Somente uma pessoa que deliberadamente trabalha contra o interesse da maioria agiria como o presidente Jair Bolsonaro agiu em diversos momentos dessa crise sanitária. Já disse outro dia que ele é um homem mesquinho e egoísta. Mas é pouco. Bolsonaro não gosta do ser humano, se lixa para o próximo e só se preocupa com sua família e sua corriola. Mexeu com a família ou com os parças, mexeu com ele. Fora isso, danem-se. Somente um homem assim baixaria um decreto autorizando a realização de cultos religiosos em meio a uma pandemia de coronavírus.
O que isso significa? Significa que Bolsonaro deu oficialmente argumento para que pastores e bispos de diversas igrejas evangélicas exijam a presença dos seus fiéis e das carteiras dos seus fiéis nos cultos. Os pobres e explorados filhos de Deus que podiam ficar em casa, orando solitariamente, sem pagar dízimos aos devoradores de poupanças, agora não têm mais essa desculpa. O presidente do Brasil baixou decreto estabelecendo que culto religioso é uma atividade essencial e como tal pode ser realizado mesmo em meio ao caos sanitário que o planeta vive. Nenhum problema se a aglomeração facilita o contágio. Deus protege, acredita o devoto capitão.
Os bispos da Universal e das suas igrejas-satélites já estavam tendo pane de criatividade para seguir sugando o suado dinheirinho dos fiéis que, por orientação do Ministério da Saúde, permaneciam em casa. Um deles, o televangelista R.R. Soares, cunhado de Edir Macedo, passa os dias na TV pedindo que os seus crentes depositem dinheiro na conta da sua igreja. Como Ancelmo Gois mostrou aqui na quarta-feira, R.R. mandou os fiéis que não entendem de internet ou não têm conta bancária pedir auxílio a parentes ou amigos para fazer a remessa. Mais do que uma exploração vergonhosa, trata-se de um pecado. Mortal.
Essa exploração de gente fiel, simples e ingênua, que nunca foi combatida pelos governantes brasileiros, mereceu agora espaço num decreto presidencial que além de ignorá-la ainda a estimula. Por que, em nome de Deus, o capitão faria uma sandice dessa? Como só age com a cabeça eleitoral, por puro medo de que as suas bobagens o tornem no primeiro presidente a não conseguir se reeleger no Brasil, é óbvio que ele quer agradar os chefes evangélicos para obter suas simpatias e merecer seus apoios em campanhas eleitorais.
Será que Bolsonaro ignora que estes mesmos pobres fiéis que estão sendo explorados pelas igrejas mesmo em meio a esta pandemia são, afinal, os eleitores de quem ele quer ganhar o voto? Claro que não. Ele aposta na ignorância dessa turma e na ascendência que os pastores têm sobre ela. O pior é que ele tem razão. Os cultos de algumas igrejas hipnotizam muitos fiéis de tal forma que eles ficam sem ação ou não conseguem encontrar alternativas. O infundado medo da mão pesada de Deus limpa suas carteiras e os torna em rebanhos de eleitores cegos.
Foi sobre esse caldo que Bolsonaro mergulhou ainda mais fundo sua colher ao decretar a essencialidade de cultos religiosos. Saúde a gente vê depois.
Não entendeu
Só Bolsonaro não entendeu que o confinamento não é uma medida para salvar as pessoas do contágio pelo coronavírus, mas para atenuar sua curva de maneira a que os hospitais não entrem em colapso por falta de leitos, ventiladores e outros equipamentos necessários para o combate à Covid-19, como máscaras e luvas. Você já imaginou o que aconteceria se a contaminação explodisse e pessoas passassem a morrer como moscas? Ou alguém aqui acha que os brasileiros cordiais entenderiam tranquilamente quando seus parentes começassem a morrer sem conseguir sequer dar entrada no hospital?
Caçador de saídas
São tantas as encrencas em que Bolsonaro se mete que daqui a pouco criarão um cargo no Planalto, o de “caçador de saídas”. Se não couber na estrutura palaciana, quem sabe o partido arruma um desses para o chefe. Ah, mas Bolsonaro não tem partido. Então deixa para a família e os amigos. Mas aí também não dá. O trabalho de Bananinha & Cia é justamente encontrar problemas, não saídas.
Missionários
Interessante nessa crise é conhecer um pouco mais a intimidade de entrevistados e entrevistadores das TVs, entrando com eles em suas casas. Por óbvio, cada vez mais entrevistas são feitas através de aplicativos do que presencialmente. Também analistas falam de casa para evitar as ruas. Dá até para saber o que eles leem. Apenas os profissionais que são indispensáveis nas emissoras e os missionários, como a pneumologista Margareth Dalcolmo, estão sempre presentes. Correm riscos para informar corretamente os brasileiros. Aplausos.
Irresponsabilidade contagiante
Os servidores do Palácio do Planalto mudam de lado no corredor quando passam em frente ao gabinete do general Heleno, ministro da Segurança Institucional. Do seu pessoal de apoio direto, apenas os mais próximos entram na sua sala. Os da cozinha, fazem um sorteio (ou “azareio”?) para ver quem vai levar café e água para o ministro. O homem voltou ao trabalho uma semana depois de testar positivo, desobedecendo a mais trivial recomendação médica, afastamento e isolamento por duas semanas do portador do coronavírus para não contaminar outros.
Silêncio revelador
O ministro Braga Neto tem o poder mas não tem a palavra. Ou o general tem dificuldades de oratória ou limitação de respostas. Só assim se entende porque o chefe da força-tarefa de combate ao coronavírus nunca responde a perguntas de jornalistas, entregando a terceiros a tarefa de enfrentar o quebra-queixo. Foi por isso que ocorreu aquele silêncio constrangedor da segunda passada no Palácio do Planalto. O repórter Gustavo Maia perguntou aos ministros que ficaram após a saída de Braga Neto por que não estavam usando máscaras como na véspera? Mudou o protocolo? Ninguém respondeu. Onyx Lorenzoni deu de ombros, como se estivesse dizendo “isso não é comigo”.
Aliás
A pergunta ainda vale, por que o presidente e toda a turma do governo parou de usar máscaras nas entrevistas? Ontem, no anúncio do pacote de empréstimos dos bancos oficiais, além de não estar mascarado, Bolsonaro ainda chamou para bem perto de si os presidente das instituições enquanto um deles falava. Antes era só hipocrisia?
Bangu também quer
Os presos em Bangu com mais de 60 anos querem cumprir o resto das penas que lhes cabem em prisão domiciliar, como Eduardo Cunha. Dos nove mil presos na carceragem do Rio, pelo menos 800 estão nessa faixa etária. O número sobe se analisadas as condições de saúde dos detentos. No Brasil, a população carcerária é de cerca de 600 mil pessoas. Se a média de Bangu valer para o resto do país, uns 50 mil presidiários têm de ser colocados nas ruas por medida de isonomia com o ex-presidente da Câmara dos Deputados.
Tadinho do Cabral
Quem perdeu mais uma vez foi Sérgio Cabral. Menino ainda, tem apenas 57 anos, não pode ser alcançado pelo benefício concedido a Cunha.
Refugiados paraguaios
Na fronteira entre Brasil e Paraguai está surgindo uma nova categoria de refugiados, os agora chamados “refugiados sanitários”. São paraguaios que querem retornar a seu país, mas ainda não conseguiram porque o governo do presidente Mario Abdo Benítez fechou totalmentea fronteira, até mesmo para seus compatriotas. Estima-se que quase 200 pessoas estão nessas condições. A repatriação deve começar hoje.