“Não aprenderam nada e não esqueceram nada” foi a primeira coisa que me passou pela cabeça ao ler a entrevista de Fernando Haddad ao Pravda, perdão, Valor Econômico no início da semana.
Não vou me aprofundar nas barbaridades proferidas acerca da “radicalidade liberal”, nada mais que o velho “controle social da mídia” (sob novo nome) nas pegadas do sinistro Franklin Martins, nem acerca da curiosa afirmação sobre a inconstitucionalidade da prisão em segunda instância com base em decisão que Fernando imagina que o STF (Supremo Tribunal Federal) tomará em algum momento. Eu me atendo aqui aos aspectos econômicos da proposta.
A começar por atrocidade frequente, que, diga-se de passagem, não é monopólio do Fernando, mas que encontra mais eco do que deveria: o uso de fração das reservas para financiar “joint ventures, investimentos privados, PPPs em infraestrutura”.
Trata-se, na melhor das hipóteses, de ressuscitar o papel do BNDES nos anos dourados de Dilma, Mantega & Associados, qual seja, bancar, a leite de pato (e põe pato nisso!), projetos que iluminados do governo de plantão acreditem ser de interesse nacional, em nome de “aumentar a remuneração das nossas reservas”, notando que “interesse nacional” em tal contexto costuma significar “interesse bastante particular do meu grupo político, quase sempre inconfessável e ainda assim vendido ao distinto público como algo que supostamente deveria beneficiá-lo”.
Na pior das hipóteses, trata-se de vender reservas para obter reais e gastá-los, deixando em seu lugar apenas a dívida (e péssimos projetos!).
Já as propostas para reduzir o spread bancário parecem cuidadosamente pensadas de forma a evitar qualquer proximidade com os estudos sérios do problema mapeados por economistas do calibre de Marcio Nakane e João Manoel Pinho de Mello.
Nenhuma palavra sobre aumento de concorrência no setor, seja por meio da abertura do mercado, seja pela redução da assimetria de informações (no caso, cadastro positivo), ou menção à privatização de bancos públicos (para novos entrantes, bem entendido), ou ainda pelo estímulo às fintechs.
Há novidades, como a utilização de bancos públicos para forçar a redução do spread, algo jamais tentado nos últimos 24 meses, bem como a brilhante ideia de induzir bancos a reduzir o spread por meio de incentivos tributários, ou seja, o contribuinte bancaria os lucros das instituições financeiras que generosamente aceitassem cobrar menos de seus clientes em troca de impostos mais baixos.
Nada semelhante, como se vê, às renúncias tributárias oferecidas a vários setores no primeiro mandato de Dilma, em troca da preservação do emprego e do aumento do investimento, que fracassaram de modo retumbante, fiasco que desta vez não irá se repetir porque… Pois é, por quê?
Por fim o entendimento da questão previdenciária é parco, expresso na afirmação: “O problema está no regime próprio daqueles que não foram afetados pelas reformas de Lula e Dilma”. Sim, há um sério problema associado às aposentadorias e pensões do funcionalismo, o que não permite concluir pela inexistência de um problema ainda mais sério no INSS, devidamente ignorado na discussão.
Enfim, se alguém esperava algo de novo e inteligente no projeto econômico petista, minha sugestão é que espere um pouco mais (com sorte, duas ou três gerações devem bastar).
Não era (ainda bem!) o meu caso e, veja só, essa previsão eu acertei na mosca…
*Alexandre Schwartsman é consultor, ex-diretor do Banco Central (2003-2006). É doutor pela Universidade da Califórnia em Berkeley.