Luiz Carlos Azedo: A blindagem de Guedes

“Em meio ao zunzunzum de que Guedes havia ameaçado se demitir do cargo, Bolsonaro e seu ministro acertaram os ponteiros. Aparentemente, a equipe econômica foi finalmente blindada”.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

“Em meio ao zunzunzum de que Guedes havia ameaçado se demitir do cargo, Bolsonaro e seu ministro acertaram os ponteiros. Aparentemente, a equipe econômica foi finalmente blindada”

Uma das razões do sucesso do Plano Real foi a blindagem da equipe econômica comandada por Pedro Malan, mesmo levando-se em conta que o presidente Itamar Franco tinha suas idiossincrasias e, vez por outra, metia a colher nos assuntos econômicos. A maior delas, sem dúvida, foi a volta do fusquinha (Volkswagen), que havia saído de linha. À época, em contraposição à importação de carros liberada pelo seu antecessor, o presidente Collor de Mello, que renunciou ao mandato para evitar o impeachment, Itamar jogou uma boia para a indústria automobilística, que sofria a concorrência até dos carros russos, e lançou a proposta de criação do carro popular. O fusca foi relançado com pompa e circunstância, mas era um produto obsoleto e antieconômico, que sobreviveu apenas mais alguns anos.

A intervenção de Itamar Franco na economia, porém, esbarrou na blindagem da equipe econômica após Fernando Henrique Cardoso assumir o Ministério da Fazenda. Seus antecessores (Gustavo Krauser, Paulo Haddad e Eliseu Rezende) haviam fracassado nos esforços para acabar com a hiperinflação. FHC montou a mais brilhante e bem-sucedida equipe econômica desde a redemocratização, com um perfil predominantemente social-liberal, sob o comando de Malan, seu futuro ministro da Economia. Acabou eleito presidente da República no primeiro turno.

No primeiro mandato de FHC, com Gustavo Franco à frente do Banco Central, depois de um período de ajuste fiscal e monetário, marcado pela paridade do real com o dólar, a estabilização da economia finalmente encontrou seu eixo no famoso “tripé” da política monetária, que é adotado até hoje: “equilíbrio fiscal, meta de inflação e câmbio flutuante”. Essa política monetária também garantiu o sucesso do primeiro mandato do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No segundo mandato de Lula, porém, houve a crise do mercado financeiro norte-americano e uma forte retração da economia mundial, o que levou à guinada expansionista e intervencionista na economia, principalmente no governo Dilma, que resultou na maior recessão de nossa história e gerou uma massa de desempregados de 14 milhões de pessoas.

“Politizar a economia”, para usar uma expressão do senador Cristovam Buarque (PPS-DF), não é uma ideia boa para quem está no governo; entretanto, é uma estratégia muito utilizada pela oposição. Ideologizar a economia também pode dar ruim, como se diz. Todas as crises de governo que resultaram em rupturas políticas (impeachments de Collor e Dilma, por exemplo) ou mesmo institucional (Revolução de 1930 e o golpe militar de 1964) ocorreram durante crises econômicas profundas.

Bancos públicos
De certa forma, a nova equipe econômica tem um perfil essencialmente técnico, mas as narrativas sobre a política econômica do presidente Jair Bolsonaro e do seu ministro da Economia, Paulo Guedes, ainda não estão em sintonia fina e têm um forte viés ideológico. Na semana passada, declarações precipitadas de Bolsonaro anunciando medidas financeiras e tributárias em desacordo com os planos da sua equipe econômica geraram inquietação no mercado. O episódio levou a desmentidos oficiais inéditos do chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (é normal presidente desmentir subalternos; ministro desmentir presidente é novidade). No fim de semana, em meio ao zunzunzum de que Guedes havia ameaçado se demitir do cargo, Bolsonaro e seu ministro acertaram os ponteiros. Aparentemente, a equipe econômica foi finalmente blindada.

Ontem, Paulo Guedes falou pela primeira vez, depois de ter cancelado as entrevistas programadas para sexta-feira passada. Durante cerimônia de posse dos novos presidentes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Joaquim Levy; do Banco do Brasil, Rubem Novaes; e da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, reafirmou a orientação ultraliberal que pretende imprimir à economia: “O dirigismo econômico corrompeu a política brasileira e travou o crescimento da economia. O mercado brasileiro de crédito também está estatizado e sofreu intervenções extremamente danosas para o país”.

Guedes denunciou o nosso velho pacto patrimonialista: “A máquina de crédito do Estado sofreu desvirtuamento. Perderam-se os bancos públicos por meio de uma aliança perversa de piratas privados, democratas corruptos e algumas criaturas do pântano político”. Segundo ele, houve erros em gestões anteriores do BNDES, quando o banco emprestou a juros baixos para as empresas mais ricas, conhecidas como “campeãs nacionais”, ou investiu dinheiro em projetos de pouco retorno. Realizada no Palácio do Planalto, a solenidade serviu para Jair Bolsonaro reiterar a confiança na equipe econômica e prometer mais transparência nos bancos públicos: “Todos os nossos atos terão de ser abertos ao público, e o que ocorreu no passado também. Não podemos admitir que, em qualquer uma dessas instituições, tenha qualquer cláusula de confidencialidade pretérita”.

Nas entrelinhas: A blindagem de Guedes

 

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