“Todo artista tem de ir aonde o povo está” (Milton Nascimento e Fernando Brandt)
“Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes” (Einstein)
Em entrevista ao Globo, a atriz Marieta Severo se diz revoltada com o que ela considera a “demonização” dos artistas: “Sempre trabalhei com a maior dignidade e honestidade. Com a maior doação. A esta altura da vida ver isto virar de cabeça para baixo. É uma interpretação que vem da absoluta falta de informação…”
De fato, é um equívoco achar que a opção política de boa parte da classe artística brasileira em defesa de Lula e do PT se deve ao “dinheiro que eles recebem da Lei Rouanet”. Não é. Este apoio aconteceria e acontece independente deles receberem estes recursos. É uma opção ideológica. Não foram “comprados”. Nossos artistas não são corruptos. Eles são dignos e honestos. A Marieta tem razão neste ponto.
O problema é outro.
Mano Brown colocou o dedo na ferida: “O que mata a gente é a cegueira e o fanatismo… A cegueira que atinge lá, atinge a nós também. Não consigo acreditar que pessoas que me tratam com tanto carinho, que me respeitam, me amam, que me servem o café de manhã, lavam meu carro, que atendem meu filho no hospital, se transformaram em monstros. Eu não posso acreditar…”.
Quem primeiro demonizou seus adversários foram o PT e a esta parte da classe artística e intelectual que agora se sente “perseguida”. Durante anos, todos os dias, chamavam quem discordava de suas ideia de “fascistas” (Marina, Gabeira, Helio Bicudo…). Nas universidades os “intelectuais” petistas e não_sou_petista_mas… calavam com gritos de claque organizada toda pessoa que ousasse criticar os governos do PT e chegaram ao cúmulo de patrocinar abaixo assinado para impedir FHC de ganhar um prêmio e de falar em uma universidade americana! Na reunião anual da SBPC urraram histéricos para impedir Cristovam Buarque de discursar… O que fizeram Marieta e os demais nestes momentos? Silêncio sepulcral…
Durante mais de uma década estes artistas e intelectuais fomentaram ou, na melhor das hipóteses, silenciaram diante deste discurso de ódio promovido pelo petismo e parece que só agora estão se dando conta do que plantaram. Como diria o Einstein, insanidade seria se estivéssemos colhendo um ambiente de diálogo, carinho e tolerância com as divergências…
A maneira de combater este discurso não é cair no extremo oposto. Fazer o que os petistas sempre fizeram, só que com o sinal trocado. Mas estes “intelectuais” também vão ter que fazer seu mea culpa, colocar sua mão na consciência, como fez o Mano Brown.
E este será um longo caminho, pois esta visão de mundo da ex-querda brasileira, além de binária, é autoritária e elitista. Dizer que a “demonização dos artistas vem da absoluta falta de informação das pessoas” é uma maneira pomposa e elegante de dizer que o povo é burro. Na verdade, este discurso só acontece quando o povo discorda deles. Quando o povo concorda e, por exemplo, vota no Lula e no PT, ele é considerado por estes mesmos PhDeuses como “sábio”…
Ora, dizer que as pessoas são “informadas” quando concordam e “desinformadas” quando discordam de nós é de um autoritarismo e elitismo à toda prova. Autoritarismo porque esta visão só aceita como verdade aquela que é proclamada pela “autoridade” (intelectual ou política) que a proclama. E elitista porque coloca estes intelectuais num pedestal de onde se julgam capazes de julgar e classificar o “povo”.
Continuo achando que o pior legado do lulismo não foi a corrupção sistêmica e o aparelhamento do Estado brasileiro, mas esta lobotomia promovida em nossa intelectualidade. Perderam completamente a capacidade crítica, de pensar de forma livre e autônoma, obcecados que estão com o seu guru.
E pior, esqueceram a lição de humildade de Milton e Fernando Brandt. E ao invés de aprender com o povo, querem continuar a dar lições ao povo “desinformado”. A máxima destes intelectuais parece ser: “todo povo deve ir aonde nós, artistas, estamos”….