Míriam Leitão: Os sinais mistos do agronegócio

Ministra da Agricultura diz que a grilagem será reprimida, isso é bom sinal, mas outros pontos de seu discurso levantam dúvidas.
Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil
Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil

Ministra da Agricultura diz que a grilagem será reprimida, isso é bom sinal, mas outros pontos de seu discurso levantam dúvidas

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse que o governo não aceitará invasão de terras indígenas. “É preciso separar o que é agronegócio e o que é crime. Bandido em todo lugar precisa ser combatido”, afirmou. Ela nomeou o deputado Valdir Colatto para o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), que defende diminuir o tamanho das reservas legais e tem um projeto que permite a caça de animais silvestres, quando eles prejudicarem a agropecuária. A ministra defende a escolha que fez. “Temos que acabar com essa história de que ser ruralista é ruim.”

O Ministério ficou muito maior no governo Bolsonaro porque recebeu toda a
parte de demarcação de terra indígena que antes estava na Funai. Isso levantou preocupação entre ambientalistas e lideranças indígenas e animou grileiros. Já tem havido invasões de terras indígenas e outras estão programadas. Mas a ministra Tereza Cristina diz que discorda da interpretação de que essas nomeações e mudanças na administração pública devam ser entendidas como incentivo à grilagem. Sobre a escolha do deputado Nabhan Garcia para ser o secretário que vai cuidar da questão fundiária e da demarcação de terras indígenas, ela refuta o conflito de interesses embutido na escolha.

—Não se pode achar que, porque o Estado brasileiro mudou, vai ser possível transgredir a lei. Os índios têm 13% do território, mas as áreas estão confirmadas. O grande problema são as demarcações que estão sendo feitas, e vivemos 13 anos noutro governo e não se resolveu. Temos cada dia mais conflitos. Tem gente que tinha título da terra do Estado brasileiro há mais de 80 anos e vem uma demarcação aí. Não vamos reduzir, mas a Justiça terá que dizer — afirmou a ministra.

Quem acompanha a questão fundiária sabe que há muito documento falso de propriedade na Amazônia. O discurso da ministra de que a grilagem será reprimida, tranquiliza, mas outros pontos do que ela fala, ou escolhas que tem feito, levantam dúvidas. Ao longo de toda a entrevista, contudo, Tereza Cristina repetiu que a lei será cumprida, seja quem for o infrator. Ela justificou as mudanças administrativas:

—A demarcação de terra foi para o Ministério não por uma questão de ideologia, mas porque o governo decidiu agregar todas as áreas afins, como fez com a economia.

A ministra disse que irá ao Maranhão em fevereiro, onde houve um dos casos de invasão, e quer conversar com lideranças indígenas. Reclamou das cobranças, lembrando que o governo tem apenas 15 dias. É verdade, mas no Brasil a extensão da fronteira agrícola tem ocorrido com muita violência. A escolha de uma das partes em conflito para comandar o setor é uma tomada de posição.

O secretário Nabhan Garcia, que é muito amigo do presidente Jair Bolsonaro, disse recentemente que sua secretaria tem status de ministério. Perguntei se é isso mesmo, ou se ele será subordinado a ela. A ministra Tereza Cristina disse que ele será um dos vice-ministros, mas que a chefe será ela.

A ministra se envolveu numa controvérsia com Gisele Bündchen. Criticou a modelo, que respondeu com carta longa, firme e bem educada. A ministra diz que não a criticou, “mulher linda e inteligente”, mas repetiu que brasileiros de projeção no exterior deveriam falar bem do país.

Tereza Cristina reafirmou as críticas ao que chama de “excesso de poder dos fiscais ambientais”:

— Os fiscais aterrorizam os produtores. Esses fiscais precisam ser treinados.

Sobre o crescimento do desmatamento nos últimos anos, disse que é preciso ver exatamente onde está ocorrendo e se é ilegal. Ela disse que a meta de “desmatamento ilegal zero” pode até ser antecipada, mas repetiu que o Brasil precisa receber recursos dos outros países por este combate ao desmatamento. Afirmou também que é contra a redução do tamanho das reservas legais em cada bioma. Bom saber, porque o novo diretor do Serviço Florestal, Valdir Colatto, já defendeu a redução dessas áreas de preservação nas propriedades. Em favor do futuro do próprio agronegócio, tomara que vença o lado luminoso do setor rural na gestão da ministra Tereza Cristina.

Entro em férias por três semanas. Este espaço será ocupado por uma coluna de notas escrita por Álvaro Gribel e Marcelo Loureiro.

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