Caberá a Haddad conduzir, por tempo indefinido, os rumos da nau lulista
As consequências do ataque a faca sofrido por Jair Bolsonaro em Juiz de Fora (MG), às vésperas do Dia da Pátria, e a oficialização de Fernando Haddad na condição de postulante presidencial do PT, uma semana mais tarde, colocaram novos personagens no primeiro plano da política nacional.
A rápida utilização do atentado pelos bolsonaristas, com um vídeo dramático gravado no leito de UTI mineira pouco depois de o candidato ser submetido a extensa cirurgia, prenunciava uma onda eleitoral a favor da vítima. Transferido para o Hospital Albert Einstein, em São Paulo, cogitava-se até sua vitória em um turno só.
O Datafolha publicado nesta sexta (14), contudo, mostra um crescimento de 22% para 26%, insuficiente para vencer de imediato. O levantamento traz, por outro lado, a constatação de que 75% dos que preferem o candidato da extrema direita estão totalmente decididos a votar nele. Aparentemente, o sufrágio no antipetista cristalizou num patamar capaz de levá-lo à segunda rodada.
Ocorre que na última quarta (12) o capitão reformado teve que ser submetido a uma segunda operação em caráter de emergência. Apesar do sucesso da nova intervenção, no momento em que estas linhas são escritas o quadro descrito por médicos aponta ser improvável a liderança direitista retomar a campanha antes do decisivo 7 de outubro.
Os holofotes, então, voltaram-se, de imediato, para o seu vice, Hamilton Mourão. Enquanto Bolsonaro estiver afastado, o general da reserva passa a ter inédito protagonismo. Possuidor de ideias e estilo próprio, o ex-comandante militar do Sul fica na berlinda.
Do outro lado da cerca, Lula, depois de levar a espera ao limite, oficializou na última terça, 11 de setembro, data cheia de simbolismos, a candidatura de Fernando Haddad à Presidência da República.
Embora obscurecida pela tragédia que se abatera sobre o adversário, a cerimônia de transmissão de responsabilidades, realizada diante da Polícia Federal em Curitiba, onde o ex-presidente se encontra preso, permitiu entrever o peso depositado sobre os ombros do ex-prefeito paulistano.
Detido há cinco meses, Lula conseguiu manter vivo o fenômeno do lulismo: cerca de 40% do eleitorado, fortemente concentrado entre os mais pobres, gostaria de recolocá-lo no Palácio do Planalto.
Agora caberá a Haddad, que chegou rapidamente a 13% das preferências, conduzir, por tempo indefinido, os rumos da nau lulista. As decisões que vai tomar enquanto estiver no topo do edifício construído por Lula serão muito importantes para o Brasil.
O enredo da crise, com essa troca de atores no centro do palco, pode tomar giros bastante imprevisíveis.
*André Singer é professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.