acusa Favreto de agir “sem imparcialidade”, “dolosamente” e “motivado por sentimentos pessoais contrários à lei”. De quebra, pediu ao CNJ a aposentadoria compulsória do desembargador.
Contrariando o estereótipo de mulheres delicadas, medrosas e frágeis, Laurita, Cármen e Raquel foram fortes na defesa das instituições que comandam, ou, como diz Raquel, contra “a exposição do Poder Judiciário brasileiro (...) a sentimentos que variaram de insegurança à perplexidade, da instabilidade ao descrédito”. Isso não poderia passar em branco. E não passou. A reação é à altura da ação tresloucada.
Eliane Cantanhêde: Todos contra um: Favreto
PT vende que Moro foi maior derrotado, mas quem ficou ilhado foi desembargador
Que o PT é bom de marketing não há a mínima dúvida, mas insistir na versão de que o partido e o ex-presidente Lula foram os grandes vitoriosos, enquanto o TRF-4 e o juiz Sérgio Moro foram os grandes derrotados na lambança de domingo já é demais. O pior é que tem quem acredite e passe adiante.
Para além do marketing, existe o fato, ou a realidade: quem ficou totalmente isolado durante todas as longas horas do imbróglio foi justamente quem o gerou, o desembargador Rogério Favreto, filiado ao PT por 20 anos, auxiliar dos presidentes Lula e Dilma Rousseff no Planalto e em ministérios e agora, como plantonista do TRF-4, autor do bombástico habeas corpus para soltar Lula.
Senão, vejamos. O juiz Sérgio Moro o declarou “absolutamente incompetente” para derrubar uma decisão do TRF-4, ratificada, nada mais nada menos, pela mais alta Corte do País, o Supremo Tribunal Federal. A Polícia Federal, perplexa, como todo o meio jurídico e o próprio Brasil, alegou que não é obrigada a cumprir uma decisão ilegal e em meio a um evidente conflito de competência.
Dentro do próprio TRF-4, ninguém abriu a boca ou tomou qualquer atitude para apoiar, concordar ou ratificar a posição do plantonista de fim de semana. Ao contrário, o desembargador que é relator da Lava Jato, João Pedro Gebran Neto, suspendeu o habeas corpus assinado por ele. E quem bateu o martelo foi o próprio presidente do tribunal, Carlos Eduardo Thompson Flores, contra o HC de Favreto e a favor da suspensão decidida por Gebran.
Para fechar o cerco – e a condenação ao voluntarismo de Favreto – a própria presidente do Supremo, Cármen Lúcia, distribuiu nota em tom de advertência, pedindo Justiça “sem quebra de hierarquia”. Uma alusão direta à audácia do desembargador ao contrariar a 8.ª Turma do TRF-4 e, incrível!, o STF. Logo, foram todos contra um – o que se aproveitou de um plantão para botar fogo no circo.
E Moro? Há quem reclame porque ele estava de férias e não tinha nada que se meter na decisão de Favreto, representante de uma instância superior. Mas há muita gente que vai em sua defesa, de procuradores a atuais e ex-ministros do próprio Supremo, alegando que juízes não deixam de ser juízes porque estão de férias e ele tem pleno direito de se manifestar 24 horas por dia, esteja onde estiver.
Ok, essa divergência reflete o “ame-o ou deixe-o” que persegue Sérgio Moro desde que ele virou a principal cara da Lava Jato, mas não tem nada de nova, muito menos o transforma no principal derrotado de um vexame que extrapola o TRF-4 e agrava ainda mais o momento conturbado, tenso e beligerante da Justiça brasileira, a começar da mais alta Corte do País.
A guerra agora está no CNJ e logo vai parar no STJ. Um punhado de advogados entrou contra Moro no CNJ, mas promotores e procuradores entraram contra Favreto. É um jogo de perde-perde, enquanto Lula continua preso, seus advogados juram que não tiveram nada a ver com aquele habeas corpus e nesta segunda-feira, 9, o PT novamente decidiu não decidir sobre a candidatura presidencial de outubro. Logo, o que Lula e o PT ganharam? Holofotes? Visibilidade? O velho “falem mal, mas falem de mim?”
Quanto ao TRF-4, realmente ficou dividido e correndo atrás do prejuízo causado por Rogério Favreto, mas nada que se compare ao desgaste acumulado, por exemplo, pelo próprio Supremo. E pode piorar.
O presidente Temer vai para o exterior duas vezes em julho, os presidentes da Câmara e do Senado não podem substituí-lo, pois serão candidatos e a Presidência vai sobrar para Cármen Lúcia. E quem assume o Supremo? Dias Toffoli. Vamos combinar que Toffoli no STF e Favreto no TRF-4 podem dar o que falar...
Eliane Cantanhêde: Operação Tabajara 2
O que está ocorrendo no TRF-4, de Porto Alegre, não é uma decisão jurídica, mas uma articulação claramente político-partidária entre deputados e um desembargador que mandaram “às favas os escrúpulos de consciência” (como na edição do AI-5, na ditadura militar) para soltar o ex-presidente Lula.
Lembram quando o vice-presidente da Câmara Waldir Maranhão (na época do PP) desembarcou em Brasília com um texto mequetrefe suspendendo a votação do impeachment de Dilma Rousseff pelos deputados em plenário? A situação é muito semelhante, e os dois casos caracterizam uma tentativa de ganhar no tapetão.
Na operação anti-impeachment, chamada pelo ministro Gilmar Mendes de “Operação Tabajara”, houve uma manobra do governador Flávio Dino (PCdoB) e do então ministro José Eduardo Cardozo (PT), usando a ingenuidade – ou a vaidade – de Maranhão. Foi um vexame e deu em nada.
Na “Operação Tabajara 2”, neste domingo, 8, os deputados petistas Wadih Damous e Paulo Pimenta entraram com pedido de habeas corpus para Lula quando já tinha começado o plantão, ora, ora, do desembargador Rogério Favreto, que foi filiado ao PT e trabalhou anos com o ex-governador e ex-ministro do PT Tarso Genro. Não só em uma, mas em três canetadas monocráticas, ele mandou soltar Lula.
Tudo indica um movimento coordenado contra decisões da 8.ª Turma do TRF-4 e do próprio Supremo Tribunal Federal, última instância do País. O TRF-4 manteve a sentença do juiz Sérgio Moro, condenou Lula e mandou prendê-lo. O Supremo, que aprovara em plenário a prisão após condenação em segunda instância, negou o HC de Lula com base nessa decisão.
O que alegou o desembargador Favreto para passar por cima das instâncias superiores à dele? Um: que faltou fundamentação na ordem de prisão de Lula. Ele quis dizer que o juiz e a Turma do seu tribunal fizeram tudo errado e foram irresponsáveis? Dois: que há um “fato novo”, a pré-candidatura de Lula à Presidência. Novo?!
O conluio gerou reações e contrarreações que jogam a Justiça brasileira num ridículo sem fim perante a população e o mundo. Um tribunal federal decide uma coisa, a Suprema Corte confirma, um desembargador desfaz tudo, um juiz de primeira instância (Moro) decreta que o desembargador é “absolutamente incompetente” para dar o HC. É para rir ou para chorar? Aliás, é ou não para soltar Lula? Tudo isso é estarrecedor, e Jair Bolsonaro já tenta tirar uma casquinha.
Eliane Cantanhêde: Guerra de foice
Eleição vai ter de afunilar, apesar dos temores e inseguranças de candidatos
Acaba a Copa para nós e começa de fato a eleição, ainda cercada de interrogações, mas com o tempo correndo cada vez mais rápido. Até 15 de agosto, prazo final para o registro de candidaturas, as respostas mais importantes terão que ser dadas, queiram ou não os partidos. É quando ficará claro quem entra, quem sai, quem está com quem.
Cresce a pressão para que o ex-presidente Lula faça uma “Carta à Nação” a ser lida na convenção do PT, no dia 28, para sair de campo espetacularmente, lançar Fernando Haddad e articular a candidatura dele a partir da cela em Curitiba – enquanto ainda estiver na cela em Curitiba.
Essa carta, com a renúncia à candidatura, serviria, ou servirá, como sinal verde para o Supremo dar o passo seguinte: livrar Lula da prisão. Em resumo, Lula abdica de ser candidato em troca de conquistar a liberdade. Uma complexa negociação, com Dias Toffoli afirmando-se não só como o próximo presidente de fato do STF, mas como o mais audacioso entre os onze ministros.
Fora da prisão e da chapa, Lula apresenta um candidato que mantém o PT e as esquerdas unidas, oferece enfim um nome ao Nordeste, que vota em quem seu mestre Lula mandar – e atrai dois tipos essenciais de eleitores: petistas decepcionados com o partido, mas sem alternativa, e também eleitores de outras siglas, igualmente desanimados com os nomes já colocados.
Do lado oposto, na raia da direita, Jair Bolsonaro repete Collor em 1989 e Trump agora nos EUA: a mídia e os analistas não conseguem acreditar que ele está consolidado para o segundo turno, mas ele vai vencendo resistências. Aplaudido na CNI? Sem entender de economia e sem ter administrado coisa nenhuma? Pois é. Collor, o marajá número um, venceu com o marketing de “caçador de marajás”.
Bolsonaro desdenha de alianças e partidos e cobre preventivamente a falta de tempo na TV com as redes sociais, enquanto seus principais concorrentes fazem o oposto: desdenham a internet e mergulham em cafés, almoços, jantares e reuniões em busca de alianças que lhes deem minutos de TV, palanques e condições futuras de governabilidade.
No foco está o tucano Geraldo Alckmin, que, pelo currículo ou pelo partido (que vence ou disputa o segundo turno desde 1994), é, ou seria, o maior beneficiário de uma união ao centro. Mas o aliado e até afilhado João Doria lhe fez o imenso favor de criar, antes do início da eleição, a sensação de que ele “não tem chance”. A cada pesquisa, a cada nome alternativo, aumenta o medo dos aliados naturais do PSDB, a começar do DEM. Os partidos querem que Alckmin cresça nas pesquisas para se definir. Alckmin quer que eles se definam para poder crescer nas pesquisas.
O futuro de Ciro Gomes está atrelado ao PT, desde que ele cismou de se colocar como opção de esquerda, mas fez um movimento esquizofrênico: disputava o PT, enquanto soltava cobras e lagartos contra o partido e contra Lula. Agora, disputa o DEM, que pode ser tudo, menos de esquerda. “O que nós temos em comum com o Ciro? Nada!”, resume José Carlos Aleluia (DEM-BA).
Marina Silva é o voto confortável, de quem valoriza ética, biografia, simbologia, mas isso nunca será suficiente para levar uma candidatura ao segundo turno, muito menos para empurrá-la rampa acima. Mais uma vez, Marina parece candidata a válvula de escape para aqueles que não encontrarem uma opção entre os que são “para valer”.
É assim que a eleição mais pulverizada desde 1989 vai caminhando, trôpega, surpreendente e, de certa forma, amedrontadora. Mas, com o fim da Copa e a chegada, já, já, de agosto, tudo vai começar a afunilar. E a exigir que você, eleitor, eleitora, pare de resmungar e passe a fazer o mais difícil: analisar e decidir.
Eliane Cantanhêde: Haddad em campo
Tudo caminha para Lula se materializar no ex-prefeito de São Paulo e chacoalhar a eleição
A grande novidade da eleição presidencial, tão pulverizada e incerta, está para surgir: a entrada em cena do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que une o útil, a força do ex-presidente Lula, ao agradável, a sua própria imagem, que extrapola o PT.
Condenado, preso, longe de holofotes e microfones, Lula mantém seus inacreditáveis 30% das pesquisas, numa eleição com tantos nomes e nenhuma certeza. Logo, Lula é quem tem o maior capital e o maior potencial de transferência de votos.
Livre, passando ao largo de denúncias de corrupção, Haddad é aquele bom moço sem a pecha, as marcas e as cicatrizes do PT e amplia o leque de eleitores do partido. Petista só vota em petista, mas tem muita gente que não morre de amores pelo PT, mas poderia votar de bom grado no professor Haddad.
Lula e Haddad, portanto, se complementam. Um tem voto, mas alta rejeição. O outro não tem voto, mas não tem rejeição. Um garante a largada, o outro tem de fazer o resto, ganhar fôlego, abrir horizontes. Ou atrair as elites, assim como José Alencar, em 2002, atraiu o capital.
De bobo, Lula não tem nada, muito pelo contrário. E ele acha plenamente possível que em algum momento seja solto, mas dificilmente trabalha com a hipótese de ser candidato até o fim. Sabe que sua candidatura tem mil e uma utilidades, mas é uma ficção.
Aliás, será mesmo que Lula gostaria de voltar à Presidência? Ele saiu do Planalto com 80% de popularidade, governou com a herança bendita de Fernando Henrique e numa época de prosperidade na América do Sul raramente vista. Voltar para quê? Para enfrentar a crise, a dívida, os 13 milhões de desempregados e os Estados falidos?
É muito mais cômodo – e prudente – que Lula use a “candidatura” para manter força política, exposição na mídia e carregar um candidato nas costas. Alguém que não precise ter o que ele já tem, mas agregue o que ele não tem. Quem poderia ser, além de Fernando Haddad?
Lê-se que Haddad acaba de se lembrar que é bacharel em Direito, foi buscar a carteira da OAB e vai integrar a equipe de defesa de Lula – já tão congestionada, causando atropelos e batidas. Para disputar com Cristiano Zanin, que está desde o começo? E com Sepúlveda Pertence, que é um ás?
Logo, o advogado Haddad tem um único objetivo: obter passe livre para entrar e sair da prisão de Curitiba, com acesso direto a Lula. E não me venham dizer que vão falar de flores. O (muito) mais provável é que falem de... eleição.
Até aqui, Jair Bolsonaro está isolado na liderança, petulante ao ponto de prever vitória em primeiro turno, e o segundo pelotão está embolado com Marina, Ciro, Alckmin e, tentando correr atrás, Alvaro Dias. O resto é o resto. Mas a entrada de Haddad para valer tem potencial para dar uma boa chacoalhada nisso.
O primeiro efeito tende a ser nas pretensões de Ciro, que só chegou até onde chegou no vácuo do PT, troca desaforos com a própria sombra e cria constrangimento para empresários na casa deles, a CNI. A um sinal de Lula, boa parte dos votos do Nordeste migram para Haddad. E, sem Nordeste, não há Ciro.
Consolidadas a direita, com Bolsonaro, e a esquerda, com Lula materializado em Haddad, que o centro trate de jogar a sério, deixando vaidades de lado. O treino está acabando e a pergunta é: quem quer levar a culpa por um segundo turno entre Bolsonaro e PT?
Tem candidato que não tem voto para se eleger, mas tem para impedir as chances do centro. Aliás, é isso que Fernando Henrique e o próprio Alckmin tentam dizer para Alvaro Dias, que divide os votos de centro no Sul. Assim como não seria surpresa a candidatura de Haddad a presidente, não seria a de Dias ao governo do Paraná.
P.S.: O jogo de hoje, o de futebol, vai ser de matar do coração. Dá-lhe, Brasil!
Eliane Cantanhêde: A volta de quem não foi
O que, afinal, Dilma Rousseff tem a defender na campanha ao Senado pelo PT em Minas?
O anúncio da candidatura de Dilma Rousseff ao Senado por Minas Gerais é duplamente, digamos, curioso. Ela, como Lula, é tecnicamente inelegível. E como vai defender o seu legado na Presidência da República durante a campanha?
Quem esqueceu de como Dilma manteve a possibilidade de disputar eleições, apesar do impeachment? No último segundo do segundo tempo, os então presidentes do Senado, Renan Calheiros, e do Supremo, Ricardo Lewandowski, fizeram um acordão e inventaram a novidade.
Pela letra fria das leis e da Constituição, presidente da República que sofre impeachment se torna automaticamente inelegível durante oito anos, como ocorreu com Fernando Collor de Mello, e ninguém jamais questionou. Ele cumpriu pacientemente sua quarentena, antes voltar à política com mandato de senador.
Collor era Collor, o inimigo número um da Nação, que na reta final não tinha mais aliados, só adversários. Já Dilma tinha por trás o padrinho Lula e o PT, um dos maiores partidos do País, então com 13 anos de Presidência. Por causa de Lula e do partido, Renan e Lewandowski deram um jeitinho e Dilma manteve o direito de se candidatar.
Dilma nasceu em Minas, mas fez carreira política no Rio Grande do Sul e praticamente estabeleceu residência no Rio de Janeiro. Como vai fazer campanha em Minas, um dos três Estados mais importantes e mais politizados? Vai defender o seu próprio legado, desastroso? Ou o do governador Fernando Pimentel, seu amigão, que enfrenta problemas na Justiça e encerra o mandato com uma baita crise econômica, até atraso de salários de funcionários?
Apesar da tese de “golpe”, Dilma caiu por inapetência política, inaptidão administrativa e erros crassos na economia. Afundou o Brasil em dois dolorosos anos de recessão econômica; inflação acima da meta; juros estratosféricos; fundos de pensão depenados; agências desarticuladas; estatais sem prumo; setor elétrico de pernas para o ar; pré-sal condenado a ficar para sempre nas profundezas do oceano.
Foi assim que o País mergulhou no desemprego. Hoje, são 13 milhões de desempregados e precisa-se reconhecer que Michel Temer não conseguiu controlá-lo, mas a culpada número um foi Dilma, sua autossuficiência, suas noções antiquadas de economia, sua incapacidade de entender a importância dos pilares macroeconômicos. “Coisa da direita...”, diria ela.
A eleição em Minas, portanto, parece ir de mal a pior. Dilma disputando o Senado como revanche pelo impeachment e seu contendor no segundo turno de 2014, Aécio Neves, do PSDB, pior ainda: sem ter para onde correr. Presidência de novo? Governo de novo? Senado de novo? Nem perto. Se der sorte, pode até encontrar uma vaga de deputado federal, mas sem ilusões: mandato não é mais garantia de foro privilegiado. Nem de impunidade.
Já confuso desde 2016, o politizado eleitor mineiro acabou levando à prefeitura de Belo Horizonte o verdadeiro outsider daquela eleição, Alexandre Kalil, do inexpressivo PHS. E esse é o maior risco da eleição presidencial no Estado este ano.
Para o governo, o PT aposta na reeleição de Pimentel e o PSDB foi buscar o ex-governador Antonio Anastasia, que encerrou a primeira gestão bem avaliado e passa ao largo das infindáveis descobertas da Lava Jato. Por fora, corre o ex-prefeito de BH Marcio Lacerda (PSB), que aguarda articulações de seu partido com o PDT de Ciro Gomes.
O pior em Minas é a eleição para a Presidência. Com o Norte e o Nordeste petistas e o Sul e o Centro-Oeste antipetistas, Minas é um Estado-chave para definir o sucessor de Temer. Se mantiver o “espírito do contra” que levou Kalil para a prefeitura, vocês sabem quem vai se dar bem, não é? Ou já está se dando...
Eliane Cantanhêde: Lula no mata-mata
Decisão do STF impacta Lava Jato, eleição, autoestima brasileira e até rumo da história
Com a chegada do recesso do Judiciário, bateu o desespero no ex-presidente Lula e nos seus advogados, que saíram em desabalada carreira para entupir o Supremo de recursos, tentando atropelar o plenário e até o sorteio eletrônico (!) para escolher não só a turma, mas o próprio relator desses recursos. Esse serve, esse não serve... Uma audácia incrível, no vale tudo para Lula trocar a prisão em Curitiba pela campanha à Presidência.
Nessa corrida, com chute, cotovelada e empurrão, os advogados Sepúlveda Pertence e Cristiano Zanin disputam homem a homem quem apresenta seus recursos primeiro e, no fundo, quem cai mais nas graças do cliente famoso. Sepúlveda tem mais credenciais, como ex-presidente e grande referência no Supremo. Zanin, bastante esforçado, foi escolhido por ser genro de um dos maiores benfeitores de Lula, Roberto Teixeira.
Assim, Pertence, mais experiente, mais pé no chão, trabalha com a prisão domiciliar de Lula como lance na negociação com o Supremo. Mas o próprio Lula, a cúpula do PT e Zanin aderiram ao tudo ou nada, têm uma posição menos jurídica e mais política e não admitem um milímetro a menos do que a anulação da condenação do juiz Sérgio Moro e do TRF-4, com a conversão do réu em vítima. Por isso, a defesa acabou apresentando dois recursos conflitantes.
O primeiro foi para anular a condenação e todos os seus efeitos: a prisão e a inelegibilidade. O segundo, num evidente recuo, para anular apenas a prisão e deixar a questão da inelegibilidade para lá. Por que? Porque o PT pretende registrar a candidatura Lula até 15 de agosto e a partir daí guerrear contra a impugnação na Justiça Eleitoral, mas, se o STF confirmar a inelegibilidade antes, nada feito, a guerra já estará perdida. O STF tem sempre a última palavra.
Enquanto rola solto o confronto de egos e estratégias entre os advogados de Lula, mais o Supremo vai se organizando em três grupos. O dos que gritam pelo fim da prisão em segunda instância e, até lá, soltam todo mundo e abrem caminho para soltar Lula também. O dos que não soltam ninguém, não admitem votar pela quarta vez a prisão em segunda instância e não parecem dispostos a salvar Lula. E um terceiro que serve de pêndulo.
Assim, foram eleitos os “amigos” de Lula, os “inimigos” e as “incógnitas”. Entre os amigos, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello. Entre os inimigos, Cármen Lúcia – que vai chegando ao fim de sua presidência sem por em pauta a revisão da prisão após a segunda instância – e Edson Fachin, o “petista roxo” que bate de frente o tempo todo com os lulistas (desde sempre ou de ocasião) na Segunda Turma. Entre as incógnitas, Celso de Melo e Rosa Weber, que guardam seus votos para... a hora do voto.
E, assim, chegamos a julho com Cármen Lúcia no olho do furacão. Ela distribuiu a pauta de agosto sem os recursos de Lula, mas assume poderes monocráticos durante o recesso e pode decidir a qualquer momento levar esses recursos ao plenário na primeira quinzena de agosto. Uma responsabilidade monumental, porque impacta a Lava Jato, a autoestima do brasileiro, a percepção internacional sobre o combate à corrupção no Brasil, a eleição presidencial e, sem exagero, o rumo da história.
O Brasil está parado, com a respiração suspensa, não só pela disputa do hexa na Rússia, mas também pela indefinição de uma eleição que praticamente congelou. O líder nas pesquisas é uma ficção, o segundo é um perigo, os demais não vão nem para a frente nem para trás. Passada a Copa e decidido finalmente o destino de Lula (e, com ele, o da Lava Jato e da Ficha Limpa...), os advogados vão parar de correr e a eleição vai enfim andar. Na verdade, enfim começar.
Eliane Cantanhêde: Volta ao pré-Lava Jato
STF ‘está voltando a ser STF’? Ou a era da impunidade é que está voltando?
Estava demorando, mas o ministro Marco Aurélio Mello conseguiu alcançar os três colegas da Segunda Turma, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, que tomaram a dianteira no confronto à Lava Jato e à opinião pública. Ontem, Marco Aurélio deu clara contribuição à sensação de que há uma corrida pela impunidade: por liminar, mandou soltar o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha no caso de desvios na Arena das Dunas (RN).
Por sorte – ou por azar, dependendo da ótica –, Cunha coleciona processos e teve a prisão decretada por outras acusações, inclusive uma condenação em segunda instância por desvios da Petrobrás na compra de um campo petrolífero no Benin, na África. Assim, o todo ex-poderoso presidente da Câmara continua atrás das grades.
Marco Aurélio, porém, conseguiu dar seu recado: ele é da Primeira Turma do STF, mas com coração e mente na Segunda, ao lado de Gilmar, Lewandowski e Toffoli. Afora o fato de que Gilmar vivia às turras com Lewandowski e Marco Aurélio no julgamento do mensalão do PT, os quatro agora parecem firmemente determinados a dar um chega prá lá na Lava Jato, numa posição de confronto ostensivo.
“O Supremo está voltando a ser Supremo”, comemorou Gilmar, após a Segunda Turma despejar decisões polêmicas na terça-feira: soltou José Dirceu até o STJ anunciar se reduz ou não a pena de mais de 30 anos; anulou provas colhidas contra o ex-ministro Paulo Bernardo (PT) no apartamento funcional onde vive com sua mulher, a senadora Gleisi Hoffmann; suspendeu a ação contra o deputado estadual Fernando Capez (PSDB), envolvido na “Máfia da Merenda” em São Paulo.
Ilhado e perplexo, o relator da Lava Jato, Edson Fachin, contestou as decisões machadianamente, mas perdeu em todas. Transformar uma reclamação num habeas corpus que nem sequer fora apresentado pela defesa de Dirceu? Pela “plausibilidade” de redução da pena?
No caso de Paulo Bernardo, acusado de desvios no crédito consignado de funcionários públicos, o trio Toffoli, Gilmar e Lewandowski alegou que ele mora com Gleisi, que tem foro privilegiado no Supremo, e a busca e apreensão não poderia ter sido autorizada por um juiz de primeira instância. Dúvida de Fachin: o foro vale para uma pessoa, a senadora, ou para um imóvel?
A grande suspeita é de que todos esses movimentos têm um objetivo audacioso e comum: livrar Lula da prisão e, ato contínuo, dar um jeito para permitir sua candidatura à Presidência, apesar da condenação em segunda instância e da prisão. Aliás, apesar de tudo. Até por isso, Fachin decidiu driblar a Segunda Turma e enviar o pedido de Lula para o plenário, onde o equilíbrio é outro, pelo menos por ora.
Em setembro, Cármen Lúcia vai para a Segunda Turma, salvar Fachin do isolamento, e Toffoli assume a presidência – e a pauta. Podem escrever: ele vai pôr em votação a revisão da prisão em segunda instância, como o quarteto cobra a todo instante.
Ao dizer que “o Supremo está voltando a ser Supremo”, Gilmar deixa no ar um temor: o de que não só o STF, mas o próprio País esteja voltando à velha normalidade pré-Lava Jato, em que tudo era uma festa para corruptos e Cunha, Cabral, Geddel, Joesley... jamais seriam presos.
Naqueles tempos em que presidentes definiam pessoalmente regras e porcentagens para o assalto à Petrobrás, a operacionalização da corrupção era no Ministério da Fazenda, sindicalistas eram destacados para depenar os fundos de pensão e vai por aí afora. A Lava Jato tem defeitos e excessos, mas nada, nada, nada pode ser pior do que estava acontecendo no Brasil.
PS: Hoje é o último dia de votações no STF antes do recesso. Olho vivo! Tudo pode acontecer.
Eliane Cantanhêde: Quem ri por último...
Com o impeachment, Dilma está numa boa e a vida de Temer virou um inferno
Se arrependimento matasse, talvez Michel Temer já estivesse mortinho da Silva depois de deixar sua eterna zona de conforto, articular meticulosamente o impeachment de Dilma Rousseff e assumir a Presidência em meio à maior crise política e econômica da história. Temer virou o principal alvo do País, Dilma vive (quase) em paz.
Ela caiu ao perder as condições de governabilidade, diante da certeza de que o Brasil não suportaria mais dois anos de Dilma Rousseff. O que não se sabia é que, ao assumir, Temer viraria o maior vilão nacional. Deputado federal desde 1987, presidente da Câmara três vezes, presidente nacional do PMDB e vice-presidente da República por seis anos, ele sempre tinha passado incólume por investigações e denúncias.
Durante essas décadas, conviveu tranquilamente com o fantasma de suspeitas e maledicências sobre suas relações com o Porto de Santos. Um fantasma que nunca se materializara, até que... Bastou subir a rampa do Planalto e tudo mudou, a vida de Temer virou um inferno de denúncias, acusações, investigações. Sua biografia, que parecia condizente com um professor de Direito Constitucional, esfarelou. Até sua saúde sai abalada.
Não bastasse a gravação sorrateira de Joesley Batista e duas denúncias de Rodrigo Janot, Temer viu Romero Jucá despencar do Planejamento e Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima e Henrique Alves irem em fila para a prisão, com quase todos os seus assessores políticos. O que dizer de Rocha Loures e sua mala?
Agora, Temer vê a filha exposta nas tevês por depoimentos constrangedores sobre uma reforma na sua casa e vê os fiéis amigos José Yunes e coronel João Baptista Lima nas situações mais aflitivas, tentando explicar decretos, Porto de Santos, empresa Rodrimar, temas com os quais o brasileiro comum já está familiarizado.
Temer acabou sofrendo o que considera uma imensa humilhação à sua pessoa e que todo o resto considera uma imensa humilhação à instituição Presidência da República. Onde já se viu um presidente com sigilo bancário e fiscal quebrado a pedido da Polícia Federal e por autorização do Supremo?
Além da J&F e do Porto de Santos, há ainda a história dos R$ 10 milhões da Odebrecht para o então PMDB, acertados no Jaburu em 2014. Apesar de as doações privadas para campanhas serem ainda legais, por pouco lá se vai também o sigilo telefônico do presidente da República.
Nos dois casos, o do Porto de Santos e o do PMDB, a PF pediu a quebra de sigilo de Temer, mas a PGR deu parecer contrário. No primeiro, Luís Roberto Barroso ficou com a PF. No segundo, Edson Fachin seguiu a PGR. Temer passou raspando, mas seus Eliseu Padilha e Moreira Franco não tiveram a mesma sorte. O mundo de Temer continuou a desmoronar quando os inegáveis ganhos na economia começaram a fazer água. A reforma da Previdência não vingou. O País parou de crescer. O desemprego parou de cair. E veio a greve dos caminhoneiros. Recuar da tabela de fretes horas depois da publicação é só uma pitada de vexame.
Pode-se dizer que a vida de Temer anda um inferno. E seu troféu é o pior índice de popularidade de um presidente, com chance zero de reversão. Enquanto isso, Dilma transita entre Rio, Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba, Europa e EUA e insiste em ser candidata em Minas, atravessando o samba da aliança PT-MDB no Estado. Pensando bem, quem mais se deu mal com o impeachment? Temer, o novo inimigo número um do País, ou Dilma, que passeia por aí trombeteando a tese do “golpe” e ainda se dá ao desplante de dizer que “estão destruindo a Petrobrás”?
Aliás, será que os quase vinte candidatos têm mesmo certeza de que querem assumir a Presidência da República?
Até já: Saio duas semanas de férias. Ufa!
Eliane Cantanhêde: Cavando a derrota
Quantos mais candidatos, mais todos eles perdem, principalmente Alckmin
Quanto mais as forças políticas de centro falam em “união”, mais ocorre justamente o oposto: os candidatos já colocados desdenham a possibilidade e novos nomes continuam entrando numa corrida presidencial já tão inflacionada. Em vez de diminuir, como se esperava, o número de candidatos só faz aumentar.
Isso reforça uma constatação: os partidos não acreditam nas chances do ex-governador Geraldo Alckmin, que seria o nome com mais força e melhores condições para aglutinar as tais forças e os tais votos de centro. Afinal, Alckmin é do PSDB, partido que ou ganhou ou disputou o segundo turno em todas as eleições desde 1994, e foi quatro vezes governador do principal Estado da Federação. E bem-sucedido, faça-se justiça.
Logo, Alckmin tem a força, a estrutura os recursos, a capilaridade, o tempo de TV e a capacidade de fazer alianças do PSDB e acrescenta a isso as suas próprias qualificações, inclusive as pessoais. Mas não sai do lugar e tem até de suportar recado malcriado do líder das pesquisas, Jair Bolsonaro: “Quando atingir dois dígitos, ele liga pra mim”.
Com Bolsonaro consolidado pela direita e Ciro Gomes (PDT) crescendo à esquerda, o congelamento da opção Alckmin aumenta o desespero da turma que trabalha, ou reza, por uma “união do centro”. Na mesma semana em que é lançado o Manifesto por um polo democrático e reformista continuaram entrando novos nomes considerados de centro ou centro-direita. Em vez de somar, dividem-se.
O manifesto foi assinado por Fernando Henrique Cardoso e nada mais é do que um esforço para uma candidatura comum. Envolve PSDB, PPS, MDB, DEM, PV, PSD e PTB, joga iscas à esquerda e à direita e considera seis beneficiários de uma “união”: além de Alckmin, Rodrigo Maia, Meirelles, Marina Silva, Flávio Rocha e Alvaro Dias. Mas até Rodrigo Maia joga água fria na articulação, que considera “conversa meio de bêbado”, por falta de ressonância na sociedade.
E assim, vão entrando na disputa Nelson Jobim, do MDB, Guilherme Afif Domingos, do PSD, e Josué Gomes da Silva, do PR. Jobim observa ao longe e só entra na boa, com mínimas garantias e alguma segurança. Afif se licenciou da presidência do Sebrae nacional e Josué saiu ontem da Fiesp, ambos colocando-se à disposição para disputar em outubro. Nos três casos, a mesma constatação e a mesma ambição.
Eles acham que as chances de Alckmin são reduzidas, que grande parte do eleitorado torce o nariz para Bolsonaro e para Ciro e que há uma longa avenida de oportunidades para novos nomes – os deles próprios.
Jobim passou com nota 10 pelo Executivo, Judiciário e Legislativo, mantendo boa interlocução com militares. Afif já disputou a Presidência em 1989 e tem a força das pequenas e médias empresas. Josué é um dos mais bem sucedidos empresários brasileiros e tem a aura de filho de José Alencar, vice de Lula.
O timing deles é o final de julho, início de agosto, com as convenções partidárias. Jobim teria de se viabilizar o suficiente para disputar com Henrique Meirelles no MDB, Afif vai enfrentar a aliança praticamente já definida do PSD com o PSDB e Josué está aí para o que der e vier, variando entre uma candidatura a vice e a cabeça de chapa do PR, partido ainda indefinido sobre o que fazer em outubro.
Tudo pode acontecer, mas é improvável que um deles dispare até outubro, acabe no segundo turno e vire um sucesso espetacular na eleição. Assim, eles seguem o mesmo destino de Alvaro Dias (Podemos): dificilmente ganham, mas certamente enfraquecem Geraldo Alckmin. Por quê? Por que todos tiram votos potenciais do tucano, pulverizam ainda mais o centro e deixam Bolsonaro e Ciro correndo por fora, livres, leves e soltos.
Eliane Cantanhêde: O eleitor militar
Assim como a maioria dos eleitores, militares também estão cheios de dúvidas
De supetão, o general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, pergunta:
– Você é a favor da intervenção militar?
A resposta é óbvia e rápida:
– Eu? Sou absolutamente contra!
E ele, com um sorriso:
– Você é? Pois eu sou mais ainda!
É assim que as Forças Armadas se esforçam para afastar mais esse fantasma, nesses tempos já tão conturbados e assombrados, e tentam focar em questões mais imediatas e objetivas: fazer as contas dos seus gastos durante as missões extras durante a greve dos caminhoneiros, cumprir bem o mandado de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Rio e se informar sobre candidatos e propostas para outubro.
Alvaro Dias, por exemplo, já debateu com oficiais em Santa Maria (RS) e a intenção é convidar todos os presidenciáveis bem colocados nas pesquisas para apresentar seus programas, suas ideias e suas intenções a oficiais da Força. Sem preconceito.
O Exército já ouviu ou está pronto a ouvir Ciro, Marina, Alckmin, Meirelles, Rabello de Castro, Bolsonaro... E o candidato do PT? A resposta dos oficiais é rápida e dada com naturalidade: assim que ficar definido o nome do PT, também será convidado.
As Forças Armadas, aliás, não tiveram dificuldade com os governos civis, muito menos com Lula, que nomeou Nelson Jobim para a Defesa, patrocinou a “Estratégia Nacional de Defesa” e bancou os maiores programas de reaparelhamento em décadas, como os submarinos da Marinha e os jatos da FAB anunciados já com Dilma Rousseff.
A boa relação continuou com Dilma. Quando ela queria reclamar de alguém ou de um programa, apontava o dedo para generais, brigadeiros e almirantes e tascava: “Vocês deveriam fazer como os militares! Aprendam com eles!”.
Isso, claro, não significa que oficiais das três Forças estejam animados ou mesmo dispostos a votar num candidato do PT, qualquer que seja ele, ou de um partido nitidamente de esquerda. Mas não é por isso que eles estão indo em massa para o lado oposto, o de Jair Bolsonaro – primeiro nas pesquisas sem Lula.
Ao que se saiba, não há pesquisas eleitorais nas tropas, ou seja, nas bases, mas qualquer conversa na cúpula militar identifica que eles estão mais ou menos como a grande maioria da população brasileira: indecisos, observando, querendo entender melhor o quadro e quais são as alternativas que se colocam. Ou seja: estão prudentes, enquanto líderes militares e enquanto eleitores em tempos de crise.
Basicamente, sabem que o rombo fiscal é gigantesco, a dívida pública apavora, a violência urbana é grave, não dá mais para cortar em saúde e educação e todos os setores vão ter se acostumar com a ideia de que a conta será repartida. Cada um vai dar sua cota e os militares não podem ficar de fora. Isso vale, por exemplo, para a reforma da Previdência que, mais cedo ou mais tarde, virá.
Em conversas informais, oficiais com grande liderança já admitem que a idade de aposentadoria é muito baixa e que, como a população em geral, os militares também estão vivendo muito mais e contribuindo para o desequilíbrio do sistema. Logo, eles aceitam debates e mudanças, mas deixando bem claro que é preciso respeitar as peculiaridades de uma carreira diferenciada, com muitas mudanças e nem sempre com carga horária fixa.
Outra questão muito delicada entra sutil e acessoriamente nas conversas: a Comissão da Verdade, o pedido de desculpas oficial por torturas e desaparecimentos na ditadura e o fato de as notícias daquele período continuarem a atormentar os militares e as Forças Armadas.
Mas isso não é questão para já. Até as eleições e a posse do novo presidente, há muitas outras prioridades já dividindo o País. Muitas questões importantes terão de esperar. Afinal, cada dia, sua agonia.