Na ONU, aprofunda movimento de ruptura e aposta em tratamento de críticos como vilões
Em nove meses de mandato, Jair Bolsonaro já havia mostrado que não faria concessões e ignoraria qualquer apelo por moderação. Agora, o presidente levou à ONU as credenciais de um governo que abraça de vez uma espécie de fundamentalismo político.
O discurso do brasileiro na Assembleia Geral foi uma vitória da ala ideológica do Palácio do Planalto e da Esplanada –uma prova praticamente definitiva de que esse grupo determina não apenas a essência, mas todo o corpo do bolsonarismo.
O presidente fez questão de deixar sua marca completa, mas deu peso especial a sua conhecida contraposição às ideias da esquerda. Com isso, mostrou mais uma vez que não aceita nada além de alinhamento absoluto e que seus críticos se tornam imediatamente adversários e vilões.
O pronunciamento foi, segundo os próprios auxiliares de Bolsonaro, uma tentativa de apresentar ao mundo e reforçar dentro de casa a linha mestra de um movimento de ruptura. Sob esse argumento, o presidente busca um salvo-conduto até para as medidas mais controversas tomadas por seu governo.
Num pot-pourri do repertório de campanha, o fantasma socialista apareceu com destaque, o governo foi apresentado como vítima da imprensa e as queimadas da Amazônia pareceram uma ilusão.
Apostando no enfrentamento, o presidente foi capaz de dizer, sem corar, que a floresta não está sendo devastada. Bolsonaro sabe que negar a realidade não encerrará as cobranças pela preservação da Amazônia, mas explora essa fantasia para reforçar sua disposição em afrouxar a política ambiental brasileira.
O presidente usa problemas verdadeiros, como a corrupção e a criminalidade, para tentar convencer o mundo de que seus adversários políticos podem ser ignorados e de que só ele tem as soluções. Deixa de dizer, entretanto, que sua gestão mal arranhou a superfície da segurança pública e que ele passou a ser criticado por sua base política ao interferir em órgãos de controle.