Folha de S. Paulo: Ex-ministros da Justiça e da Segurança Pública assinam Carta aberta pelo controle de armas

Nós, ex-ministros da Justiça e da Segurança Pública, que em diferentes momentos da história fomos responsáveis por conduzir a política de segurança pública no âmbito federal, demonstramos nossa profunda preocupação com os retrocessos no controle de armas e munições e com o impacto dos decretos federais no desmantelamento dos principais pilares desta agenda.
Foto: Marcos Corrêa/PR
Foto: Marcos Corrêa/PR

Ampliar acesso não é solução para garantir segurança

Nós, ex-ministros da Justiça e da Segurança Pública, que em diferentes momentos da história fomos responsáveis por conduzir a política de segurança pública no âmbito federal, demonstramos nossa profunda preocupação com os retrocessos no controle de armas e munições e com o impacto dos decretos federais no desmantelamento dos principais pilares desta agenda.

A efetividade das políticas públicas depende de sua continuidade, monitoramento e avaliação constantes para que possamos aperfeiçoá-las e dar respostas a seus novos desafios. O controle de armas e munições no Brasil é uma agenda central para o enfrentamento do crime organizado e para a redução dos homicídios. Por essas razões, seus ganhos não podem ser colocados em risco. Precisamos trabalhar para o seu fortalecimento, impedindo retrocessos.

No período em que exercemos nossas funções de ministro, cada um de nós trabalhou para que fosse estabelecida no país uma política de regulação responsável de armas e munições. Em 2003, o Congresso aprovou o Estatuto do Desarmamento, um importante passo nesta trajetória. Resultado de mobilização entre diferentes partidos, organizações da sociedade civil e lideranças de diversos setores da sociedade, além de quase um ano de debates no Congresso, o estatuto definiu alguns dos pilares centrais desta regulação: proibição do porte civil, restrições à posse e o estabelecimento de mecanismos de controle de produção, circulação e comercialização de armas e munições.

Independentemente dos partidos que estavam no poder e da orientação dos governos dos quais fazíamos parte, nosso compromisso sempre foi o de fortalecer avanços que consolidassem o Brasil como uma referência de regulação responsável de armas e munições para a América Latina e para o mundo.

Conquistamos avanços importantíssimos, incluindo a queda da taxa de crescimento de homicídios nos primeiros anos da legislação em vigor e a desaceleração no crescimento de mortes por armas de fogo nos anos posteriores. De acordo com o Mapa da Violência, na década seguinte à sua aprovação, o Estatuto do Desarmamento ajudou a salvar a vida de cerca de 133 mil brasileiros. Apesar desses avanços, agora se articula o desmantelamento de uma lei largamente discutida, democraticamente votada e universalmente executada por diferentes governos.

A consolidação de uma regulação responsável de armas e munições no país é uma ação de longo prazo e é preciso orientar todos os esforços para superar os desafios com os quais ainda somos confrontados. Tais esforços precisam ser feitos em contínua colaboração com os estados e quadros técnicos e profissionais que se dedicam ao enfrentamento dos desvios e tráfico ilegal de armas e munições, à redução da criminalidade e à prevenção da violência no país.

Como ex-ministros e cidadãos, estamos convencidos de que ampliar o acesso às armas e o número de cidadãos armados nas ruas, propostas centrais dos decretos publicados pelo Executivo federal, não é a solução para a garantia de nossa segurança, de nosso desenvolvimento e de nossa democracia.

Ao invés de flexibilizar os principais pilares do controle de armas e munições de nosso país, precisamos proteger o legado das conquistas que protagonizamos e concentrar nossos esforços na função primordial do Estado: garantir o direito à vida e a segurança para todos.

Aloysio Nunes Ferreira
Ex-ministro da Justiça (2001-2002, governo FHC)

Eugênio Aragão
Ex-ministro da Justiça (mar. a mai.2016, governo Dilma)

José Carlos Dias
Ex-ministro da Justiça (1999-2000, governo FHC)

José Eduardo Cardozo
Ex-ministro da Justiça (2011-2016, governo Dilma)

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