Ascânio Seleme: Um presidente nada pode

São mal-informados e, de certa forma, inocentes, os eleitores que acreditam nas promessas mirabolantes de seus candidatos.
Foto: Reprodução/Veja
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São mal-informados e, de certa forma, inocentes, os eleitores que acreditam nas promessas mirabolantes de seus candidatos.

É incrível como estão seguros e cheios de si os brasileiros que votarão em Bolsonaro pensando que ele vai mesmo resolver tudo na bala. E também os que aceitam sem questionar que Haddad vai conseguir dar uma virada na economia apenas porque tem o apoio do mártir Luiz Inácio.

O fato é que um presidente sozinho nada pode. Ele precisa de apoio do Congresso, do Judiciário e dos diversos mecanismos de controle do Estado para poder encaminhar, debater e aprovar medidas que de fato resultem em mudanças estruturais na vida da nação. Precisa também do apoio dos brasileiros, da sociedade organizada para tocar suas pautas. Você pode dizer que todo presidente recém-eleito chega fortalecido pelas urnas. Pode ser, mas se o quadro até aqui pintado for este mesmo, o presidente eleito chegará ao Planalto com mais oposição do que apoio.

Mas, o pior é que, na verdade, esta é uma eleição sem propostas. A questão política é tão preponderante que propostas, projetos, ideias de inovação na gestão pública não fazem parte do cardápio da mais crucial sucessão presidencial desde a redemocratização. Além das menções ligeiras, sem profundidade, com nenhuma contestação, pouco ou quase nada se sabe sobre o que querem fazer do país os candidatos a presidente. Estamos num deserto sem qualquer vista para o futuro. O Brasil corre perigo.

Mesmo nos debates, entrevistas e sabatinas promovidos por TVs, jornais, revistas, rádios e sites o tema é predominantemente político. Queria ouvir dos eleitores de Bolsonaro o que eles podem dizer sobre as propostas do seu candidato para a geração de empregos, a dívida pública, o saneamento básico. Duvido que saibam. Tampouco saberiam dizer qual a fórmula dele para a segurança pública. Sim, apesar de ser o candidato mais identificado com a segurança, nada se sabe sobre o que fará para conter a criminalidade no país.

Os eleitores sabem quase tão somente que Bolsonaro é duro, agressivo, misógino, homofóbico, racista e quer liberar o porte de armas de maneira indiscriminada. E daí? Daí, nada. Bolsonaro é uma incógnita. Nem mesmo o seu lado mais civilizado, exercido pelo economista Paulo Guedes, pode ser levado muito a sério. Já foi chamado de exótico e mentiroso e não é respeitado pelos seus pares. Suas ideias ultraliberalizantes são tão simplistas quanto inadequadas.

O mesmo pode se dizer dos eleitores de Haddad. Desconhecem o que propõe o candidato. Como o capitão do PSL, o poste de Lula tem que se ocupar muito mais com a sua defesa e a do seu partido, responsável pelo maior escândalo de corrupção do planeta. Claro que os temas estão todos elencados no programa de governo que ele mesmo ajudou a construir. Mas papel aceita tudo e não é contestado. Um dos principais desenhistas do programa, o economista Marcio Pochmann, ultra-estatista, já foi até desautorizado publicamente por Haddad.

Enquanto isso, o eleitor fica no ar. Os mais esclarecidos podem até saber mais ou menos como pensa cada corrente antagônica que os dois representam, mas se quiser detalhes terá que pesquisar, ir no site dos partidos e ler o que propõem. Mas aí, como já disse, o mundo é cor de rosa por absoluta falta de contra-argumentação. Bolsonaro não tem TV e não pode, portanto, trazer conteúdo para os 12 segundos de que dispõe. A TV de Haddad prefere dourar a própria pílula, atacar Temer, ignorar Dilma e louvar, louvar e louvar Lula.

O que se ouve aqui e ali dos candidatos são pitacos, para usar um termo apropriado. Mesmo a proposta de Ciro Gomes de limpar o seu nome no SPC merece detalhamento, que ele mesmo disse que uma hora vai apresentar. Geraldo Alckmin, dono do maior tempo de TV, pode se dar ao luxo de apresentar no horário algumas das suas ideias, mas a pressão com a derrota que se avizinha fez do programa dele um campo de guerra. Pode ser a solução, difícil, para ele, mas certamente não será a solução para os problemas do país.

Você pode estar certo se disser: “dane-se, conheço a ideia central do meu candidato e sei que ele vai corresponder”. Claro, o direito de votar é seu, mas convenhamos que ter informação ajuda muito mais do que atrapalha. Salvo o pouco que se extrai de algumas entrevistas colhidas pelas ruas da cidade, por insistência dos repórteres, pouco mais se sabe do caminho por onde os candidatos a presidente querem levar o Brasil.

QUEM FAZ A CABEÇA DE QUEM
Paulo Guedes, na mesma reunião em que propôs a volta da CPMF, disse que no Brasil morreram 400 pessoas durante a ditadura, e destas, segundo ele, 150 eram militares. Então, calculou, foram 250 civis nos dez anos da linha dura. “Morreram 25 por ano, não é muito”, concluiu. E você pensando que era ele que fazia a cabeça do Bolsonaro.

A DELAÇÃO É NOSSA
Fernando Haddad exagerou. Na entrevista para a CBN disse, literalmente, que “a lei da delação é nossa, fomos nós que a sancionamos”. Francamente, candidato. O PT execrou a lei. Dilma se arrependeu de tê-la sancionado e disse se tratar de lei de exceção, o deputado Wadih Damous (PT-RJ) apresentou projeto desfigurando a lei quando o senador Delcídio do Amaral (PT-MT) resolveu delatar.

O CRIVELLA MINEIRO
O governador de Minas, Fernando Pimentel (PT), mandou servidores venderem ingressos, de R$ 250 cada, para uma festa em favor da sua candidatura à reeleição. Os gabinetes receberam pacotes de ingressos com a recomendação de que funcionário em cargo de confiança vendesse R$ 5 mil, ou 20 ingressos. Aos secretários foi recomendado que vendessem pelo menos R$ 20 mil cada um. No convite vinha impresso “sua doação é importante para continuar ao lado dos mineiros”. A festa foi quinta.

SEVERINO DOIS
Quem foi baixo clero no Exército e baixo clero no Congresso pode ser alto clero noutro lugar?

BRIGA BOBA
Bobagem essa briga entre direita e esquerda na polêmica sobre o Nacional Socialismo de Hitler. Todo mundo sabe Hitler e seu partido eram de ultradireita mesmo. Mas a esquerda pode ficar tranquila, ela tem Stalin, um sanguinário para chamar de seu.

CANDIDATOS DO NADA
Aquela turma que está lá embaixo nas pesquisas, que pode até ter projeto, mas não representa ninguém na sociedade brasileira, flutuando de zero a dois por cento das intenções de voto, prova a importância da cláusula de barreira.

NOVATO EXPERIENTE
O candidato mais novo a uma vaga na Câmara, com 19 anos, faz sua campanha no Rio dizendo ter se preparado a vida toda para exercer um mandato federal.

BOA IDEIA PARA A CULTURA
O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, estuda permitir empresas a empregarem recursos com o apoio da Lei Rouanet que não forem usados em razão da anualidade fiscal. É dinheiro que deixa de ser investido em cultura porque empresas não conseguem aprovar projetos e fazer a sua declaração antes do fim do ano. A ideia é permitir que elas usem os recursos e façam depois, no ano seguinte, o ajuste do imposto na Receita. A medida pode colocar mais R$ 60 milhões circulando no mercado cultural a cada ano.

AGORA VAI
O prefeito Marcelo Crivella contratou a Nasa para monitorar áreas de risco no Rio, sobretudo nas encostas das favelas cariocas. Enquanto isso, falta manutenção no sistema de alarme das comunidades. Em alguns lugares pode chover canivete que o alarme não soará.

NOTA DEZ
Vai para Anitta, que entrou na campanha saindo.

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