O país em dois anos pode economizar R$ 200 bilhões em juros, fruto do ajuste que começou no governo passado e continua agora
O Congresso, ao voltar, terá uma tarefa imediata. Decidir se dará seguimento à tramitação do projeto de venda da Eletrobras. Se não andar nada em fevereiro, na primeira revisão bimestral do Orçamento, em março, o governo terá que contingenciar R$ 16 bilhões. Mas há boas notícias fiscais. Uma delas é a contínua redução da dívida pública. Se os juros forem mantidos nos níveis atuais até o fim do ano, mesmo sem qualquer queda eventual, o governo terá economizado em dois anos quase R$ 200 bilhões só em pagamento de juros.
O contingenciamento é obrigatório pelas regras orçamentárias. Na conta das receitas entraram os R$ 16 bilhões que o governo deve arrecadar com a renovação das usinas, que só pode acontecer se a Eletrobras for privatizada. E pela lei, no final de março, o governo terá que dizer como está a gestão orçamentária. Nessa revisão, terá que comprovar que o projeto está andando. Do contrário, há risco de frustração de receita, e o congelamento de despesas é automático.
No final do ano passado, o governo acabou liberando tudo o que contingenciou. Mas o problema é que a liberação em muitos casos chegou tarde demais. A receita extra veio do leilão do petróleo. Até o início de dezembro havia R$ 34 bilhões bloqueados. Quando liberou, muitos ministérios não conseguiram gastar. O ano passado terminou com dados fiscais muito melhores do que o imaginado, mas ainda com déficit. Se parte desse dinheiro liberado no final de 2019 for gasto este ano, isso pressionará as contas de 2020. São os problemas das muitas regras engessadas do orçamento brasileiro.
A decisão de aumentar o salário mínimo na proporção da inflação do ano passado foi tomada na equipe econômica por dois motivos: primeiro, porque a lei exige que haja recomposição do poder de compra do salário mínimo. Segundo, como será por MP, o Congresso poderia mudar. O que criou a defasagem foi que a inflação subiu no final do ano, mais precisamente, no último mês. Por isso a inflação de fato ocorrida foi um ponto percentual acima das projeções.
Mas não há espaço para novas pressões de gastos. Uma delas foi o pedido do presidente Bolsonaro de se dar redução na conta de luz dos templos religiosos. As igrejas já têm deduções ou isenções em vários tributos como Imposto de Renda e IPTU. Se tiverem privilégios nos pagamentos da energia, isso será pago pelos outros consumidores. Pelo contrato, a empresa de energia não pode ter prejuízo na venda de luz. Então alguém pagará. Além do mais, isso vai na direção oposta da defendida pelo Ministério da Economia.
O temor entre integrantes da equipe econômica é que as notícias de melhora nas contas do governo sejam entendidas como licença para aumentar os gastos. Alguns são indispensáveis, evidentemente. Mas o que se ouve por lá é que o Brasil não pode esquecer que ainda é um país deficitário e com uma grande dívida pública.
A melhora mais visível foi exatamente na dívida. Essa redução dos juros e, portanto, dos custos, começou no governo Temer, quando a Selic saiu, de forma consistente, de 14,25% até 6,5%. Mas as quedas que aconteceram no atual governo já produziram efeito. Na conta de juros brutos, o governo pagou, em 2019, R$ 69 bilhões a menos do que pagaria se a Selic permanecesse em 6,5%. E este ano, se ficar constante, haverá outra redução de R$ 120 bilhões. O governo pagava de juros 9% do PIB em 2015 e deve estar pagando entre 4% e 4,5% agora, segundo fontes do governo. A mudança da TJLP para TLP, também na administração Temer, diminuiu o subsídio financeiro concedido via BNDES. E o banco no ano passado devolveu ao Tesouro R$ 123 bilhões, que foram usados para abater dívida. Além disso, houve a reforma da Previdência, que não tem efeito imediato, mas melhora as projeções, e a venda de parte das reservas cambiais.
Tudo isso fez cair a dívida pública. A previsão era de que bateria em 80% do PIB e está em 77%. Essa reversão estava projetada pelos economistas para acontecer no próximo mandato presidencial. Já está acontecendo. O temor agora é que o mundo político entenda isso como licença para ampliar gastos. E por mundo político entenda-se até o presidente, com pressões como essa da energia dos templos religiosos. O Brasil é um país que está começando o seu ajuste fiscal. Há muito a ser feito.