Depois de nomeado ministro, Ernesto Araújo poderia ter encontrado o equilíbrio para exercer o cargo. Mas continua sem nexo e histriônico
O futuro ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, continua se esforçando muito para produzir mais desatinos do que os governos petistas naquela pasta. E tem conseguido. O principal erro da diplomacia é quando ela se dispõe a representar uma parcela do país, desprezando ou ofendendo o resto. Agora ele diz que representará o agronegócio, porque o PT o fez com o MST. Talvez fosse bom ele entender que a Casa de Rio Branco deve espelhar o país e não um grupo, por mais importante que seja para a economia.
Durante os dois anos e meio do governo Temer, tentou-se corrigir as inclinações indevidas e a paralisia decisória do período anterior. Houve desde a mudança em relação ao governo chavista até a redução de pendências burocráticas. Só o atual chanceler, Aloísio Nunes Ferreira, aprovou quase mil remoções que estavam pendentes. O custo da política externa do PT pode ser quantificada pelos calotes no BNDES que o Tesouro terá de cobrir. Aconteceram também os vexames, como instalar o então presidente Lula numa tenda para ter aulas de geopolítica de Muamar Kadafi ou a imposição aos diplomatas de leitura obrigatória de textos de esquerda. A grande virtude no governo Temer foi a busca da normalidade.
Agora volta-se o pêndulo para o sentido oposto, com igual equívoco. Como se parecem. A diferença é que o embaixador Celso Amorim, apesar dos erros que cometeu, era um diplomata com carreira consolidada. O embaixador Ernesto Araújo é o equivalente a um general de divisão chamado a comandar o Exército.
Uma das decisões acertadas no período Temer foi a iniciativa de suspender a Venezuela do Mercosul, com base na cláusula democrática. O governo Maduro não é democrático, portanto, não cumpre o pré-requisito. Qualquer histrionismo em relação a ele só vai municiá-lo. O mais sábio com relação ao governo da Venezuela é não dar a Nicolás Maduro o que ele quer: um “inimigo” externo. Quando Maduro faz ameaças de armar as milícias, é bom ignorar. Algumas pessoas sabem disso no novo governo brasileiro, mas entre elas não está o nosso esbravejante chanceler com seus tuítes voadores.
Araújo soltou várias notas definindo o que ele chama de “nova política externa”. Disse que o Brasil vai exportar soja, frango, carne e açúcar, mas “também esperança e liberdade”. Segundo o novo chanceler, “a velha política e a velha mídia” querem “usar o agro como pretexto para reduzir o Brasil a um país insignificante”. A palavra “ridícula” é a mais apropriada para definir essas e outras manifestações do futuro ministro.
Os textos que ele assinava em seu blog sempre foram rasos. Mas naquele tempo ele era apenas uma pessoa se esforçando para ganhar espaço no futuro governo. Depois que atingiu o objetivo almejado, ser nomeado ministro, Ernesto Araújo poderia ter encontrado a centralidade necessária para o exercício eficiente do cargo. Contudo, permanece histriônico e sem nexo.
Sua mistura inusitada de despropósito político, fundamentalismo religioso, palavras intempestivas podem provocar um estrago grande nas relações do Brasil com o mundo. O clima de revolta entre diplomatas se espalha. Não por discordarem do futuro governo. Há pessoas com convicções políticas diferentes entre si e a mesma preocupação porque sabem que o futuro ministro tem ferido um a um os princípios de uma boa diplomacia.
A sua “nova” política externa será, na verdade, a diplomacia errada. Na economia, os governos do PT criaram a “nova matriz econômica”. Não era nova, estava equivocada e levou o país à recessão. Proclamar a adoração ao governo Trump vincula o país a uma administração, que é passageira, em vez de ser ao país, que é permanente. Além disso, representa um retrocesso de meio século na política externa, ao tempo do alinhamento automático.
As várias espetadas em diversos parceiros comerciais, cometidas por ele e por outros do futuro governo, têm o mesmo componente. São gratuitas. O Brasil nada ganha com isso e pode perder. Os perdedores são os mesmos que Ernesto Araújo alega que defenderá porque são, segundo ele, “a essência da brasilidade”, os empresários do agronegócio. Sendo o Brasil um dos mais eficientes produtores de alimentos do mundo, a militância fervorosa e maniqueísta do novo chanceler pode fechar portas que hoje estão abertas.