Com a eleição presidencial praticamente decidida a favor de Jair Bolsonaro, convém o eleitor olhar para o que está ocorrendo em seu estado. No Rio, a chance de termos Wilson Witzel no Palácio Guanabara é enorme. Recém-chegado no processo político, ele se apresenta como o novo, o homem de fora da caixa, o antissistema. E se traveste também como a versão local do capitão-candidato.
Witzel tem o apoio do prefeito Marcelo Crivella e de seu partido. O PRB anunciou sua adesão à candidatura do ex-juiz na sexta-feira passada. O prefeito do Rio e toda a igreja do seu tio bispo Macedo apoiam também Bolsonaro para presidente. Teremos, então, se Witzel ganhar a eleição no domingo, 28, um alinhamento singular entre as três esferas de poder.
Você acha que este alinhamento seria bom para o Rio? Não sei. Mas vale a pena fazer algumas observações do que pode significar este alinhamento para lá de programático e ideológico. O que viveremos no Rio com Witzel governador será um grande arranjo administrativo em que estarão de mãos dadas três líderes conservadores, de conceitos morais e comportamentais ultrapassados pela história.
Mais do que isso, a conjunção desses três governantes pode resultar na construção de um estado em permanente beligerância. Se a proposta de Witzel de abater bandido armado soa como música nos ouvidos de Bolsonaro, a sua implantação poderia resultar num aumento dramático de tiroteios e voos de balas perdidas, sobretudo na Região Metropolitana.
Apesar de o candidato a presidente negar apoio formal ao ex-juiz, a proposta dos dois para a área de segurança é parecida. Querem colocar em prática uma lei do Velho Oeste americano, a de atirar primeiro e perguntar depois. Não sei como o leitor vê isso, mas está claro que o eleitor quer melhorar muito a sua segurança e já votou no primeiro turno a favor de medidas drásticas para conter a criminalidade. Ocorre que há uma diferença enorme entre o que prega um candidato e o que ele pode efetivamente fazer em razão dos inúmeros embaraços legais e constitucionais.
O leitor pode dizer que um alinhamento automático, por afinidade política e ideológica, resultará em benefícios para o estado. Pode ser. Mas isso não significa que desalinhamento signifique prejuízos para os interesses estaduais. A história mostra que, havendo ou não afinidade política, os interesses do Rio podem ser protegidos por entendimento superior ao da pauta partidária.
No passado, apesar das muitas divergências políticas, governantes conseguiram manter íntegros os interesses em favor do Rio. Desde a coabitação de Brizola e Collor, o Rio soube muitas vezes ser pragmático para que mesmo desajustes de ideias e propostas de gestão não atrapalhassem o estado. Foi com Collor que Brizola conseguiu financiar a Linha Vermelha, por exemplo. E não havia maior distância ideológica no país dos anos 90 do que a que separava aqueles dois governantes.
Anos depois, Rosinha Matheus governou o estado em permanente tensão com o governo federal na gestão de Lula. Rosinha, todos sabem, é mulher do também ex-governador Anthony Garotinho, que foi eleito pelo PDT com apoio do PT. O exemplo prova que alinhamento automático não é tudo. E que afinidades políticas podem desaparecer com o tempo. Garotinho também manteve uma constante guerra com o governo de Fernando Henrique Cardoso.
O Rio, na hipótese de em janeiro termos Crivella na prefeitura, Witzel no governo e Bolsonaro na Presidência, será um estado de pensamento único. Também sobre isso deve refletir o eleitor. Interessa ter este alinhamento onde não existe o contraditório, a diversidade e a complementaridade de ideias? Talvez a alma mais conservadora do Rio entenda que sim. Saberemos isso muito brevemente.
O resultado, se essa for mesmo a vontade do eleitor, transformará o Rio num dos estados mais rígidos do país em setores onde ele sempre foi vanguarda, sobretudo na cultura e nas questões do comportamento. Seremos uma Santa Catarina mais miscigenada, um Paraná com mais calor, um Rio Grande Sul de sunga. Isso pode não ser ruim. Mas será que é bom?