“Nós, classe operária, os camponeses, estamos cansados de sofrer e precisamos acabar com os capitalistas, com o monopólio, com Souza Leão, esse capitalista carrasco” [1]
O episódio conhecido como chacina de Tupã tinha como pano de fundo a Guerra Fria e o sentimento anticomunista decorrente desta época. Um aglomerado de fatores gerou este evento obscuro que marcou a história da cidade do interior do estado de São Paulo.
A associação pútrida entre o poder local, encarnado na figura do “fundador”, prefeito da cidade e coronel oligarca da região Souza Leão, o governo estadual e o federal, sem contar catalisadores como a imprensa da cidade e a igreja foram às causas do massacre dos comunistas do PCB em 1949.
O processo histórico brasileiro relegou as populações rurais à marginalização política e econômica gerando uma grande concentração de terras nas mãos de alguns poucos proprietários, o latifúndio como fator de atraso e estagnação, cuja expressão seria o monopólio da propriedade da terra, elemento presente em nosso país até a atualidade [2]. A repressão aos movimentos sociais expressaria a natureza desse processo, no qual “caso social” é “caso de polícia”. Em meio a um cenário desfavorável, uma série de transformações econômicas, políticas e sociais marcaram a segunda metade da década de 40, com o general fascista e lacaio do imperialismo, Eurico Gaspar Dutra chegando à presidência do Brasil após um golpe em Getúlio Vargas.
Nessa época Adhemar de Barros era o governador de São Paulo (1945-1950) pelo PSP, hábil articulador que conseguiu alianças entre seu eleitorado, os coronéis, os comunistas e o governo Federal. Adhemar em prol de sua sobrevivência política fez algumas concessões ao PCB, ao mesmo tempo em que, desde 1946, reprimia suas organizações no meio rural.
Após o panorama nacional e mundial nos atentamos ao evento em si. “Segundo dados do Jornal Diário de São Paulo daquela época, Tupã possuía 2600 propriedades agrícolas, das quais 1.067 eram pequenas propriedades, dentro de uma população rural de aproximadamente 34 mil habitantes (60% do total)” [3].
Tupã detinha um grande histórico de lutas no campo devido ao excesso de grilagens de terra por meio da violência. O já mencionado Souza Leão era um grande proprietário de terra truculento que não hesitava em mandar seus jagunços para dizimar os camponeses. Moradores do campo relatavam que ao arar a terra encontravam ossadas humanas.
No mês de setembro em 1949, seria realizada em Tupã uma reunião de militantes do Partido Comunista Brasileiro que tratava da realização de um Congresso de Trabalhadores Rurais da Alta Paulista, com a participação de figuras políticas de relevo do PCB, vereadores da região e camponeses.
O militante do partido Dário de Paula frequentemente recebia visitas de camaradas comunistas camponeses na sua fazenda arrendada situada nos arredores de Tupã. A dona da fazenda se queixava das movimentações de Dário perante as mais diversas alegações.
Um parente próximo da proprietária da fazenda, ciente da movimentação no sítio, procurou o oficial de justiça da cidade e mais do que depressa o delegado Renato Imparato mobilizou uma caravana rumo à fazenda. Os policiais pararam as viaturas longe da fazenda de Dário para que na noite pudessem passar despercebidos e tomarem de assalto os comunistas, que foram rendidos e revistados quando começou o tiroteio.
Aqueles que ali estavam foram violentamente reprimidos pela polícia, três comunistas e um policial morreram no confronto. Mesmo com a grande repercussão nacional obtida naquele momento, o episódio foi relegado ao esquecimento na história da cidade.
A tocaia arquitetada por oito policiais forjaram “provas” contra os comunistas alegando que estes “resistiram à voz de prisão”. Deixaram armas no local e marcaram as paredes da casa com tiros.
Posteriormente quando o sargento depôs ao Juiz, confessou ter colocado revolveres sobre dois mortos para depois fotografar e assim construir as provas que incriminariam os comunistas. Dário de Paula conseguiu fugir, os militantes Aparecida e Honório foram presos até o julgamento em 1950. Esse episódio ficaria conhecido na história do Partido Comunista como “A Chacina de Tupã”.
O sentimento anticomunista difundido pela mídia reacionária local principalmente através do Jornal de Tupã, e o pensamento conservador da influente Igreja da região, pavimentaram o caminho para que essa tragédia ocorresse; assim como os resíduos do patriarcalismo das velhas oligarquias cafeeiras e do engenho de açúcar, e ação violenta dos coronéis locais que existem até hoje no Brasil.
Fontes:
[1]http://www.athena.biblioteca.unesp.br/exlibris/bd/bma/33004110042P8/2009/lima_as_me_mar.pdf
[2]https://www.novacultura.info/single-post/2016/12/03/Menos-de-1-das-propriedades-agr%C3%ADcolas-det%C3%A9m-quase-metade-da-%C3%A1rea-rural-no-pa%C3%ADs
[3]http://www.uel.br/grupo-pesquisa/gepal/segundosimposio/airtonsouzadelima.pdf