O ministro Paulo Guedes disse que a alta do dólar é boa para todo mundo. A frase foi soterrada por outra ainda pior que acabou ganhando destaque. Mas do ponto de vista técnico, sobre câmbio ele também estava errado. Não há qualquer evidência de que o real desvalorizado produza crescimento. Ele subiu por exemplo em 2015, de R$ 2,65 para R$ 3,90 e a economia mergulhou na recessão. É um preço que tem impacto sobre vários outros e o ideal é que ministros não estimulem especulações e que o Banco Central faça intervenções mínimas, apenas por razões técnicas e pontuais.
A declaração do ministro da Economia provocou reação imediata, por ter revelado preconceito social. “Empregada doméstica estava indo para a Disneylândia. Uma festa danada. Peraí”. O que aparece nessa fala infeliz é tão discriminatório que evidentemente provocou polêmica. Um ministro da Economia deveria querer a prosperidade do país como um todo, um liberal deveria se preocupar menos com as escolhas individuais, um economista deveria olhar os números que não confirmam sua tese.
O preço mais difícil de entender — e prever — é o câmbio. Baixo, não nos torna ricos, alto, não garante crescimento. Quando está sobrevalorizado cria distorções, se for excessivamente desvalorizado, também.
Os exportadores sempre querem uma cotação mais alta porque isso aumenta seus ganhos na exportação e ameniza os efeitos da falta de competitividade da indústria brasileira. Muitos que produzem apenas para o mercado interno também gostam do dólar alto que encarece o produto importado com o qual vão competir. O problema é que a moeda americana saiu de R$ 1,80 em 2012 para R$ 4,30 agora e não houve crescimento sustentado das exportações do setor industrial. O Brasil precisa resolver problemas estruturais que reduzem competitividade dos manufaturados, como inovação e logística.
O salto do dólar aumenta alguns preços como medicamentos, combustíveis, certos alimentos como pão, bens importados como celulares. Alguns produtos e matérias-primas, mesmo sendo exportados pelo Brasil, acabam subindo porque há uma correlação entre preços internos e externos. O aço, por exemplo. Os investimentos também ficam mais caros. Dos US$ 16 bilhões importados pelo país em janeiro, 32% foram “insumos industriais elaborados”, o maior item da pauta. Logo depois, vêm os bens de capital, com 22%. Peças e acessórios, equipamentos de transporte são mais 16%. Esses dados mostram como o câmbio pode ter impacto sobre os custos das indústrias e dos investimentos no país. Os bens de consumo, como eletrônicos, são 13%. Quando ele está alto, empresas que têm dívidas externas passam a ter um custo maior. A Petrobras é uma delas.
O gráfico mostra o PIB acumulado em 12 meses, trimestre por trimestre, e compara com o dólar no final de cada trimestre. O maior período de crescimento do PIB é o que tem a cotação mais baixa. Quando há o pior período do PIB, o real já havia se desvalorizado em quase 100%.
O dólar não deve ser manipulado nem para estimular o consumo nem para contê-lo. Não deve ser elevado para empurrar as exportações e proteger a indústria local, nem deve ser artificialmente baixo para segurar a inflação. Isso é o que o Brasil aprendeu com erros de sua história recente. Funciona melhor quando o câmbio é flutuante, e o Banco Central não quer defender uma cotação, alta ou baixa. E também é melhor quando o ministro da economia não explicita uma preferência, como fez o ministro Paulo Guedes, ao dizer que o dólar alto é “bom pra todo mundo”. O BC teve que entrar no mercado para conter o movimento especulativo que se formou por causa da declaração.
Há erro técnico no que ele falou sobre dólar. Mas isso é o de menos. Não é o primeiro, não será o último ministro a errar nesse assunto. O pior é a visão revelada de que um grupo de trabalhadores, pela natureza do seu trabalho, não deveria usufruir de certos prazeres. “Peraí” ministro. Como já disse aqui, neste espaço, dias atrás, Paulo Guedes deveria pensar antes de falar.