A reforma da Previdência no Brasil está na ordem do dia. É quase um consenso que depois de setenta anos de existência, do crescimento da população e da massa de trabalhadores nesse período, é necessário que haja uma reformulação. Essa já era uma intenção do governo da presidente afastada, Dilma, e continua a ser uma necessidade para a administração do presidente interino, Michel Temer.
O Brasil precisa pensar no seu futuro e como continuará a pagar as aposentadorias da previdência oficial diante do crescimento da população idosa e do aumento da expectativa de vida dos trabalhadores. Sendo necessário, não podemos, porém cometer injustiças ou retirar direitos legítimos dos contribuintes e aposentados.
Quando foi instituído, o sistema previdenciário indicou seus protagonistas e financiadores, a saber: o empregado, o empregador e o governo, cada um com valor de contribuição equivalente a 6% do salário do trabalhador.
E daí para frente, como se comportaram esses protagonistas? Bem, o trabalhador fez a sua parte, pagando fielmente a sua parcela, já que não poderia mesmo escapar do desconto obrigatório em seu salário, já definido no contracheque, na fonte, como se diz.
O mesmo não se pode dizer dos demais parceiros dessa sociedade previdenciária. O governo federal, já em 1967, quando decidiu reunir os diversos institutos de aposentadoria existentes, em uma só instituição, o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), com a justificativa de unificar o caixa da Previdência, e torná-la mais forte, logo usou o dinheiro dos trabalhadores para financiar a construção da ponte Rio-Niterói, na época, uma espécie de cartão postal do regime militar, e a Transamazônica, até hoje inacabada e nos atormentando sem trafegabilidade, mas aí já é outra história.
Só quatro anos depois, o governo militar do Brasil decidiu preencher uma lacuna, com a justíssima criação da aposentadoria rural, um benefício reservado aos homens do campo, sem que houvessem, necessariamente, contribuído para qualquer instituto de previdência, por inexistência dos mesmos. Era mais uma questão de assistência social, que propriamente de previdência.
O governo, como se viu, usou o caixa da Previdência para diversas finalidades, como hoje se faz com o FGTS, para financiar a política de habitação. E, às vezes, para cobrir rombos do Tesouro nacional em gastos de natureza duvidosa.
Mas, e o empregador, o terceiro dos protagonistas? Um número é suficiente para definir seu comportamento nesse processo. A dívida do empresariado com a Previdência Social atinge a estratosférica soma de R$ 472 bilhões. Isso mesmo, bilhões.
Não é que nossos governantes tenham sido rigorosos demais ao fixar a parte que cabe ao empresariado na conta da Previdência. Na verdade, até o ano passado, as desonerações concedidas a alguns empregadores somaram R$ 65 bilhões, concedidos em forma de incentivo ao setor produtivo. Os governos petistas, mas não só estes, foram pródigos em conceder esses benefícios a setores do empresariado, em uma política desenvolvimentista de resultado duvidoso, como vemos agora.
A conclusão lógica que decorre desses fatos é que não cabe ao trabalhador, que paga direitinho a sua parte, receber ainda mais encargos para fechar a conta da Previdência no futuro. O trabalhador já fez a sua parte para que o sistema funcione, ao cumprir com a sua obrigação, que é a contribuição sistemática e infalível.
É necessário dizer isso porque a questão que domina o debate sobre a reforma da previdência é o estabelecimento de uma idade mínima para a aposentadoria, como se isso bastasse para resolver todos os problemas da Previdência. Como se quem nada deve, deva pagar a conta de quem não geriu bem os recursos, ou de quem deixou de pagar o que deveria.
Fixar uma idade mínima para a aposentadoria poderá até ser necessário, com vistas no futuro da Previdência, porém, sem exageros, sem colocar nas costas do trabalhador o peso desse ajuste. Sejamos coerentes, o brasileiro é bombardeado todos os dias por notícias de corrupção e roubo do dinheiro público, e ainda tem que responder pelo enorme rombo da Previdência? Enquanto isso, continua a escorrer pelo ralo dos ‘propinodutos’ o suado dinheiro dos nossos impostos.
Ao reformular a Previdência, temos que cuidar de dividir a responsabilidade, e fazer com que as partes cumpram o que foi acordado como obrigação legal, e que as novas normas arbitradas sejam de fato obedecidas.
Arnaldo Jordy é deputado federal pelo PPS do Pará
Fonte: pps.org.br