Lourival Sant’Anna / O Estado de S.Paulo
O que o húngaro Viktor Orbán, o argentino Alberto Fernández e o brasileiro Jair Bolsonaro têm em comum? Os três se dispõem a visitar Vladimir Putin para estreitar os laços de amizade com o presidente russo, enquanto ele intimida militarmente a Ucrânia.
A identificação de um governante rotulado de esquerda e de dois de direita com Putin é reveladora do quanto essas categorias são vazias e da atração que o ditador russo exerce sobre determinado tipo de político – e de homem.
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Fernández disse a Putin: “Estou empenhado em que a Argentina deixe de ter essa dependência tão grande que tem com o Fundo (Monetário Internacional) e com os Estados Unidos. Tem de se abrir caminho a outros lados e me parece que a Rússia tem um lugar muito importante.”
Putin está há 22 anos no poder e aprovou lei que lhe permite permanecer até 2036, quando terá 84 anos de idade. Sua perpetuação no cargo é sustentada pela prisão e assassinato de todos que disputam o poder político e econômico com ele, pelo controle de todos os grandes negócios da Rússia e da mídia.
Putin provoca constantes tensões internacionais, como a atual, para justificar a violência contra opositores, que acusa de serem “agentes externos”. Com leis e medidas arbitrárias, ele eliminou direitos dos homossexuais, das mulheres e de minorias étnicas, em nome da defesa de uma suposta “identidade russa”.
A homofobia, o machismo e o racismo de Putin o aproximam de Bolsonaro e de Orban, não de Fernández. Mas, para a esquerda latino-americana, o antiamericanismo e a captura do Estado estão hierarquicamente acima das pautas “progressistas”.
O americano Joe Biden, o francês Emmanuel Macron e o britânico Boris Johnson também têm conversado com Putin. Mas não foram a Moscou, e o conteúdo de sua mensagem é outro: temos garantias de segurança a lhe oferecer; se invadir a Ucrânia, você, as pessoas a seu redor e a economia da Rússia serão castigados.
RESPALDO
Xi Jinping recebeu Putin em Pequim, e ambos declararam apoio mútuo em seus embates com o Ocidente. Assinaram o aumento do fornecimento de gás russo para a China, de modo a reduzir a dependência da Rússia das exportações para a Europa.
A China importa soja russa, embora numa escala muito menor que a brasileira, mas a tendência é esse volume crescer e, com ele, a concorrência entre Brasil e Rússia nesse segmento. O que não impede a cooperação entre os dois países em muitos setores.
Em relações internacionais, como na vida, timing é tudo. O Brasil só tem a perder quando seu presidente se deixa usar por outro, mais experiente e inteligente, para provar que não está isolado, enquanto ameaça a soberania de um vizinho mais frágil.
É COLUNISTA DO ESTADÃO E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS
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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,apoio-da-esquerda-e-da-direita-a-putin,70003970781