Novo governo vai ter que enfrentar o dilema de escolher em qual das suas agendas pretende investir a lua de mel do começo de mandato
O mercado financeiro acredita que a agenda prioritária do presidente eleito Jair Bolsonaro será a de reformas econômicas e já comemora por antecipação. O juiz Sergio Moro foi para o governo convencido de que será possível tocar a agenda anticorrupção. Bolsonaro deu sinais de que continua focado nas suas ideias sobre segurança, como liberação de armas, redução da maioridade penal e o “excludente de ilicitude” para proteger policiais. Enquanto isso, tem feito anúncios na política externa.
Apenas 11 países, dos 193 da ONU, têm relações com todos os membros e o Brasil é um deles. É um dos orgulhos da nossa diplomacia. Bolsonaro quer sair desse simbólico clube rompendo relações com Cuba. Um ato sem maiores motivos e ganhos. Avisou que será o terceiro país do mundo a transferir a embaixada brasileira para Jerusalém. Deveria ser lembrado do relevante comércio com os países árabes. A Liga Árabe tem 22 membros e a Conferência Islâmica, 57. Recados diplomáticos estão desembarcando em alguns ouvidos de que pode haver retaliação comercial por parte de países com os quais temos superávit comercial. A falta de prioridade do Mercosul foi dita com ênfase bem audível pelo futuro ministro da Economia. A Argentina é o maior comprador de manufaturados do Brasil.
Enquanto o governo Bolsonaro exercita sua diplomacia, já vai ficando claro que haverá no Congresso, no ano que vem, pelo menos três agendas em conflito. Em qual delas, o presidente eleito Jair Bolsonaro pretende investir a sua lua de mel? A econômica, a do seu pacote de segurança, ou o combate à corrupção.
O cientista político Carlos Pereira, da FGV, lembra o grande capital político que ele terá ao assumir.
— Minha impressão é que ele aprovará tudo o que quiser no Congresso no curto prazo, porque é um governo inaugural e que terá uma maioria homogênea com partidos de centro-direita.
Essa também é a convicção do cientista político Jairo Nicolau, da UFRJ. Mas ambos lembram que ele promete governar formando maiorias eventuais conforme o tema, sem base de sustentação definida, o que pode aumentar a dificuldade da negociação, em geral árdua, no Congresso.
Governar é fazer escolhas. Bolsonaro terá que fazê-las e dizer qual é a prioridade. Sua maior ênfase durante a campanha foi o fim do estatuto do desarmamento para liberar o porte de armas, a proposta que amplia o respaldo jurídico a policiais que matam em serviço, a redução da maioridade penal, além da sua pauta de conservadorismo nos costumes. São propostas polêmicas sobre as quais nem se sabe qual é a opinião do novo superministro da Justiça, Sergio Moro. Não se vai para um governo pela metade. Moro terá que respaldar essas ideias ou então convencer o presidente do contrário.
O juiz fez a aposta de risco ao trocar a sua carreira jurídica pela ida a um governo que tem encontro marcado com várias controvérsias. Analistas com quem tenho conversado concordam que foi um enorme gol do governo Bolsonaro e que o risco ficou todo para Moro.
Ele, pelo visto, acredita que conseguirá tocar o que está resumido no livro que empunhava no avião: as novas medidas contra a corrupção. Elas nasceram de um movimento que uniu várias entidades num belo trabalho interdisciplinar e que deu origem a uma lista de 70 medidas de uma agenda anticorrupção. Especialistas que participaram do processo de preparação, acham que se escolher tocá-las o governo vai economizar de 6 a 12 meses porque essa discussão prévia já amadureceu as medidas. Resta a dúvida: como fazer isso com uma base que tem PTB, PP e outros menos investigados?
Empresários e economistas do mercado financeiro fazem a aposta geral de que Bolsonaro tocará as reformas na economia, começando pela Previdência. Nesses primeiros dias de governo eleito, o que se ouviu da equipe que se forma foi a mais ruidosa cacofonia sobre que reforma é desejável. O presidente fala em aprovar a atual proposta, da qual Onyx Lorenzoni sempre discordou. Paulo Guedes tem técnicos formulando um projeto, e o economista Marcos Cintra falou em acabar com a contribuição previdenciária patronal e criar a CPMF, ideia que Bolsonaro negou de novo. Se a economia não for a prioridade haverá uma reversão de tendência no mercado.