Está em curso a consolidação da aliança entre o presidente da República e o bloco de deputados e senadores que responde pelo nome de “Centrão”. Repudiada, no primeiro momento, pelos núcleos duros do bolsonarismo como capitulação frente à “velha política”, a aliança já rende frutos significativos ao governo e promete colheita ainda melhor de resultados no futuro.
Os arroubos do presidente como revisor e intérprete da Constituição e o consequente confronto com o Legislativo e o Judiciário parecem coisas do passado. Em troca, o governo conseguiu fortalecer sua base de apoio na Câmara e no Senado; está prestes a obter uma composição do Supremo Tribunal Federal mais receptiva para suas demandas e inicia a campanha eleitoral com perspectivas favoráveis para os candidatos do novo e turbinado bloco governista, espalhados entre diversas siglas partidárias.
A oposição, por seu turno, permanece na defensiva, aparentemente atordoada com o crescimento da popularidade do presidente, apesar das crises superpostas, sanitária e econômica, que assolam o país e apontam para um quadro de enorme dificuldade para todos no futuro próximo.
No entanto, é preciso ter claro que a política de confronto aberto com as instituições democráticas não cessou por obra de alguma mudança nas convicções profundas do presidente e de seu círculo mais próximo, mas pela ausência das condições mínimas necessárias para levar essa política às últimas consequências. Houve mudança para ganhar tempo; tempo para fortalecer as posições do governo, com dois objetivos.
Primeiro, possibilitar o aceleramento da política de destruição nacional em andamento. “Passar a boiada”, na expressão do ministro Ricardo Salles, para avançar no rumo da catástrofe ambiental, do isolamento internacional, do desastre sanitário, do retrocesso educacional, bem como da transformação da segurança pública e dos direitos humanos em campos repletos de minas.
Segundo, criar as condições para revisitar a estratégia do confronto, quando as consequências da crise e a responsabilidade do governo sobre o processo aparecerem de forma mais clara para a opinião pública. Cenários de popularidade baixa e dificuldades eleitorais crescentes são propícios para investidas populistas contra a legitimidade do processo eleitoral.
Cabe às oposições não ceder às tentações da divisão, ao conforto ilusório do isolamento. Urge retomar o processo de convergência em torno de objetivos comuns: a defesa da democracia e a construção de uma plataforma mínima de reconstrução nacional.