Governo teve derrota humilhante no Fundeb. Se seu plano vencesse, haveria o caos na educação em 2021 e pedalada na despesas do fundo
Foi tamanha a trapalhada do governo no Fundeb que ficou difícil até explicar. A decisão foi a de fazer dele o primeiro teste da sua base ampliada com o centrão. Terminou num fracasso tão grande que ao governo só restou a mentira. Bolsonaro comemorou como sendo seu o plano contra o qual conspirou. Planeja outros testes nas próximas votações. Foi tentada a estratégia de manter o presidente em silêncio. Não tem dado muito certo, e as emas do Alvorada sabem disso.
O Ministério da Economia fez uma manobra brusca para atropelar na reta final um projeto que vem de longa estrada sendo articulado com parlamentares, especialistas, sociedade civil, educadores. O governo ficou fora da pista durante todo o tempo e entrou daquele jeito. Tentou tirar dinheiro do Fundeb para um programa inexistente com o qual pretende substituir o Bolsa Família. Foi pela contramão fiscal porque era para burlar a lei do teto, já que o fundo da educação não está incluído nele. Se oficialmente os recursos fossem do Fundo, poderiam ser usados no programa Renda Brasil.
O governo fez tudo contra o Fundeb. Arthur Lira, o líder informal, quis adiar a votação na reunião dos líderes e, no plenário, tentou obstruir a sessão. Mas a aprovação foi consagradora com duas votações de emenda constitucional numa única noite. Houve apenas sete votos contrários, todos bolsonaristas. Depois dessa o governo deveria ter tido a prudência de recolher seu carro. Bolsonaro preferiu trombar com a verdade. Disse que havia sido uma vitória do seu governo. “A esquerda não engole mais uma derrota. Não engole. Não fizeram nada.” O ministro da secretaria de governo, Luiz Eduardo Ramos, havia feito um esforço para reduzir o tamanho da derrota, mas derrapou no Twitter: “Aprovamos. O que os governos anteriores não fizeram o presidente Bolsonaro deu o primeiro passo em menos de dois anos.”
Os fatos: os governos anteriores fizeram. O Fundef, na época de Fernando Henrique, e o Fundeb, no período Lula. Bolsonaro ignorou o assunto e na reta final veio com um projeto doido e tentou impedir a votação. O Fundeb resistiu e está a um passo de entrar para a Constituição. Falta o Senado.
O governo colocará seus carros na pista para novos testes. Um deles é a votação do veto da desoneração da folha. O ministro da Economia entregou seu imposto com uma alíquota alta e acenou com uma desoneração mais ampla que depende da aprovação de um novo imposto que ele ainda não quer chamar pelo nome próprio.
Nessa e em outras votações o governo tenta saber quantos votos tem. Se for derrotado, dirá que venceu, se o filho for bonito, é dele, se for feio, é da oposição. Com os quase 200 votos que supõe ter com o centrão no banco do carona, Bolsonaro quer barrar eventual processo de impeachment ou denúncia contra ele na Câmara.
Desde que Fabrício Queiroz foi preso na casa do seu advogado e do seu filho, Bolsonaro tenta ficar em silêncio e abandonar a tática de agredir pessoas, instituições e sobretudo os fatos, diariamente. Já não está com a boca fechada, como se viu nos últimos dias.
Fazendo um exercício contrafactual, o que teria acontecido se o governo tivesse conseguido aprovar o projeto que improvisou contra o Fundeb? O ano que vem o Brasil viveria um caos na educação. O ensino básico em quase dois mil municípios entraria em colapso. As escolas teriam que ser fechadas no ano seguinte a uma pandemia em que elas serão mais necessárias do que nunca. E, depois, no ano eleitoral de 2022, começaria a sair dinheiro oficialmente do fundo para um programa de voucher creche que seria, além de tudo, uma pedalada no teto de gastos. Outro ponto da proposta poderia deixar professores sem pagamento em municípios de todas as regiões do país.
O governo que faz uma gestão criminosa na saúde tem tentado tudo contra a educação também, da omissão à ação irresponsável. O plano que fez demonstra que seus autores sequer olharam os dados, não tiveram o cuidado de se informar minimamente sobre o funcionamento do país. O Brasil venceu no final, mas está ficando exaurido de ter que lutar para sobreviver a este governo. A sensação que se tem é que ele testa a paciência das instituições até o limite do tolerável, esperando quem sabe a ruptura que o filho do presidente disse que é uma questão de tempo.