Projeto substitui e amplia o “Plano Mansueto”
Um projeto de lei complementar que deverá ser colocado em votação na Câmara dos Deputados em novembro vai alterar três leis complementares, três leis ordinárias e uma medida provisória. Ele prevê uma nova renegociação das dívidas estaduais com a União e estabelece condições para que os Estados classificados com capacidade de pagamento “C” pelo Tesouro Nacional possam realizar novas operações de crédito, com aval da União. Atualmente, existem 13 Estados com essa classificação de risco.
O projeto de lei complementar 101/2020 é de autoria do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) e substitui e amplia o escopo do chamado “Plano Mansueto” (PLP 149/2019), que foi encaminhado pelo governo ao Congresso no ano passado, mas que não chegou a ser votado.
O objetivo do plano, que leva o nome do ex-secretário do Tesouro Mansueto Almeida, era justamente estabelecer condições para que os Estados classificados como “C” pudessem fazer novas operações de crédito, com aval da União. O PLP 149 terminou sendo transformado, na Câmara dos Deputados, em um seguro-receita aos Estados e municípios, com validade durante a pandemia da covid 19, o que foi rejeitado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e enterrado pelo Senado.
Agora, ele retorna como PLP 101, de autoria do ex-relator do “Plano Mansueto”. O deputado Pedro Paulo disse ao Valor que, passada a pandemia, quando a União transferiu diretamente recursos aos Estados e municípios, é preciso garantir crédito para que os governos estaduais e prefeituras possam realizar investimentos e bancar despesas correntes. “O PLP 101 autoriza novas operações de crédito, condicionadas à adoção de medidas de ajuste fiscal”, explicou.
O projeto de Pedro Paulo, no entanto, é bem mais amplo do que o “Plano Mansueto”. Ele prevê, por exemplo, uma nova renegociação das dívidas estaduais. Mesmo antes da pandemia, vários Estados conseguiram liminares no Supremo Tribunal Federal (STF) para não pagar as suas dívidas com a União.
Pela proposta em análise, os débitos serão incorporados ao saldo devedor e pagos em 240 meses, segundo informou o deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE), relator do PLP 101. Ele disse que as dívidas do Rio de Janeiro também serão renegociadas, com prazo de pagamento de 20 anos. Apenas durante a vigência do Regime de Recuperação Fiscal, o deputado disse que o Rio acumulou dívidas no montante de R$ 52 bilhões. “Ainda estou fazendo o levantamento do total dos débitos estaduais que serão renegociados”, disse Benevides. “O montante é impressionante”, afirmou.
O PLP 101 muda o Regime de Recuperação Fiscal (instituído pela Lei Complementar 159), com o objetivo de criar condições para que outros Estados, além do Rio de Janeiro, possam aderir ao programa. Para isso, o Estado precisará cumprir, simultaneamente, três exigências: ter sua dívida consolidada maior que a receita corrente líquida, ter o valor de suas obrigações superior às disponibilidades de caixa e gastar com pessoal mais do que 60% de sua receita corrente líquida ou sua despesa corrente ser superior a 95% de sua receita corrente líquida. Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás estão na lista de Estados que poderão aderir ao regime.
Benevides Filho informou também que o projeto vai mudar o prazo de duração do regime, que passará dos atuais seis anos para até oito anos, e as condições de pagamento dos débitos, que começarão a partir do segundo ano da adesão, com 10%, aumentando o percentual progressivamente. Outra alteração importante é que o governo estadual não precisará mais privatizar suas estatais para fazer caixa, podendo vender apenas 49% do capital e, com isso, manter o controle da empresa.
Os Estados com classificação de risco “C” que quiserem fazer novas operações de crédito, com aval na União, terão que pactuar um Plano de Promoção ao Equilíbrio Fiscal (PEF), que será instituído pelo PLP 101. Para isso, eles terão que implementar pelo menos três das sete exigências que constam da LC 159. O PEF terá metas fiscais e compromissos a serem aceitos pelos Estados. Cada um deles terá limite individualizado de endividamento.
“Os Estados terão que sofrer um arrocho para ajustar as suas contas”, advertiu Benevides Filho, em conversa com o Valor. Em seu parecer, ele pretende exigir que os Estados cortem os seus incentivos fiscais em 10% ao ano, durante três anos.
O PLP 101 muda também a Lei Complementar 101, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Umas das alterações está relacionada com a forma de cálculo da despesa com pessoal. A proposta que o parlamentar cearense estuda é incluir na despesa com pessoal os gastos com aposentados, pensionistas e os aportes de fundos feitos pelos Estados para cobrir o déficit previdenciário.
No caso da lei complementar 156, será dado aos Estados um prazo de mais três anos para que eles se enquadrem no teto de gastos, com as despesas podendo crescer apenas pela variação da inflação. Mesmo assim, Benevides pretende estabelecer que os Estados poderão deduzir o “excesso” das vinculações com saúde e educação, para efeito de apuração do teto.
Hoje, governos estaduais são obrigados a destinar 25% de sua receita para educação e 12% para saúde. “Se a receita do Estado subir 10% e a inflação for de 3%, a despesa com saúde e educação vai aumentar mais do que a inflação”, explicou. “Há um excesso que precisa ser excluído para o cálculo do teto.” O relator explicou que a União não tem esse problema pois, desde que adotou o teto de gastos, suas despesas com saúde e educação não estão mais vinculadas à receita. O teto estabelece que o gasto mínimo com saúde e educação é o mesmo do ano anterior, corrigido pela inflação.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), colocou o PLP 101 na lista de prioridades para votação ainda neste ano. Benevides disse ao Valor que o seu parecer estará pronto para ser votado no dia 4 de novembro.
Questionado pelo Valor, o Ministério da Economia não quis dizer se está sendo consultado sobre o PLP 101.