Ascânio Seleme: Presidente enfermo, precedentes

É justa a preocupação de muitos com a saúde do presidente Jair Bolsonaro. O vai-e-vém dos boletins médicos informa pouco. Sabe-se que o presidente passou por uma cirurgia bem sucedida de reconstrução do intestino, reassumiu rapidamente o mandato, mas em seguida teve febre e náuseas, depois melhorou e passou a despachar do hospital.
Foto: Facebook
Foto: Facebook

É justa a preocupação de muitos com a saúde do presidente Jair Bolsonaro. O vai-e-vém dos boletins médicos informa pouco. Sabe-se que o presidente passou por uma cirurgia bem sucedida de reconstrução do intestino, reassumiu rapidamente o mandato, mas em seguida teve febre e náuseas, depois melhorou e passou a despachar do hospital. Aí piorou de novo, suspendeu os despachos e em dois dias melhorou. Depois piorou outra vez e teve febre de novo, seguido de pneumonia bacteriana. Na sexta, melhorou, comeu gelatina e tornou a despachar. Difícil dizer como estará amanhã. Sua volta a Brasília teve dois adiamentos. Era para ele sair na semana passada, depois sairia amanhã, agora fica internado até quinta.

Não é por outra razão que as redes sociais estão infestadas de boatos sobre a cirurgia de Bolsonaro. Alguns desses boatos falam em doenças, mas a maioria discorre sobre teorias conspiratórias. Estranho? Nem um pouco. Fake news é modelo de ação política bem conhecida da turma de Bolsonaro. E também de seus adversários de esquerda, claro. Não seria diferente com nenhum outro recém eleito presidente. Imaginem como seria com Lula, se ele fosse internado dias depois de tomar posse de seu primeiro mandato. Seria um deus-nos-acuda, com redes sociais ou sem elas.

O Brasil já passou por algumas experiências difíceis de presidentes em hospitais. A mais dramática delas foi a internação de Tancredo Neves, primeiro presidente civil depois da ditadura, na véspera de sua posse. Os mais velhos se lembram muito bem dos 36 dias de agonia de Tancredo no Hospital de Base, em Brasília, depois no Incor, em São Paulo. Tancredo passou por sete cirurgias. Todas as tentativas foram feitas para que ele superasse um leiomioma, câncer de intestino. Até médicos americanos especialistas foram trazidos para inutilmente tentar salvar a vida do presidente Tancredo.

No começo, o câncer foi diagnosticado como uma diverticulite. Depois soube-se que os médicos mentiram a pedido do próprio enfermo que não queria assustar a nação. Não é trivial ter um presidente internado em condições difíceis de saúde. Toda uma gigantesca máquina se movimenta em torno dele. Em alguns casos, o país pode parar esperando a melhora do convalescente. Foi assim com Tancredo. O governo Bolsonaro também está parado esperando o seu retorno. A reforma da Previdência só segue para o Congresso após a sua volta.

Os casos de Tancredo e Bolsonaro são absolutamente distintos. Tancredo foi internado e acabou morrendo porque escondeu um câncer que se tivesse sido tratado antes poderia ser curado. Bolsonaro sofreu um atentado a faca que quase lhe tirou a vida. Foi tratado com cuidado e rigor desde a primeira hora e seguiu sua campanha até se eleger presidente. Sua internação agora é desdobramento da primeira etapa do tratamento iniciado quando do ataque. Normal.

Normal também a preocupação do país com a saúde do seu presidente. Toda a transparência que tem sido dada à evolução do seu quadro clínico parece não ser suficiente. Talvez seja o caso de os médicos virem a público para dar satisfação formal aos brasileiros. Muitos acham que médicos, sobretudo os de São Paulo, falam demais e gostam de holofotes. Discordo. Médico tem que falar. Boletins oficiais e palavra de porta-voz muitas vezes apenas agravam a tensão.

Privacy Preference Center