Quatro anos após o levante antigovernamental de junho de 2013, e depois da remoção presidencial em 2016, a política brasileira caminha para uma eleição com promessas novidadeiras. Fala-se de ameaças à tradicional polarização PT-PSDB, hegemônica no último quarto de século. A fragilidade relativa está, entretanto, mais à direita, o que parece paradoxal.
Nas duas últimas eleições, a terceira via caminhou pela centro-esquerda. Agora, no ápice e epílogo de um ciclo fortemente antipetista, a dispersão ameaça, contraditória e principalmente, a direita. Proliferam as pré-candidaturas, o PSDB parece hoje dividido e enfraquecido, especula-se com todo tipo de malabarismo para chegar ao eleitor vestido de novidade.
Uma razão da relativa desorganização é conhecida: o PT no poder acoplou-se tão bem ao sistema político que, para remover o partido, precisaram implodir toda a edificação. Não se faz omelete sem quebrar ovos, mas isso criou um problema: muitos dos comandantes e combatentes antipetistas de primeira linha acabaram soterrados pelos escombros.
Agora a poeira começa a baixar, e o PT aparece algo preservado. Por duas razões, interligadas. A maneira como foi ejetado do Planalto ofereceu-lhe a sempre preciosa narrativa de vitimização e, mais importante, tem um único líder. Os 30% de Lula (quase 40% dos votos válidos) mais a ameaça de o crítico ser associado a um suposto golpismo produzem poderosa dissuasão.
Some-se a isso o perfil da recuperação econômica, fortemente baseada em ganhos de produtividade e nas exportações. A situação melhora, mas não haverá uma retomada brilhante do emprego, que impulsionou as vitórias de Lula, nem uma elevação explosiva do poder de compra dos mais pobres, o combustível para os triunfos de Sarney e Fernando Henrique.
O PT tem um problema grave, o isolamento político, mas o corpo está inteiro. Já os adversários contabilizam baixas consideráveis. As pesquisas são objetivas ao medir a perda de massa de cada um. E esse vazio à direita é o caldo de cultura do novo, que no momento está dividido em diversas facções. Uni-las é o desafio de quem deseja derrotar a esquerda.
Há os antiesquerdistas de raiz, algo autoritários, que hoje se agrupam em torno de Bolsonaro. Mas há também os liberais, ou libertários, que defendem a liberação das drogas e do direito ao aborto, entre outras medidas para remover o jugo do Estado sobre o cidadão. Há os defensores do agronegócio, mas há também os adeptos radicais do socioambientalismo.
E há os que preferem simplesmente dar as costas à política. A dificuldade de fundir esse mix fica clara nas pesquisas de intenção de voto, quando trazem o grande contingente potencial de brancos, nulos, não sei e nenhum. Se essa massa ficar à deriva, de todo o alarido em torno do novo poderá dar o velho, como recentemente na eleição extra no Amazonas.
Outro risco à direita é o potencial de dispersão do assim chamado centro, enquanto parece haver certa convergência em torno da direita mais radical. A lógica diz que haverá um esforço gigantesco do establishment para levar um centrista ao segundo turno, mas, e se não der certo? E se a dispersão se mantiver, como na última eleição de prefeito do Rio?
A direita tem uma carta forte, que é o potencial de um apelo antilulista e antipetista num eventual segundo turno. Mas Lula e o PT não estarão parados, e procurarão de todo jeito impedir que o campo adversário se agrupe. É esse jogo que vai definir o resultado final. E acompanhá-lo com sintonia fina será a principal utilidade das pesquisas.
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A luta interna do PSDB tem uma explicação óbvia. No momento em que o nome tucano estiver definido, são enormes as chances de vir a ser ungido como o preferido do establishment para derrotar a esquerda num segundo turno. É um prato apetitoso demais para ser simplesmente deixado de lado. Ainda vai ter muita briga ali.
Até a semana que vem, ou até algum fato realmente novo pedir uma análise extra.
* Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação