Presença de militares do Exército no Planalto pode levar a um esvaziamento de decisões a cargo do Ministério da Defesa
Por Vinicius Sassine, de O Globo
BRASÍLIA — A presença de pelo menos três generais do Exército no Palácio do Planalto e na linha de frente do governo que começa no próximo dia 1º de janeiro pode levar a um esvaziamento de decisões a cargo do Ministério da Defesa — pasta responsável por supervisionar as três Forças Armadas — e a uma contaminação política das forças, com risco de associação direta entre governo e militares. A avaliação é feita reservadamente por generais com poder de decisão no governo Michel Temer e no futuro governo de Jair Bolsonaro .
O presidente eleito decidiu cercar-se de generais da reserva do Exército para governar. Seu principal conselheiro, que vem influenciando a composição do governo de forma decisiva, é o general Augusto Heleno, indicado para ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). O general Carlos Alberto dos Santos Cruz será ministro da Secretaria de Governo. E o vice-presidente eleito, general Antônio Hamilton Mourão, quer despachar de dentro do Planalto, à frente de projetos de infraestrutura, de concessões na área e de uma espécie de coordenação dos ministérios.
Diante dessa configuração, passaram a ser frequentes as afirmações no sentido de que governo e Forças Armadas são dissociados e não devem ser confundidos, embora tenham saído do Exército alguns dos principais nomes da gestão Bolsonaro. A preocupação de generais que fazem circular essas afirmações é com uma associação direta entre a Presidência da República e as Forças Armadas, especialmente em eventuais crises que venham a ocorrer ao longo do governo.
Se algo não sair bem…
Ainda na campanha presidencial, o entusiasmo na caserna com a candidatura de Bolsonaro — capitão do Exército até o ingresso na carreira de político, em 1989, quando foi eleito vereador — já era bastante amplo, contaminando as mais diferentes escalas da hierarquia militar. Reservadamente, generais com poder de decisão apontam que será possível dissociar o governo dos militares e que as escolhas de Bolsonaro são coerentes com o que afirmou durante a campanha. O presidente eleito já falava na disputa em cercar-se de militares para governar. Mesmo assim, esses oficiais manifestam preocupação.
O temor principal é com crises ao longo do governo, que podem arrastar os militares para o centro das cobranças da população. O problema é se “alguma coisa não sair bem”, nas palavras de um general. Por isso, os generais que despacharão dentro do Palácio do Planalto se esforçarão para manter uma separação entre governo e Forças Armadas, diz ele.
O risco mais concreto, na visão de generais em posições de tomada de decisão, é de esvaziamento do Ministério da Defesa. Nas palavras de um general, é real o risco de que “um se sente na cadeira do outro”. Outro general afirmou ao GLOBO que o único representante político das Forças Armadas é o Ministério da Defesa. Assim, não caberia a mais ninguém qualquer decisão relacionada às três forças do país.