Nem Moro, nem Guedes. Em sete meses de governo, o ministro que mais facilitou a vida de Bolsonaro foi Dias Toffoli, presidente do STF
Nem Moro, nem Guedes. Em sete meses de governo, o ministro que mais facilitou a vida de Jair Bolsonaro foi Dias Toffoli. O detalhe é que ele não integra o governo do capitão. Dá expediente como ministro do Supremo Tribunal Federal.
O presidente deve a Toffoli um favor de mãe: a liminar que paralisou as investigações contra o primeiro-filho, Flávio Bolsonaro. Com uma canetada em pleno recesso, o ministro tirou a polícia do encalço do Zero Um. Para salvá-lo, travou centenas investigações que também usaram dados do Coaf e da Receita Federal.
“Nunca na história brasileira um plantão judiciário concedeu liminar num caso sem urgência e a causar um tumulto de tal ordem”, resumiu o professor Walter Maierovitch.
A liminar surpreendeu pela ousadia, não pelo propósito. Desde a campanha, Toffoli se esforça para cortejar Bolsonaro e os militares que o cercam. Numa atitude inédita na democracia, o ministro instalou um general na presidência do Supremo. Depois saiu-se com a declaração de que preferia chamar o golpe militar de “movimento de 1964”.
Com Bolsonaro no poder, Toffoli virou habitué do Planalto e do Alvorada. Em abril, acompanhou o presidente num encontro com pastores evangélicos que o apoiaram na eleição. No mês seguinte, posou de figurante num café da manhã com deputadas e senadoras governistas.
As aparições foram complementadas pelo anúncio de um estranho pacto entre Poderes, a pretexto de “destravar o Brasil para retomar o crescimento”.
Após o recesso de julho, o ministro resolveu dar mais uma prova de fidelidade. Na revista “Veja” que circula neste fim de semana, ele relata encontros em que teria acalmado políticos, empresários e militares insatisfeitos com Bolsonaro. Toffoli emerge da entrevista como o fiador de um governo em apuros.
“O Supremo deve ter esse papel moderador, oferecer soluções em momentos de crise”, afirma.
O Poder Moderador foi abolido pela Constituição de 1891. O texto instituiu a separação dos Poderes, que deveriam funcionar com “independência e harmonia”. A ideia de um Judiciário governista, seja qual for o governo, contraria um princípio básico da República.
No Congresso, os movimentos do presidente do Supremo são interpretados como uma busca por proteção. Nomeado pelo ex-presidente Lula, ele costuma ser alvo da militância bolsonarista na internet. O ministro também se viu na mira da Lava-Jato ao ser citado na delação da OAS. No início do ano, soube-se que a Receita investigava sua mulher por suspeita de irregularidade fiscal.
Em março, Toffoli instaurou um inquérito sigiloso que, nas palavras da procuradora Raquel Dodge, transformou o Supremo em “tribunal de exceção”. Ele alegou que pretendia rebater “notícias fraudulentas” e defender a “honorabilidade” da Corte.
Há dez dias, o ministro Alexandre de Moraes usou o inquérito para suspender investigações da Receita. Beneficiou 133 pessoas, incluindo a primeira-dama do Supremo.