Eis que Jair Bolsonaro está às voltas com o problema costumeiro dos presidentes da República. Para consolidar e ampliar a dominância sobre o cenário político, precisa de um, ou mais de um, partido para chamar de seu, e precisa que este(s) lutem por capilaridade nos processos eleitorais.
E tudo começa pela eleição municipal. É nela que se elegem os cabos eleitorais dos deputados federais, sem quem o presidente da República, aí sim, está arriscado a virar rainha da Inglaterra, ou a sofrer coisas ainda piores.
A política brasileira é peculiar. Aqui o sujeito não chega ao poder por ter um partido forte, mas precisa usar o poder para construir um partido forte, sem o que fica ainda mais sujeito a instabilidades, dada a entropia do sistema.
Nenhum presidente eleito desde a democratização contava com, ou conseguiu eleger junto, uma legenda hegemônica, e todos usaram o poder da caneta para alavancar, depois, gente para lhes dar sustentação. Aliás foi, e é, a fonte dos grandes escândalos nacionais.
Administrações partidárias são complicadas sempre, ainda mais com a massa de recursos proporcionada no Brasil pelo financiamento público. É muito poder. Todo mundo depende do proprietário, ou proprietários, de partido.
Proprietários regra geral eternos, pois inexiste na legislação mecanismo que os obrigue a praticar democracia interna. Eis um motivo, talvez o principal, para tantos partidos: a única garantia de quem tem projeto próprio é ser dono de legenda. Assim é a vida de quem faz política no Brasil.
O sintomático na guerra interna do PSL é inexistir qualquer proposta de resolver a disputa no voto. Nos Estados Unidos seria assim. Ali todas as candidaturas são decididas em primárias.
Ali foi possível Barack Obama derrotar no voto Hillary Clinton. Ali foi possível Donald Trump tratorar todo o establishment republicano.
É curioso que apesar de toda a conversa no Brasil sobre reforma política ninguém proponha uma lei que obrigue os partidos a praticar democracia interna. Curioso e compreensível. Essa mudança não virá nem do Executivo nem do Legislativo.
Já que o Judiciário está curtindo legislar, talvez ele pudesse dar um empurrão. E há argumentos. Se os partidos se financiassem apenas com dinheiro privado seria razoável ninguém meter o bedelho no funcionamento. Mas não é o caso, principalmente depois que passaram a receber montanhas de dinheiro público.
O partido só deveria poder lançar candidato nos municípios onde tivesse diretório eleito em convenção com voto direto e secreto. De preferência eletrônico. Comissão provisória não deveria ser suficiente. E todos os candidatos deveriam ser escolhidos em primárias.
É uma maneira simples de resolver imbroglios como este do PSL. Uma ideia simples e ingênua. Analistas políticos também deveriam ter o direito a, digamos, pelo menos uma ingenuidade anual.
O bom de ser considerado “do bem” é poder fazer tudo que faz quem é “do mal”, sem entretanto deixar de ser considerado alguém “de bem”. Quem duvida deve comparar os vieses da abordagem nas crises venezuelana, equatoriana e de Hong Kong.
*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação