Bobagem. Não adianta querer negar, Luiz Inácio Lula da Silva é um preso especial. Não é preso político, como queremos petistas, obviamente não. Mas tampouco é um preso comum. Como ex-presidente da República, Lula tem direitos estabelecidos por lei. Mesmo que não os tivesse, a responsabilidade pública recomendaria tratamento especial no seu aprisionamento. Decidir sua transferência para o presídio de Tremembé sem antes se cercar de todos os cuidados possíveis é mais do que temerário. Fez bem o STF em negar provimento à decisão.
O direito do preso estaria assegurado com a transferência? Ele teria, como determina a lei, sala especial de alto comando? Em Tremembé não há sala nas condições adequadas para atendera um ex-presidente. Depois, a segurança do detento estaria garantida? Claro que não. A decisão da juíza Carolina Lebbos sequer assegura a ele uma sala exclusiva. “A cela poderá consistirem alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana”.
Apesar da impertinência da juíza, se a transferência se desse, muito provavelmente Lula ficaria em cela sozinho, mas não isolado. Todos os seus deslocamentos e suas saídas para banho de sol seriam feitos entre outros encarcerados. Lula poderia salivar e conquistar a moçada, ele é bom nisso, mas nada impediria que um preso enfurecido atacasse o ex-presidente. Imagine o transtorno político que um episódio desse geraria. Não é possível que juízes não avaliem todas as possibilidades ao tomarem decisões dessa magnitude. Lebbos não tomou. Tampouco o juiz corregedor Paulo Eduardo de Almeida Sorci, do TJ de SP, pensou nisso ao escolher Tremembé.
O sistema carcerário brasileiro é uma vergonha. Os presídios estão caindo aos pedaços. As instalações são tão inadequadas que episódio como o da chacina de 58 detentos na Centro de Recuperação de Altamira, na semana passada, é corriqueiro. Antes de Altamira, no Pará, houve massacres em presídios do Amazonas, de Roraima, de Rondônia, do Maranhão, do Rio Grande do Norte. Não, os casos não acontecem apenas nos estados do Norte e do Nordeste.
Lembre-se de Benfica, no Rio, em 2004, com 31 assassinatos. Ou o maior de todos, o do Carandiru, em São Paulo, com 111 mortos. Não é possível colocar Lula num ambiente destes. Ele é criminoso? Sim. Ele tem que cumprir sua pena? Claro. Mas em ambiente especial. E seguro.
Ao pedira transferência de Lula, ajuíza atendia pedido da Superintendência da Polícia Federal de Curitiba, que apresentou alegações ridículas. Lula estaria causando transtornos à instituição e à sua vizinhança. A PF diz que ali emite passaportes. Sim, e daí? Que está tendo despesas. Sim. E daí? E a vizinhança estaria incomodada pelo acampamento petista numa praça ao lado da sede da polícia. Sim, imagino que incomode mesmo. Sobretudo de manhã, quando às 8h os acampados começam a gritar “Bom dia, presidente”. Deve ser um saco. Mas, para resolver este problema, criar-se-ia outro igual, ou maior, porque inflamado, em Tremembé.
Lula é um criminoso comum. Foi julgado e preso por corrupção. Sua pena foi avalizada por três instâncias, e nada poderá mudar sua condenação. Nem mesmo o bate-papo virtual entre o juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol tornados públicos pelo conta-gotas do Intercept. Mesmo sendo um criminoso comum, Lula é um prisioneiro especial. A absoluta falta de visão política dos policiais que pediram a sua transferência e a dos juízes que decidiram atender ao pedido é estarrecedora.
Além de ter sido presidente do Brasil por dois mandatos, Lula é um ícone nacional. Como ignorar isso? Se não estivesse preso em 2018, Lula estaria no segundo turno da eleição com chances reais de ser eleito para um terceiro mandato. Em qualquer pesquisa que se faça, o ex-presidente aparecerá com apoio de pelo menos 30% dos brasileiros. Ao afrontar Lula, a Justiça alcança também este contingente que o apoia. Tirar Lula de Curitiba parecia, enfim, picuinha. Como se a cela especial da PF fosse um palácio. Ela tem cama, mesa, TV e banheiro. Bobagem.