Parece que nestes tempos o povo, enojado com a corrupção que grassou no Brasil e castigado pela crise, virou as costas para o mundo político e apenas aguarda 2018 para tentar uma solução. Fazer deste modo tal travessia contém várias armadilhas. Uma delas é deixar que a polarização Lula-Bolsonaro cresça e chegue a outubro do próximo ano como a alternativa mais forte, o que, entre outros males, elevaria o absenteísmo, o voto nulo e em branco a patamares nunca antes atingidos. Outra é deixar espaço para que o Governo Temer e o Legislativo, juntos, empurrados pelo que têm de pior, anulem o trabalho da Lava-Jato.
É natural que esta descrença aconteça. Durante quase treze anos uma polarização primitiva patrocinada pelo PT e seus governos — “nós” contra “eles” — dividiu o povo brasileiro. Esta mercadoria, vendida por vários meios, foi comprada meio às cegas; aparecia para a grande maioria como “pobres” contra “ricos”.
Entretanto, a realidade era outra: foi nestes governos que os banqueiros realizaram os maiores lucros de sua história e outros setores do empresariado — a Lava-Jato escancarou boa parte deles — enriqueceram às custas de favores do Estado, numa aliança espúria que visava dominar o Brasil no mínimo por vinte anos, segundo verbalizado por alguns líderes petistas. Na verdade, o “nós” significava quem estava ou apoiava os governos de Lula e Dilma e o “eles” aqueles que lhes faziam críticas ou simplesmente não os apoiavam.
Ao passar do tempo, o verdadeiro caráter destes governos foi revelando-se. De repente, sem que os analistas ou os políticos previssem, o povo acordou. Em junho de 2013 milhões saíram às ruas pedindo mudanças, verberando os políticos de maneira indiscriminada. Não tinham uma proposta única, apenas gritavam que aquilo não podia continuar, era preciso fazer algo diferente.
Em março de 2014 veio uma primeira resposta: a Lava-Jato começou a tarefa de combater a corrupção, fosse de quem fosse. Preferencialmente daqueles que haviam indevidamente se apropriado dos recursos das empresas ou de setores públicos. Foi e continua sendo uma resposta do Poder Judiciário às demandas populares, instituição da democracia brasileira que demonstra ter meios de defendê-la no terreno que lhe cabe.
Mas isto não bastava. Sem entrar em questões jurídicas, vemos que foi a incapacidade do governo Dilma de articular uma resposta à altura da indignação popular, expressa em novas grandes manifestações de rua, e de lidar com a “crise de governabilidade”, os motores que levam ao seu impedimento em agosto de 2016. Este e a assunção de Michel Temer ao governo central dão-se de acordo com a Constituição da República. Era para ser uma resposta no terreno do Poder Executivo ao clamor do povo.
Entretanto, o DNA do PMDB e do próprio Presidente não lhes permite responder à expectativa popular. O governo Temer não consegue mudar o rumo do despenhadeiro para o qual apontava o governo Dilma e aos poucos se tornou refém do “centrão”, a parte mais fisiológica do Poder Legislativo. De tropeço em tropeço, seus esforços principais vão, hoje, no sentido de chegar vivo às eleições de 2018.
É este cenário de longos e sucessivos engodos que, hoje, joga para baixo a expectativa popular em relação à política. Se isto persistir neste tempo de travessia, será o pior, porque é nele que vai ser decidido o futuro do Brasil nos próximos anos. A pergunta que não quer calar é: o que fazer de agora até outubro do próximo ano, diante da campanha pela sucessão presidencial já começada?
A alternativa é, desde já, iniciar a formação de um bloco político de centro-esquerda que mobilize o povo e possa plasmar neste período e em outubro de 2018 uma solução democrática e republicana. Esta é a grande tarefa que está colocada para o vasto mundo que não se identifica com extremismos. Difícil? Sem dúvida, mas é possível realizá-la.
Agora, o primeiro passo nesta direção será lançar um nome que tenha, pelo seu passado, um sólido compromisso com a ética política, experiência administrativa e uma proposta para o futuro do País que coloque os interesses do povo à frente daqueles que vêm marcando a política brasileira nos últimos tempos.
Até hoje nenhuma pré-candidatura presidencial demonstrou potencial para realizar essa tarefa. Pelo centro surgem nomes, principalmente em São Paulo. Eles não levantam o ânimo, não acendem a esperança das mudanças sonhadas. À exceção do prefeito de São Paulo, que mais parece um pescador de águas turvas, os nomes levantados são de políticos conhecidos, alguns que podem até ser administradores razoáveis, porém incapazes de entusiasmar as multidões.
Mas também se ouve nas redes sociais o nome do senador Cristovam Buarque. Quem escuta ou lê suas propostas percebe que ele é portador de um projeto moderno, centrado na redução das desigualdades e na educação. Seu passado de político é exemplar, nada a ver com a Lava-Jato. Como governador de Brasília fez um trabalho que marcou época.
Quando foi eleito senador, tinha direito a dois salários: um de sua aposentadoria na Universidade de Brasília e outro de parlamentar. Abriu mão de seu salário como senador. Não usa carro oficial, vai para o senado em seu próprio veículo. Rara mercadoria entre os políticos de hoje, ele tem condições para acender a esperança do nosso povo, tornando-se o aglutinador da aliança apontada acima, única que pode tirar o Brasil do lamaçal onde está atolado e levá-lo à posição que todos almejamos.
* Sergio Augusto de Moraes é engenheiro e Conselheiro Vitalício do Clube de Engenharia.