Em meio a uma generalizada e justificada preocupação da comunidade científica brasileira em relação aos sucessivos cortes no orçamento destinado à área de pesquisa e inovação tecnológica, apresentei na Câmara dos Deputados uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a destinação mínima de 5% das receitas correntes da União, em igual proporção, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). A proposta altera o Artigo 218 da Constituição Federal e garante o repasse de valores mínimos a serem administrados de forma privativa por ambas as instituições, com aplicação em custeio e capital, transferidos mensalmente a partir de percentual calculado sobre a arrecadação do mês de referência e a ser pago no mês subsequente.
É evidente que, no momento em que o Brasil ainda esboça uma leve recuperação da mais dramática crise econômica de sua história, compreendemos a necessidade do governo federal de reduzir custos. De todo modo, não podemos perder de vista que a área científica é determinante para a construção do futuro. Tenho afirmado que cortar investimentos de forma tão abrupta em um setor estratégico significa usar o remédio para matar o próprio paciente.
A área de ciência, tecnologia e inovação oferece resultados geralmente no médio ou no longo prazo – de modo que, se não houver uma reversão dos cortes orçamentários, serão necessários muitos anos para que recuperemos o tempo perdido. A ciência não representa um entrave para a recuperação da economia brasileira, muito pelo contrário. É essencial para o desenvolvimento do país e a superação da crise.
A PEC por mim apresentada teve como inspiração um modelo de financiamento utilizado com êxito em São Paulo, onde a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) recebe 1% da receita tributária do Estado, deduzida a parcela de transferência aos municípios, como renda para aplicação em desenvolvimento científico e tecnológico. A proposta amplia tal sistema para o âmbito nacional, prescindindo da criação de qualquer órgão do governo federal para administrar os recursos transferidos ao CNPq e à Finep.
Nesse sentido, é importante destacar o papel exercido pelas universidades e institutos de pesquisa paulistas no fomento à inovação tecnológica. Trata-se, sem dúvida, de um exemplo a ser seguido para o avanço da ciência brasileira. Segundo o Ranking SIR 2010, divulgado em maio deste ano e produzido por uma consultoria espanhola, a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) ocupam, respectivamente, a primeira e a terceira posições na lista de instituições acadêmicas que mais produziram artigos científicos entre todos os países ibero-americanos no período que vai de 2003 a 2008. A Universidade Estadual Paulista (Unesp) figura na sexta colocação.
Outro dado relevante, este publicado em 2014 pela “Folha de S.Paulo” com base em uma tabulação da base de dados “Web of Science” feita pela Fapesp, mostra que as universidades de São Paulo responderam por quase 40% da produção científica anual no Brasil entre 2012 e 2013. Não é por acaso que costumo dizer, sem nenhum exagero, que o país seria muito mais desenvolvido se pudesse se tornar um imenso São Paulo – esse raciocínio vale também, e fundamentalmente, para o setor de ciência, tecnologia e inovação.
Historicamente, nossa preocupação com a ciência brasileira teve origem ainda com o saudoso Caio Prado Júnior, historiador, geógrafo, escritor e um dos mais destacados pensadores da realidade brasileira. Como membro da Assembleia Constituinte Paulista de 1947, então deputado pelo PCB, ele foi o responsável, ao lado de Mário Schenberg, por emendas que destinavam recursos para a área científica. A inclusão do Artigo 132, regulamentado em 1962, que previa que “o amparo à pesquisa científica será propiciado pelo Estado por intermédio de uma fundação organizada em moldes a serem estabelecidos por lei”, levou à criação da própria Fapesp.
A tradição do PPS em ter um olhar atento sobre as questões relacionadas à ciência e à tecnologia é amplamente reconhecida. Não foram poucos os momentos em que nos posicionamos no lado oposto ao de setores mais atrasados da esquerda, sobretudo durante os debates a respeito do desenvolvimento da indústria biotecnológica no Brasil – cujo avanço alguns tentavam impedir, especialmente em relação às pesquisas sobre o uso de alimentos geneticamente modificados. Defendemos alterações em artigos da Lei de Biossegurança que criminalizavam a pesquisa e proibiam a utilização, a comercialização, o registro e o licenciamento das tecnologias genéticas de restrição de uso, por meio das quais há intervenção humana na geração ou multiplicação dos organismos geneticamente modificados. Entendemos que o futuro do país e a melhoria das condições de vida da população não podem ficar à mercê de forças reacionárias e obscurantistas.
Seguindo e honrando os exemplos de Caio Prado Júnior, Mário Schenberg e tantos outros, e estabelecendo como parâmetro a ser alcançado o nível de excelência das universidades e institutos de pesquisa de São Paulo, esperamos que a PEC de minha autoria ajude no fortalecimento da ciência em todo o país. Só seremos uma nação plenamente desenvolvida se valorizarmos a pesquisa, a inovação e os avanços proporcionados pela tecnologia. Temos, afinal, de ser contemporâneos do mundo do futuro. E o futuro é hoje, agora, não pode esperar.