Com o democrata, país seria forçado a abandonar a estratégia de bajulação
Biden é um candidato moderado, pró-globalização, dotado de vasta experiência pública e com uma agenda de desenvolvimento sustentável para seu país.
Trump é um populista isolacionista e que governa pensando apenas em sua popularidade imediata. Não tenho muita dúvida de qual seria melhor presidente para os EUA. Mas, dado que Bolsonaro construiu uma relação especial com Trump, será que, do ponto de vista brasileiro, a reeleição do presidente americano seria melhor?
Não seria. Primeiro porque a nossa relação de subserviência para com os EUA não nos tem rendido muitos frutos. Às vezes ganhamos um afago —como a simplificação aduaneira—, mas Trump bem sabe que dependemos muito mais dele do que ele de nós e por isso impõe tarifas a nossos produtos sem pensar duas vezes. Ao mesmo tempo, nossa relação com as outras nações só piora. Com Biden, seríamos “forçados” a abandonar a estratégia da bajulação e nos portar novamente como nação altiva em busca de seus interesses.
Interesses como o estreitamento de laços comerciais com todos: China, EUA, UE, países árabes, Israel. Para isso, uma OMC atuante (hoje está, por iniciativa americana, capenga) nos ajuda; já um mundo marcado por guerras comerciais intempestivas, e se fechando cada vez mais, nos atrapalha.
Trump é o rei da bravata vazia. Fala grosso com a China, inicia uma guerra comercial. Mas não entrega resultados. O déficit comercial dos EUA aumentou. No início de seu mandato, Trump saiu das negociações da Parceria Transpacífica, que uniria comercialmente diversas nações do oceano Pacífico, excluindo a China.
Desde então, os demais países fecharam um acordo entre si, e os EUA ficaram de fora. O “colocar a América em primeiro lugar” de Trump significou, na prática, fechar e isolar o país, tornando o mundo menos interconectado e mais caótico.
No debate do dia 22, a diferença entre os dois candidatos era clara: ambos entendem que a ascensão chinesa apresenta ameaças, mas enquanto Trump apela para a mistificação do “vírus chinês”, ponta de lança retórica para um cabo de guerra indefinido, Biden dá os termos de estratégia pensada: enquadrar a China nas regras globais —seja no meio ambiente, propriedade intelectual, práticas comerciais, etc. Com Biden, acordos econômicos substantivos se tornam mais prováveis.
Por fim, o governo Biden seria melhor para nós também na pauta ambiental. Trump encoraja a irresponsabilidade destrutiva de Bolsonaro e Ricardo Salles. Já corremos o risco real de perder o acordo comercial com a UE se nada for feito para reverter o quadro de devastação. Empresas internacionais começam já a boicotar produtos brasileiros que possam estar ligados ao desmatamento. Caso se torne presidente, Biden será mais uma liderança que nos ajudará a seguir a direção certa, conforme ele próprio disse no primeiro debate.
No meio ambiente, como em tantas outras pautas, nosso interesse de longo prazo é harmônico com o do resto do mundo: a Amazônia é uma fonte de riqueza e prestadora de serviços ambientais que beneficiam mais o Brasil do que qualquer outro país.
O mundo que beneficia o Brasil é um mundo de relações amistosas entre os países, mediadas por regras e instituições internacionais. Em que a diplomacia tem precedência sobre as armas.
Se Biden vencer, o mundo respirará aliviado. No Brasil, será motivo para celebrar duplamente.
*Joel Pinheiro da Fonseca, economista, mestre em filosofia pela USP.