Lula solto “desfulanizaria’ julgamento no STF
No começo de julho, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, comparou o colegiado à equipe do Capitão Nascimento: “quem está aqui, está todo dia numa Tropa de Elite, com todo mundo falando: pede pra sair”. Ele afiançou que os ministros têm “couro” para resistir à pressão. Essa blindagem será testada no julgamento sobre a prisão após a condenação em segunda instância na sexta vez em que a Corte volta a debater o tema, a contar de 2009.
Se o clima não fosse de apreensão nos bastidores, com o STF sob bombardeio das redes sociais, o seguinte cenário não estaria sendo debatido: uma ala do tribunal acredita que se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aceitasse a progressão para o regime semiaberto aumentariam as chances de se formar a maioria contra a execução antecipada da pena.
Essa corrente argumenta que um cenário de Lula literalmente “livre” poderia “desfulanizar” o julgamento. Segundo esse grupo de ministros, com Lula solto, eventual declaração de inconstitucionalidade da prisão em segunda instância não seria recebida pela opinião pública como uma decisão “pró-Lula”.
De fato, os efeitos desse entendimento podem beneficiar cerca de 190 mil presos que segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cumprem a pena antecipada.
Essa avaliação interna do Supremo foi levada a Lula, mas o presidente resiste a aceitar a progressão da pena. Ele espera que o STF julgue o habeas corpus onde requereu a anulação do processo relativo ao triplex de Guarujá invocando a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça.
Lula está convicto de que a migração para o semiaberto fragiliza o discurso de “preso político”. Ele se veria submetido às mesmas condições que os ex-tesoureiros do PT João Vaccari Neto e Delúbio Soares: usaria tornozeleira, teria de morar em Curitiba e cumprir restrições de horários e de vida social. “Não quero uma pena mais leve, quero minha inocência”, disse à agência France 24.
Já o PT aguarda com ceticismo o julgamento porque dos três desfechos possíveis, apenas um deles beneficia Lula. 1) O STF pode manter o atual entendimento; 2) entender que a prisão após a condenação em segunda instância é ilegal; 3) modular o entendimento para que a execução provisória da pena comece logo após o julgamento do recurso pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a terceira instância do sistema brasileiro.
Apenas a segunda hipótese favorece Lula, porque o petista teve o apelo na ação sobre o triplex rejeitado pelo STJ. Se não for compelido a migrar para o semiaberto, ele permaneceria detido na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba porque já foi julgado pelo STJ.
Em julho, esta coluna informou que o ministro Alexandre de Moraes sinalizou a interlocutores o voto contrário à prisão em segunda instância. A se confirmar este aceno, o placar desta quinta-feira seria de 7 votos a 4 contra a execução da pena antes do esgotamento dos recursos.
Em abril do ano passado, no julgamento do habeas corpus que evitaria a prisão de Lula, Moraes posicionou-se a favor da prisão em segunda instância, e o placar favorável ficou em 6 votos a 5.
O placar esperado para quinta-feira é o seguinte: Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes julgariam inconstitucional a prisão em segunda instância. Parte deste grupo acompanha a modulação de Toffoli para que a detenção do condenado ocorra após a análise do apelo no STJ.
Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia votariam pela legalidade da prisão na segunda instância.
Como no julgamento anterior, Rosa Weber tende a acompanhar a maioria. E embora tenha julgado inconstitucional a prisão antecipada, o voto do decano Celso de Mello agora seria incerto, segundo uma fonte credenciada da Corte. São os votos de Moraes, Rosa Weber e do decano que podem formar o placar de 7 a 4.
O precedente favorável à prisão em segunda instância remonta a 2016, numa conjuntura de Operação Lava-Jato nas ruas e forte indignação popular. Por 6 votos a 5, o STF decidiu que um condenado deveria recorrer atrás das grades.
Dias Toffoli garante que a pressão social não influenciará os ministros. “Quem vem para cá tem que ter couro e tem que aguentar qualquer tipo de crítica”, afirmou no dia 1 de julho. Tomando a ferro e fogo a declaração, um cenário com “Lula preso” ou “Lula livre” não influenciaria a convicção dos julgadores.
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Em meio à vitória da aliança da esquerda na eleição para a Prefeitura de Budapeste, a ex-ministra e ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy começou a articular, sem alarde, a formação de uma frente única, encabeçada por ela, para concorrer à Prefeitura de São Paulo no ano que vem.
No último domingo, Gergely Karacsony derrotou o prefeito Istvan Tarlos, presidente do partido no poder – e aliado do primeiro-ministro Viktor Orbán – que tentava se reeleger. Karacsony atribuiu a vitória à unidade da oposição.
Marta, que está sem partido, se filiaria ao PDT, e concorreria com apoio de uma frente ampla formada por PSB, PCdoB e PT. O presidente do PDT, Carlos Lupi, diz que não há nada definido, mas um partido que mantém um candidato a presidente da República (Ciro Gomes) tem que ter candidato próprio na maior metrópole do país.
Lupi ressalva que a conversa com Marta ainda não ocorreu, e deve ser nesta ou na próxima semana. Ela está sem partido desde 2018, quando deixou o MDB sem tentar a reeleição ao Senado.
Mas a frente ampla sonhada por Marta não contaria com o PT. Petistas lembram que ela queimou todas as pontes quando deixou a sigla em 2015 atirando. Marta disse na época que o PT protagonizou “um dos maiores escândalos de corrupção que a nação brasileira já experimentou”.
Ela também enfrentará resistência no PSB, que pretende lançar a candidatura do ex-governador Márcio França. No embate com João Doria em 2016, Marta ficou em quarto lugar, com 10% dos votos, atrás de Fernando Haddad (PT) e Celso Russomano (PRB).