Na quarta-feira relator vai definir data com Campos e Maia
Nunca o Congresso esteve tão perto de aprovar o projeto de autonomia do Banco Central. O momento não poderia ser mais favorável. Os juros básicos (Selic) estão no patamar mais baixo da história e a inflação em setembro foi negativa. Houve uma ligeira deflação, de 0,04%, e o risco, agora, é de o IPCA, índice oficial do regime de metas, ficar bem abaixo da meta de 4,25% neste ano. O nível de atividade continua em banho-maria e amplia-se o espaço para uma redução adicional da taxa de juros, para a casa dos 4,5% ao ano.
O ex-presidente do BC Ilan Goldfajn deixou bem pavimentado o caminho para a votação do projeto de lei complementar (PLP) que confere autonomia ao BC junto às lideranças dos partidos. Foram inúmeras as conversas com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em um processo de negociação que continuou com o novo presidente, Roberto Campos Neto. Na semana passada, por pouco a proposta de autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira do Banco Central não foi colocada em votação na Câmara.
O deputado Celso Maldaner (MDB-SC), relator do PLP, informou que entre terça e quarta-feira da próxima semana terá uma reunião com Maia e Campos para definir a data que o assunto será levado ao plenário da Câmara.
Quando votado e aprovado, encerra-se um longo período de três décadas para esse assunto amadurecer. As primeiras iniciativas de atribuir autonomia legal para o BC datam de 1989 e precederam a própria estabilização da economia, a partir do Plano Real, de 1994. O objetivo dos projetos era, então, de garantir à autoridade monetária autonomia para controlar a quantidade de moeda na economia.
Agora, o objetivo fundamental do BC será o de assegurar a estabilidade de preços e zelar pela estabilidade financeira. O projeto de lei complementar que o Executivo enviou ao Congresso em abril deste ano foi apensado ao projeto 200/1989.
Ao estabelecer mandato fixo e alternado para o presidente e para os oito diretores do Banco Central, a lei estará retirando-os do alcance de eventuais pressões políticas. A possibilidade de exoneração da diretoria do Banco Central, pelo presidente da República e com a chancela do Senado, ficará restrita a casos de doença que impeça o exercício do mandato, à condenação mediante decisão transitada em julgado ou por insuficiência de desempenho para o alcance dos objetivos citados acima.
A autonomia e o mandato fixo dificultam, mas não eliminam totalmente a possibilidade de demissão da diretoria do BC. Foi o que aconteceu na Argentina quando a então presidente Cristina Kirchner exonerou o então presidente do BC independente, Martín Redrado, em 2010, por divergências políticas. Em geral, as pressões são por mais crescimento no curto prazo, em detrimento do controle da inflação.
A inflação e o desemprego observados no mundo nas décadas de 1970 e 1980 levaram os bancos centrais a ajustar o foco na proteção do valor da moeda e, para isso, tiveram que ser isolados de pressões políticas contrárias ao cumprimento desse mandato.
Delegar o controle da política monetária a bancos centrais independentes foi um processo bem-sucedido pois a inflação, no mundo ocidental, saiu de pouco mais de 20% nos anos de 1980 para quase nada hoje.
No Brasil, após 1994, a estabilidade da moeda tornou-se um patrimônio nacional. Mas faltou o marco legal da autonomia do BC para dar, inclusive, segurança jurídica à instituição no desempenho dessa função.
Desde então, o BC obteve autonomia delegada pelo presidente da República, mas não está escrito em nenhum lugar que o objetivo institucional do Banco Central é manter a estabilidade de preços e que o seu objetivo complementar é zelar pela estabilidade financeira.
Também não há lei que atribua ao BC a condição de autarquia de natureza especial, caracterizada pela ausência de vínculos de subordinação à ministérios.
Associados aos mandatos fixos e escalonados da diretoria do BC, esses são elementos necessários para dissociar a administração da taxa básica de juros dos ciclos políticos eleitorais.
Haverá um mecanismo de coordenação com o ministério da Economia para o caso de alguma operação da autoridade monetária gerar custo fiscal. O BC terá que informar o Conselho Monetário Nacional (CMN) quando for fazer, por exemplo, empréstimos com instituições financeiras públicas ou privadas que representem algum impacto fiscal.
Guedes e o BC
O ministro da Economia, Paulo Guedes, declarou que a deflação registrada em setembro abre espaço para queda da taxa de juros.
Como o Comitê de Política Monetária (Copom) já indicou que deverá cortar a Selic em mais 0,5 ponto percentual na próxima reunião, marcada para os dias 29 e 30 de outubro, é de se supor que Guedes esteja sinalizando cortes adicionais, que levem a taxa básica para o terreno dos 4,5% ao ano. O ministro já demonstrou que não se importa de tratar de assuntos relativos ao BC. Em junho ele anunciou que o Banco Central iria liberar R$ 100 bilhões de depósitos compulsórios. E referiu-se, também, à redução das reservas cambiais, ao dizer que, se o dólar chegar a R$ 4,50 ou R$ 5,00, poderá vender US$ 100 bilhões das reservas e usar esse dinheiro para abater a dívida pública.
Sem reforma
Um ministro do círculo mais próximo do presidente da República garantiu que não se cogita, no governo, fazer uma reforma ministerial. Esse mesmo ministro disse, ainda, que nunca ouviu qualquer menção a uma eventual saída de Paulo Guedes do governo, seja por vontade própria, seja por desejo de Jair Bolsonaro.