Eduardo Gonçalves / O Globo
BRASÍLIA — Relegada à prateleira dos temas de menor importância em pleitos anteriores, a Amazônia deverá migrar para o centro dos debates na disputa pelo Palácio do Planalto deste ano. Da esquerda à direita, as pré-campanhas dos presidenciáveis têm defendido que a preservação da floresta não é mais um tema restrito à ordem ambiental, mas de economia, relações exteriores e desigualdade social.
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A pauta ganha força por se tratar de um ponto de fragilidade do presidente Jair Bolsonaro, postulante à reeleição. Dentro e fora do país, sua política ambiental é alvo de críticas contundentes. Grandes investidores internacionais, reiteradamente, ameaçam retirar seus ativos do país caso o governo não intensifique a fiscalização para coibir o desmatamento da floresta.
Só no último mês, três pré-candidatos à Presidência fizeram discursos e postagens relacionados à proteção do bioma amazônico. No último dia 2, Sergio Moro (Podemos) defendeu a necessidade de se “estabelecer uma meta ambiciosa de desmatamento zero”. No dia 6, Ciro Gomes (PDT) cobrou a Polícia Federal e o Ministério Público Federal por investigações contra integrantes do governo Bolsonaro que “ampliam a marcha da devastação dos últimos santuários da Amazônia”. No dia 9, Lula declarou que “cuidar da floresta é obrigação ambiental e econômica”.
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Em contraponto, os planos e diretrizes das campanhas de 2018 de Geraldo Alckmin, Ciro Gomes e Jair Bolsonaro não tinham sequer a palavra “Amazônia”.
Com equipes próprias para tratar do assunto, as pré-campanhas já começaram a rascunhar suas propostas sobre o tema. Elas vão desde a retomada da demarcação de terras indígenas e renumeração de povos tradicionais para preservar áreas de conservação a políticas de “tolerância zero” contra o crime ambiental. Em comum, apesar das diferenças ideológicas, está a visão de que a questão ambiental é um dos flancos com maior potencial de dano aos planos de Bolsonaro, assim como a gestão da pandemia de Covid-19.
Para tornar o assunto mais palatável aos eleitores, os candidatos devem pontuar que a crise climática acaba impactando a vida dos mais pobres, vide a tragédia das fortes chuvas que mataram mais de 150 pessoas em Petrópolis (RJ). Além disso, eles devem destacar a urgência de recuperar a credibilidade verde do Brasil para garantir os bons resultados do agronegócio e atrair investimentos estrangeiros.
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Um dos responsáveis por estudar o assunto na campanha de Lula, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) afirmou que o “enfrentamento da crise climática está hoje no mesmo patamar do debate sobre erradicação da desigualdade social”. Segundo ele, o PT pretende retomar as políticas que vinham sendo implementadas durante as gestões Lula e Dilma, como o programa “Bolsa Verde” que oferecia R$ 300 a famílias pobres que viviam em áreas de conservação; e destravar os processos de demarcação de terras indígenas paralisados no governo Bolsonaro.
— Mais de 50% dessas áreas ainda estão em fase de processamento — disse ele.
O comitê de campanha de Bolsonaro ainda não indicou quem vai capitanear a elaboração de propostas voltadas ao tema. Por ora, as manifestações sobre a pauta têm partido do ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite. Durante a Conferência Mundial sobre o Clima, a COP26, em novembro, ele apresentou os planos do governo, que precisaria de mais dois mandatos para colocá-los em prática. Na ocasião, Leite anunciou uma nova meta de redução de 50% das emissões dos gases associados ao efeito estufa até 2030, a neutralização das emissões de carbono até 2050 e o fim do desmatamento ilegal até 2028.
Plano de investimento
Já o representante do meio ambiente na campanha de Moro, o agrônomo Xico Graziano não vê na criação de mais reservas ambientais a solução para acabar com a devastação do bioma.
— O diagnóstico que temos é que o desmatamento é maior em terras públicas. Criar unidades de conservação e não fiscalizar é só para inglês ver — afirma Graziano, que defende a criação de um cadastro de desmatadores.
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Coordenador de campanhas tucanas do passado, Graziano afirmou que antes a Amazônia era um assunto lateral na agenda ambiental, que geralmente priorizava questões de saneamento básico e administração de lixões.
— Inevitavelmente, o bioma agora é o grande tema —disse ele.
Guru econômico da campanha de Ciro Gomes, o economista Nelson Marconi tem elaborado o que chama de uma “política de desenvolvimento científico-tecnológico” que leve as universidades à Amazônia para “promover atividades farmacêuticas, químicas e de alimentos”.
— A pesquisa estimula o comércio, os serviços, os mercados de software no lugar da exploração predatória — afirmou ele.
Já o governador de São Paulo e pré-candidato do PSDB, João Doria, anunciou no fim da COP26, em Glasgow, um aporte de R$ 100 milhões do estado para um programa de pesquisa na região.
Propostas e iniciativas para a Amazônia
Lula (PT)
Retomar programa “Bolsa Verde”, que oferecia R$ 300 a famílias pobres que viviam em áreas de conservação. Destravar processos de demarcação de terras indígenas paralisados no governo Bolsonaro
Bolsonaro (PL)
Fim do desmatamento ilegal até 2028. Nova meta de redução de 50% das emissões dos gases associados ao efeito estufa até 2030. Neutralização das emissões de carbono até 2050
Sergio Moro (Podemos)
Ampliar o monitoramento e a integração das forças de segurança na região, o chamado programa Vigia. Criar um cadastro de desmatadores para bloquear o acesso deles ao mercado financeiro
Ciro Gomes (PDT)
Elaboração de uma política de desenvolvimento científico tecnológico que leve as universidades à Amazônia para promover atividades farmacêuticas, químicas e de alimentos. O objetivo é estimular o comércio, os serviços e os mercados de software
João Doria (PSDB)
O governador de São Paulo anunciou no fim do ano na Conferência do Clima (COP26), em Glasgow, um aporte de R$ 100 milhões do estado para um programa de pesquisa na região.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/amazonia-ganha-destaque-na-disputa-presidencial-extrapola-pauta-ambiental-25402962