Segue um resumo das urnas no Reino Unido. Os conservadores mantiveram a fatia dos votos da eleição anterior. Os trabalhistas perderam uns sete pontos percentuais. A diferença final foi cerca de dez pontos. O sistema de voto distrital permitiu aos conservadores formar uma maioria confortável no parlamento. Os trabalhistas perderam votos pró-Brexit para os conservadores e votos anti-Brexit para os Liberais-Democratas. Esse é o resumo.
Os votos operários pró-Brexit que os trabalhistas do RU perderam para a direita são parecidos com os do Rust Belt (cinturão da ferrugem, zonas de desindustrialização) que os democratas de Hillary Clinton perderam para Donald Trump. E esse movimento expõe o desafio fundamental enfrentado pelo discurso da esquerda nos países desenvolvidos. Como ser ao mesmo tempo cosmopolita, identitário, ambientalista, nacionalista, protecionista e desenvolvimentista?
Os três primeiros vetores costumam atrair os jovens, mas os três últimos falam ao coração dos nem tanto. E mesmo entre os jovens a bandeira do emprego tem forte potencial mobilizador. Daí verifica-se o desafio demográfico de uma esquerda cosmopolita e antenada, especialmente em países com crescimento populacional desacelerado ou negativo. O sujeito pode lacrar à vontade nas redes mas isso não garante uma coalizão social majoritária, e sem ela não se ganha eleição.
As pesquisas mais recentes mostram qualquer candidato democrata derrotando Trump no voto nacional, mas o presidente americano bateria qualquer candidato democrata no colégio eleitoral, se a eleição fosse hoje. O pedaço da classe trabalhadora perdido pelos liberais (esquerda nos Estados Unidos) para os republicanos nos estados volúveis continua vulnerável a Trump. Inclusive porque os empregos estão bombando. Protecionismo traz resultados ali.
Desemprego alto e/ou desconforto social são combustível para turbulências políticas e alternâncias de poder. Aqui, o governo Jair Bolsonaro aposta na retomada da economia, e em programas como a carteira verde-amarela. Iniciativas parecidas, como o Primeiro Emprego no mandato inicial de Luiz Inácio Lula da Silva, falharam. Na Argentina, Alberto Fernandez tenta medidas agressivas pró-emprego na largada. Não quer dar mole.
No fim a economia decide, na maioria das vezes. Mas é preciso uma leitura mais cuidadosa do que vem a ser “a economia”. As manchetes bonitas da imprensa especializada nem sempre se traduzem como satisfação social. Um exemplo? O aumento da produtividade das empresas na saída da crise, notícia positiva, na outra ponta são menos empregos e mais produção pela mesma remuneração. Pois é, tudo tem dois lados.
Talvez esteja na hora de fazer a leitura político-eleitoral da economia levando mais em conta o bem-estar social, objetivo e subjetivo. O Chile ensina isso. O Reino Unido também. Mas os números frios continuarão tendo sua força, como mostra Donald Trump. Ele só consegue resistir ao cerco do impeachment porque a economia americana e os empregos ali estão bombando.
A única certeza? Só se ganha eleição falando ao povão. Isso nunca muda.
*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação