Não queremos a continuidade prometida pelo futuro ministro da Saúde
Mesmo sob ameaças e críticas daqueles que defendem a economia acima de tudo e das mortes de brasileiros que poderiam ser evitadas, esta coluna de análise econômica vai continuar apoiando e alardeando a necessidade de adoção de medidas restritivas de isolamento para conter a transmissão acelerada da doença. E também para salvar a economia do desastre maior. Repetir e repetir.
Para um país sem vacinas suficientes para imunizar em massa a sua população, é o único caminho apontado por cientistas para conter o colapso do sistema de saúde público e privado que transformou todo o Brasil numa grande Manaus e celeiro de variantes do vírus.
Necessitamos de medidas (efetivas), bem planejadas em cada localidade, que aumentem a taxa de isolamento, e não ações de prefeitos e governadores que vão sendo desidratadas e acabam resultando em ganho muitíssimo limitado por causa da pressão econômica e política dos seus adversários. Temos de parar de verdade. É preciso coragem política e espírito humanitário para afastar interesses eleitorais neste momento de descontrole, o maior colapso sanitário e hospitalar da história do País, na definição da Fiocruz.
A pandemia, infelizmente, está mostrando que a maioria dos governantes, parlamentares e lideranças empresariais brasileiras não está à altura do momento para enfrentar essa guerra que mata tantos de nós e destrói a economia. Há dez dias, chocou a notícia de que morreriam 3.000 pessoas por dia no Brasil. Hoje, o número é realidade.
Os empresários que fazem agora campanha contra o isolamento daqui mais um tempo vão pedir para as medidas serem adotadas. A razão é simples. Médicos e enfermeiros não são insumos que se compram na prateleira. O caos já derruba o PIB, desorganiza a economia e afasta investidores. O BC aumenta os juros de 2% para 2,75% (na aposta mais alta) em plena queda do PIB para conter a aceleração da inflação. Sinal de que as coisas não andam bem para a economia e já na primeira reunião após a aprovação da autonomia.
Não queremos a continuidade prometida pelo futuro ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. Em vez de ficar em Brasília para instalar seu gabinete de crise, planejar a ação e orientar a nação, preferiu ir para o Rio de Janeiro, ao lado do general Eduardo Pazuello, para receber as primeiras doses da vacina da Oxford fabricadas no País.
Não queremos mais cerimônias de chegada e distribuição de vacinas. Se ao menos o ministro tivesse ido a um hospital para ver a fila de pessoas doentes sem leito, teria sido um alento. É tarde para o governo Jair Bolsonaro “só” falar de mudanças de hábitos, usar máscaras, manter “um grau” de afastamento social e medidas hospitalares. Os países sérios fazem planos e executam.
Neste momento tão dramático, em que o foco tem de ser o bom combate da doença, é desconcertante para aqueles que escrevem sobre economia continuar falando sobre temas outros que não a pandemia, a crise do sistema de saúde e os relatos particulares de cada um dos brasileiros.
É necessário, porém, seguir mostrando o impacto da pandemia na economia, falar sobre câmbio, juros, inflação, gastos públicos, estimular o debate que aponte rumos, pressionar para que ações emergenciais saiam rapidamente e não se perca mais tempo.
É um absurdo governo e Congresso enrolarem por meses a aprovação do auxílio emergencial e depois de a PEC ter sido aprovada, na sexta-feira passada, o benefício só começar a ser pago em abril. Não tem desculpa que justifique tamanha crueldade e falta de planejamento.
É hora também de abrir o olho, ser vigilante, para que as “boiadas” econômicas, assim como as ambientais, não passem com a justificativa da pandemia. A derrubada de vetos garantindo perdão tributária às igrejas e mais poder de emendas aos parlamentares mostram que as boiadas passam. As falhas e a falta de atenção nessa vigilância serão cobradas no futuro. Perguntaremos: onde estávamos?
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A coluna de hoje é dedicada ao seu Gomes, goiano e pai da repórter Lorenna Rodrigues da sucursal de Brasília do Estadão, que morreu de covid-19 após batalha incansável da família por atendimento hospitalar, que chegou tarde demais.