Paulo Guedes enfrentou dois problemas: o temperamento e a fraqueza da base. A oposição repetiu as demagogias de sempre
Eram cinco da tarde quando o ministro Paulo Guedes recebeu perguntas de deputados do PSL. Até então ele havia enfrentado apenas os 50 tons —e decibéis —de crítica ao projeto da Previdência. Isso é apenas uma amostra da falta de organização da base. O centrão, que já defendeu outros governos, e outras reformas, não jogou a favor. Guedes cometeu erros ao falar ontem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O principal foi cair em tantas provocações, o que acabou levando ao encerramento antecipado da sessão após bate-boca com um deputado. Mas Guedes está absolutamente certo no seu diagnóstico: o sistema de repartição está falido, a Previdência precisa mudar por ser deficitária e criadora de desigualdades.
A oposição não tem uma ideia nova, uma proposta. Não consegue explicar as próprias contradições. O PT fez também uma reforma da Previdência e se o fez é porque havia déficit. Agora nega o rombo, apesar de tê-lo aprofundado com suas desonerações. Mas é um equívoco o ministro achar que se um deputado grita ele deve gritar de volta. Esse estilo faz parte do show deles, mas nunca de um ministro da economia. Quem garante a palavra ao convidado é o presidente da Comissão e não a sua repetição de “eu tenho o direito de falar, pessoal?” A sorte de Paulo Guedes é Jair Bolsonaro não ser mais deputado. Ele era bem mais histriônico e agressivo do que os deputados que enfrentou ontem.
Um erro estratégico do ministro Guedes foi falar tanto em capitalização. Ele está convencido de que esta é a melhor proposta para o futuro. O problema é que a reforma da Previdência muda os parâmetros do atual sistema. O projeto de capitalização ficou para ser detalhado depois. O próprio Paulo Guedes afirmou que, dependendo “da potência fiscal” do que for aprovado, a capitalização nem será proposta.
Então esta é a hora de lutar pelo atual projeto e nele o ministro deveria ter se concentrado. Cairia em menos armadilhas. O ministro teve explosões bem típicas de seu temperamento, mas nada convenientes para o seu objetivo. Às oito da noite houve desentendimento em torno de ele ter dito que era preciso internar quem nega a necessidade da reforma. Ele costuma dizer que não é do meio político. Mas é fácil saber algumas regras. Ao responder, não dizia o nome do parlamentar, e sim “o primeiro a falar”, “o segundo”. O deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE) avisou que ali eram todos iguais. “De primeiro escalão para primeiro escalão”. Ele então acatou a sugestão de anotar o nome.
Apesar de a CCJ não ser uma comissão de discussão de mérito, e sim de verificação da constitucionalidade, os deputados não respeitaram isso. E esse foi outro erro de estratégia. Paulo Guedes poderia ter levado sim uma apresentação mais estruturada com algumas ideias básicas e números. Isso evitaria a crítica de que ele fora genérico e não havia explicado a própria proposta. Aqueles minutos iniciais, com a imprensa transmitindo, seria uma boa oportunidade para explicar aos deputados e a quem acompanhasse os pontos centrais da reforma. Números importantes foram falados de forma vaga e sem informação visual.
As críticas que Paulo Guedes ouviu são conhecidas. Os que não querem fazer a reforma sempre explicarão a sua posição alegando que o projeto afeta os mais pobres. A realidade é que os mais pobres se aposentam mais tarde e recebendo menos. São 71% dos beneficiados. No caso da mulher, a média das que se aposentam hoje por idade já é 61,5 anos. Quem se aposenta com 54 anos está nos 29% do sistema do tempo de contribuição.
O governo deu um presente a quem quer argumentos demagógicos para se opor à reforma, quando propôs mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC). É fácil para um político dizer que está ali defendendo os mais pobres. Difícil é assumir que defende as aposentadorias dos que ganham mais no sistema. Qualquer consulta aos dados mostra que os servidores públicos, dos três poderes, se aposentam mais cedo e ganhando muito mais, têm inúmeras vantagens que são negadas ao resto da população.
A reforma dos militares ter ido junto com uma alta nos soldos torna mais difícil a vida do governo. Mas, como disse Paulo Guedes, “você são os senhores desse destino”. O Congresso, com os erros do governo e a demagogia da oposição, tem o poder de enterrar mais uma reforma. Se o fizer, tornará o colapso mais iminente.