PT precisa entender que, se não falar à centro-esquerda, vai ter quem fale
Tanto Luciano Huck quanto Joaquim Barbosa teriam vencido a eleição presidencial de 2018 se tivesse concorrido sem o outro na disputa.
Se tem algo que foi provado pela eleição de Bolsonaro é que o eleitorado queria um outsider, e, se valeu Bolsonaro, teria valido qualquer um. Barbosa e Huck eram incomparavelmente superiores a Bolsonaro.
Todo mundo é.
Aqui é bom contar uma parte da história de 2018 que é pelo menos tão importante quanto o antipetismo.
A rejeição ao PT foi importante no segundo turno, mas lembrem-se: Bolsonaro quase venceu no primeiro, quando havia uma ampla gama de candidatos disponíveis. Os analistas próximos ao PSDB precisam explicar por que Bolsonaro, e não Alckmin, Meirelles, Amoêdo ou Dias, se beneficiou do antipetismo.
O governo Temer foi uma tentativa de recomposição do sistema político diante dos ataques da Lava Jato. Toda a direita moderada apoiou isso. Para barrar os outsiders, os grandes partidos mudaram a regra de financiamento eleitoral, dificultando as pequenas candidaturas.
A centro-direita apostou tudo na hipótese de que 2018 seria uma eleição normal, em que estrutura partidária, dinheiro de campanha e tempo de TV seriam decisivos. Quando essa aposta se consolidou, a candidatura de Huck perdeu espaço.
Havia vozes dissidentes. O governador tucano do Espírito Santo, Paulo Hartung, dizia que Alckmin seria um ótimo presidente, mas não era o que o eleitorado de 2018 queria. Hartung foi um dos principais defensores da candidatura Huck. Tanto FHC quanto Arminio Fraga tiveram, em algum momento, entusiasmo pela ideia.
Hartung e os defensores de Huck perderam a disputa interna. É tentador comparar esse erro tucano com o erro petista de não acompanhar Haddad em direção ao centro no segundo turno.
Huck será candidato em 2022. Não sabemos se terá sucesso. Talvez o eleitorado queira algo muito diferente do que quis em 2018, quando o apresentador teria sido eleito. Talvez não.
Temos uma discussão em curso sobre a viabilidade de uma candidatura de centro. Há muito ruído nessa conversa, porque Bolsonaro voltou a desmoralizar o termo “direita”, que havia sido reabilitado nos anos finais dos governos petistas.
João Doria, por exemplo, quer conquistar eleitores ao centro, mas busca sobretudo retomar o controle da direita pelos (comparativamente) moderados.
O perfil da candidatura de Huck deve ter várias semelhanças com o da candidatura Doria. Mas já é possível notar uma diferença: ao contrário do governador de São Paulo, que se elegeu em uma onda de antipetismo, Huck também quer eleitores da centro-esquerda.
Seus discursos sobre o combate à desigualdade e a importância de políticas sociais podem conquistar eleitores moderados do PT. Afinal, tem gente no partido que parece disposta a abdicar dos votos da centro-esquerda.
Seria bom se o eleitorado ex-tucano voltasse a se organizar sob a liderança de um moderado, mas confesso que meu interesse na candidatura Huck é outro: o PT precisa entender que, se ele não quiser falar à centro-esquerda, vai ter gente falando.
Pode ser Huck por um lado, ou o PSB pelo outro, pode ser Ciro, pode ser alguma outra coisa. Mas o espaço que venceu quatro eleições presidenciais seguidas não vai ficar vazio.
*Celso Rocha de Barros, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).