Queda em avaliação é mais acentuada entre quem ganha de 2 a 5 salários mínimos
Aspecto pouco notado na queda de aprovação do governo, registrada pelo Ibope nesta semana, é a sua distribuição pela renda. Foram os eleitores populares que começaram a pular do barco bolsonariano. Possivelmente os mesmos que, no final do primeiro turno de 2018, sobretudo no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, produziram a incrível onda de extrema direita que varreu o país.
A perda de 15 pontos percentuais na avaliação positiva de Bolsonaro foi mais acentuada entre os eleitores que ganham de 2 a 5 salários mínimos (SM) de renda familiar mensal, chegando ali a um recuo de 18 pontos. Hoje apenas 35% desse segmento apoia o mandato em curso, índice que cai para 29% daqueles cujo ingresso familiar restringe-se a um SM.
Já quando a família recebe acima de cinco salários mínimos, 49% dos entrevistados gostam da administração do capitão reformado. Aqui a perda foi de apenas oito pontos em relação à posse (tinha 57% de ótimo e bom em janeiro).
Na mesma linha, o instituto de pesquisa nota o aumento da rejeição entre os moradores “que residem nas cidades das periferias brasileiras”. Nesse segmento o índice dos que consideram ruim ou péssimo o desempenho presidencial subiu nada menos que 21 pontos no período. O Nordeste, por sua vez, abriga apenas 31% que se mostram satisfeitos.
A persistência de melhor humor no Sul, onde 41% ainda apreciam o mandato em curso, ilustra a divisão social que permeia a conjuntura, pois a região concentra os menores indicadores de pobreza.
Se a economia comandar os rumos do eleitorado, como parece provável, uma recuperação no curto prazo é difícil. Vale lembrar que o primeiro governo Lula, por exemplo, em que pese ter demorado para produzir aquecimento do PIB, conseguiu estancar de imediato o ciclo inflacionário que herdara da etapa anterior.
Bolsonaro já pegou o leme com inflação irrelevante. Se não conseguir criar postos de trabalho e oferecer renda, continuará em baixa. Tal contexto daria à oposição a chance de apresentar alternativas ao modelo ultraneoliberal. As eleições de 2020, sobretudo nas capitais, seriam o teste de tal embate.
Olhando o assunto do ângulo político, a prisão de Michel Temer ainda é uma incógnita.
Foi a Lava Jato que o levou ao poder, uma vez que decisiva para o impeachment de Dilma Rousseff. Depois, com a gravação de Joesley, afundou o regime emedebista e ajudou a ascensão de Bolsonaro.
Agora, com a detenção do ex-presidente, atrapalha a reforma previdenciária de Paulo Guedes e aprofunda a divisão das hostes bolsonaristas. Terá fôlego para empurrar Sergio Moro rampa acima?
*André Singer é professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.