Corrupção criou ambiente de ineficiência e má gestão. Foi isso que quebrou as empresas, e não a Operação Lava-Jato
O que quebrou as empresas foi a Lava-Jato ou a corrupção? Essa questão que sempre ronda a economia retorna agora após a entrevista do ministro Dias Toffoli. Certamente não é o combate ao crime que produziu esse efeito. É o crime em si. A relação promíscua com os governantes deu aos administradores e aos donos das empresas a confiança de cometer desatinos de gestão, que a prudência não recomendaria caso eles não estivessem certos de que seriam salvos com o dinheiro público.
As empresas entraram em projetos sem viabilidade econômico-financeira, participaram de concorrências fraudulentas, formaram cartéis de distribuição de projetos entre elas, fizeram obras no exterior com garantias fracas, expandiram excessivamente os negócios, alavancaram demais seus grupos.
No primeiro governo Fernando Henrique, bancos quebraram. Alguns porque haviam passado a ser dependentes da inflação, outros por fraudes contábeis, e alguns pelos dois motivos. O Proer separou os bancos dos seus donos. E vendeu os ativos bons. A engenharia financeira do Proer aumentou a concentração bancária, mas salvou ativos e impediu o prejuízo dos correntistas na mais séria e devastadora crise bancária que o Brasil já teve. Ao constatar os crimes, o Banco Central apresentou denúncia ao Ministério Público (MP).
Agora seria possível separar as empresas de seus donos? Ainda que fosse, por exemplo, tomar a Odebrecht da família controladora, quem faria isso? O Ministério Público não teria a prerrogativa de fazer tal intervenção. Como os crimes descobertos pela Lava-Jato envolviam integrantes dos governos que estavam no poder naquele momento, o governo também não teria legitimidade de expropriar a empresa dos seus controladores. E se alguma instância no país o fizesse, o que aconteceria com os direitos dos minoritários nos casos das empresas com ações em bolsa?
Essa acusação do ministro Dias Toffoli, de que a Lava-Jato quebrou as empresas, não se sustenta por uma série de motivos. Talvez o mais importante é que a operação foi resultado de apurações da Polícia Federal e do MPF, com denúncias apresentadas pelo Ministério Público, e processos desenrolando-se, claro, na Justiça. O que o ministro diz recai, portanto, em parte sobre a própria Justiça, cujo principal tribunal ele preside no momento.
Na entrevista de Marcelo Odebrecht ao jornalista Thomas Traumann, está lá uma parte do problema que quebrou a empresa. Porque eles tinham vantagens nessa relação com o setor público, eles passaram a tomar decisões que levaram a prejuízos apenas para atender a pedidos do governo. Ele listou os investimentos: “…nos aventuramos no setor de etanol a pedido do governo e tivemos muito prejuízo, assim como no estaleiro na Bahia. O estádio do Itaquerão foi uma dessas missões em que perdemos muito dinheiro.” O próprio empresário diz que é fácil dizer que foi a Lava-Jato que quebrou a Odebrecht. Mas ele admite que não souberam administrar a crise. “A Odebrecht quebrou por manipulações internas”.
A corrupção produz uma mudança na maneira como uma companhia funciona. Uma empresa onde há corrupção precisa evitar a transparência e o controle. Nessas sombras tudo pode acontecer e levar uma corporação a perdas. A Petrobras não quebrou porque é pública, mas teve enorme prejuízo. Cada área da estatal era uma verdadeira ilha, com autonomia, setor de compras independente, sem sinergia. Assim ficava mais fácil entregar cada parte da petrolífera a um partido diferente. A Odebrecht chegou a ter um departamento clandestino dentro da empresa, ainda que Marcelo diga que é folclore. Claro que existia toda uma movimentação fora da contabilidade. Na holding baiana se vê agora que havia também, e ainda há, uma briga intestina dentro da própria família que opõe pai e filho, irmão e irmão. Isso não tem nada a ver com a Lava-Jato.
Em todas as empresas apanhadas pela Lava-Jato foi possível encontrar áreas de ineficiência, desperdício, pessoas desqualificadas em postos de confiança, negócios com prejuízos que não seriam mantidos se estivessem sendo seguidas boas práticas corporativas. A corrupção quebrou as empresas e não a investigação da corrupção. A alternativa era conviver com o crime para não prejudicar a economia. Isso não é aceitável.